Maria Raquel Alves Ferreira A gestão do patrimônio arqueológico pelo estado brasileiro: O caso do sítio arqueológico do Morro da Queimada, Ouro Preto-MG Parte dos morros da Serra de Ouro Preto. “Vila Rica”. [1817-1821]. Aquarela sobre lápis. Autor: Thomas Ender 2011 Maria Raquel Alves Ferreira A gestão do patrimônio arqueológico pelo estado brasileiro:: O caso do sítio arqueológico do Morro da Queimada, Ouro Preto-MG Parte dos morros da Serra de Ouro Preto. “Vila Rica”. [1817-1821]. Aquarela sobre lápis. Autor: Thomas Ender Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo. Área de concentração: Bens Culturais, Tecnologia e Território Linha de pesquisa: Gestão do Patrimônio no Ambiente Construído Orientador: Luiz Antônio Cruz Souza Co-orientadora: Yacy Ara Froner Gonçalves Belo Horizonte Escola de Arquitetura da UFMG 2011 À Meus pais, Adilson e Ivete, meus irmãos, Paula, Carolina e Eduardo, e a meu marido, Felipe. AGRADECIMENTOS Agradeço aos professores do MACPS-UFMG, por terem me transmitido as informações que possibilitaram a realização deste curso de Mestrado em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável, de proposta inovadora e atual. E, sobretudo, ao meu orientador, Professor Luiz Souza, e à minha co-orientadora, Professora Yacy Ara Froner Gonçalves, agradeço pelas proposições e discussões apresentadas em cada orientação, possibilitando novas abordagens que enriqueceram esta pesquisa. Aos funcionários do Escritório Técnico do IPHAN em Ouro Preto, minha extrema gratidão pela forma solícita como me atenderam, ao chefe do ETOP/IPHAN, Rafael Arrelaro, à responsável pela organização do Arquivo Administrativo da Casa da Baroneza, Ilza Perdigão, e à historiadora Simone Fernandes, pelas informações prestadas, de fundamental importância para o desenvolvimento desta dissertação. Também aos ex-chefes do ETOP/IPHAN, Benedito Tadeu de Oliveira, pelas informações sobre o Projeto de Implantação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada, e à Marta D’ Emery Alves, por ter me alertado sobre a degradação do Sítio do Morro da Queimada. Também aos arqueólogos da Superintendência de Minas Gerais, Alexandre Delforge e Jeanne Crespo. RESUMO A questão da preservação ambiental vem tornando-se mais frequente nas discussões referentes à gestão pública no Brasil. A alta concentração da população brasileira na zona urbana ocasiona o adensamento das áreas centrais e o crescimento das cidades para as periferias, na maior parte dos casos, sem planejamento. Outro agravante é a implantação de obras de infra- estrutura de modo desvinculado da preservação ambiental. Conjuntamente com as atividades extrativistas realizadas sem critério em áreas rurais, o crescimento urbano sem planejamento causa danos ao ambiente, incluindo-se aí a destruição dos bens culturais existentes nestas áreas, sobretudo aqueles mais frágeis e vulneráveis, como os bens de natureza arqueológica. Em Minas Gerais, os sítios urbanos históricos da época colonial, preservados até meados do século XX, a partir da década de setenta retomaram suas atividades socioeconômicas, com um novo ciclo vinculado ao minério de ferro e também com a atividade turística, iniciando-se um processo de crescimento urbano desordenado, modificando a paisagem original e deteriorando o patrimônio arqueológico existente no entorno do centro histórico. Considerando o fato de que Sítios Urbanos Históricos possuem formas de proteção específicas, esta pesquisa buscou compreender como se dá a gestão do patrimônio arqueológico inserido em sítios urbanos tombados. Buscou-se conhecer os conceitos e os valores que nortearam os protocolos internacionais de preservação, as Cartas Patrimoniais, e sua relação com a legislação nacional e as políticas de gestão do patrimônio brasileiro, com foco no patrimônio arqueológico. Em relação à pesquisa de campo, selecionou-se o Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, localizado em Ouro Preto-MG, que guarda vestígios do antigo arraial minerador que deu origem ao Sítio Urbano Histórico tombado pelo IPHAN. Através da análise dos documentos do Arquivo Administrativo do IPHAN em Ouro Preto, observou-se a atuação do Instituto na preservação do sítio arqueológico em questão, seus entraves e conquistas. Assim, a pesquisa faz uma contextualização das políticas de preservação arqueológicas no Brasil e realiza análises estatísticas deste processo de gestão, principalmente no Morro da Queimada. O entendimento desta situação é fundamental para a realização de políticas urbanas que conciliem de modo integrado desenvolvimento e preservação. Palavras-Chave: Patrimônio cultural, gestão urbana, legislação, arqueologia ABSTRACT The question of environmental conservation is becoming more common in discussions about public management in Brazil. The high concentration of Brazilian population in the urban area causes the crowding of central areas, and the growth of cities towards the suburbs, in most cases, without planning. Another problem is the implementation of infrastructure highly divorced from environmental preservation. Along with the extraction activities carried out without discretion in rural areas, unplanned urban sprawl causes environmental damage, including therein the destruction of existing cultural property in these areas, especially those most vulnerable and fragile, like the nature of archaeological property. In Minas Gerais, the urban historical sites from the colonial era, which were preserved until the mid-twentieth century, resumed their socioeconomic activities since the seventy’s, with a new economic cycle tied to iron ore and also with the tourist activity, starting a process of urban sprawl, changing the original landscape and deteriorating the existing archaeological heritage around the town. Considering the fact that Historic Urban Sites have specific forms of protection, this study sought to understand how to happen the management of the archeological traces inserted in urban sites declared cultural heritage is done. With this search we tried to learn the concepts and values that guided the preservation of international protocols, the UNESCO legal instruments, and its relationship with national laws and policies for the management of the Brazilian heritage, with a focus on the archaeological heritage. In relation to the field research, we selected the Archaeological site of the Morro da Queimada, located in Ouro Preto-MG, which preserves traces of the former camp miner originated the Historic Urban Site declared national heritage and protected by IPHAN. Through the analysis of the documents from the IPHAN Archive's Administrative, in Ouro Preto, we observed the activity of the Institute for the conservation of the archaeological site in question, its obstacles and achievements. Thus, the research makes a contextualization of the policies to preserve archaeological sites in Brazil and performs a statistical analysis of this process of preservation, especially in the Morro da Queimada. The understanding of this situation is crucial to the achievement of urban policies that fully reconciled development and preservation. Key-Words: Cultural heritage, urban management, legal apparatus, archaeology LISTA DE ILUSTRAÇÕES Gráfico 01: Quantidade de publicações produzidas por ano no Brasil, que compõem o acervo da Biblioteca do Museu Nacional da UFRJ, desde 1870 a 2009. Gráfico 02: Quantidade acumulada de publicações produzidas desde 1870 até 2009 no Brasil, que compõem o acervo da Biblioteca do Museu Nacional da UFRJ. Gráfico 03: Quantidade de publicações produzidas por décadas, desde 1870 até 2009 no Brasil, que compõem o acervo da Biblioteca do Museu Nacional da UFRJ. Gráfico 04: Número de publicações sobre arqueologia e antropologia biológica brasileira. Gráfico 05: Quantidade acumulada de sítios tombados pelo IPHAN desde 1938 até 2010. Gráfico 06: Quantidade de sítios tombados pelo IPHAN por décadas, desde 1938 até 2010. Gráfico 07: Número de licenças de pesquisa expedidas pelo IPHAN para arqueólogos em território brasileiro (janeiro de 2003 a agosto de 2010). Gráfico 08: Quantidade de documentos encontrados no Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto-IPHAN, referentes à área do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009, distrubuídos anualmente. Gráfico 09: Quantidade acumulada de documentos encontrados no Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto-IPHAN, referentes à área do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009. Gráfico 10: Quantidade de documentos encontrados no Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto-IPHAN, referentes à área do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009, distrubuídos por décadas. Gráfico 11: Quantidade de documentos organizados por assunto, encontrados no Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto-IPHAN, referentes à área do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009, distrubuídos anualmente. Gráfico 12: Quantidade acumulada de documentos, organizados por assunto, encontrados no Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto-IPHAN, referentes à área do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009. Gráfico 13: Quantidade de documentos organizados por assunto, encontrados no Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto-IPHAN, referentes à área do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009, distrubuídos por décadas. Figura 01: Delimitação do Perímetro Tombado pelo IPHAN - 1989 Figura 02: Delimitação do Perímetro de Delimitação Especial do Plano Diretor de 1996 Figura 03: Ruínas das construções das construções do arraial minerador setecentista. Figura 04: Ruínas de um moinho. Figura 05: Mapa de Ouro Preto - 1897. Figuras 06 e 07: Ocupação irregular das ruínas – segunda metade do século XX. Figura 08: Foto Aérea de Ouro Preto. Figura 09: Foto Aérea de Ouro Preto. Figura 10: Foto Aérea de Ouro Preto. Figura 11: Imagem de satélite de Ouro Preto Figura 12: Mapa de Localização do Parque Cachoeira das Andorinhas e sua relação com as demais UC’s na região de Ouro Preto. Figura 13: Foto do Morro da Queimada de 1990. Figura 14: Foto do Morro da Queimada de 1998. Figura 15: Mapa da evolução do Morro da Queimada entre 1950 e 1997. Figura 16: Área levantada pelo Projeto de Implantação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada. Figura 17: Delimitação da área do Parque Arqueológico do Morro da Queimada e adjacências. Figura 18: Delimitação do Perímetro de Tombamento do IPHAN -1989- Anexo VII da Portaria 122/2004. Figura 19: Delimitação do Perímetro da Zona de Proteção Especial do Plano Diretor Municipal de 1996. Figura 20: Delimitação do Perímetro de Tombamento do IPHAN -1987. Figura 21: Delimitação do Perímetro de Tombamento do IPHAN -1989. Figura 22: Sítios por município – 1698 sítios pré-coloniais - Estado de Minas Gerais – 2010 Figura 23: 867 sítios pré-coloniais georreferenciados - Estado de Minas Gerais – 2010 LISTA DE SIGLAS ABCH – Associação Brasileira de Cidades Históricas AMA-OP – Associação de Amigos de Ouro Preto APA – Área de Preservação Ambiental APA-OP – Associação de Proteção Ambiental de Ouro Preto BDMG – Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais CECOR – Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis da UFMG CEFET-OP – Centro Federal de Educação Tecnológica de Ouro Preto (atual Instituto Federal de Minas Gerais, IFMG) CODEMA – Conselho Municipal de Desenvolvimento Ambiental de Ouro Preto CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente CONDEPHAAT - Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNSA – Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos do IPHAN DEPROT – Departamento de Proteção Legal do IPHAN DNPM – Departamento Nacional de Produção Mineral DPHAN Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional EIA/RIMA – Estudo de Impacto Ambiental para respectivo Relatório de Impacto Ambiental EMBRATUR – Instituto Brasileiro de Turismo (antiga Empresa Brasileira de Turismo) ENAH – Escola Nacional de Antropologia e História do México ETOP I – IPHAN – Escritório Técnico de Ouro Preto – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional FAFICH - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas FEOP – Fundação Educativa de Ouro Preto FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos FNSDEC – Fórum Nacional dos Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura GAT – Grupo de Assessoramento Técnico da PMOP IBAMA – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente IBPC - Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural IB-USP – Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo ICCROM – International Centre for the Study of the Preservation and Restoration of Cultural Property ICOM - International Council of Museums ICOMOS - International Council on Monuments and Sites IEF – Instituto Estadual de Florestas IEPHA-MG - Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais INAH – Instituto Nacional de Antropologia e História do México INC- Instituto Nacional de cultura do Peru IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional IRPA - Royal Institute for Cultural Heritage MA – Museu de Arte e Arqueologia da Universidade de São Paulo MAE-USP – Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo MCT – Ministério da Ciência e Tecnologia MinC – Ministério da Cultura do Governo Federal do Brasil MPF – Ministério Público Federal MPE – Ministério Público Estadual PAC – Plano de Aceleração do Crescimento do Governo Federal PMOP – Prefeitura Municipal de Ouro Preto PRONAPA – Projeto Nacional de Pesquisa arqueológica PVCDMOP – Plano de Valorização, Conservação e Desenvolvimento de Mariana e Ouro Preto SAB – Sociedade Brasileira de Arqueologia SGPAB – Sistema de Gerenciamento do Patrimônio Arqueológico Brasileiro SPHAN - Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional SPHAN/FNpM - Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional/Fundação Nacional pró-Memória UFBA – Universidade Federal da Bahia UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais UFOP – Universidade Federal de Ouro Preto UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro UNESCO - United Nations Educational Scientific and Cultural Organization USP – Universidade de São Paulo ZPAM - Zona de Proteção Ambiental do Plano Diretor Municipal de Ouro Preto ZPE – Zona de Proteção Especial Plano Diretor Municipal de Ouro Preto SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 8 1 O PENSAMENTO ARQUEOLÓGICO A PARTIR DO SÉCULO XX ......................... 15 2 PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO: LEGISLAÇÃO, CONCEITOS E AÇOES DE PRESERVAÇÃO ................................................................................................. 28 2.1 A proteção do patrimônio arqueológico no contexto internacional: diretrizes de intervenção ........................................................................................................................... 29 2.1.1 Conceitos e ações de reconhecimento e gerenciamento vinculadas à preservação do patrimônio arqueológico ............................................................................................. 37 2.1.2 Conservação e Arqueologia ............................................................................... 41 2.1.3 Conservação Urbana .......................................................................................... 43 2.1.4 A gestão do patrimônio arqueológico no México e no Peru .............................. 49 2.2 A gestão do patrimônio arqueológico no Brasil ........................................................ 51 2.2.1 Proteção legal do patrimônio arqueológico brasileiro: desafios e conquistas .... 51 2.2.2 Apontamentos históricos sobre os institutos de pesquisa brasileiros voltadas para a preservação do patrimônio arqueológico: .............................................................. 63 2.2.3 Apontamentos históricos sobre o IPHAN, criação e trajetória da instituição até os dias atuais, focando a preservação do patrimônio arqueológico ................................. 72 3 O SÍTIO ARQUEOLÓGICO DO MORRO DA QUEIMADA ....................................... 86 3.1 Apontamentos Históricos .......................................................................................... 86 3.2 O IPHAN em Ouro Preto: o papel do patrimônio arqueológico para a instituição na época do tombamento e seus desdobramentos nas gestões posteriores ............................. 101 3.3 Análise da Pesquisa Documental realizada no Arquivo Administrativo da Casa da Baronesa, ETOP I – IPHAN, referente à preservação do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada ........................................................................................................................... 110 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ...................................................................................... 125 CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 135 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 138 APÊNDICES .......................................................................................................................... 151 LISTA DE PASTAS PESQUISADAS NO ARQUIVO ADMINISTRATIVO DO E.T.O.P. I – IPHAN .......................................................................................................................... 151 LISTA DE SIGLAS ........................................................................................................... 156 NOMENCLATURA E SIGLAS DO INSTITUTO DE PRESERVAÇÃO NACIONAL E RESPECTIVOS PERÍODOS DE VIGÊNCIA .................................................................. 157 QUADROS DE DIRIGENETES DO IPHAN ................................................................... 157 ANEXOS (CD-ROM)..............................................................................................................................159 8 INTRODUÇÃO O século XX caracteriza-se como uma época na qual ocorreram intensas mudanças econômicas e sociais, cuja ideia predominante de desenvolvimento vinculava-se ao infinito crescimento do consumo de recursos naturais. A partir da segunda metade do século, sobretudo na década de setenta, pesquisadores e governantes de várias partes do mundo começaram a perceber que o crescimento econômico acelerado de algumas nações teria como consequência a escassez dos recursos naturais, ocasionando uma situação insustentável para os ecossistemas existentes no planeta Terra, e em decorrência disto, da própria humanidade. Nesta época, as perspectivas teóricas sobre meio ambiente faziam uma distinção entre a esfera natural e a humana, como mostra CARVALHO (2009). Sob este ponto de vista, criou-se uma hierarquia na relação entre estas esferas, na qual a humanidade detinha o controle sobre o ambiente natural. Representando outra vertente, a ONU, na Conferência de 1972, considerava o ambiente humano interligado ao ambiente natural, e assim, “o Ambiente Construído seria composto pelos espaços ocupados e transformados pelos Homens” (CARVALHO, 2009, p. 208). A conscientização de vários atores sociais sobre os riscos ambientais e sócioculturais ocasionou a realização de encontros e debates internacionais com o intuito de solucionar questões relacionadas à homogeneidade e hegemonia cultural que vigorava até então, propondo-se a valorização da diversidade das manifestações naturais e culturais. No final do século XX o pensamento científico passa a ser reavaliado em sua estrutura, sobretudo o modelo racionalista nascido na época moderna, que dominou as chamadas ciências exatas. O positivismo científico e os avanços tecnológicos mostraram-se limitados frente às questões mais amplas sobre a preservação ambiental e cultural, como conflitos históricos e crescimento urbano desenfreado. Javiér Pérez Cuéllar, Secretário das Nações Unidas de 1982 a 1991, afirmou que grande parte dos esforços empreendidos em prol do desenvolvimento1 não teve sucesso por terem negligenciado a complexidade dos diferentes grupos culturais, sendo que as experiências bem sucedidas foram aquelas que concordaram as tradições específicas de cada cultura com modernos recursos econômicos, científicos e tecnológicos. 1 O pensamento de Cuéllar que a equivalência de significado entre desenvolvimento e crescimento econômico obtido a qualquer custo, através de avanços industriais e tecnológicos, mostrou-se inadequada por negligenciar fatores sócio-culturais. Segundo SACHS (1998), questões como fome, desigualdade, repressão, desemprego, entre outros, começaram a ser tratadas nas discussões referentes ao conceito de desenvolvimento somente nos anos 70, coincidindo com os debates internacionais sobre meio-ambiente. 9 O atual contexto de mudanças climáticas e a acelerada degradação ambiental que ameaça a existência de várias espécies, inclusive a humana, colocam em risco o patrimônio arqueológico, de natureza frágil e finita. Ao considerar que os ambientes, os lugares, são construídos por vários grupos sociais ao longo do tempo, preservar os recursos ambientais e culturais implica pensar em preservá-los como patrimônio das comunidades, ou seja, como fonte de sobrevivência e como legado identitário. No entanto, inicia-se o século XXI, sem que demandas referentes à degradação do meio ambiente e à desigualdade social tivessem sido solucionadas, sendo que problemas como desertificação do solo, aquecimento global, poluição das águas e do ar, fome, abuso de mão de obra e violência, intensificaram-se com o aumento da população mundial. Países da América Latina que viveram por décadas em recessão, internamente sob regimes ditatoriais e externamente dependentes de nações economicamente mais estruturadas, após atravessar um processo de democratização, passam por um período de crescimento econômico. O fato é que estes países necessitam de políticas administrativas que articulem aumento da produção e consumo com preservação dos recursos naturais e humanos, ou seja, gestões pautadas no desenvolvimento sustentável2, para que não ocorra a falência dos sistemas sócioambientais prevista nas décadas anteriores. Na área do Direito, segundo MIRANDA (2001), a noção atual de proteção do meio ambiente não se resume ao aspecto naturalístico, mas apresenta uma conotação mais abrangente, compreendendo tudo o que envolve e condiciona o homem em sua existência, tanto nas relações com a comunidade a que pertence quanto na interação com o ecossistema que o cerca. Assim, o conceito de patrimônio ambiental compreende em si o de patrimônio cultural, devido ao fato de a noção de meio ambiente abranger todos os recursos naturais e culturais vinculados à existência humana e de todos os seres vivos. Conforme Miranda, a partir desta perspectiva, torna-se difícil separar o que é humano e o que é natural, buscando-se uma interação que beneficie ambos. Em decorrência do processo de crescimento econômico e adensamento urbano ocorrido no Brasil, sobretudo a partir da década de setenta, desencadearam-se ocupações desordenadas e explorações extrativistas que vêm afetando áreas remanescentes do processo histórico ocorrido no final do século XVII e início do século XVIII, onde se originou a colonização de Minas Gerais, ocasionando sua rápida depredação, conforme GUIMARÂES e 2 Processo de crescimento que também inclua a dimensão ambiental, além das dimensões econômicas e sociais, segundo VEIGA (2005). 10 NASCIMENTO (2006). Esta região, convencionalmente denominada de Região das Minas ou Região do Ciclo do Ouro, é dotada de grande quantidade de vestígios arqueológicos da ocupação ocorrida nos séculos XVIII e XIX, como é o caso do Morro da Queimada, localizado na área urbana de Ouro Preto, e do Forte de Brumadinho, situado na cidade de mesmo nome. Atualmente, concentram-se na região grandes empreendimentos mineradores iniciados em meados do século XX, voltados à extração principalmente do minério de ferro, que depredam tanto as zonas rurais quanto às áreas urbanas periféricas, nas quais ainda podem ser encontrados vestígios arqueológicos. As preocupações que justificam a realização deste trabalho referem-se à situação de ameaça de desaparecimento dos remanescentes arqueológicos, registros materiais de acontecimentos do passado, cuja perda seria irreversível. Este fato remete à política de preservação do patrimônio arqueológico por parte do Estado brasileiro, sobretudo no contexto político atual, em que ações desenvolvimentistas ligadas ao governo federal estão previstas para os próximos anos, como as obras do PAC, Plano de Aceleração do Crescimento. A teoria aponta para a falta de políticas públicas voltadas para proteção do patrimônio arqueológico no Brasil, em contraponto ao enfoque dado pelo IPHAN na preservação de Sítios Urbanos, como por exemplo, Ouro Preto. Atualmente os vestígios arqueológicos do Morro da Queimada não devem ultrapassar 10% de seu conjunto original (GUIMARÂES, 2004, p. 05). Faz-se necessário, portanto, a reunião e sistematização de documentos referentes à proteção deste patrimônio, ampliando o conhecimento sobre o tema, fornecendo informações para novas pesquisas. Também é imperioso alertar as instituições ligadas à proteção do patrimônio de Ouro Preto e a população da cidade sobre a ameaça de desaparecimento do sítio arqueológico do Morro da Queimada, para que revejam suas formas de planejamento e gestão urbanos. Desta forma, a pesquisa tem por objetivo identificar lacunas e avanços na proteção do patrimônio arqueológico brasileiro, buscando fomentar a reavaliação da legislação e das políticas existentes, assim como verificar a relação entre as ações do IPHAN na proteção desta categoria de patrimônio, ou a falta delas, e o processo de depredação dos bens arqueológicos inseridos em Sítios Urbanos tombados. Para o entendimento da gestão do IPHAN nestes Sítios Urbanos, a pesquisa reuniu e sistematizou informações existentes no Arquivo Administrativo do IPHAN, sobre a proteção do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, situado no Conjunto Arquitetônico e Paisagístico de Ouro Preto. Assim, buscou-se 11 compreender se as ruínas deste sítio despertaram ou não interesse do SPHAN no tombamento de Ouro Preto em 1938. A pesquisa tem ainda a intenção de ampliar e promover o conhecimento dos gestores do patrimônio e da comunidade acadêmica sobre a proteção do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada. Partiu-se da premissa de que no tombamento de Ouro Preto as ruínas do Morro da Queimada não despertaram interesse de preservação, incidindo a prioridade sobre o conjunto arquitetônico e urbanístico (obra de arte acabada), fato também ocorrido no tombamento de Mariana, apesar do tombamento das ruínas de São Miguel das Missões/ RS ter sido contemporâneo aos tombamentos dos Conjuntos Arquitetônicos e Urbanísticos de Mariana e Ouro Preto. Nas gestões posteriores, apesar da ampliação dos conceitos de bem cultural e das ações de proteção patrimonial, a Serra de Ouro Preto, onde se situa o sítio arqueológico do Morro da Queimada continuou sendo tratada como cenário, moldura do centro histórico. Considerando o contexto onde existe a falta de estrutura administrativa institucional, somada à ameaça do conjunto arquitetônico e urbanístico pelo crescimento desordenado da cidade, também se partiu da premissa de que o IPHAN continua optando pela proteção do centro histórico, permanecendo o sítio arqueológico em segundo plano. Frente ao crescente processo de degradação que os sítios arqueológicos vêm sofrendo, correndo o risco de serem extintos antes mesmo de obterem reconhecimento como patrimônio, a pesquisa busca compreender como os bens arqueológicos, de modo geral, e os bens arqueológicos de cunho histórico, mais especificamente, localizados em sítios urbanos tombados, vêm sendo geridos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Como mostra ACSELRAD (1999), a enunciação conceitual é produtora de ordenamento, divisão e classificação da sociedade. E os discursos conceituais produzem estratégias e práticas vinculadas a escolhas e condutas legitimadas por estes discursos. Desta forma, a pesquisa busca pontuar conceitos, definições e interesses que norteiam a atuação dos órgãos responsáveis pela proteção dos sítios urbanos tombados a nível federal, sobretudo o Instituto IPHAN, verificando-se a eficácia dos mecanismos gestores disponíveis para a preservação do patrimônio arqueológico inserido em áreas urbanas, ou seja, os pontos falhos e os avanços na gestão destes bens. Em relação à metodologia utilizada no trabalho, a abordagem foi qualitativa, com perspectiva interpretativa de condução da pesquisa. Buscou-se avançar no conhecimento do processo de preservação do patrimônio arqueológico pelo IPHAN, através de sua descrição, procurando o 12 nexo causal entre seus condicionantes (conceitos de patrimônio, forma de gestão), pela análise contextual, pela distinção entre forma manifesta (acervo tombado, registros, inventários) e essência (critérios norteadores de seleção). Assim, o universo a ser pesquisado foi a preservação do patrimônio nacional pelo IPHAN, desde a sua criação até os dias atuais, e a parcela deste universo a ser realmente submetida à verificação foi a atuação da instituição na preservação do patrimônio arqueológico do Sítio do Morro da Queimada, inserido no Sítio Urbano tomado como Conjunto Arquitetônico e Paisagístico de Ouro Preto. Para tal, de forma mais abrangente, realizou-se um exame da literatura referente à Arqueologia enquanto disciplina, e dos conceitos e definições que embasaram e influenciaram os protocolos internacionais de preservação do patrimônio arqueológico. De forma mais específica, foi abordado patrimônio cultural brasileiro, o patrimônio arqueológico e a gestão desta categorial de patrimônio. O acautelamento do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada foi investigado através da documentação existente no Arquivo Administrativo da Casa da Baronesa, Escritório Técnico de Ouro Preto - IPHAN. O trabalho de pesquisa documental, por sua vez, foi facilitado pela vivência em Ouro Preto e pela experiência profissional da autora, moradora da cidade, tendo trabalhado como Consultora da UNESCO através do Programa Monumenta/ BID, atuando como apoio local ao Escritório Técnico do IPHAN em Ouro Preto, no Escritório do Serro e no Escritório de Mariana. Neste sentido, realizando uma revisão da literatura pertinente ao tema, o primeiro capítulo parte de um panorama mais geral e aborda a evolução do pensamento arqueológico no século XX, período concernente ao objeto desta pesquisa, discorrendo sobre a Arqueologia enquanto disciplina, sobre suas teorias e métodos formulados de acordo com cada contexto sóciocultural em que se desenvolveram. Dentro deste enfoque, buscou-se compreender a construção da Arqueologia Histórica no Brasil, categoria vinculada ao objeto desta pesquisa, definida pelo estudo dos vestígios materiais das sociedades que possuem registros escritos, e nas Américas, ao período posterior à colonização europeia. No Brasil, esta corrente consolidou-se na década de oitenta e ganhou força a partir da restauração das liberdades públicas advindas do fim do regime ditatorial, pelo fato de resgatar os vestígios, os ideais e os direitos de povos excluídos das narrativas construídas por apenas uma parcela da sociedade. Buscou-se mostrar que esta postura de inclusão social também foi encontrada nas esferas institucionais vinculadas à salvaguarda do patrimônio nacional, com a ampliação das categorias de bens a serem acautelados, que a partir da década de oitenta incorporaram à sua responsabilidade bens de natureza intangível, como formas de expressão, conhecimentos, 13 práticas, representações e técnicas, assim como os lugares relacionados ao cotidiano das comunidades, como mercados públicos, estações de trem, entre outros. No segundo capítulo investigou-se legislação, conceitos e ações de preservação pertinentes à gestão do patrimônio arqueológico, verificando-se inclusive a abrangência deste patrimônio pelos protocolos de controle de impacto ambiental. Partiu-se de um contexto mais geral, pontuando-se as diretrizes das normas de preservação internacionais, ou seja, das Cartas Patrimoniais, procurando-se relacionar estes protocolos ao contexto sócio-político no qual foram publicados. Foi realizada também uma rápida explanação sobre os órgãos gestores do patrimônio arqueológico no México e no Peru, países cujos sítios possuem grande visibilidade mundial. Da apresentação de um panorama internacional, a investigação focou a proteção legal dos bens de natureza arqueológica no Brasil, seus desafios e conquistas, como a instauração da Lei n° 3924/1961, que dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré- históricos, assim como a Portaria n° 230/2002, que vincula a exigência de pesquisa arqueológica aos processos de licenciamento ambiental previstos pela Resolução CONAMA n° 001/1986. Buscou-se compreender também a atuação do Ministério Público na investigação de processos referentes a delitos contra o patrimônio cultural e natural, com ênfase na proteção do patrimônio arqueológico. Também foi levantado um breve histórico sobre as instituições voltadas para a pesquisa e gestão do patrimônio arqueológico brasileiro, como o Museu Histórico Nacional, o Museu Paulista e o Instituto de Pré-história da USP, verificando-se como a política governamental do país refletiu na gestão destes institutos. Investigou-se a atuação do órgão gestor do patrimônio cultural brasileiro, o IPHAN, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, originalmente SPHAN, Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, criado em 1936, enfatizando-se a organização administrativa do órgão em relação ao setor de arqueologia. Investigou-se ainda a relação dos arqueólogos da instituição com os membros da SAB, Sociedade Brasileira de Arqueologia, criada na década de oitenta, avaliando os pontos acordo e as discordâncias existentes entre os mesmos. Para verificar a efetividade da salvaguarda dos bens arqueológicos inseridos em Sítios Urbanos tomados pelo IPHAN, o terceiro capítulo analisa como caso de estudo a gestão do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, inserido no Conjunto Arquitetônico e Urbanístico de Ouro Preto, MG. O capítulo inicia-se com um breve histórico sobre o Morro da Queimada e relata o processo de tombamento do Conjunto Arquitetônico e Urbanístico de Ouro Preto, inscrito no Livro do Tombo de Belas Artes, em 1938, no Livro do Tombo Histórico e no 14 Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, em 1986, relacionando este processo de tombamento com criação do conceito de monumento atribuído a este bem, vinculado à necessidade de invenção de símbolos nacionais no início do século XX. Buscou- se também o entendimento da relação entre o IPHAN e os outros órgãos comprometidos com a preservação patrimonial em Ouro Preto, como Prefeitura Municipal, PMOP, Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais, IEPHA, Instituto Estadual de Florestas, IEF, e Universidade Federal de Ouro Preto, UFOP, considerando-se fatos como a instituição, em 1996, do Plano Diretor Municipal, no qual está inclusa a criação do Parque Municipal da Cachoeira das Andorinhas e Morro da Queimada. Com o objetivo de compreender a gestão do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada pelo IPHAN, a pesquisa embasou-se na análise dos documentos contidos no Arquivo Administrativo da Casa da Baronesa, Escritório Técnico de Ouro Preto do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, IPHAN. Os Arquivos Administrativos dos Escritórios Técnicos consistem no registro documentado da gestão do IPHAN nos Sítios Urbanos Tombados. A análise deste arquivo permitiu avaliar a trajetória do Instituto, enfocando o cumprimento de sua função ou sua omissão, quanto à preservação do patrimônio arqueológico do Morro da Queimada. Devido ao fato dos documentos específicos sobre o Morro da Queimada encontrarem-se misturados aos documentos referentes a outros assuntos, foi necessário consultar 197 pastas do arquivo supracitado, desde 1982, época em que o Escritório Técnico foi efetivamente instalado na cidade de Ouro Preto, a 2009, contabilizando um total de 38.294 folhas de documentos. Nesta consulta, foram encontrados 190 documentos específicos sobre a área do Morro da Queimada, dos quais foram transcritos aqueles de maior relevância para esta pesquisa, apresentados em anexo. 15 1 O PENSAMENTO ARQUEOLÓGICO A PARTIR DO SÉCULO XX O final do século XX consistiu em um momento onde o pensamento científico passa a ser reavaliado em sua estrutura, sobretudo o modelo racionalista nascido na época moderna, que dominou, sobretudo, as chamadas ciências exatas. Trata-se de uma época de transição e instabilidade, em que o positivismo científico e os avanços tecnológicos mostraram-se limitados frente a questões ampliadas sobre a preservação ambiental e cultural, como conflitos históricos, crescimento urbano desenfreado e a globalização. Nesta linha de pensamento, LIMA (2007) mostra que a existência de várias espécies, inclusive a humana, encontra-se ameaçada pelas mudanças climáticas e pela acelerada degradação ambiental que vêm ocorrendo, sobretudo nas últimas décadas, as quais também colocam em risco o patrimônio arqueológico, de natureza frágil e finita. Como assinala CUÉLLAR3 (1997), o fracasso de grande parte dos esforços empreendidos em prol do desenvolvimento deve-se à negligência para com a complexidade das relações humanas, as crenças, os valores e as motivações inerentes a cada grupo cultural. Segundo o ex-secretário-geral da Organização das Nações Unidas, o processo de desenvolvimento como um processo único, uniforme e linear teve que ser repensado, passando-se a considerar a diversidade cultural, as diferentes versões de modernização, de acordo com as experiências próprias de cada povo. As experiências bem sucedidas de desenvolvimento foram aquelas que concordaram as tradições específicas de cada cultura com modernos recursos econômicos, científicos e tecnológicos. O sociólogo Boaventura Souza Santos, em Discurso sobre as ciências (2003), afirma que o conhecimento científico é construído socialmente, portanto, o fato de ser rigoroso não implica que seja neutro. O cientista, ao observar seu objeto, o faz a partir de um conhecimento formado em determinado contexto histórico, que influencia sua prática científica. Para Santos, a visão humanística das Ciências Sociais, que coloca o observador na posição de autor e sujeito, resistindo à separação sujeito/ objeto, buscando compreender o mundo ao invés de controlá-lo, confere a estas um caráter contemporâneo. Enquanto na Revolução Científica do século XVI os pesquisadores apontavam a construção de paradigmas científicos como solução para os problemas mundiais, as modificações estruturais do pensamento científico na época 3 Javiér Pérez Cuéllar foi Secretário-geral das Nações Unidas entre os anos de 1982 e 1991. 16 atual procuram desenvolver um paradigma social, que seja também ético. Neste paradigma emergente o conhecimento é total, ou seja, o objeto é analisado numa perspectiva interdisciplinar, sendo também local, focando temas que abordam “projetos de vida locais”. (SANTOS, 2003, p. 76). Apresenta-se, portando, uma metodologia de pesquisa que não é disciplinar, mas sim temática. Nesta mesma linha de pensamento, o arqueólogo Bruce G. Trigger, em História do Pensamento Arqueológico, aponta para o fato de que os arqueólogos, assim como historiadores e sociólogos, “abandonaram a certeza positivista e passaram a ter dúvidas acerca da objetividade de sua pesquisa” (TRIGGER, 2004, p. 01), considerando que não apenas as questões lançadas por eles, mas também as respostas julgadas como verdadeiras são determinadas por fatores sociais. Segundo o autor, o estabelecimento de qualquer fato, por mais simples que seja, depende de um contexto teórico. O que ocorria no passado é que os quadros teóricos não eram formulados explicitamente e conscientemente pelos arqueólogos, ao contrário do contexto atual da arqueologia americana, por exemplo, onde as proposições são verificadas de maneira sistemática. Para Trigger, não se pode determinar a exclusividade teórica às formulações da época atual, sendo que uma análise mais aprofundada da história da interpretação arqueológica mostra que as teorias anteriores apresentavam um nexo de relações coerentes. Ainda segundo Trigger, há autores que consideram os trabalhos de arqueólogos do passado dotados de embasamento teórico, porém afirmam a falta de consistência científica verificada nestes métodos, ou seja, não havia paradigma de pesquisa, conceito lançado por KUHN (2006), em A estrutura das Revoluções Científicas. Um paradigma consiste num modelo aceito e difundido por uma comunidade científica, formado por leis, teorias, aplicações e instrumentos, que proporcionará a formação de um conhecimento coerente e específico da pesquisa científica. Teóricos como D. L. Clarke compactuam da concepção de Kuhn, ao considerar a arqueologia uma disciplina de caráter empírico, “indisciplinada” (CLARKE, 1968, apud. TRIGGER, 2004, p. 05), que até a década de 1960 encontrava-se em “estado pré- paradigmático” (TRIGGER, 2004, p. 05). Trigger questiona este posicionamento, afirmando que estudos atuais sobre a evolução da arqueologia descobriram formulações muito mais abrangentes e consistentes do que se pensava até então, como o fato de que havia um respeito à integridade do passado, procurando analisar os achados em seu contexto histórico, e não segundo a ótica sóciocultural e econômica da época atual. 17 Seguindo a análise de Trigger, outro grupo de arqueólogos considera que há um sentido linear no desenvolvimento da disciplina, onde novos paradigmas substituíram os anteriores, seguindo o conceito de KHUN (2006) sobre revolução científica (STERUD, 1973, apud. TRIGGER, 2004, p. 05). Há ainda outra linha de pensamento para a qual as ciências não passam por revoluções, mas por mudanças graduais, para a qual a Arqueologia, caracteriza-se simultaneamente por tipos distintos de paradigmas, que podem interligar-se de maneira tênue, alterando-se em proporções diversas, que acabam produzindo lentas alterações, sem rupturas radicais, haja visto que muitas interpretações atuais são parecidas com as do passado (BINFORD e SABLOFF, 1982, apud. TRIGGER, 2004, p. 06). Há ainda outro ponto de vista apresentado por um grupo de arqueólogos que avalia o desenvolvimento da teoria arqueológica como um processo não linear, mas dialético, onde a causa das mudanças viria de novas ideias formuladas em outras ciências sociais, ou seja, de um diálogo externo, e não de dados arqueológicos, sendo, portanto, moldadas por contextos sócioculturais em constante transformação (PIGOTT, 1950, 1968 e 1976; DANIEL, 1950; HUNTER, 1975, apud. TRIGGER, 2004, p. 07). O enfoque histórico do estudo de Trigger permitiu que os estilos de interpretação arqueológica fossem observados como modelos mutáveis, os quais não podem ser delimitados cronologicamente nem geograficamente, pois vêm influenciando e inovando os conceitos e procedimentos arqueológicos em diferentes regiões e em várias épocas. Assim como ocorre com as disciplinas de modo geral, a grande questão que vem sendo debatida pelos arqueólogos é a influência do contexto social nas pesquisas. Para os positivistas, se os dados adequados estiverem disponíveis e forem analisados a partir de métodos científicos apropriados, a validade dos resultados independe da formação cultural do pesquisador. No entanto, outro grupo avalia que as condições sociais influenciam a seleção das questões a serem abordadas, dos dados julgados relevantes, “como também as respostas que os arqueólogos se predispõem a considerar aceitáveis”. (TRIGGER, 2004, p. 12) Dois grupos de estudiosos são formados a partir daí, os hiper-positivistas, os quais consideram que somente a qualidade dos dados arqueológicos e das técnicas analíticas determinam a validade das interpretações, e os hiper-relativistas, que tendem a desconsiderar a importância dos dados arqueológicos, buscando explicar as interpretações arqueológicas a partir da formação cultural e social do pesquisador. Assim, focando suas observações no pesquisador, Trigger afirma que, no início, a arqueologia encontrou seus patronos na aristocracia, mas o desenvolvimento da disciplina foi concomitante à ascensão da classe média na sociedade ocidental, recebendo 18 influências dos profissionais desta classe que atuaram ou se envolveram em pesquisas arqueológicas, os quais compõem grande parte do percentual dos pesquisadores da academia. Assim, a interpretação dos dados arqueológicos está arraigada ao conhecimento prévio que o pesquisador tenha sobre o registro arqueológico, assim como aos interesses da sociedade da qual faz parte. Sobre a influência do contexto sócio-político na atuação dos profissionais da área de arqueologia, LIMA (1988) mostra que: (...) cabe aos profissionais que a ele (patrimônio arqueológico e passado) se dedicam uma conscientização quanto aos possíveis usos políticos de seu objeto de estudo, uma avaliação quanto ao seu grau de envolvimento com os sistemas vigentes e uma reflexão quanto aos seus condicionamentos e influências determinados pelos seus próprios valores e ideologias (LIMA, 1988, p. 19). Embora o reconhecimento da Arqueologia como disciplina científica seja recente, com corpo teórico estabelecido a partir da década de sessenta, o emprego de dados arqueológicos para testar convicções potenciais referentes às origens humanas e ao desenvolvimento da sociedade antecede a sua estruturação disciplinar com paradigmas científicos próprios segundo os conceitos de KUHN (2006). Escavações realizadas com o intuito de encontrar antiguidades são registradas desde o século VI AC, segundo GASPAR (2003); porém, estas iniciativas não são consideradas o surgimento da arqueologia. Na época renascentista, os antiquários também realizavam empreendimentos com finalidades colecionistas e para aumentar fortunas (príncipes e papas participavam), buscando encontrar peças valiosas, fazendo da arqueologia um ramo da arte. A acumulação de relíquias da antiguidade, neste sentido, tinha bases aristocráticas e eram de cunho privado. No século XVIII, antiquários publicaram uma revista intitulada Arqueologia, revelando preocupação em divulgar seus trabalhos. Apesar da busca pelas origens da cultura europeia, que teve como consequência o reconhecimento da cultura greco-romana, BERNAL (1952) considera estes empreendedores como pré-arqueólogos, os quais tinham a intenção de resgatar objetos de arte sem se importar com seu contexto ou significado cultural. Segundo o pesquisador, os exploradores não levantavam plantas exatas, nem mesmo faziam croquis, não conservando dado algum sobre a posição de um objeto, perdendo todas as associações, como também não preservavam uma ruína prestes a cair. Estas coleções privadas, no entanto, ajudaram a salvar do vandalismo vários dos objetos que se encontram em museus modernos, os quais foram sendo acumulados ao longo dos séculos e posteriormente tornaram-se propriedade estatal. Como aponta Bernal, a depredação de sítios arqueológicos remonta à antiguidade, tendo-se notícias de fatos ocorridos no século XII A.C. Entre as causas destes danos encontram-se: saques às tumbas dos Faraós no Egito e Mesopotâmia; destruição por motivos religiosos ou políticos (para eliminar restos materiais 19 de outras culturas); explorações arqueológicas sem critério, sobretudo no início do século XIX; como também danos provenientes de fenômenos naturais, guerras e incêndios. No período compreendido entre meados do século XVIII e início do século XIX, ocorreram os processos de unificação dos Estados-nação europeus, caracterizados pela legitimação e representação dos cidadãos pelo poder republicano. Estes cidadãos, como apontam FUNARI e PELEGRINI (2006), deveriam compartilhar uma língua, uma cultura, uma origem e um território, transformando a noção de patrimônio, onde os bens materiais da antiguidade passaram a ser relacionados à transmissão das tradições de um determinado povo. Nesta busca pela delimitação e dominação de territórios considerados comuns a uma nação, estadistas organizaram escavações abrangendo amplas áreas, como as escavações empreendidas por Napoleão em Roma, as quais posteriormente deram origem aos primeiros Parques Arqueológicos Urbanos, destinados ao lazer da burguesia ascendente. Até meados do século XX, a atividade arqueológica restringia-se a descrever os achados e os sítios onde estes se concentravam, buscando caracterizar e analisar a história de uma determinada cultura, relacionando-a geograficamente.com povos de outras regiões. Basicamente, as questões aplicadas eram onde e quando. A Arqueologia Clássica é atribuída ao período delimitado entre o início do século XIX e meados do século XX. Assim como em época precedente, as missões arqueológicas do século XIX têm objetivo estético e filológico (estudo das civilizações a partir da história escrita), porém, realizaram procedimentos de caráter mais sistematizado. No texto Teoria e métodos na Arqueologia contemporânea: o contexto da Arqueologia histórica, pertencente à coletânea de textos Arqueologia e Patrimônio, FUNARI (2007) afirma que este modelo histórico-cultural pressupõe a cultura como sendo homogênea, cujas tradições passam de geração a geração. As escavações seguiam os procedimentos daquelas que haviam sido realizados anteriormente, preocupando-se com grandes artefatos e ruínas de edificações, desprezando os pequenos achados que pudessem existir no entorno. Este procedimento resultou na perda de camadas estratigráficas de solo, juntamente com elementos arqueológicos de pequenas dimensões, ocasionando uma lacuna até hoje existente na interpretação de dados. A investigação das antigas civilizações tem o objetivo de complementar outras disciplinas, buscando nas fontes materiais do passado, arquitetura, pintura e escultura, a confirmação e ilustração para os episódios e histórias escritos em textos referentes principalmente à Grécia e Roma. Assim, o ambiente de surgimento da Arqueologia Clássica consiste em um contexto de exploração colonizadora, em que países como a 20 Inglaterra, França, Alemanha, enviaram seus pesquisadores aos países do Mediterrâneo com o intuito de ilustrar a história das origens do continente europeu. A Escola Processual surgiu na década de sessenta do século XX, também conhecida como Nova Arqueologia, liderada pelo arqueólogo norte-americano Lewis Binford (1930 – presente). Segundo Trigger, esta escola foi influenciada pelo neo-evolucionismo, que teve como principais representantes os etnólogos Julian Steward (1902 – 1972) e Leslie White (1900 – 1975). Apresenta uma ruptura com a dimensão subjetivista e empirista das épocas anteriores, introduzindo novas maneiras de entender os conceitos e práticas arqueológicas ao estruturar a pesquisa científica nos registros arqueológicos, incluindo identificação e explicação de processos culturais para comprovar hipóteses. A pesquisa arqueológica passa a exercer uma relação interdisciplinar com as ciências exatas: química, física. Na busca de modelos exatos, ocorre o afastamento da história, repudiando os estudos que se embasassem em cronologia, descrição e preocupação com ocorrências acidentais. FUNARI (2007) argumenta que enquanto a vertente histórico-cultural buscava a singularidade nos eventos e no comportamento humano, a corrente americana buscava a regularidade cultural. Tornou-se assim extremamente positivista, buscando nas evidências arqueológicas padrões generalizados que demonstrassem comportamentos humanos regulares, partindo do pressuposto de que qualquer grupo social busca minimizar os custos e maximizar os resultados, independentemente da época e do lugar. Segundo Trigger, as teorias processualistas rejeitam explicações de mudanças que se pautam em fatores psicológicos e na vontade humana, buscando argumentações embasadas em relações entre tecnologia e ambiente como determinantes dos sistemas culturais. Assim, faz-se pertinente a afirmação de BERNAL (1952) ao considerar a especialização rigorosa da Arqueologia Processual, tão difundida pelos Estados Unidos, como uma simples apresentação dos materiais, sem preocupação em interpretar os dados, denominando os pesquisadores desta linha como “arqueógrafos”. Para ele, o arqueólogo deve realizar as duas coisas simultaneamente. Na década de setenta, um grande número de arqueólogos norte-americanos, insatisfeitos com as explicações dos esquemas evolutivos gerais, passou a considerar a diversidade cultural em suas pesquisas sobre a pré-história, dando origem à Arqueologia Pós-Processual, surgida em meados dos anos 1980. Segundo FIGUEIREDO (2004), a escola surgiu em Cambridge, a partir de discussões que envolviam críticas ao cientificismo exacerbado da Nova Arqueologia, e também às ideias que se pautavam na autoridade do declarante, próprias da Arqueologia 21 Clássica. Abarca desde os hiper-relativistas aos moderados, tendo como principal representante o arqueólogo inglês Ian Hodder (1942 - presente). Abrange diversas tendências teóricas atuais, muitas delas advindas da sociologia, da semiótica, do estruturalismo, da filosofia, do marxismo, entre outras procedências. Os Arqueólogos desta escola dividem-se em três ramificações básicas: os Neo-Marxistas, voltados para o estudo da luta de classes ao longo da História; os Estruturalistas, que estudam as estruturas das sociedades antigas; e os Processuais Cognitivos, que incorporam técnicas da Antropologia, buscando a compreensão de coisas outrora vistas como impossíveis de serem estudadas pela Arqueologia e, inclusive, algumas das responsáveis pela ruptura passada da Nova Arqueologia com a História, ou seja, as religiões, as motivações artísticas, as mentalidades e os pensamentos cotidianos. A Arqueologia Pós-Processual trouxe para a disciplina a dimensão dos significados simbólicos que variarão e se destacarão em diferentes contextos culturais. Como mostra GASPAR (2003), esta escola parte do princípio que os artefatos são símbolos materiais que refletem e criam a estrutura organizacional das práticas sociais. Enfatiza a ação dos arqueólogos enquanto construtores dos fatos a partir de sua classe social, ideologia, cultura e gênero como pontos de partida para as perguntas que formula frente às evidências arqueológicas. A partir de então, a Arqueologia passou a ser considerada como sendo o estudo da cultura material, independentemente do tempo e do lugar, o arqueólogo busca conhecer a história de povos de modo geral, sobretudo a partir de seus restos ou registros materiais. Os objetos remanescentes, produzidos e usados no cotidiano, são consequência do pensamento destas sociedades e consistem em parte de nossa cultura. Interessam para o arqueólogo mais em seu sentido histórico do que artístico. Assim, a arqueologia é uma ciência que procura, através dos restos materiais de uma cultura, entende-la em seu amplo contexto, interpretando e estabelecendo relações entre os achados. Para isto, é preciso conhecer a ordem cronológica, as relações funcionais, o ambiente natural, a distribuição geográfica e os dados. Este panorama de conceitos favoreceu a efetivação da Arqueologia Histórica, segundo Gaspar, pois não se questionava mais se estudar determinado período era pesquisa arqueológica ou não, e também pelo fato das análises valorizarem múltiplas fontes de informação na interpretação dos fatos, como cultura material, documento escrito e discurso, consistindo em uma inovação na Arqueologia Ocidental nas últimas décadas. O termo Arqueologia Histórica é usado para definir o estudo dos vestígios materiais das sociedades que possuem registros escritos. Como já foi dito anteriormente, na Europa, houve uma preocupação com a história das civilizações greco-romanas, medievais e também aquelas ligadas às origens do cristianismo. Porém, como 22 aponta FUNARI (2007), o conceito de Arqueologia Histórica não está fundamentado nestes períodos ou nestas regiões. Segundo Funari, o termo surgiu nos anos 30 do século XX, particularmente na América do Norte, tendo suas raízes na Antropologia. Os arqueólogos europeus vêm a distinção entre Pré-História e História como uma gradação, ao contrário dos grupos norte-americanos cujo enquadramento histórico inicia-se a partir da colonização do território americanos pelo Velho Mundo. Ao formarem os chamados estados nacionais, os europeus buscavam as origens de sua história na incorporação da história das grandes civilizações do passado, e assim não tinham interesse em estabelecer limites entre Pré-história e História. Nos Estados Unidos, ao contrário, os grupos dominantes, formados por descendentes de europeus, definiram a Arqueologia Histórica como aquela que estudava sua própria história, a partir da colonização, podendo realizar um recorte que desvincula da época atual os processos culturais anteriores. Alguns grupos dentro da própria América do Norte, na Austrália e África do Sul apresentam um terceiro ponto de vista, onde a Arqueologia Histórica não faz distinção entre civilizações letradas e não letradas, nem mesmo considera a passagem de uma a outra como um processo evolucionista. Esta abordagem amplia a observação de todas as formas de organização cultural em seus aspectos sociais, econômicos e políticos. Desta maneira, a Arqueologia também deixa de ser uma disciplina cujo objetivo é preencher as lacunas da História, organizando seus próprios procedimentos, protocolos e teorias. De modo simultâneo ao surgimento da Arqueologia Histórica, continuaram a ser difundidos os modelos histórico-culturalista e processualistas. FUNARI (2007), em Teoria e métodos na Arqueologia contemporânea, contido em Arqueologia e Patrimônio, destaca o aparecimento, na década de sessenta, de uma vertente histórico-cultural em alguns países latino-americanos, denominada Arqueologia Social Latino-Americana, cuja teoria foi aplicada à reconstrução das grandes civilizações pré-colombianas de origem indígena, bases culturais de países como México e Peru. A gestão do patrimônio arqueológico pelos órgãos de preservação destes dois países, assim como no caso do Brasil, será analisada no segundo capítulo desta pesquisa. Ainda que a América do Norte tenha influenciado o pensamento arqueológico na América Latina (divisão da Arqueologia histórica e pré-histórica), segundo FUNARI (2007), a influência europeia também se fez presente, sobretudo a tradição francesa, pautada numa abordagem histórica da chamada Pré-História. Funari salienta a importância da Arqueologia Histórica Latino-Americana na definição da Arqueologia enquanto disciplina, a partir dos 23 anos oitenta do século XX, abrangendo o conceito de História a todas as organizações sociais. Em Teoria e métodos na Arqueologia contemporânea, Funari relaciona o surgimento da Arqueologia Histórica no Brasil, à restauração das liberdades públicas advindas do fim do regime ditatorial nos anos oitenta. Cada vez mais difundida no contexto internacional, esta vertente da Arqueologia ganha força no âmbito nacional por resgatar os vestígios, os ideais e os direitos de indígenas, negros e de outros povos excluídos das narrativas construídas pelos setores dominantes da sociedade. Apesar de ter permanecido restrita ao meio acadêmico durante muito tempo, como mostra FUNARI (2008), nos últimos anos as pesquisas realizadas por arqueólogos no Brasil passaram a abranger atividades educativas as quais permitem uma maior interação com a comunidade, assumindo sua responsabilidade social, decorrendo nas ações da chamada Arqueologia Pública, como veremos na explanação que se segue. GASPAR (2003) mostra que, no início, a Arqueologia Histórica era uma disciplina que estudava os contextos provenientes da colonização europeia no Brasil e em países vizinhos, estando assim vinculada ao pensamento patrimonial dos anos trinta do século XX. Nesta época foram realizados empreendimentos arqueológicos na região sul do país, dirigidos durante um longo período ao estudo de construções coloniais (igrejas, missões, conventos, fortificações, solares, entre outras), apresentando uma concepção elitista, que privilegiava monumentos de “pedra e cal”4. Como aponta Gaspar, as pesquisas arqueológicas eram realizadas a serviço da Arquitetura e da História. O tombamento a nível nacional das ruínas da Igreja de São Miguel, localizadas em Santo Ângelo, RS, no ano de 1938, e sua inscrição no Livro de Belas Artes, segue a lógica de valorização estética dos primeiros tombamentos, na medida em que protege as ruínas de um monumento do estilo barroco. A partir da década de sessenta os estudiosos do patrimônio passaram a ter uma abordagem mais acadêmica sobre o tema, como Yves Bruand (1966), Benedito Lima de Toledo (1981), Nestor Goulart Reis Filho (1970)5. Estas pesquisas deram continuidade aos empreendimentos iniciados nos anos trinta, sobretudo no nordeste e na região sul do país, e se dedicaram durante um longo período ao estudo de construções representativas da ocupação do território por colonizadores europeus. Porém, o interesse continua a se concentrar na descrição e restauração dos monumentos, e 4 A expressão bens de “pedra e cal” foi usada por Miceli para se referir aos monumentos arquitetônicos erigidos durante o século XVIII, que representam “os espécimes característicos de todas as frações da classe dirigente brasileira em seus ramos público e privado, leigo e eclesiástico, rural e urbano, afluente e decadente”. (MICELI, 1987, p.44). Esta expressão passou a ser amplamente utilizada na bibliografia referente à preservação do patrimônio cultural brasileiro. 5 BRUAND, 1966; TOLEDO, 1981; REIS FILHO, 1970; apud FUNARI, 1994, p. 51-52) 24 segundo Funari, a falta de interesse destes pesquisadores em coletar uma amostra significativa de remanescentes materiais não comprovava suas “análises impressionísticas” (FUNARI, 1994, p. 52). No final dos anos oitenta e início dos noventa, a própria História começa a questionar o potencial informativo dos documentos escritos e valorizar também evidências materiais como documentos. A geração de arqueólogos historiadores, entre eles Arno Kern, Pedro Paulo Funari e Carlos Guimarães, a cultura material “permite lançar “um novo olhar” sobre determinadas realidades sociais” (GASPAR, 2003, p. 275), sobretudo àqueles grupos que ficaram à margem da sociedade e não tiveram a oportunidade de registrar de forma escrita suas manifestações. Segundo Gaspar, os registros materiais permitem descobrir informações não mencionadas ou mesmo omitidos nos relatos produzidos pelas elites dominantes. Para FUNARI (2007), em Teoria e métodos na Arqueologia contemporânea, a Arqueologia possui uma dimensão política, sendo de extrema importância para cada povo na conquista por seus direitos, incluindo-se aí o seu próprio passado. A partir deste engajamento político, na década de noventa organizou-se no Brasil a chamada Arqueologia Pública, preocupada com todas as implicações públicas da disciplina, tanto aquelas referentes ao patrimônio, quanto a questões próprias dos direitos humanos. No entanto, em seu artigo Ética, capitalismo e arqueologia no Brasil, FUNARI (2008) mostra que, em nível nacional a Arqueologia Pública sempre esteve mais relacionada às pesquisas de contrato, vinculadas ao licenciamento para grandes obras de infraestrutura, objetivando a definição de instrumentos e estratégias voltados para a sustentabilidade sócioambiental vinculado às questões econômicas. As informações das pesquisas arqueológicas permanecem, assim, restritas ao meio burocrático, não havendo na maioria das vezes uma interação entre arqueólogos e a comunidade. Desta maneira, Funari desenvolve sua argumentação discorrendo sobre o termo "desenvolvimento sustentável" (FUNARI, 2008, p.04), citado na Carta do Rio, Conferência geral das Nações Unidas sobre o meio ambiente e o desenvolvimento, realizada em 1992, como sendo parte de uma retórica política que visa qualidade de vida e conservação de recursos naturais para as gerações futuras. Além de recursos naturais e crescimento econômico, este protocolo abrange questões sociais, culturais e históricas, buscando a harmonia nas relações entre sociedade e meio ambiente. Assim, a prática da Arqueologia Pública no Brasil, como afirma Funari, é um desafio estimulante, pelo fato de se tratar de um país socialmente estratificado, com enorme diversidade de contextos histórico-culturais, onde 25 grande parte da população não tem acesso à educação, fator essencial para a formação de uma consciência crítica. Num contexto de realizar esforços objetivando a integração entre desenvolvimento e preservação em meios urbanos, onde se desencadearam questões relacionadas a potencial arqueológico, riscos de destruição e instrumentos de preservação, surge a vertente da Arqueologia Urbana. Conforme TCCHETTO e THIESEN (2007), a partir das décadas de 1960 e 1970, nos países europeus, a pesquisa arqueológica pontual, focada nos monumentos medievais e da antiguidade clássica, estava sendo substituída pelas ações de salvamento, vinculadas ao ritmo das obras de reconstrução das cidades após a Segunda Guerra Mundial. E a partir do final da década de setenta e durante os anos oitenta, em substituição à arqueologia de salvamento, passou-se a desenvolver a arqueologia preventiva, que atuava por meio do planejamento urbanístico. No Brasil, as primeiras questões referentes à arqueologia urbana surgiram na década de noventa, vinculadas às ações de salvamento, com o reconhecimento do potencial arqueológico e os riscos de sua destruição, frente à contínua transformação das cidades, sobretudo aquelas de grande porte, como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Curitiba. Com o intuito de instrumentalizar as políticas urbanas, foram desenvolvidas então as chamadas Cartas Arqueológicas Municipais. Estas Cartas contemplam cadastro, inventário e zoneamento de áreas com potencial arqueológico, e juntamente com a legislação específica (urbanística e arqueológica), são dispositivos do Planejamento Urbano. Consistem em instrumentos de gestão para o diagnóstico e a avaliação de impactos em áreas de risco arqueológico, possibilitando a elaboração e implementação de ações preventivas. Assim, a arqueologia urbana pode implicar em diferentes discussões, como por exemplo, realizar uma arqueologia na cidade ou da cidade. Na primeira, a forma de abordagem é pontual, os monumentos e sítios são considerados isoladamente, sendo a cidade o ambiente que os abriga. Já numa análise arqueológica da cidade, esta é considerada ambiente e objeto de pesquisa, sendo que os registros arqueológicos, oriundos de uma contínua ocupação do território, são tomados como componentes de um sistema amplo e integrado. A cidade passa a ser tratada como sítio arqueológico (CRESSEY e STEPHEN, 1982, apud. TOCCHETTO e THIESEN, 2007, p.179). Esta visão abrange cultura material, comportamento humano e inter- relação no ambiente urbano, ou seja, consiste em uma abordagem arqueológica de cunho histórico. Como apontam Tocchetto e Thiesen, as cidades são espaços bem específicos de 26 materialização de memórias, onde as memórias individuais interligam-se para construir as memórias coletivas, tornando-se locais onde grupos sociais de diferentes épocas deixaram suas marcas. A Arqueologia Histórica investiga os vestígios materiais de um grupo, produzidos ao logo de sua existência, para obter informações sobre seu modo de vida e suas interações sociais. A Arqueologia Urbana, como um ramo da arqueologia Histórica, consiste em instrumento para compreensão dos remanescentes arqueológicos existentes em contextos urbanos habitados, e para sua consequente valorização. As paisagens urbanas, segundo Tocchetto e Thiesen, estão em constante transformação ocasionada por construções, demolições, terraplanagens, aterros, instalação de linhas de metrô subterrâneas e outras obras de infra-estrutura que colocam em risco os vestígios arqueológicos como fonte potencial de estudo sobre a história das cidades e das práticas humanas relacionadas a modos de vida urbanos. Segundo as pesquisadoras, o crescimento desordenado das cidades, com uso intenso dos centros e das periferias, induz à noção equivocada de que remanescentes que se encontram no subsolo são insuficientes para serem pesquisados e registrados. A pouca monumentalidade dos vestígios arqueológicos ocasiona o descrédito em relação à preservação e à valorização deste patrimônio. Conforme Toccheto e Thiesen, considerando que cabe ao poder público implementar políticas de proteção ao patrimônio arqueológico, nos âmbitos administrativo e legislativo, a arqueologia urbana torna-se indissociável do poder público. E as ações preservacionistas mostram que as preocupações continuam a recair sobre o patrimônio edificado, o monumento arquitetônico, que possui maior visibilidade. Para ARGAN (2005), em História da Arte como História da Cidade, assim como os monumentos, a cidade é considerada como obra de arte, como manifestação estética e histórica de uma determinada cultura socialmente estabelecida em um território, que se transforma segundo a dinâmica contextual ao longo dos anos. Segundo o autor, também as políticas urbanas e a forma de interpretação das cidades são determinadas pelo contexto histórico. O historiador analisa a atual crise das cidades, a falta de políticas públicas, como agregação histórica de manifestações da sociedade. O homem não detém mais os processos de produção de seus objetos, dentre eles os próprios espaços e elementos urbanos como obra artística, pois desconhece o fazer, perdendo-se o valor deste objeto e sua relação com o sujeito que o produzia. Argan define a deterioração dos materiais das edificações como uma alegoria radical da incompatibilidade daquilo que resta da cidade antiga com a vida da metrópole. 27 Assim, na atualidade, o centro histórico das cidades seriam fragmentos do passado desvinculados do presente. A conservação dos monumentos e a recuperação dos bairros históricos abandonados, segundo Argan, dependem de um tipo de cultura urbana que não repudie a sua própria historicidade, mas que dela seja consciente. Por sua experiência em gestão urbana como prefeito de Roma (ocupou o cargo de 1976 a 1979), Argan considera inadmissível uma política de salvaguarda para a parte antiga separada de uma política urbanística que considere globalmente todos os problemas da cidade. A partir desta integração, “a Vênus, expulsa da cidade e refugiada nos montes, volta para a cidade: o mito de Venusberg6.” (ARGAN, 2005, p. 9) Diante do exposto, avalia-se que a noção de patrimônio arqueológico, assim como a própria noção de patrimônio, surgida no século XVIII com a formação dos Estados nacionais, e que se limitava a valores arbitrariamente impostos pelas classes dominantes, ligados a grandes feitos e à representatividade da história de uma parcela da sociedade, passou por transformações a partir de movimentos contestatórios ocorridos no século XX, concomitantes à decadência de preconceitos incongruentes à pluralidade social. Ao tornar-se mais abrangente e diversificada, tanto em relação às categorias patrimoniais quanto à incorporação de setores sociais antes marginalizados, a noção de patrimônio passou a valorizar conjuntos de sítios que envolvem bens naturais, histórico-culturais e arqueológicos. Assim, a Arqueologia deixou de ser uma disciplina que trabalhava de forma pontual a favor de um Estado impositivo, passando por um período de abordagem restrita a descrições deterministas, para tornar-se uma ciência abrangente, que trata o ambiente como uma constante construção combinada da natureza e da ação humana, considerando o patrimônio arqueológico como legado deste ambiente, reconhecido pelas comunidades e cuja atuação está intimamente vinculada ao poder público. 6 Venusberg é o mito de um templo subterrâneo da deusa Vênus. 28 2 PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO: LEGISLAÇÃO, CONCEITOS E AÇOES DE PRESERVAÇÃO Neste capitulo busca-se expor a relação entre os protocolos internacionais, as leis nacionais de proteção ao patrimônio arqueológico e estratégias de preservação dos vestígios e sítios arqueológicos brasileiros. Apresentou-se um esboço cronológico da evolução das cartas internacionais referentes à conservação patrimonial e suas influências sobre a proteção do patrimônio arqueológico no Brasil do século XX. Desta forma, revela-se o processo de construção histórica das leis patrimoniais brasileiras, com foco no acautelamento do patrimônio arqueológico, observando-se seus avanços e deficiências. Os apontamentos, contudo, mostram que ineficácia da aplicabilidade das leis não está na ausência destas; mesmo que incompletas ou mal elaboradas, mas na forma como estas leis estão sendo implantadas e ainda na falta de participação popular nos processos de gestão. O desconhecimento dos valores patrimoniais por parte da população, como a dissociação deste patrimônio de sua vivência cotidiana, ocasionam a depredação e a falta de conservação de vestígios que poderiam resgatar informações referentes a uma parte da história ainda desconhecida do Brasil. A falta de aplicabilidade dessas leis inicia-se com a deficiência na fiscalização e controle dos órgãos públicos responsáveis pela preservação do patrimônio arqueológico, passando pela ausência de uma política de gestão interativa entre os poderes públicos municipal, estadual e federal, que buscassem diretrizes voltadas para a educação patrimonial de populações locais, que se apropriariam de uma maneira positiva dos bens arqueológicos e se tornariam defensores destes bens existentes em seu território. Também se observa que as ações de preservação do patrimônio arqueológico são desvinculadas de políticas de gestão mais amplas, quadro começa a ser alterado no Brasil, principalmente pela atuação do Ministério Público Federal, que veementemente vem inquirindo os órgãos responsáveis pelo acautelamento destes bens sobre a negligência ou o cumprimento de suas atribuições, num contexto em que o potencial arqueológico das cidades e das áreas rurais confronta-se com a implantação de grandes obras de infra-estrutura, crescimento urbano e empreendimentos extrativistas de grande impacto. 29 2.1 A proteção do patrimônio arqueológico no contexto internacional: diretrizes de intervenção Os documentos produzidos ou incorporados pela UNESCO ao longo da segunda metade do século XX até os dias atuais, conforme mostra a pesquisa de FRONER, “proporcionaram o fundamento para a percepção da construção dos conceitos de patrimônio e preservação, relacionados à própria construção da memória”. (FRONER, 2001, p. 172). Os fundamentos que nortearam a seleção dos bens e as orientações de proteção foram ampliados pela UNESCO, abrangendo além de monumentos representativos dos poderes hegemônicos, também aquelas construções mais simples que estivessem integradas ao cotidiano das comunidades, e ainda mais recentemente, os bens de natureza imaterial. A tabela e o quadro abaixo possibilitam perceber a organização cronológica desses discursos de acordo com cada época. Considerando que o foco desta pesquisa recai sobre o patrimônio arqueológico, será feita uma breve exposição sobre as cartas e recomendações elaboradas pela UNESCO em conjunto com ICOMOS, ICOM e ICCROM, que contenham recomendações mais enfáticas referentes à preservação deste patrimônio. Como mostra o Quadro I, o patrimônio arqueológico foi abordado desde a Carta de Atenas, de 1931. Na década compreendida em os anos de 1940 a 1950, período marcado pela Segunda Guerra Mundial, não foi elaborado nenhum protocolo referente a nenhuma categoria patrimonial, sendo que nas décadas seguintes, a partir da década de cinqüenta até 2000, o patrimônio arqueológico foi abrangido com certa regularidade, assim como outras categorias patrimoniais como patrimônio histórico, arquitetônico, bens culturais móveis, subaquático e natural. A divisão dos documentos em categorias não tem caráter restritivo, mas visa ressaltar as abordagens expostas, podendo um mesmo documento referir-se a várias categorias. Esta pesquisa deter-se-á nos documentos que tratam da arqueologia de forma mais específica, apesar do tema aparecer em outras cartas não citadas. 30 QUADRO 1 QUADRO CRONOLÓGICO POR ÁREA DAS CARTAS, CONVENÇÕES, RECOMENDAÇÕES E TRATADOS ELABORADOS PELA UNESCO EM CONJUNTO COM ICOMOS, ICOM E ICCROM Fonte: FRONER, 2001, pp. 178 – 179) TIPOLOGIA 30 – 40 40 – 50 50 – 60 60 – 70 70 – 80 80 – 90 90 – 00 PATRIMÔNIO HISTÓRICO . Carta de Atenas (31) . Pacto de Roerich (35) . Convenção Cultural Européia (54) . Carta de Veneza (64) . Normas de Quito (67) . Convenção p/ Patrimônio Cultural e Natural Mundial (72) . Recomendações p/ Patrimônio Cultural e Natural Nacionais(72) . Recomendações p/ pequenas cidades históricas (75) . Recomendações s/ o papel de Áreas Históricas (76) . Convenção de San Salvador (76) . Carta de Burra (81) . Carta de Florença (81) . Carta de Quebec (82) . Declaração de Roma (83) . Carta de Washington (87) . Seminário para Revitalização Centros Históricos Brasil (87) . Carta Cidades Históricas EUA (92) . Carta de Nova Zelândia (92) PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO .Carta de Atenas (31) . Carta Cidades Históricas EUA (92) . Carta de Nova Zelândia (92) . Carta de Veneza (64) . Normas de Quito (67) . Convenção Patrimônio Arqueológico (69) . Convenção de San Salvador (76) . Carta para o Gerenciamento do Patrimônio Arqueológico (90) . Convenção para a Proteção do Patrimônio Arqueológico Europeu (92) PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO . Carta de Atenas (31) Recomendações Internacionais p/ o Planejamento arquitetônico(56) . Carta de Veneza (64) . Normas de Quito (67) . Recomendações sobre Edifícios Antigos (72) . Declaração de Amsterdã (75) . Carta da Europa (75) . Carta de Florença (82) . Carta Centros Históricos (87) . Carta de Appleton (83) .Patrimônio Vernacular (99) 31 .Convenção sobre Patrimônio Arquitetônico Europeu (85) BENS CULTURAIS MÓVEIS (OBRAS E COLEÇÕES) . Pacto de Roerich (35) . Normas de Quito (67) . Convenção de San Salvador (76) . Recomendações p/ Patrimônio móvel (78) PATRIMÔNIO SUBAQUÁTICO . Convenção para proteção de Patrimônio Subaquático (94) Carta Patrimônio Subaquático (96) PATRIMÔNIO NATURAL . Recomendações p/ paisagens (62) . Convenção p/ Patrimônio Cultural e Natural Mundial (72) . Recomendações p/ Patrimônio Cultural e Natural Nacionais (72) .Carta de Burra (81) . Carta de Florença (82) . Carta de Nova Zelândia (92) 32 Pelo quadro acima exposto, percebe-se que os bens patrimoniais históricos e arquitetônicos predominam no foco das preocupações dos órgãos internacionais responsáveis pela realização e publicação dos protocolos de conservação. Observa-se ainda, que apesar do patrimônio arqueológico ter sido abordado por estes documentos internacionais desde os primeiros encontros, foi nas décadas de sessenta e setenta que o tema teve maior número de documentos específicos. O primeiro documento oriundo das convenções internacionais, a Carta de Atenas, de 1931, resulta da Conferência do Escritório Internacional de Museus, e teve como direcionamento principal a neutralidade e a proteção do Patrimônio Cultural de cunho histórico, artístico e científico, obrigando aos Estados participantes a assumir um compromisso oficial de respeitar as decisões internacionais em momentos de conflitos armados, como aponta FRONER (2001). Com a divulgação desta Carta, segundo SANTOS (2004/2005) as autoridades governamentais brasileiras passam a ter uma preocupação sobre a necessidade de criação de leis que viessem a proteger os monumentos históricos, como por exemplo, através do texto constitucional de 1934, e ainda na divulgação do Decreto-Lei nº25 de 1937, que introduz em seu primeiro artigo uma conceituação sobre patrimônio histórico e artístico, e engloba a proteção do patrimônio arqueológico. Com o intuito de normatizar as intervenções em bens arqueológicos, as especificações da Carta de Atenas formalizam os princípios éticos básicos da pesquisa arqueológica. Uma abordagem tecnológica também pode ser observada neste documento, como por exemplo, no item VI. Técnica da Conservação, que, ao mencionar a técnica de conservação de ruínas, mostra uma preocupação comum às práticas de restauração arquitetônica da época, em vigor até os dias atuais, de deixar visíveis as novas intervenções, utilizando materiais e técnicas diferentes daqueles utilizados no bem cultural original: Quando se trata de ruínas, uma conservação escrupulosa se impõe, com a recolocação em seus lugares dos elementos originais encontrados (“anastilose”), cada vez que o caso o permita; os materiais novos necessários a esse trabalho deverão ser sempre reconhecíveis. Quando for impossível a conservação de ruínas descobertas durante uma escavação, é aconselhável sepultá-la de novo depois de haver sido feito um estudo minucioso. Não é preciso dizer que a técnica e a conservação de ruínas descobertas impõem a colaboração estreita do arqueólogo e do arquiteto7. O documento ainda finaliza com a Deliberação da conferência sobre a “anastilose” 8 dos 7 INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL, 2000, p. 16. 8 Anastilose: (...) recomposição de partes existentes, mas desmembradas. Os elementos de integração deverão ser sempre reconhecíveis e reduzir-se ao mínimo necessário, para assegurar as condições de conservação do 33 monumentos da Acrópole, que demonstra a preocupação dos participantes da Conferência com questões referentes às técnicas empregadas na conservação das ruínas dos antigos templos e palácios gregos, as quais passaram a empregar novos materiais como o cimento e metais menos suscetíveis de deterioração. Percebe-se, deste modo, uma preocupação com o monumento isolado, cuja importância ainda vinculava-se a valores estéticos e históricos próprios da cultura europeia. A partir de meados do século XX, os protocolos internacionais apresentam novos parâmetros referentes ao patrimônio, na medida em que ampliam o conceito de monumento, estabelecendo recomendações de preservação para obras e conjuntos urbanos modestos que tenham adquirido significado cultural e histórico para as comunidades. A Recomendação de Nova Délhi, de 1956, consiste na primeira e mais completa carta internacional referente aos princípios internacionais a serem aplicados em pesquisas arqueológicas. O documento considera que a conservação dos bens culturais produzidos em épocas passadas vincula-se ao seu reconhecimento e respeito por parte das comunidades ao nível nacional e internacional, já que a história da humanidade compõe-se de informações oriundas de várias civilizações. Desta maneira, considera o conhecimento e a contemplação dos bens antigos como propulsores de harmonia entre povos de diferentes etnias. Este protocolo estimula o auxílio mútuo, a troca de informações e o intercâmbio de missões científicas entre os Estados- membros. Define princípios comuns a serem seguidos pelas autoridades nacionais encarregadas pela proteção do patrimônio arqueológico, como aqueles referentes à fiscalização e autorização prévia das pesquisas, como também a necessidade de instauração de um regime jurídico específico. O documento também sugere que os serviços de pesquisa arqueológica em cada Estado-membro consistissem preferencialmente numa administração estatal, e que contassem com a colaboração de institutos de pesquisa e universidades para o ensino técnico de escavações e criação de arquivos documentais e acervos. Mostra-se atual pela sua preocupação vanguardista e pela sua elevada compreensão técnico-científica da aplicabilidade da pesquisa arqueológica na preservação dos bens culturais da humanidade. Conforme SANTOS (2004/2005), no Brasil, a Recomendação de Nova Délhi embasou a elaboração da Lei 3924, de 1961, que regula a proteção dos monumentos pré-históricos e arqueológicos. Como aponta Froner, a Carta de Veneza, de 1964, relativa à conservação de Sítios e monumento e restabelecer a continuidade de suas formas. In: Cartas Patrimoniais. INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL, 2000, p. 95. 34 Monumentos, preconiza a fundação do ICOMOS, tornando-se referência internacional para a Conservação e Restauração de Monumentos. As orientações do protocolo resultam do II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos de Monumentos Históricos, e desta maneira, os aspectos arquitetônicos dos monumentos e conjuntos urbanos prevalecem sobre as questões arqueológicas. Apesar de se concentrar na preservação de monumentos e sítios históricos o documento apresenta um item especifico para escavações, o qual reafirma os postulados científicos da Recomendação resultante da Conferência de Nova Délhi, referentes aos princípios a serem adotados em Pesquisas Arqueológicas. Assim como a Carta de Atenas, a Carta de Veneza determina que o ordenamento e a conservação das ruínas devem ser realizados sem que haja interferência na composição original do bem cultural. Este protocolo também apresenta um item complementar ao item Escavações, denominado Documentação e publicação, que vincula aos trabalhos de conservação, restauração e escavação, a elaboração e publicação de relatórios técnicos referentes às etapas executadas, para que possam ser acessíveis a outros pesquisadores. As pesquisas de FRONER (2001), GUIMARÃES e MOREIRA (2010), FONSECA e SOBREIRA (2001) mostram que o processo de crescimento desordenado e a expansão das atividades industriais ocorridos na segunda metade do século XX contribuíram para a destruição dos sítios históricos, e neste contexto, a reunião da Organização dos Estados Americanos, OEA, ocorrida em 1967, sobre conservação e utilização de monumentos e sítios de interesse histórico e artístico, resultou no documento denominado Normas de Quito. Este protocolo propõe como solução aos problemas citados a elaboração de planos regulamentares que conciliem as demandas do crescimento urbano e a proteção dos centros históricos. Não se restringe ao Patrimônio Histórico, mas engloba o Patrimônio Artístico e Arqueológico, com ênfase para os remanescentes do período pré-colombiano. Nesta época, os países latino- americanos perceberam que apesar da heterogeneidade histórica, social e política de seus centros urbanos, os problemas que enfrentavam eram comuns, como a degradação do patrimônio cultural, insuficiência de serviços prestados pelo poder público, predominância de população residente de baixa renda, ou a expulsão destes moradores com projetos de revitalização. As orientações deste protocolo, desta forma, buscam soluções para a deficiência da sustentabilidade sócioeconômica, ambiental e cultural dos sítios. Se as Normas de Quito englobam outras categorias patrimoniais além dos bens históricos, e abordam a preservação dos sítios de modo integrado ao crescimento das cidades, a Convenção sobre Patrimônio Arqueológico, de 1969, ressalta a importância da realização de inventários nacionais públicos 35 e privados como uma forma de acautelamento do patrimônio arqueológico ameaçado pela ocupação desordenada dos sítios, e trata ainda da necessidade de difusão dos conhecimentos referentes ao patrimônio arqueológico no âmbito científico e educacional. O protocolo define bens arqueológicos como sendo todos os objetos ou aspectos da civilização cujo conhecimento e estudo somente se viabiliza a partir de escavações arqueológicas, independente da época e do local. O documento tem uma preocupação ética em relação à Arqueologia, na medida em que orienta para a aplicação de métodos científicos na pesquisa arqueológica e o impedimento das escavações ilegais como principais formas de preservação do patrimônio arqueológico. A Convenção de Paris, ocorrida em 1972, sobre a proteção do patrimônio mundial, surgiu a partir da reação da comunidade internacional à construção da Barragem do Assuão, em 1959, que teria como consequência a inundação e destruição dos templos de Abu Simbel, no Egito. Consiste em um dos instrumentos legais internacionais mais abrangentes para a proteção do patrimônio cultural e natural. Foi inovador na inclusão do patrimônio natural junto à lista de bens culturais. Seguindo o pensamento da época, faz uma divisão entre as definições de patrimônio entre cultural e ambiental. Os elementos ou estruturas de caráter arqueológico, por exemplo, são considerados dentre os monumentos de cunho cultural, assim como as obras resultantes das ações humanas ou que integrem trabalho humano e da natureza, e ainda as áreas em que se situam sítios arqueológicos, considerando valor universal excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da ciência, são avaliados como sítios associados ao patrimônio cultural. O patrimônio natural refere-se aos ambientes resultantes de formações fisiográficas e bióticas que se destaquem pelo valor estético, científico ou histórico. Esta Convenção cria o Comitê de Patrimônio Mundial, responsável entre outras ações pela criação da “Lista do Patrimônio Mundial”, da qual passaram a fazer parte somente os bens do patrimônio natural e cultural ameaçados de desaparecimento pela degradação acelerada devido a perigos concretos, assim como do “Fundo do Patrimônio Mundial”, para angariar recursos para a preservação deste patrimônio ameaçado. Para Sampaio (2009), a instituição dos bens como patrimônio cultural da Humanidade foi o passo mais importante dado pela UNESCO na proteção dos bens culturais. Porém, como aponta FRONER (2001), o documento não faz nenhuma referência específica às ações voltadas para a preservação do patrimônio arqueológico, apenas o define como Patrimônio Cultural. Em 1976 foi realizada a Convenção de San Salvador, referente à Proteção do Patrimônio Arqueológico, Histórico e Artístico das Nações Americanas, na qual ficou definida como 36 premissa básica para qualquer acordo entre países americanos o respeito às propriedades culturais, através de ações que coíbam a importação e exportação ilegal, como também de auxílio mútuo na preservação desse patrimônio, enfocando, portanto, questões de cunho político. O documento ainda tem a intenção de anular qualquer forma de preconceito em relação à arte e cultura pré-colombiana. O artigo segundo do texto apresenta como categorias de propriedade cultural monumentos, objetos, fragmentos, ruínas e materiais arqueológicos pertencentes às culturas existentes antes da ocupação europeia, como também vestígios das ações humanas, fauna e flora relacionados a estas culturas. A Carta de Lausanne, de 1990, é direcionada à proteção e gestão do patrimônio arqueológico, aproximando-se mais das orientações das recomendações de 1956 e envolve outras disciplinas além da arqueologia nas pesquisas. Este protocolo chama a atenção para o fato de o patrimônio cultural consistir em um recurso natural não renovável, sendo necessário, desta forma, que os projetos desenvolvimentistas sejam integrados às políticas de proteção patrimoniais, objetivando que os danos a este patrimônio sejam minimizados. Para se atingir este objetivo, estas políticas devem estar integradas em nível local, regional e nacional, e contar com a participação de todos os setores da sociedade, sobretudo das populações cujo patrimônio estiver ameaçado, além de especialistas e pesquisadores, o poder público, as empresas privadas, chamando a atenção para a importância da participação popular como agente da preservação do patrimônio arqueológico. A implementação de programas internacionais de intercâmbio também são sugeridas pelo documento, como forma de capacitação dos gestores do patrimônio arqueológico. No entanto, como afirmam BASTOS e SOUZA (2008), no caso brasileiro, o Instituto do Patrimônio necessita ampliar e qualificar seus quadros técnicos estabelecendo programas de aprendizado e troca de ensinamento na área da gestão do patrimônio cultural arqueológico. A Carta de La Valette, também conhecida como Carta de Malta, oriunda da Convenção para a Proteção do Patrimônio Arqueológico Europeu, de 1992, reafirma as discussões dos protocolos anteriores acima citados. Complementa e substitui o documento de 1969, apontando a Conservação Integrada (preservação integrada ao ordenamento territorial) como instrumento de gestão do patrimônio arqueológico. Tem como objetivo a proteção do patrimônio arqueológico como fonte da memória coletiva da cultura europeia e instrumento de estudo histórico e científico. Para FRONER (2001), a divisão do patrimônio em blocos, europeu e americano, não inviabiliza a troca de conhecimento a auxílio mútuo entre as nações, principalmente entre universidades. A orientação para que este intercâmbio ocorra 37 aparece em vários protocolos. No entanto, como afirma a pesquisadora, efetivamente não há nenhum documento relativo a um projeto integrado relacionado ao patrimônio africano, asiático ou da Oceania. A explanação dos protocolos patrimoniais acima citados, de forma cronológica, teve a intenção de mostrar a evolução do pensamento preservacionista internacional a partir do século XX até os dias atuais, assim como as decorrências de seus diferentes enfoques sobre a preservação do patrimônio arqueológico. Como se pôde observar, as preocupações existentes na década de trinta, documentadas na Carta de Atenas, restringiam-se às diretrizes técnicas para práticas conservacionistas, inclusive aquelas direcionadas à arqueologia. Foram estipuladas por um grupo de especialistas em restauração e voltadas para a preservação de monumentos isolados. No final da década de sessenta, as orientações referentes à arqueologia eram específicas para os procedimentos da pesquisa. Somente com a aproximação da década de setenta as discussões dos protocolos internacionais abrangeriam questões como a degradação de sítios arqueológicos vinculadas ao crescimento urbano sem planejamento, como atestado pelas Normas de Quito, cujas orientações baseavam-se na conservação integrada. A partir da Convenção de Paris e da Convenção sobre Patrimônio Arqueológico, o conceito de sítio arqueológico passa a ser visto como sendo resultante das ações humanas, ou seja, historicamente construídos. Nos anos seguintes, no entanto, os protocolos produzidos somente viriam a reafirmar e complementar as diretrizes dos documentos anteriores. 2.1.1 Conceitos e ações de reconhecimento e gerenciamento vinculadas à preservação do patrimônio arqueológico O conceito de Patrimônio Natural surgiu recentemente, da mesma forma que os conceitos de ecossistema e crescimento sustentável. Como aponta FRONER (2001), são conceitos criados no século XX, num cenário de grandes modificações geradas pelas transformações tecnológicas e industriais, as quais acarretaram o esgotamento dos recursos naturais e a destruição do meio ambiente, colocando em risco a própria sobrevivência humana. Este contexto levou a sociedade capitalista a repensar suas práticas de exploração da natureza. Ainda segundo Froner, a percepção da natureza e de seu significado enquanto patrimônio da humanidade também consiste em um conceito construído a partir desta conjuntura histórica. Ressaltam-se as discussões promovidas pela Organização das Nações Unidas, na tentativa de conciliar desenvolvimento econômico e preservação dos ecossistemas. Para SOUZA (2009), houve dois momentos marcantes: a Conferência de Estocolmo, de 1972, e a Conferência das 38 Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento – Eco 92, de 1992, cujas recomendações contribuíram para a proteção dos recursos naturais, atraindo a atenção do público para este tema. Também merece destaque a Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural da UNESCO, ocorrida em 1972, da qual o Brasil é signatário desde 1977, pelo fato de ter sido através deste protocolo que os antagonismos entre preservação e desenvolvimento econômico num mundo globalizado deixaram de ser um problema de âmbito nacional, para tornarem-se questões de interesse e solução conjunta e obrigatória dos Estados-membros. Além do mútuo auxílio econômico e tecnológico, SAMPAIO (2009) aponta a criação de um tribunal internacional para proteção e defesa do Patrimônio Mundial, o Comitê do Patrimônio Mundial, cuja atuação poderia ser solicitada pelos governantes que necessitassem de avaliação de prejuízos e danos aos seus respectivos Estados, como auxílio àqueles países em que a salvaguarda do patrimônio cultural não esteja devidamente discriminada por leis internas. A Convenção de 1972 adotou a Paisagem Cultural como conceito fundamental para enfrentar os dilemas da preservação no mundo moderno, como aponta RIBEIRO (2007), oriundos do processo de destruição acelerada, sobretudo pelas sociedades industrializadas. Este raciocínio corrobora a afirmação de FUNARI e PELEGRINI (2006), de que dentre as campanhas lançadas pela UNESCO para salvaguarda do patrimônio cultural da humanidade, em 1988 foi difundido o plano de proteção das missões jesuíticas cujas áreas englobam Brasil, Argentina e Paraguai, ação que extrapola os limites geográficos dos países envolvidos. Ainda segundo Funari e Pelegrini, observa-se um empenho deste órgão na capacitação de agentes patrimoniais e na exortação dos países para que incluam as populações locais nas ações de salvaguarda. O turismo cultural, por exemplo, atraindo turistas para um país ou para a região conformada por estes sítios, pode consistir em um importante efeito de sua instituição como patrimônio mundial. Porém, como aponta FRONER (2010), este o documento jurídico internacional aplica-se apenas aos bens imóveis, ao patrimônio material, tendo sido criado e depois sustentado e mantido segundo perspectivas culturais das sociedades complexas. Além de excluir o patrimônio imaterial, as classificações oriundas da Convenção do Patrimônio Mundial separavam patrimônio cultural e natural, conforme CASTRIOTA (2010). Desta forma, as preocupações recaem sobre certo tipo de patrimônio que é valorizado por apenas uma parcela da comunidade internacional. Conforme Froner, a atuação do Comitê reflete a predominância do conceito de monumento na inserção de bens na Lista de Patrimônio Mundial, em detrimento de outras correlações socioculturais. Para a pesquisadora, a noção de 39 patrimônio ficou dissociada da noção de cultura, na medida em que foi desconsiderada nos procedimentos de seleção a reciprocidade entre os sistemas construtivos, materializados nos sítios, edificações e conjuntos arquitetônicos, e os modos de vida das diferentes organizações culturais do presente e do passado, manifestas em crenças, formas de conhecimento e representação. Segundo Castriota, após muitos encontros e discussões durante os anos noventa e início do século XXI, o Comitê do Patrimônio Mundial definiu o conceito de paisagem cultural como interação entre natureza e cultura, vinculada a maneiras tradicionais de viver. A Convenção do Patrimônio Mundial de 2008 definiu três categorias para paisagem cultural: i. “uma paisagem planejada e criada intencionalmente pelo homem”; ii. uma “paisagem que se desenvolveu organicamente” que pode ser uma “paisagem relíquia (ou fóssil)” ou uma “paisagem com continuidade”; iii. uma paisagem cultural “associativa” que pode ser valorizada por causa das “associações religiosas, artísticas ou culturais dos elementos naturais”.9 Apesar de lidar com a historicidade das paisagens, a primeira e a segunda categorias definidas pela UNESCO apresentam uma visão de paisagem como superfície inscrita, onde as informações sobre determinado grupo social podem ser interpretadas. Segundo CASTRIOTA (2010), esta também foi a conclusão de uma análise acadêmica, realizada em 2006, pelo próprio Comitê do Patrimônio Mundial, juntamente com especialistas de várias partes do mundo e das nações, para aplicar o conceito de “paisagem cultural”. A segunda categoria de paisagem cultural definida pela UNESCO equivale a uma linha de abordagem geográfica de reconhecimento de processos ambientais únicos. Desde o início da década de noventa, a comunidade científica vem se empenhado em realizar ações referentes à geoconservação, como projetos e eventos envolvendo a comunidade geológica mundial, abrangendo questões como o valor patrimonial das rochas, fósseis, minerais, relevo, paisagens. A defesa do patrimônio geológico está vinculada não apenas à conservação, mas também à valorização e divulgação de sua importância para a sociedade, como mostra RUCHKYS (2009). No final desta mesma década, A UNESCO desenvolveu um programa de conservação e reconhecimento do patrimônio geológico mundial, denominado Programa Geoparques, o qual prevê o acesso da sociedade à história geoecológica da Terra (objeto de estudo da Geologia), através dos sítios geológicos. Este trabalho pretende fomentar a ideia de que a musealização de um território, com rico patrimônio geológico, pode ser conseguida com 9 Convenção do Patrimônio Mundial de 2008. Fonte: http://www.unesco.org. 40 a criação de geoparques. Além dos aspectos geológicos, um geoparque abrange valores ecológicos, arqueológicos, históricos ou culturais. Em 2004 a UNESCO publicou o documento Operational Guideline for Geopark Seeking UNESCO´s Assistence, que define geoparque como: Um território com limites bem definidos que tenha uma área suficientemente grande para que sirva ao desenvolvimento econômico local, com determinado número de sítios geológicos de importância científica especial, beleza ou raridade e que seja representativa da história geológica, dos eventos ou processos de uma área10. O documento da UNESCO, além de definir os critérios para qualificação de áreas como geoparques, orienta os Estados-Membros interessados em estabelecer um geoparque nacional, na realização dos procedimentos necessários. Entre outras determinações, a proposta deve conter: 1) identificação do território; 2) importância científica; 3) análise territorial; 4) seção de assinaturas. Segundo RUCHKYS (2009), através deste programa, a musealização do território possibilita o reconhecimento do patrimônio de maneira integral, tornando-o um instrumento de educação, desenvolvimento e melhoria das condições de vida das comunidades locais. Uma forma mais abrangente de aplicação do conceito de patrimônio cultural, mais próxima da terceira categoria definida pelo Comitê do Patrimônio Mundial, que vem sendo empreendida com o intuito de valorizar o ambiente como um processo construído pelo homem e pela natureza consiste nos denominados Ecomuseus. Segundo MATTOS (2006), os Ecomuseus associam-se aos movimentos museológicos internacionais do início da década de setenta, sob tutoria do Conselho Internacional de Museus – ICOM/UNESCO, época em que se evidenciava a uma preocupação com o papel que desempenhavam os museus. Surge assim o conceito de Museu Integral, cujo objetivo é proporcionar às comunidades uma visão de conjunto de seu ambiente material e cultural, levando-as a conhecer os problemas do meio rural e do meio urbano, assim como as questões referentes ao desenvolvimento técnico- científico. Estes princípios continuarão a gerar mudanças conceituais na década seguinte, os quais foram proferidos na Declaração de Quebec, de 1984, que propunha a ampliação das atribuições e funções tradicionais da Museologia a práticas mais abrangentes, inserindo suas ações naquelas ligadas ao meio humano e físico. Neste contexto começa a se estruturar uma Museologia de caráter social, substituindo a lógica da constituição de coleções pela busca de testemunhos materiais e imateriais oriundos de experimentações e vivências do presente, 10 UNESCO, 2004. 41 sendo que o público usuário teria uma participação ativa, criadora, e não mais contemplativa, de espectador. Como aponta Mattos, “trabalha-se inicialmente as questões afetivas, cognitivas e volitivas relacionadas com a memória presente para transportá-la ao passado em uma fase posterior” (MATTOS, 2005, p.7). Desta maneira, o museu torna-se um instrumento ao homem como indivíduo e como ser social, contribuindo para a solução de conflitos e desafios enfrentados ao longo de sua vida, proporcionando seu desenvolvimento de forma integral. 2.1.2 Conservação e Arqueologia Surgida num contexto específico de culto ao passado, a Ciência da Conservação está intimamente vinculada ao patrimônio cultural. A pesquisa de FRONER (2001) mostra que o conceito moderno de conservação e sua estruturação como disciplina científica, assim como a Museologia e a Arqueologia, são construções relativamente recentes. A concepção da restauração como intervenção técnico-científica e não como experiência artística modificou-se a partir da segunda metade do século dezenove. Neste momento histórico também estrutura-se o corpo conceitual da maioria das disciplinas associadas à Ciência da Conservação: Arqueologia, História da Arte e da Arquitetura. De uma atividade antes vinculada a reparos de cunho artístico, no decorrer do século XX a Ciência da Conservação passou a analisar não só os objetos isoladamente, mas também o entorno onde este objeto está inserido. Assim, passou-se a ter uma maior preocupação com variáveis ambientais e urbanísticas das cidades e também das regiões, ou seja, como o ambiente construído onde se encontram os acervos. No entanto, é a partir do início do século XXI, nos anos de 2000 a 2004, que se inicia uma nova abordagem na área da conservação, surgindo o conceito de gestão da conservação, passando- se a incluir a análise probabilística de riscos na restauração, onde se trabalha com as fontes potenciais de danos (naturais e humanas) e com a manutenção preventiva. Froner compara a conservação de bens materiais à medicina preventiva, cujos métodos intencionam controlar os agentes de degradação, sejam estes internos ou externos, buscando-se prevenir, estacionar ou retardar a deterioração dos artefatos. Esta nova metodologia de conservação parte do objeto, de suas características intrínsecas, para analisar a adequação e gestão ambiental do edifício e do entorno em que está inserido, considerando também objetivos, funções, atividades e recursos institucionais. A Conservação Preventiva apresenta caráter interdisciplinar, onde a Química, a Física, a Engenharia e a Meteorologia atuam como disciplinas aplicadas à conservação de bens 42 culturais, devido à ampla gama das origens dos danos em obras de arte, assim como os métodos de controle empregados. No meio acadêmico institucional, as universidades federais do Rio de Janeiro e da Bahia foram as primeiras a oferecer disciplinas de conservação e restauro. Na década de cinqüenta, como mostra Froner, o Prof. Edson Motta introduz as disciplinas de restauração de pintura de cavaletes e de papel na Escola de Belas Artes da UFRJ e o Prof. João José Rescala, a disciplina de restauração de pinturas no curso de graduação em Belas Artes na UFBA. O Centro de Conservação e Restauração da UFMG, coordenado e dirigido inicialmente pela Profa. Beatriz Vasconcellos Coelho, mantém desde 1979 cursos de restauração de pintura de cavalete e escultura policromada, sendo o primeiro curso de restauro a ser reconhecido oficialmente com curso de especialização. A Escola de Belas Artes da UFMG mantém atualmente um curso de pós-graduação ao nível de mestrado e doutorado – Programa de Pós-Graduação em Artes – com uma linha de preservação prevista na área, tendo como orientador o Prof. Dr. Luiz Souza, químico-restaurador reconhecido internacionalmente, a Professora DraYacy-Ara Froner e a Professora Dra. Maria Regina Emeri. O CECOR também oferece cursos associados a grandes organismos internacionais, como ICCROM, ICOM, The Getty Conservation Institute e Smithsonian Foundation, abrangendo questões da conservação preventiva e das intervenções, com embasamento científico. Em relação à Conservação Arqueológica, apesar de tratados, postulados e teorias sobre integrações em esculturas e achados arqueológicos existirem desde o século XVII, a obra de Harold Plenderleith, The Preservation of Antiquities, publicada em 1934 forjou as bases do conceito moderno de restauração nesta área, por se pautar em bases científicas, sendo imprescindível o conhecimento sobre a composição dos materiais, os agentes de degradação, utilizando-se de estudos tecnológicos na aplicação de métodos para conter a degradação. Segundo Froner, a teoria de Plenderleith, conjuntamente com os estudos de Brandi, influenciou o documento denominado Carta de Veneza, de 1964. Neste mesmo ano, Albert France-Lanord escreveu o texto: Savoir “interroger” l’ objet avant de le restaurer, o qual influenciou toda uma geração de arqueólogos franceses. Neste contexto, surge a necessidade de se formarem associações e instituições que propiciem a troca de informações, realizem publicações e ofereçam treinamento adequado. Como comenta Froner, após a segunda Guerra Mundial, centros internacionais como o ICOM, IIC, ICCROM, IRPA elaboraram encontros e seminários para difundir, questionar e estruturar um conhecimento científico estritamente voltado para a Ciência da Conservação. Porém, é na década de noventa que se acirram os 43 debates referentes às intervenções de restauro e às medidas preventivas de conservação relacionadas aos resgates das escavações. Seguindo a argumentação de Froner, assim como ocorre na restauração, a prática arqueológica ainda é desempenhada sem muito profissionalismo em vários países. O controle sobre intervenções arqueológicas exercidas por leigos, no Brasil, é exercido pelo IPHAN, pelos órgãos de preservação estaduais ou pela SAB, porém, como aponta Froner, os grandes entraves à profissionalização da prática encontram-se na falta de legislação e na vulnerabilidade científica vinculada à falta de reconhecimento da atividade. Além disso, como foi apontado nos tópicos anteriores, a destruição oriunda de ocupações irregulares, causadas pelo crescimento urbano desordenado, por grandes obras de infraestrutura e empreendimentos extrativistas, sobretudo os mineradores, tem sido a maior causa da extinção do patrimônio arqueológico nacional, sendo que a conservação destes bens depende de ações integradas de planejamento territorial, integrando preservação e desenvolvimento. Nestas ações, torna-se necessário que sejam previstas prospecções prévias sobre o impacto arqueológico, ambiental e histórico, como também o esclarecimento das comunidades residentes no entorno dos sítios. 2.1.3 Conservação Urbana Segundo ACSELRAD (1999), a sustentabilidade urbana, ou seja, propostas de reprodução adaptativa das estruturas urbanas que têm como referência a noção de qualidade de vida, estrutura-se segundo o modelo da eficiência energética, da cidadania e do patrimônio. Para o autor, o conceito de cidade é vinculado ao espaço que possibilita o processo de construção de direitos a condições saudáveis de existência, como também ao usufruto durável da dimensão simbólica de sítios urbanos. Esta noção de sustentabilidade associada à categoria patrimônio (grifo original) refere-se não só à materialidade das cidades, mas a suas identidades, ou seja, valores e heranças construídos ao longo do tempo. A intenção de se manter a existência simbólica de sítios construídos ou naturais pode consistir tanto em estratégias para fortalecer o sentimento de pertencimento dos habitantes às suas cidades, como em promover uma imagem de cidade representada por seu patrimônio biofísico, estético ou cultural, de modo a atrair investimentos. Para ZANCHETI (2003), o conceito de desenvolvimento urbano sustentável refere-se à utilização das estruturas urbanas herdadas de épocas passadas na atualidade, transformando-as quando necessário, sem comprometer a liberdade de utilização, memória e identidade das gerações futuras. 44 Um exemplo de política urbana sustentável consiste na Conservação Urbana Integrada, conhecida como CI11. Na Espanha e na Itália, a CI serviu como argumento teórico e prático para as administrações municipais de esquerda para a construção de uma imagem política de eficiência administrativa, justiça social e participação popular nas decisões do planejamento urbano e regional. Segundo AGUIAR (2007), no processo de reconstrução das cidades após a segunda guerra mundial o citado grupo de planejadores italianos, do qual faziam parte Carlo Argan e Cesare Brandi, contestaram os projetos cópia (repristinação12), assim como a renovação urbana moderna, baseada em demolições e substituições oriundas das grandes intervenções do urbanismo moderno. Segundo Aguiar, o grupo de planejadores italianos foi protagonista de uma nova escola de pensamento da conservação, onde metodologia operativa é inseparável da pesquisa científica, formando uma base conceitual que resultou na elaboração de uma nova carta internacional de restauro, a Carta de Veneza, de 1964, e posteriormente, na Carta de Restauro do Governo da Itália, de 1972. Nestes dois documentos internacionais, a restauração é apontada como uma operação excepcional, que se fundamenta no respeito à matéria original e no princípio da autenticidade. Como foi visto no primeiro capítulo desta dissertação, nas discussões sobre arqueologia urbana, o final da década de setenta corresponde à época em que Giulio Carlo Argan atuou como prefeito de Roma (pelo Partido Comunista Italiano). As ações demolitórias tipo “arrasa-quarteirão” (SEGAWA, 1992, p. 203), mostraram-se anti- humanas, anti-sociais, conforme Segawa, contrariando a intenção dos defensores das políticas de renovação, de se criar um mundo melhor. Em oposição a esta postura excludente, a CI foi implantada inicialmente em bairros históricos centrais com grande concentração de habitantes de baixa renda, numa tentativa de recuperar a área em sua estrutura física, econômica e social, mantendo os habitantes nos edifícios recuperados. Percebe-se, desta forma, que os princípios básicos da conservação integrada foram sistematizados e expressos nas Normas de Quito, de 1967, e na Declaração de Amsterdã, de 1975. No final dos anos setenta até os meados dos oitenta, a CI foi expandiu-se para outras áreas das cidades, em especial as modernas de caráter 11 Segundo ZANCHETI (2003), a conservação urbana integrada originou-se no urbanismo progressista italiano dos anos setenta, mais especificamente, a partir da reabilitação do centro histórico da cidade de Bolonha, iniciada nos últimos anos da década de sessenta, conduzida por políticos e administradores ligados ao Partido Comunista Italiano, cujas obras estavam relacionadas à arqueologia de salvamento. 12 Na Teoria do Restauro, a repristinação é a intervenção que busca recuperar a unidade estilística do bem, segundo seu estilo. 45 residencial. Buscava-se integrar áreas periféricas aos centros urbanos e aos locais de concentração de equipamentos coletivos, através de políticas especiais de transporte coletivo. Nos anos oitenta e noventa, ocorreu uma apropriação da proposta da CI por políticas urbanas isentas de preocupação social, tornando-se uma forma de revitalização ou reabilitação de áreas centrais degradadas ou obsoletas, associadas a propostas de recuperação econômica e do valor imobiliário de construções, especialmente daquelas protegidas por instrumentos legais de tombamento. Nestas políticas, a questão social é deixada em segundo plano, aceitando-se a gentrificação13. Considera-se que a recuperação física, econômica e social das áreas degradadas compensa socialmente a expulsão de habitantes e pequenos negociantes. Após a 2ª Conferência Mundial do Meio Ambiente no Rio de Janeiro, ECO 92, a CI é retomada em duas frentes de discussão sobre políticas urbanas, sobretudo aquelas que vinculam a questão ambiental à social. Na primeira frente de discussão, os princípios da CI são utilizados para uma leitura dos territórios urbanos, em oposição ao conceito de região, de cunho economicista. Conforme ROLNIK (1992), a tentativa de se impor uma divisão no espaço urbano, através do zoneamento funcional, baseado nas relações econômicas (setor industrial, setor comercial, separados do setor habitacional), contraria a própria lógica de produção da cidade, pois as relações econômicas e sociais são dinâmicas e estão em constante transformação. Ainda segundo Rolnik, o espaço urbano, ao contrário de ser um reflexo das relações sócio-econômicas, consiste em um fator que influencia e interage com estas relações. Se o zoneamento funcionalista cria uma situação excludente, na medida em que torna o uso do solo mais caro em algumas regiões restritas à habitação, afastando os moradores de baixa renda para as periferias da cidade, também a delimitação de áreas de preservação, se consistir em uma ação isolada no Planejamento Urbano, desvinculada, por exemplo, de políticas voltadas para a habitação popular, torna estas áreas preservadas vulneráveis à ocupação irregular. Assim, na segunda frente de discussão, o planejamento urbano utiliza a CI numa análise morfológica e tipológica da cidade, que é reconhecida como artefato composto historicamente por partes distintas, em sua estrutura física, ambiental e cultural. Desta forma, o planejamento urbano perde sua característica de generalidade (toda a cidade), abandona a forma quantitativa de regulação (índices urbanísticos) e privilegia a ação localizada com potencial de transformação da área onde se insere. Consiste em uma ação sobre artefatos urbanos e arquitetônicos localizados ou busca fornecer procedimentos-padrão para a 13 O processo de gentrificação consiste na expulsão dos antigos moradores de áreas urbanas degradadas, para a implantação de projetos de requalificação arquitetônica e econômica do lugar, destinado a um novo público. 46 realização de projetos urbanos. Conforme ROLNIK (1992), a preservação deixa de ser uma ação estática e isolada, passando a interferir no processo de produção da cidade como um todo. O plano urbano é assim composto por vários projetos com sentido estratégico de direcionamento da mudança urbana em uma determinada direção. SEGAWA (1992) mostra, por exemplo, que processos de preservação podem sinalizar como uma possibilidade de implantação de políticas de reabilitação social, relacionadas a uma diretriz de renovação e preservação de um bairro. Esta afirmação condiz com os apontamentos de FUNARI e PELEGRINI (2006), referentes à recuperação patrimonial dos antigos núcleos latino- americanos, nos quais a estratégia de recuperação da cidade de Quito é indicada como exemplo de gestão urbana onde foi privilegiada a inclusão social, agregando defesa do patrimônio, política habitacional e investimento turístico. Conforme Funari e Pelegrini, estas intervenções buscavam valorizar as potencialidades sociais, econômicas e funcionais da área. Assim, a conservação urbana e territorial consiste em uma nova proposta de planejamento oriunda da análise do esgotamento do processo de expansão continuada, que predominou nas cidades européias e, especialmente nas americanas até o final do século XX. O planejador italiano Giuseppe Campos Venuti14, estudioso da conservação urbana territorial, considera cultura da expansão como sendo o planejamento urbano que procurava solucionar problemas de crescimento urbano e de infraestrutura por meio da criação de novas áreas urbanizadas. E por cultura da transformação, o reconhecimento da cidade como fato físico que pode e deve ser reutilizado mediante processo de qualificação das estruturas urbanas existentes. A cultura da transformação leva em conta a especificidade cultural local e concretiza-se no patrimônio construído. A consciência ambiental modificou e ampliou a concepção de conservação integrada. O tema do patrimônio construído, dos monumentos, dos sítios e dos centros históricos, foi inserido no conceito de território histórico e cultural. O planejamento urbano torna-se uma atividade de gestão que ultrapassa a escala municipal e se torna metropolitana, regional, nacional ou mesmo global, dependendo do contexto, havendo uma busca de redefinição dos papéis e participação dos agentes públicos e privados da sociedade civil, abrangendo o modelo de gestão antes limitado a técnicos e administradores políticos. O controle da dinâmica de transformação da cidade é transferido do administrador de recursos para o gestor de interesses e conflitos dos setores públicos e privados. Estes critérios de gestão 14 VENUTI, Giuseppe Campos, 1994, 1993, apud. ZANCHETI, 2003) 47 urbana seguem os parâmetros da Recomendação de Nairóbi, de 1976, e da Carta de Washington, de 1986. Assim como a Arqueologia Urbana, o planejamento urbano e territorial reconhece a cidade, ou uma rede local de cidades, como produto de um longo processo de transformação que deixa vestígios de seu percurso no território, como, por exemplo, a divisão das propriedades, a organização dos cultivos, os caminhos e estradas, a rede de drenagem, as construções, as cidades. Como comenta Zancheti, o território é visto sob uma visão antropológica, segundo um método arqueológico. Conforme TOCHETTO e THIESEN, em seu estudo sobre a preservação do patrimônio arqueológico em áreas urbanas, “uma abordagem interpretativa sobre a cidade deve partir da ideia de que as diferentes manifestações arqueológicas são inter- relacionadas ao processo dinâmico que constitui a vida urbana” (TOCHETTO e THIESEN, 2007, p.179). O desafio do planejamento urbano territorial está em conciliar o processo de transformação do território e a manutenção dos vestígios dos artefatos humanos produzidos em épocas passadas, numa relação harmônica ponto de vista da cultura, do ambiente e das tradições construtivas. Para este fim, Zanqueti considera necessário o conhecimento da cultura material local, em seu aspecto dinâmico, ou seja, da construção histórica do território e de seus artefatos. Ainda segundo o autor, a conservação deve ser tomada como base da inovação, ou seja, a relação dialética conservação/inovação torna-se a origem do processo de intervenção no território. Nas considerações finais do artigo Conservação integrada e novas estratégias de gestão, utilizado nesta dissertação como base para a apresentação da política urbana da conservação integrada, Zancheti pontua como pontos para debate os seguintes argumentos: A conservação urbana será um dos componentes principais das estratégias de desenvolvimento local. Será aplicada não só em áreas de interesse histórico e cultural, mas também em outras áreas urbanas consolidadas. A conservação integrada é um poderoso conjunto de proposições normativas para o planejamento urbano que esteja ajustado aos princípios do desenvolvimento sustentável. A CI somente faz sentido, enquanto estratégia de desenvolvimento local, se for inserida numa nova perspectiva de planejamento enquanto processo de gestão entre os atores com capacidade de comando sobre a cidade. Nesse sentido, a CI será, necessariamente, uma componente dos novos instrumentos de coordenação entre ação pública e privada como, por exemplo, os planos estratégicos. A CI depende da presença do poder público municipal, pois a tarefa de coordenação de pactos restritos não pode ser delegada a nenhum grupo com interesses específicos. A CI é uma forma de ação na cidade, a qual busca revalorizar as qualidades ambientais dos ambientes urbanos. Assim, é também um processo de construção de 48 imagens coletivas, ao procurar ressaltar os valores culturais desses ambientes e transformá-los em atributos básicos das propostas de inovação. (ZANCHETI, 2003) No caso das políticas públicas brasileiras, PARDI (2006) indica que instrumentos como os Zoneamentos, os Planos Diretores, e o Estatuto das Cidades, com apoio do Ministério das Cidades, também podem contribuir para a preservação dos registros materiais em consonância com o crescimento organizado das cidades. Para que isto ocorra, Pardi chama a atenção para a necessidade de o Estado atuar como parceiro de forma mais incisiva, criando um setor especializado para a questão, como já é feito em relação à preservação dos bens edificados, fomentando a integração dos diferentes áreas de atuação, procurando trabalhar em conjunto com os municípios. Pardi ainda aponta os arqueólogos como possíveis avaliadores da criação de um curso de especialização ou mestrado voltado para este tema, sendo também mantenedores de um fórum permanente para elaboração de um diagnóstico a nível nacional. Para tanto, a pesquisadora considera imprescindível a realização de inventários regionais e a constituição de uma base nacional que forneça dados estatísticos e indicadores para associações, análises, sistematização, interpretação de dados, possibilitando o planejamento e a proteção do patrimônio arqueológico. A participação da comunidade, assim como os poderes: executivo, legislativo e judiciário, também é indicada pela pesquisadora como um fator importante neste processo. Segundo Pardi, cabe à comunidade cientifica sensibilizar os gestores do executivo para a criação de quadros e inserção de procedimentos específicos nas políticas públicas do Estado, ou seja, ações preventivas, preservação e pesquisa referentes aos sítios arqueológicos urbanos. Conforme COZEN (2010), as paisagens urbanas históricas são construídas pela acumulação de formas culturais. E além da acumulação, há a transformação das formas existentes, vinculada à adaptação funcional às novas necessidades. Para Cozen, as transformações representam mudanças dinâmicas das paisagens culturais, consistindo em uma intermediação entre processos de acumulação e substituição. O ambiente físico com maior expressividade histórica, para Cozen, é um bem essencial para o desenvolvimento social, para se atingir os mais avançados graus de civilização. Esta definição de transformação de Cozen coincide com a definição de desenvolvimento sustentável da conservação integrada. Em ambientes onde as formas originais são valorizadas e incorporadas no cotidiano das comunidades, há um sentido de continuidade e diversificação de experiência em épocas diferentes, estimulando comparações que levam à construção de uma consciência crítica por parte dos indivíduos. 49 Neste sentido, CASTRIOTA, SOUZA e TOLENTINO (2010), apresentam uma proposta inovadora de Planejamento Integral aplicado à paisagem cultural, com a inclusão do patrimônio imaterial como fator básico para a elaboração de estratégias de desenvolvimento. Este plano possui uma perspectiva multidisciplinar, conjugando Programa de salvaguarda de práticas, conhecimentos e técnicas tradicionais, Programa de reabilitação da paisagem, Programa de fortalecimento econômico (aliando princípios de preservação do patrimônio e sustentabilidade ambiental à geração de renda), Programa de fortalecimento institucional (criando leis específicas, colegiados e conselhos gestores), acordando intervenções físicas e ações culturais. Diante do exposto pode-se observar que a preservação do patrimônio arqueológico em áreas urbanas depende da gestão nos parâmetros da conservação integrada, ou seja, do desenvolvimento urbano sustentável. Neste tipo de política urbana, os sítios arqueológicos, assim como as estruturas atuais, são considerados como elementos compositivos da cidade a serem contemplados pelas estratégias de ação, fazendo parte do cotidiano atual, podendo, por exemplo, serem utilizados como parques urbanos. A conservação integrada, como forma de planejamento territorial, possibilita ainda a inclusão destes sítios na análise de questões como o impacto oriundo da implantação de empresas extrativistas em áreas dotadas de bens arqueológicos, ou mesmo o adensamento e expansão urbanos consequentes do crescimento econômico de uma região. 2.1.4 A gestão do patrimônio arqueológico no México e no Peru Com o intuito de comparar a política de preservação do patrimônio arqueológico no Brasil com a atuação de instituições afins no âmbito internacional, optou-se por analisar esta situação no México e no Peru, por serem países que também se localizam na América Latina, mas que apresentam reconhecimento mundial sobre seu legado arqueológico. O INAH, Instituto Nacional de Antropologia e História do México, um dos órgãos patrimoniais mais antigos da América Latina, foi fundado em 1939 pelo governo federal com o intuito de investigar, conservar, proteger e difundir o patrimônio cultural do país, referente aos bens pré-histórico, arqueológico, antropológico, histórico e paleontológico. Além dos monumentos históricos, bibliotecas e museus nacionais, regionais e locais, o Instituto é responsável pela preservação de vinte e nove mil zonas arqueológicas registradas em todo o país (calcula-se que existam duzentos mil sítios com vestígios arqueológicos no México, 50 dentre os quais cento e setenta e seis estão abertos à visitação). Este órgão também realiza pesquisas científicas, contando com mais de oitocentos acadêmicos de várias áreas: história, antropologia social, antropologia física, arqueologia, linguística, etnohistória, etnologia, arquitetura, conservação e restauração do patrimônio. O Instituto também possui centros de formação superiores como a Escola Nacional de Antropologia e História do México, a ENAH Chihuahua, e a Escola Nacional de Conservação, Restauração e Museografia Manuel del Castillo Negrete , situada na Cidade do México. Para a Instituição, atividades como a escavação e abertura de sítios arqueológicos ao público, ou a restauração de monumentos históricos são tão importantes como o registro de monumentos históricos e bens arqueológicos que se encontram sob cuidado de particulares. Também são considerados de grande importância os trabalhos educativos dos museus, a organização de passeios culturais e a reprodução de peças históricas ou arqueológicas, buscando-se evitar os saques. O Instituto Nacional de Cultura do Peru foi instituído em 1971, em substituição à antiga Casa de Cultura, criada em 1962. Este órgão possui um Plano Mestre no qual se baseiam projetos de manejo de locais onde estão inseridos bens do patrimônio cultural peruano. O Plano Mestre tem como objetivo investigar, conservar e promover os sítios que se destacam por ser únicos e representativos da evolução histórica do Peru (como os sítios arqueológicos de Chan Chan e Machu Picchu, e o Centro Histórico de Lima), com o intuito de compreender o passado e dar um uso no momento atual que os valorize. A realização de um Plano de Manejo deve levar em conta a unidade territorial de um determinado sítio, assim como o reconhecimento de seus valores pela sociedade ao longo dos anos. As primeiras definições de planejamento e gestão para Machu Picchu, por exemplo, ocorreram com a equipe da Missão Científica da National Geographic Society e da Universidade de Yale, coordenada pelo pesquisador Hiriam Bingham, que o descobriu e nele trabalhou entre os anos de 1911 até 1920. Nesta época inicia-se o reconhecimento do valor cultural da Cidade Inca de Machu Picchu, como também sua promoção como atrativo turístico. Em 1929, a Lei n. 6634, declara Machu Picchu Monumento Arqueológico Nacional. Nas décadas de trinta e quarenta, através da pesquisa coordenada por Paul Feijos, patrocinada pela Fundação Wenner Green, o Estado Peruano reconhece a importância da conservação do Conjunto composto pela Cidade Inca de Machu Picchu e pelas edificações integradas ao Caminho Inca, originando-se a constituição do Parque Arqueológico Wenner Green. O Plano Mestre de Conservação e Manejo para o Conjunto Arqueológico de Chan Chan foi aprovado em 2000, onde foi proposta uma atuação interdisciplinar, sustentável e integrada entre pesquisas científicas e ações técnicas, voltadas 51 para a conservação integral do sítio, assim como seu uso científico e cultural pela comunidade. O plano está sendo implementado pelo INC. Frente à degradação do sítio por invasões e saques, o INC considerou necessário priorizar o cumprimento do Plano Mestre para Chan Chan. Um Comitê Nacional de Gestão encontra-se em processo de formação, assim como uma parceria com a UNESCO para a realização de uma Mesa de Negociação para obter financiamento para projetos de conservação e gestão do patrimônio peruano. Esta rápida explanação sobre a gestão do patrimônio arqueológico no México e no Peru pretendeu mostrar como os órgãos gestores do patrimônio cultural destes países englobam em seus programas ações educativas e participação da comunidade, destacando-se o centro de ensino superior na área de restauração que faz parte da própria estrutura organizacional do Instituto Mexicano. O número de sítios arqueológicos registrados no México, na casa dos milhares, também demonstra a valorização desta categoria patrimonial no país. Ressalta-se ainda, no caso peruano, a inserção da preservação de sítios arqueológicos nos Planos de Manejo territoriais. 2.2 A gestão do patrimônio arqueológico no Brasil 2.2.1 Proteção legal do patrimônio arqueológico brasileiro: desafios e conquistas A primeira iniciativa de ordenamento jurídico abrangendo o patrimônio arqueológico brasileiro ocorreu no ano de 1920, quando a Sociedade Brasileira de Belas Artes encarregou Alberto Childe, conservador de Antiguidades Clássicas do Museu Nacional, a elaborar um anteprojeto de lei para defesa do patrimônio artístico nacional, cujo resultado voltava-se quase que exclusivamente para a proteção do patrimônio arqueológico, propondo a desapropriação das áreas detentoras destes bens. Como as oligarquias políticas eram compostas por grandes proprietários de terra, esta proposta não foi aprovada. No período compreendido entre os anos de 1920 e 1970, ocorreram no Brasil várias iniciativas jurídicas e institucionais de cunho conservacionista, vinculadas a ideais nacionalistas. Após vários outros projetos apresentados à Câmara sem sucesso, em 1933 foi aprovado o Decreto n° 22.928/33, que erigiu a cidade de Ouro Preto a Monumento Nacional, com o intuito de acautelamento dos “(...) velhos 52 monumentos, edifícios e templos de arquitetura colonial, verdadeiras obras d’arte, que merecem defesa e conservação”15. Como afirmou ANDRADE (1993), a proposta apresentava-se aparentemente inovadora ao abranger integralmente a estrutura urbana da antiga Vila Rica, enquanto as preocupações internacionais da época voltavam-se para o monumento isolado. Com relação às Constituições Brasileiras, RODRIGUES (2006) mostra que embora todos os textos anteriores contenham ao menos uma referência ao patrimônio histórico e artístico, foi na Constituição de 1967 que apareceu a primeira menção expressa a sítios arqueológicos. Segundo o autor, o Art. 172, que determina o dever de proteção das jazidas arqueológicas pelo Estado, dentre outros bens, foi mantido na Emenda Constitucional 01/69, sendo apenas renumerado para Art. 181. Como veremos adiante, seria na Constituição de 1988 que ocorreriam alterações substanciais no conceito de patrimônio cultural, em suas modalidades e formas de preservação. Foi também na Carta Magna de 1988 que os sítios de valor arqueológico foram expressamente incluídos na lista do Patrimônio Cultural Brasileiro. No Brasil do início do século XX, as ações preservacionistas estavam vinculadas à ideia de patrimônio como um conjunto de bens culturais pertencentes à coletividade a serem protegidos com símbolos da nação. Neste contexto, a função social de propriedade privada foi instituída pela Constituição de 1934, que em seu Art. 134° determina: Art. 134° - Os monumentos históricos, artísticos e naturais, assim como as paisagens ou locais particularmente dotados pela natureza, gozam de proteção e dos cuidados especiais da Nação, dos Estados e dos Municípios. Os atentados cometidos serão equiparados aos cometidos contra o patrimônio nacional16. Assim, a criação do Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e o estabelecimento do Decreto Lei n° 25, de 1937, ao organizar a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, dão seguimento às determinações da lei constitucional de 1934 e institui o tombamento como forma de proteção deste patrimônio pelo Poder Público. O Código Penal de 1940, Decreto-Lei n° 2.848, segundo FUNARI (2008), introduz a pena que incrimina a destruição, deterioração ou alteração dolosas dos bens tombados, incluindo os arqueológicos, o que assegura os postulados do Decreto Lei n° 25/37, que em seu art. 165, determina como crime contra o patrimônio dano em coisa de valor artístico, arqueológico ou histórico. 15 Decreto n° 22.928/ 1933, parágrafo segundo. 16 Constituição da República dos estados Unidos do Brasil/ 1934, Art°. 134. 53 A Comissão de Pré-história, criada na USP em 1952 por Paulo Duarte com o objetivo de proteção dos sítios arqueológicos, gerou discussões que decorreram na aprovação da Lei n° 3924, de 1961, que dispõe sobre a proteção dos monumentos arqueológicos e pré-históricos pelo Estado, não ficando estes mais sujeitos às normas gerais que regem a propriedade privada. Como afirma MIRANDA17 (2006), a Lei n° 3924/ 61 instituiu um regime jurídico próprio para bens de natureza arqueológica, dispensando o tombamento regido pelo Decreto- Lei 25/ 37. Os sítios arqueológicos passam a ser considerados bens da União, e sua destruição ou mutilação consiste em crime contra o patrimônio nacional. A necessidade de criação de um registro dos sítios arqueológicos pela instituição competente, no caso o SPHAN, também é mencionada na Lei. Esta lei foi criada, principalmente, para conter a depredação dos sítios arqueológicos alvo de interesse econômico, como os sambaquis. Na época, segundo BASTOS e SOUZA (2008), este tipo de sítio arqueológico era utilizado fartamente na produção de adubos, cal, fertilizantes, corretivos de solo e pavimentação de estradas. Para os autores, apesar de suas falhas e limitações, a lei em questão consiste até os dias atuais em um importante instrumento para a preservação arqueológica no Brasil. Estabelece procedimentos a serem realizados numa pesquisa arqueológica, como pedido de autorização ao Governo da União, através da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, atual IPHAN, especificações quanto às escavações, assim como a produção de relatório arqueológico e cuidados necessários ao armazenamento dos acervos oriundos das pesquisas. Conforme RODRIGUES (2006), a Lei n° 3924/61 trata equivocadamente sítios arqueológicos e pré-históricos como sinônimos, e ignora a existência de bens arqueológicos históricos. SILVA (2007) concorda com o autor na afirmação de que a proteção dos bens arqueológicos de natureza histórica não foi claramente definida pela norma. Rodrigues mostra que o texto legal aplica-se quase que exclusivamente a sítios que necessitam de escavação. O próprio contexto em que foi criada a lei em questão, na tentativa de se conter a destruição dos sambaquis, e sob influência da Comissão de Pré-história da USP, explica o enfoque na instância pré-histórica. 17 Marcos Paulo de Miranda é Promotor de Justiça de Minas Gerais, Coordenador das Promotorias de defesa do Patrimônio Histórico, Cultural e Turístico do Estado de Minas Gerais, de agosto de 2003 a setembro de 2005, assumiu o cargo de Coordenador Auxiliar do Grupo Especial de Promotores de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural das Cidades Históricas de Minas Gerais, Coordenador das Promotorias Ambientais das Sub-Bacias dos Rios das Velhas e Paraopeba e Representante do Ministério Público no Grupo Coordenador de Fiscalização Ambiental Integrada (GCFAI) do Estado de Minas Gerais. 54 A Portaria nº 07 de 1988 define de forma mais detalhada os procedimentos previstos na Lei nº 3.924/ 61, necessários à pesquisa e exploração em sítios arqueológicos, como comunicação, permissão e autorização prévias pelo Governo da União, através do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Ainda na mesma linha das regulamentações anteriores, no sentido de fortalecer a idéia de patrimônio como bem comunitário, na década de setenta, a Lei n° 6.513/ 77 estabelece os sítios arqueológicos e pré-históricos como bens de interesse turístico. PARDI (2006) lança a discussão sobre ações operacionais que fomentem a possibilitar de uso de sítios arqueológicos para o turismo, garantindo sua preservação. Segundo a pesquisadora, o desafio das instituições e atores vinculados à preservação cultural é integrar estes sítios às rotinas das comunidades locais, de forma a produzir renda e inclusão, proporcionar o acesso a valores culturais os quais o cidadão tem direito. O esforço empreendido contra a degradação ambiental e a opressão social, como mostra SANTILLI (2007), ao contrário de ser um movimento importado do continente europeu e da América do Norte, surgiram no Brasil já nos séculos XVIII e XIX, como reação contra a exploração do sistema colonial, caracterizado pelo latifúndio monocultor, que vigorava em função da devastação do solo e da escravidão. Porém, foi a partir das décadas de setenta e oitenta que a proteção ao meio ambiente estruturou-se no Brasil com a criação de órgãos e jurisprudência específica, como lembra Santilli, a partir da influência dos debates internacionais sobre o tema, como a Conferência de Meio Ambiente das Nações Unidas, realizada em Estocolmo. Dentre estas ações, a Lei n° 7.347/1985, que dispõe sobre a Ação Civil Pública, tem por objetivo a repressão e a prevenção de danos ao meio ambiente, ao consumidor, ao patrimônio público, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, podendo ocasionar sanções como multa, apreensão, demolição ou embargo. Também pode determinar o tombamento de um bem pelas instâncias administrativas responsáveis. Como afirmou MIRANDA (2006), a tutela penal dos bens que integram o patrimônio cultural não se legitima na defesa de sua propriedade, mas sim na função social destes bens, de característica suprapatrimonial, ou seja, desvinculada da ideia de titularidade sobre a materialidade que ostenta o valor protegido. A Constituição Federal de 1988, no art. 129, inciso III, conferiu ao Ministério Público ferramentas como o inquérito civil, um procedimento administrativo de natureza investigatória. O Ministério Público é a entidade que mais atua dentre aquelas com legitimidade para propor ação civil pública, 55 atuando nos casos federais, regulamentados pela Constituição e pelas leis federais, sempre que a questão envolver interesse público. Outra conquista da Constituição de 1988 foi a ampliação do conceito do que é considerado patrimônio brasileiro: Art.216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: (...) V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico (grifo nosso), paleontológico, ecológico e científico18. Esta nova abrangência acarreta alterações nos conceitos jurídicos de proteção, segundo Miranda, ao trazer para a legislação o termo ‘patrimônio cultural’, ao criar novas formas de acautelamento, como inventário, registro e vigilância, além de tombamento e desapropriação, e considerar já tombados bens relevantes como documentos e antigos quilombos. Em seu art. 20, X, a CF/88 determina que os bens arqueológicos são de propriedade da União Federal. Outro avanço da Carta Magna de 88 é a vinculação da exigência de Estudos de Impacto Ambiental à liberação de grandes obras de infraestrutura que possam provocar impactos negativos ao ambiente. A ocupação de áreas dotadas de mata nativa e de remanescentes arqueológicos, oriunda de adensamento urbano e exploração econômica, vem acarretando a progressiva destruição do patrimônio natural cultural ali existente. No ano de 1989, o sítio arqueológico do Arco da Lapa, rico em pinturas rupestres pré-históricas, situado no município de Matozinhos/ MG, foi aniquilado por uma empresa mineradora que explorava calcário na região. A empresa foi notificada, mas não interrompeu suas atividades até que obtivesse a quantidade de matéria prima desejada. Ao satisfazer suas necessidades econômicas, a empresa interessou-se em realizar pesquisas arqueológicas. No entanto, a esta época todos os vestígios de pinturas rupestres já haviam se perdido. A atuação do Departamento Nacional de Produção mineral, DNPM, não abrange a proteção do patrimônio arqueológico de caráter histórico ou pré- histórico, pelo fato de se pautar pelo Código de Mineração, Decreto-Lei n° 227/67, que vincula a obtenção de licença de lavra para uma jazida às leis específicas de proteção a minerais ou fósseis de interesse arqueológico, assim como os espécimes minerais ou fósseis destinados a Museus, Estabelecimentos de Ensino e outros fins científicos. Instrumentos como o inventário poderiam ter auxiliado na instauração de processos jurídicos como ações penais. Carlos Frederico Marés, citado por MIRANDA (2006), comenta sobre a necessidade 18 Constituição Federal/ 1988, Art° 216. 56 das leis em vigor no país se modernizarem em relação à Carta Magna de 1988, sendo necessário regulamentar o inventário, o registro e revisar a lei de tombamento de 1937 segundo o contexto atual. Ainda segundo Miranda, a Lei de Crimes Ambientais, Lei n° 9.605/ 98, consiste em um marco na legislação brasileira. Amplia a proteção ao patrimônio arqueológico e pune com mais rigor os crimes contra o patrimônio protegido, tombado ou acautelado de alguma forma. Em relação aos delitos contra o patrimônio cultural de forma geral, a exigência do tombamento tornou-se desnecessária, e o denominado meio ambiente sadio passou a abranger, além dos elementos naturais, aqueles de ordem histórica e cultural, que conferem valores identitários às comunidades. Em relação ao Código Penal, a Lei de Crimes Ambientais também avançou no sentido de admitir, no art. 62, parágrafo único, a forma culposa quando a ocorrência de danos ao patrimônio ambiental provier de negligência, imprudência ou imperícia do autor. Para BASTOS e SOUZA (2008), a lei foi instituída em face da ausência do pronunciamento e da manifestação institucional do órgão responsável pela salvaguarda dos bens culturais arqueológicos. Apesar desta afirmação ser demasiado enfática, o histórico do IPHAN em relação à salvaguarda dos bens arqueológicos revela a necessidade de melhor estruturação administrativa na gestão deste patrimônio, como veremos no Item 2.2.2. Conforme CALI (2005), a Portaria n° 230, de 2002, compatibiliza a preservação do Patrimônio Arqueológico com o licenciamento ambiental, consistindo em uma revolução na área de conservação e pesquisa dos sítios arqueológicos, como também seu uso social e educacional. Como afirma FUNARI (2008), a legislação patrimonial consiste em uma conquista do processo democrático brasileiro ao exigir que todos os projetos desenvolvimentistas potencialmente impactantes estejam vinculados à pesquisa arqueológica. Desta forma, a lei prioriza os bens culturais coletivos em relação à exploração econômica que beneficie a propriedade privada. A Portaria n° 230 complementa a Resolução CONAMA n° 001, de 1986, a qual estabelece que sítios e monumentos arqueológicos devem ser objeto de consideração para a emissão das Licenças Prévias, de Instalação e Operação de empreendimentos que causem impacto significativo ao meio ambiente, tais como: I - Estradas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento; II - Ferrovias; III - Portos e terminais de minério, petróleo e produtos químicos; 57 IV - Aeroportos, conforme definidos pelo inciso 1, artigo 48, do Decreto-Lei nº 32, de 18.11.66; V - Oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de esgotos sanitários; VI - Linhas de transmissão de energia elétrica, acima de 230KV; VII - Obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como: barragem para fins hidrelétricos, acima de 10MW, de saneamento ou de irrigação, abertura de canais para navegação, drenagem e irrigação, retificação de cursos d'água, abertura de barras e embocaduras, transposição de bacias, diques; VIII - Extração de combustível fóssil (petróleo, xisto, carvão); IX - Extração de minério, inclusive os da classe II, definidas no Código de Mineração; X - Aterros sanitários, processamento e destino final de resíduos tóxicos ou perigosos; Xl - Usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia primária, acima de 10MW; XII - Complexo e unidades industriais e agroindustriais (petroquímicos, siderúrgicos, cloroquímicos, destilarias de álcool, hulha, extração e cultivo de recursos hídricos); XIII - Distritos industriais e zonas estritamente industriais - ZEI; XIV - Exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100 hectares ou menores, quando atingir áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental; XV - Projetos urbanísticos, acima de 100ha. ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério da SEMA e dos órgãos municipais e estaduais competentes; XVI - Qualquer atividade que utilize carvão vegetal, em quantidade superior a dez toneladas por dia. Segundo DELFORGE (2010), a classificação de empreendimentos segundo a gradação de danos ao ambiente segue os critérios de porte e potencial poluidor, o que segundo o arqueólogo, nem sempre é eficiente na ótica do patrimônio arqueológico. Outra questão a ser levantada é que dentre as operações citadas pela lei não aparecem obras de infraestrutura urbana como aquelas referentes à Rede de Distribuição Subterrânea em centros históricos, que visam à retirada de postes, ou instalação de sistemas de telefonia, e que, como apontam BAETA e PILÓ (2010), podem destruir estruturas de valor arqueológico soterradas naquele logradouro, através da abertura de valas por retroescavadeiras, para a instalação dos novos canos. A Constituição Federal de 1988 corrobora a Resolução CONAMA n°001, determinando ao poder público a exigência de que todas as grandes obras de infraestrutura que pudessem provocar impactos negativos ao ambiente fossem submetidas aos chamados Estudos de Impacto Ambiental, antes de ser implantadas. No entanto, esta determinação permanece vaga para os casos de infraestrutura urbana de menor porte, e a presença do arqueólogo na obra acaba sendo solicitada, na maioria dos casos, somente quando grande 58 parte dos vestígios arqueológicos já se perdeu. No caso das grandes obras, a exigência legal vem sendo cumprida com mais efetividade, e estes estudos estão envolvendo diferentes disciplinas, contando com biólogos, geólogos, antropólogos, além de arqueólogos. Esta exigência legal resultou na chamada Arqueologia de Contrato, que se refere à atuação autônoma de profissionais ou de empresas especializadas em arqueologia, que a partir da década de sessenta passaram a ser contratados pela iniciativa privada ou pelo Estado para a prestação de serviços vinculados à realização de Estudos de Impacto Ambiental. Embora os arqueólogos que lidam com o contexto do mercado usem os mesmos procedimentos daqueles que atuam em instituições de pesquisa, precisam compatibilizar seu trabalho com o cronograma da obra e os interesses do empreendedor, além de limitar suas pesquisas aos recortes geográficos definidos pelo tipo de empreendimento, havendo, portanto, um controle da atuação destes profissionais às exigências do mercado. Segundo FUNARI (2008), no Brasil, o estado é ainda incapaz de controlar os contratos em arqueologia e as ações de resgate patrimonial. Desta forma, os interesses das empresas acabam prevalecendo sobre a preservação arqueológica. ZANNETTINI (2010) alerta sobre a questão do despreparo técnico de grande parte dos profissionais que ingressam no mercado. Apesar de existir a necessidade de ampliação do número de arqueólogos para suprir a demanda referente a profissionais envolvidos com pesquisa arqueológica (seja em institutos de pesquisa, institutos patrimoniais ou autônomos trabalhando por contrato), sobretudo aquelas vinculadas a processos de licenciamento ambiental, sendo também oportuno o cuidado com a qualidade da formação acadêmica destes profissionais. Segundo Zannettine, em relação às universidades brasileiras, há atualmente dez cursos de graduação, seis cursos voltados à especialização (Latu Sensu), e seis cursos referentes à formação Strictu Sensu, (mestrados e doutorados), sendo que, desse total, onze cursos foram criados nos últimos três anos. Conforme o pesquisador, é consensual a opinião no meio científico sobre a falta de embasamento teóricometodológico de grande parte dos arqueólogos formados e lançados hoje no mercado de trabalho da arqueologia de resgate vinculada a grandes empreendimentos. Por outro lado, se executada conforme uma postura ética, a Arqueologia de Contrato tem o potencial de trazer ao campo de discussões questões como: definição daquilo que deve ser preservado e o que pode ser destruído; determinação quanto ao modo de escavação de um sítio arqueológico, ou seja, de forma intensiva ou sumária; como também o potencial de um patrimônio arqueológico de alta significação na alteração ou impedimento da implantação de 59 um empreendimento. O aumento do número de grandes obras como hidrelétricas e estradas permitiu que extensas áreas do território brasileiro, desconhecida pelas pesquisas arqueológicas, fossem estudadas. Devido a perdas irreparáveis ao Patrimônio Cultural Arqueológico, causadas com a implantação de Usinas Hidrelétricas no Brasil, em 2003 o IPHAN institui a Portaria n° 28, que prevê a realização de estudos arqueológicos, com projetos de levantamento, prospecção, resgate e salvamento. Os bens afundados, submersos, encalhados e perdidos em águas sob jurisdição nacional, em terreno de marinha e seus acrescidos e em terrenos marginais, em decorrência de sinistro, alijamento ou fortuna do mar, passaram a ser regidas pela Lei n° 7.542 de 1986, que dispõe sobre a pesquisa, exploração, remoção e demolição deste tipo de patrimônio. No entanto, como aponta FRONER (2001), a lei é imprecisa sobre as diferenças entre bens submersos ou bens não submersos, e a falta de políticas claras em relação a estes bens a torna inoperante. RAMBELLI (2007) concorda com esta afirmação, porém considera este documento como um avanço na detenção de iniciativas danosas realizadas por aventureiras no litoral brasileiro, pois extingue o percentual de incentivo que era concedido à livre iniciativa pela exploração do patrimônio submerso e determina como pertencente à União todos os vestígios arqueológicos de naufrágios. O novo instrumento retira do IPHAN a responsabilidade sobre o patrimônio subaquático, cuja gestão e proteção tornam-se encargo da Marinha do Brasil. Atribuição esta considerada de competência duvidosa para BASTOS e SOUZA (2008), pelo fato de a Marinha não ser o Ministério próprio para a preservação e proteção do Patrimônio Cultural Arqueológico. Nas últimas décadas, observa-se um avanço tanto administrativo quanto legislativo em relação à proteção do patrimônio cultural brasileiro. Em 1997 foi lançada a Resolução CONAMA n° 237, que revisou os procedimentos e critérios utilizados no licenciamento ambiental, visando empregar o sistema de licenciamento, instituído pela Política Nacional de Meio Ambiente, como instrumento de gestão ambiental, buscando o desenvolvimento sustentável. Esta Resolução integrou a atuação dos órgãos competentes na execução da Política Nacional de Meio Ambiente. Também em 2003, é criada no Estado de Minas Gerais a Promotoria de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico do Estado de Minas Gerais. A estruturação desta Promotoria visa oferecer novos mecanismos de atuação da Instituição na proteção do patrimônio cultural e turístico de Minas Gerais, tendo sido criado em 2003 o Grupo Especial de Promotores de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural das Cidades 60 Históricas, com objetivo primordial de integrar e uniformizar a atuação do Ministério Público na defesa do patrimônio cultural existente nas principais cidades que compõem o Circuito do Ouro e adjacências. Esse Grupo, de atuação firme e profícua, acabou por constituir o embrião da Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Histórico, Cultural e Turístico de Minas Gerais - criada pela Resolução PGJ 78/2005 e implantada com o apoio do Ministério do Turismo. Essa Coordenadoria, em sintonia com os titulares das Promotorias de Defesa do Patrimônio Cultural, certamente virá a imprimir um novo ritmo à ação do Ministério Público Estadual na defesa dos bens e valores culturais e turístico das Gerais. No IV Encontro do Ministério Público na Defesa do Patrimônio Cultural, ocorrido em março de 2009, na cidade de Ouro Preto/ MG, teve como resultado a Carta de Ouro Preto, formulada por representantes do Ministério Público Federal e Estadual, e dos demais órgãos públicos vinculados à proteção do patrimônio cultural, como também por integrantes da sociedade civil. Os itens 01 e 02 reorganizam conceitos gerais referentes ao patrimônio cultural: 1) Devido ao tratamento constitucional recebido pelo patrimônio cultural, o mesmo regime jurídico aplicável constitucionalmente aos bens ambientais naturais será aplicável aos bens culturais. 2) A partir da CF/88 qualquer discussão que envolva o patrimônio cultural deve envolver a participação popular, porque o patrimônio cultural não é mais restrito aos bens alusivos ao Estado, às elites, à história dos vencedores, mas também envolve a história dos menos favorecidos, dos homens comuns19. E de forma mais específica, nos itens 31 e 32, o documento faz referência à proteção do patrimônio arqueológico do arraial minerador do ciclo do ouro da antiga Vila Rica: 31) A inadequada proteção dos documentos arqueológicos do Morro da Queimada, em Ouro Preto, é um dos casos mais graves de abandono do patrimônio cultural pelos poderes públicos nas suas diversas esferas ao longo dos tempos. 32) A efetiva implantação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada trará um impacto positivo em Ouro Preto, dando origem a diversas ações de valorização do seu patrimônio cultural e natural20. A Carta de Ouro Preto, da mesma forma que o relatório resultante do I Fórum Nacional do Patrimônio, que será citado posteriormente no Item 2.2.3, demonstra uma preocupação com a necessidade de se instituir políticas que integrem o patrimônio cultural aos processos de urbanização. Visando esta prática, a Carta cita a necessidade de criação, gestão e manutenção 19 Encontro Nacional do Ministério Público na Defesa do Patrimônio Cultural, IV. Carta de Ouro Preto, 2009, Itens 01 e 02. 20 Encontro Nacional do Ministério Público na Defesa do Patrimônio Cultural, IV. Carta de Ouro Preto, 2009, Itens 31 e 32. 61 de unidades de conservação nas políticas de planejamento, como também o vislumbre das populações locais e do entorno como fator importante para valorização desses espaços protegidos. Segundo LIMA (2007), nenhuma política de preservação arqueológica consegue manter-se sem um suporte legal que lhe sustente, mas lembra também que as leis são geradas por fatos sociais, devendo acompanhar a dinâmica da sociedade para a qual foram designadas. Caso isto não o ocorra, o Estado torna-se alvo da obsolescência da legislação, ficando impotente para combater as ações impactantes sobre o patrimônio. A efetividade da preservação do patrimônio arqueológico depende ainda da conjunção das bases jurídicas às educativas, para que haja uma identificação dos indivíduos com o valor social deste patrimônio, criando-se uma relação empática que propicie sua proteção, como também a percepção de que preservar pode tornar-se mais vantajoso do que violar as normas, inclusive sob o aspecto econômico. E, concordando com a afirmação de BASTOS e SOUZA (2008), se há dificuldades em se fazer cumprir a legislação, a questão não se restringe à área da arqueologia, mas abrange vários setores legais do país, necessitando-se de uma estruturação de trabalho dos órgãos responsáveis pela preservação do patrimônio de modo geral e de maneira integrada. Neste sentido, no ano de 2010, o Ministério Público Federal, através da Procuradoria de Minas Gerais expediu uma série de recomendações aos órgãos envolvidos nos processos de licenciamento ambiental. Dentre elas destaca-se a Recomendação n° 10/2010 à Secretária Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, ao Conselho Estadual de Política Ambiental - COPAM/MG, bem como à Diretoria de Licenciamento do IBAMA, para que observem as regras de licenciamento ambiental, especialmente a Resolução CONAMA nº 237/97 e as Portarias IPHAN nº 07/1988, nº 230/2002 e nº 28/2003, que tratam do licenciamento arqueológico, lembrando sobre a necessária participação do IPHAN no procedimento complexo de licenciamento ambiental, segundo a cronologia da expedição de licenças prévias, de instalação e de operação, abstendo-se de emitir qualquer licença ambiental antes da realização das consultas pertinentes. Tanto a legislação nacional pertinente ao licenciamento ambiental, como as Recomendações da UNESCO sobre a conservação dos bens culturais, definem que a emissão de qualquer licença ambiental está vinculada à prévia consulta ao órgão de preservação do patrimônio cultural, no caso brasileiro, o IPHAN. Se necessário, a pesquisa arqueológica já deve ser exigida, compatibilizando o diagnóstico com a Licença Prévia, a prospecção com a Licença 62 de Instalação, e eventual resgate com a Licença de Operação. Conforme apontou a procuradora da República Zani Cajueiro: No entanto, apesar de todo o arcabouço legal, funcionários do IPHAN ouvidos pelo MPF revelaram a existência de incompatibilidades entre o número de empreendimentos com significativo grau de degradação ambiental e aqueles acompanhados pelo IPHAN, bem como descompasso nas etapas do licenciamento, o que pode resultar em danos irreparáveis ao patrimônio arqueológico. Não podemos esquecer que Minas Gerais talvez seja, entre os estados brasileiros, o mais rico em sítios arqueológicos, o que por si só demonstra a imprescindibilidade dessa atuação conjunta.21 Segundo DELFORGE (2010), até o ano de 2009 foram registrados no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos do IPHAN oitocentos e trinta e cinco sítios pré-coloniais em Minas Gerais. Entretanto, estima-se que haja no Estado cerca de dois mil sítios arqueológicos pré- coloniais, entre grutas, cavernas, áreas remanescentes de povos indígenas. Desta forma, torna- se pertinente a afirmação da procuradora da República sobre a necessidade de atuação conjunta dos órgãos de preservação ambientais e o órgão cultural. É ainda importante considerar que a concessão da Licença Prévia consiste em ato administrativo complexo, ou seja, caracteriza-se pela manifestação conjunta de mais de um órgão administrativo, e a isenção de um deles no processo de licenciamento ambiental incorre em irregularidade. Um funcionário público que conceder licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais pode ser acusado criminalmente, segundo o MPF. O MPF encaminhou ao IPHAN a Recomendação n° 08/2010, lembrando sobre a atribuição do órgão como fiscalizador primário do patrimônio arqueológico nacional. A Recomendação pauta-se na Constituição da República, assim como na Lei n° 3924/61, na Portaria n° 07/88 e na Portaria n° 230/02. Cita também à Recomendação de Nova Delhi e a Carta de Lausanne. O documento recomenda à Superintendência de Minas Gerais que publique Portaria e/ou Termo de Referência acerca da temática, norteando os trabalhos de diagnóstico, prospecção e resgate bem como a manutenção posterior dos achados pelo empreendedor. Diante do grande número de empreendimentos previstos a partir de 2010 pelo Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) do Governo Federal, tanto os sítios conhecidos como aqueles que ainda nem foram descobertos permanecem ameaçados de desaparecimento, assim como os demais bens culturais inseridos em contextos urbanos e áreas rurais explorados 21 Fonte: http://www.prmg.mpf.gov.br/imprensa/noticias/meio-ambiente/mpf-recomenda-que-o-iphan-participe- dos-processos-de-licenciamento-ambiental-em-minas-gerais 63 desordenadamente, necessitando-se de se uma atuação mais integrada e urgente dos órgãos de preservação ambientais e do Instituto do Patrimônio. 2.2.2 Apontamentos históricos sobre os institutos de pesquisa brasileiros voltadas para a preservação do patrimônio arqueológico: Como explana GASPAR (2003), o século XIX foi marcado pelo surgimento das sociedades científicas, das universidades, dos museus, época em que os viajantes naturalistas empreenderam expedições de pesquisas pautadas pelas Ciências Naturais. As pesquisas arqueológicas no Brasil iniciaram-se com Peter Wilhem Lund, estudioso que montou um laboratório em Lagoa Santa/ MG, segundo FUNARI (2006). Entre os anos de 1834 a 1844, localizou 800 cavernas, descobriu fósseis, como também ossaturas humanas e de animais extintos. A ampliação das pesquisas na área da arqueologia ocorreu com a criação do Museu Histórico Nacional do Rio de Janeiro por D. João VI, em 1818. Este museu consiste na instituição científica mais antiga do Brasil, fundada na época do império. O Departamento de Antropologia, do qual faz parte o Setor de Arqueologia, foi constituído em 1867, onde as coleções foram reunidas de modo sistemático. No ano de 1934 o Museu Nacional foi reorganizado, criando-se pela primeira vez na esfera do poder público federal condições para a efetivação de ações de preservação dos monumentos nacionais, que passaram a ser responsabilidade desta instituição. Através do Decreto n° 24.735 de 1934, os bens imóveis considerados como monumentos nacionais não poderiam ser demolidos, reformados ou transformados, sem a prévia permissão do Museu Histórico Nacional. A falta de organização administrativa da instituição para tal empreendimento, no entanto, conferiu pouca eficácia ao decreto. Conforme ANDRADE (1993), uma série de obras de conservação foi realizada nos monumentos de Ouro Preto, através da Inspetoria dos Monumentos Nacionais, vinculada ao Museu Histórico Nacional, como chafarizes, Casa dos Contos, Igrejas de Nossa Senhora do Rosário, Nossa Senhora do Carmo e São Francisco de Assis. O Museu Paulista foi inaugurado em 1895, já na época republicana, como um marco da independência, com ênfase na pré- história, e participação de profissionais de várias áreas além de arqueólogos. No pós-guerra inicia-se a pesquisa universitária em arqueologia. Em 1934, foi criada a USP, Universidade de São Paulo, com a declaração do Museu Paulista como instituto complementar (mas sem significação efetiva). Deste processo participou Paulo Duarte, que tinha ligações com Paul 64 Rivet, diretor do Museu do Homem, em Paris. Em 1952, Duarte preside a Comissão de Pré- história da USP, que deu origem ao Instituto de Pré-História, criado em 1962. A partir da década de 1960 a disciplina adquiriu características científicas mais sistemáticas, dedicando- se ao estudo de sítios rupestres e sambaquis. Por iniciativa de Duarte, em 1961 foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei 3924, ainda hoje o principal instrumento de preservação dos bens arqueológicos. A proteção desta lei, no entanto, restringe-se aos vestígios materiais e sítios relacionados à ocupação dos povos paleoameríndios, ou de caráter pré-histórico. Como aponta FUNARI (1994), as pesquisas referentes à arte rupestre predominam dentre aquelas estudadas pela Arqueologia Brasileira desde o início dos anos cinquenta, o que contribuiu para a produção de grande quantidade de material arqueológico publicado. Arqueólogos franceses dedicaram-se à pesquisa de sítios de caçadores e de grafismos rupestres em vários países da América do Sul, inclusive no Brasil. Ainda segundo Funari, este grupo de pesquisadores interpretou as pinturas rupestres como linguagem pictórica, como discurso, e não somente como uma referência direta a práticas comuns. Em Minas Gerais, pesquisadores da Missão Franco-Brasileira estudaram e divulgaram pela primeira vez um conjunto pictórico existente em abrigos de rochas, chefiados pela arqueóloga Annette Laming Emperaire. Deste grupo também fez parte o arqueólogo André Prous, pesquisador do setor de Arqueologia do Museu de História Natural da Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG. No início da década de setenta, Missão Franco-Brasileira descobriu um fóssil de cerca de 11.000, o crânio conhecido como “Luzia” na gruta Lapa Vermelha, no complexo arqueológico de Lagoa Santa, região metropolitana de Belo Horizonte/ MG. Em 2001, uma equipe de pesquisadores coordenada pelo bioarqueólogo Walter Neves, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, IB-USP, fez escavações nesta mesma região de Lagoa Santa, onde encontrou parte de mais três novas ossadas com características semelhantes às de Luzia, fato que pôde contribuir para a comprovação da teoria de Neves, referente à ocupação do território americano antes do que era considerado pelas pesquisas arqueológicas até então (NEVES e PROUS, 1999). Outra pesquisa na área da Arqueologia Pré-histórica que merece destaque refere-se aos trabalhos da arqueóloga Niède Guidon de Preservação de Arte Rupestre nos sítios da região da Serra da Capivara/ PI, também iniciados na década de setenta e em desenvolvimento até os dias atuais. Os esforços da pesquisadora decorreram na transformação de uma área de aproximada mente cento e trinta mil hectares no Parque Nacional da Serra da Capivara, em 1979. O sítio foi tombado a nível nacional pelo IPHAN em 1993, inscrito no Livro do Tombo Arqueológico etnográfico e Paisagístico, e 65 erigido Patrimônio Mundial pela UNESCO em 1991, através dos critérios Natural e Cultural. Segundo RIGUETTI (2005), as pesquisas realizadas no sítio da Serra da Capivara detectaram as mais antigas pinturas rupestres do mundo, datadas de cerca de quarenta mil anos, e recentemente Niède Guidon encontrou vestígios do Homo sapiens que datam de até cinquenta mil anos. Esta descoberta gerou polêmica entre pesquisadores de todo o mundo, pois coloca em dúvida a teoria arqueológica aceita por mais de meio século, de que o homem teria chegado ao continente americano há cerca de quinze mil anos. No ano de 1964 foi criado o Museu de Arte e Arqueologia da USP por Eurípedes Simões de Paula, catedrático de História Antiga e Medieval da Faculdade de Filosofia. Segundo o documento do arquivo de Paulo Duarte Pela Dignidade Universitária, citado por FUNARI (1994), o museu foi criado para servir de apoio aos cursos de História Antiga, sendo voltado à arte e à Arqueologia clássicas. Em 1968, Simões de Paula transmite o cargo a seu assistente, Ulpiano Bezerra de Meneses, formado em Arqueologia Clássica. Com a reforma universitária de 1970, Meneses altera o nome do Museu para Museu de Arqueologia e Etnologia, continuando no cargo de diretor, embora destituído de qualquer título que o acreditasse como etnólogo ou pré-historiador, como comenta o texto de Paulo Duarte. Durante a ditadura militar, de 1965 a 1971, a nascente arqueologia universitária humanista, desenvolvida na Universidade de São Paulo, começa a sofrer restrições. Autoridades militares favoreciam as propostas norte americanas, referentes ao Projeto Nacional de Pesquisa Arqueológica, PRONAPA. Os arqueólogos do projeto, Clifford Evans e Betty Meggers treinaram alguns brasileiros em uma prática de campo defasada. A base científica dos americanos vinculava-se à Ecologia Cultural, interpretando as mudanças sociais como causadas principalmente por fenômenos ambientais. A classificação e análise de dados mantinham semelhança com a identificação de espécies pela biologia, sendo insuficiente para interpretações mais amplas das organizações sociais. O Estado ditatorial impunha uma arqueologia reacionária, desinteressada de questões políticas. Sendo contrário às políticas centralizadas e autoritárias desde a época do Estado Novo, Paulo Duarte opõe-se à ditadura militar instituída na década de sessenta, por buscar a liberdade da academia e defender uma postura mais humanista da arqueologia, que valorizasse os vestígios indígenas, assim como os índios vivos. O pesquisador foi perseguido e expulso da universidade em 1969. O MAE-USP foi reestruturado em 1989, integrando o Instituto de Pré-História, criado por Paulo Duarte e o MA original (criado em 1964, como instituto independente). À instituição 66 também foram unificados os acervos de Arqueologia e Etnologia do Museu Paulista e do Acervo Plínio Ayrosa, do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Esse processo integrou os corpos docente, técnico e administrativo das instituições envolvidas. Atualmente, o acervo do MAE compõe-se por coleções arqueológicas do Mediterrâneo e Médio-Oriente; arqueologia americana, com ênfase na pré-história brasileira; etnologia brasileira e etnologia africana. Cabe aqui citar a atuação do antropólogo Kabengele Munanga como diretor do MAE de 1983 a 1989, concomitantemente aos trabalhos como professor-titular da Faculdade de filosofia, Letras e ciências Humanas da USP, pela relevância acadêmica em nível nacional de sua administração. Conforme SILVA (2009), Kabengele orientava pesquisas relacionadas ao Museu de Arqueologia e Etnologia e às peças que compõem seu acervo, destacando-se seu empenho na expansão do curso de pós- graduação oferecido pelo MAE para além dos limites do Sudeste, buscando atingir pesquisadores de outras regiões do país, assim como os cursos oferecidos pela extensão universitária que buscam difundir a etnologia africana em nível de educação infantil, ensino fundamental, médio e superior. Assim, o acervo do museu provém de pesquisas desenvolvidas por várias gerações de etnólogos, desde o final do século passado, como também de aquisição por intercâmbios ou doações realizados com institutos estrangeiros. A partir da integração ao MAE, o Museu Paulista passou a atuar exclusivamente na área histórica, seguindo o perfil estabelecido nas primeiras décadas do século XX, estudando aspectos materiais da organização da sociedade brasileira. Com o intuito de avaliar o panorama da produção bibliográfica científica referente à Arqueologia no Brasil, esta pesquisa realizou-se uma busca no acervo da Biblioteca do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, especializada em Ciências Naturais e Antropológicas, no período compreendido desde 1876 (ano da primeira publicação nacional da biblioteca) a 2009. A busca foi realizada no sistema de documentos informatizado da UFRJ22, no Arquivo Histórico do Museu Nacional. Foram encontrados 372 registros de publicações referentes à palavra chave arqueologia, dentre os quais 115 são produções brasileiras. Os gráficos abaixo mostram a evolução desta produção bibliográfica no Brasil. 22 Página eletrônica do Sistema de Documentos da UFRJ: www.minerva.ufrj.br, Arquivos, Arquivo Histórico do Museu Nacional. Gráfico 01: Quantidade de publicações produzidas por ano no Brasil, que compõem o acervo da Biblioteca do Museu Nacional da UFRJ, desde 1870 a 2009. Fonte de dados: Sistema de Documentos da UFRJ Gráfico 02: Quantidade acumulada de publicações produzidas desde 1870 até 2009 no Brasil, que compõem o acervo da Biblioteca do Museu Nacional da UFRJ. Fonte de dados: Sistema de Documentos da UFRJ , www.minerva.ufrj.br, Arquivos, Arquivo Histórico do M , www.minerva.ufrj.br, Arquivos, Arquivo Histórico do M 67 N. N. Gráfico 03: Quantidade de publicações produzidas por décadas, desde 1870 até 2009 no Brasil, que compõem o acervo da Biblioteca do Museu Nacional da UFRJ. Fonte de dados: Sistema de Documentos da UFRJ Os gráficos mostram que até a década de sessenta a quantidade de publicações produzidas no Brasil, referentes à Arqueologia, manteve partir de então, sobretudo a partir dos anos oitenta, coincidindo com o fim d e abertura política nacional, havendo um pico em noventa, para estabilizar superior àquele da década de oitenta a partir do século XXI. Estes dados aproximam-se das estatísticas apresentadas no estudo realizado pelo arqueólogo André Prous, publicado em 1980 na UFMG (PROUS, 1980, p.24). 1801 e 1980. Além das publicações científicas, também foram considerados artigos de outra natureza e estudos publicados no estrangeiro e traduzidos no Brasil. realizada por esta dissertação no arquivo do Museu Nacional, as informações do estudo de Prous mostram que o crescimento mais efetivo no número de publicações no Brasil sobre arqueologia ocorreu a partir da década de setenta, continuando a aumentar nos anos oitenta. , www.minerva.ufrj.br, Arquivos, Arquivo Histórico do M N. -se num patamar bastante reduzido, evoluindo a Revista Arquivos do Museu de História Natural A pesquisa de Prous abrangeu um período compreendido entre Assim como na pesquisa 68 a ditadura militar -se num patamar da 69 1840 1801 1860 1841 1880 1861 1900 1881 1910 1901 1920 1911 1930 1921 1940 1931 1950 1941 1960 1951 1965 1961 1975 1971 1980 1975 1970 1966 PERÍODO N ÚM ER O D E PU BL IC A ÇÕ ES LEGENDA 20 40 100 50 150 200 250 300 350 400 380 ARQUEOLOGIA ANTROPOLOGIA APLICADA À ARQUEOLOGIA ANTROPOLOGIA FÍSICA EM GERAL (APUD CASTRO FARIA 1952) SA M BA QU IS TR A B A LH O S D E A M A D O R ES (M G ,S C) ES TU D O S PU B LI CA D O S PO R ES TR A N G EI R O S TR A B A LH O D D O PA N A M Á N O V A S FR EN TE S D E PE SQ U IS A R ES U M O S SB PC Gráfico 04: Número de publicações sobre arqueologia e antropologia biológica brasileira. Fonte: PROUS, 1980, p.24. Além das publicações, a organização de associações científicas como a Sociedade de Arqueologia Brasileira, SAB, e atualmente a criação da Plataforma Calos Chagas no CNPq, indicam um maior reconhecimento da área da Arqueologia enquanto disciplina científica. A SAB foi instituída em 1980, durante o III Seminário Goiano de Arqueologia, e conforme afirma GASPAR (2003), este encontro consistiu em um momento importante na história da disciplina, onde a comunidade de pesquisadores se reuniu para elaborar uma síntese da ocupação pré-histórica do território nacional, além de concretizar-se a ideia da formação de uma sociedade de arqueologia. Em 1981, após o III Seminário Goiano, ocorreu a I reunião científica da SAB, no Rio de Janeiro, na Universidade Estácio de Sá, onde funcionava na época a única Faculdade de Arqueologia do País. As reuniões passaram a ocorrer a cada dois anos, em diferentes cidades do Brasil, sendo que a última aconteceu em Florianópolis/SC, em 70 2007. Ao analisar os documentos resultantes dos seminários, Gaspar verificou que assim como no seminário de Goiás, na primeira reunião da SAB também não houve qualquer menção à Arqueologia Histórica, embora na época alguns pesquisadores já se inquietassem com o período colonial. Pelo fato do tema não aparecer em um encontro científico, Gaspar considera que até então os arqueólogos se definem como estudiosos do período anterior à ocupação européia no território nacional. Como comenta a autora, é neste contexto científico que surge a Arqueologia Histórica no Brasil, como desdobramento da Arqueologia, surgindo o tema pela primeira vez no VI SAB de 1987, contudo sendo a categoria que apresenta maior número de contribuições, em trabalhos sobre restauração, guerras, entre outros. A partir da década de noventa os trabalhos no campo da Arqueologia Histórica tornam-se mais recorrentes nos seminários da SAB, destacando-se autores como Pedro Paulo Funari, Arno Kern, Paulo Tadeu de Albuquerque, André Prous e Tânia Andrade Lima. A Plataforma Carlos Chagas do CNPq consiste na mais recente base de dados lançada em 2007 pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq, para unir todas as informações referentes aos pesquisadores e usuários da Agência. Entre outras funções, a Plataforma reúne dados sobre bolsas, auxílios, encaminhamento de projetos e pedidos de bolsas, andamento de processos, emissão de pareceres, assinaturas de termos de concessão, relatórios técnicos e de prestação de contas. Na área de Arqueologia Histórica, em 2009, destaca-se o Edital MCT/CNPq Nº 023/2009 - Seleção pública de propostas para apoio a projetos de pesquisa, no âmbito do Programa Antártico Brasileiro – PROANTAR. Este Edital visava apoiar propostas para projetos de pesquisa científica, tecnológica e/ou de inovação, que visassem contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico do país e que ampliassem o conhecimento sobre fenômenos ambientais ocorrentes na Região Antártica, Oceano Austral e adjacências e suas influências globais, estimulando a cooperação científica com outros países da América do Sul, que tenham programas antárticos em andamento. Dentre as Linhas Temáticas especificadas no Edital, observa-se a referencia a aspectos inovadores, ou seja, tecnológicos, culturais e sócioeconômicos na Antártica, tendo como subitens: Desenvolvimento de tecnologias inovadoras de construção civil, de equipamentos, e de materiais inovadores para uso em pesquisas na Antártica; Antropologia e Arqueologia na Antártica (grifo nosso); Saúde Humana, incluindo Psicologia, Ergonomia e Saúde no trabalho; Políticas públicas e pesquisa científica na Antártica. O Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR) do CNPq, na verdade, foi criado em 1982, sendo lançado o edital para a área de ciências sociais apenas em 2009. Esta pesquisa de abrangência internacional 71 está sendo desenvolvida por uma equipe de arqueólogos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade de São Paulo (USP), coordenada pelo professor Andrés Zarankin, do Departamento de Sociologia e Antropologia da UFMG, a qual retornou da primeira expedição brasileira de ciências humanas à Antártica. A pesquisa é financiada pelo Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR) do CNPq, criado em 1982, porém só em 2010 o programa lançou edital para a área de ciências sociais, conforme já foi mencionado no primeiro capítulo desta dissertação. ZARANKIN (2005) afirma que a pesquisas arqueológicas no continente antártico iniciaram-se na década de sessenta do século XX, com trabalhos de conservação e restauração de abrigos construídos no início do século XX, edificações de relevância histórica, as quais aparecem nos relatos das primeiras expedições no Pólo Sul, ocorridas nas décadas de setenta, oitenta e noventa. No início dos anos noventa, como resultado de uma parceria entre Espanha e Chile, foi organizada uma tripulação interdisciplinar com a participação de pesquisadores destes países, que realizaram estudos sobre arqueologia terrestre e subaquática. Como relata o próprio Zarankin, sua pesquisa na Antártica iniciou-se em 1995, devido à descoberta de um grupo de geógrafos do Instituto Arqueológico Argentino em uma caverna situada em Livingston Island. O fato desencadeou a criação de um grande projeto para estudo dos processos de incorporação da Antártica no circuito de exploração capitalista do final do século XIX e início do século XX. A pesquisa abrange a contextualização histórica deste continente, e busca entender a expansão do sistema capitalista e o desenvolvimento da sociedade moderna, utilizando-se da cultura material como alternativa para compreender o passado. Os resultados destes primeiros trabalhos permitiram então uma análise alternativa para o estudo histórico da incorporação da Antártica no sistema capitalista do final do século XVIII e início do XIX, pois através da Arqueologia, torna-se possível construir uma história que vislumbre grupos de trabalhadores não considerados em discussões oficiais. Assim, além de um maior reconhecimento da disciplina a nível nacional, vislumbra-se uma nova visão sobre o trabalho dos arqueólogos brasileiros por parte dos profissionais de países onde a Arqueologia encontra-se há mais tempo estruturada enquanto ciência. Como conta Gaspar, em 1995, no Congresso sobre Teoria e Método, realizado na Universidade de São Paulo, arqueólogos brasileiros, americanos e franceses realizaram um diálogo científico, substituindo o tradicional treinamento concedido por estrangeiros aos profissionais do Brasil. Desta forma, como aponta FUNARI (2007), nas duas últimas décadas, a Arqueologia Histórica latino-americana influenciou na reestruturação mundial da disciplina, que até então 72 enfocava a definição dos sítios pré-históricos do Novo Mundo, passando a abranger as pesquisas arqueológicas referentes às sociedades históricas de modo geral. No Brasil, esta mudança de foco disciplinar tomou força nos anos noventa, num contexto em que os valores patrimoniais tornaram-se mais abrangentes em relação às várias categorias, questionando-se as decisões unilaterais sobre aquilo que deve ser preservado, de que modo, por quem e para quem, ou seja, sobre a própria construção da memória coletiva. LIMA (2007), assim como FUNARI (2006), discorrem sobre a dimensão política da disciplina, ao afirmar que, se envolvidos os vários atores sociais nos processos decisórios, a Arqueologia consiste em um instrumento poderoso para a construção de histórias nacionais inclusivas. Ao reconhecer a diversidade cultural no passado, propicia a aceitação da diversidade cultural no presente. 2.2.3 Apontamentos históricos sobre o IPHAN, criação e trajetória da instituição até os dias atuais, focando a preservação do patrimônio arqueológico Ao analisar a política de preservação no Brasil, FONSECA (2005) aponta que de 1936, época da criação do SPHAN (atual IPHAN), Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, até o final da década de setenta, o conceito de patrimônio histórico e artístico referia-se ao conjunto de bens móveis e imóveis de excepcional valor. O reflexo deste conceito está no acervo tombado pela União, onde há o predomínio de obras de arte eruditas, monumentos arquitetônicos e sítios urbanos coloniais. A política de preservação tombava estes bens para a nação. O Decreto Lei nº 25, instituído em 1937, no Capitulo I, Art. 1º, determina que: Art. 1º - Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico23. Para SILVA (2007), apesar de os bens arqueológicos estarem inseridos dentre a relação daqueles passíveis de serem reconhecidos como patrimônio histórico e artístico brasileiro pela norma de 1937, no que se refere à arqueologia, o tombamento não conseguiu garantir a preservação da grande maioria dos sítios. Sua ação focada nos bens de excepcional valor tornou-se improcedente como instrumento de proteção para salvaguarda da grande quantidade de sítios identificados em território brasileiro. Silva aponta outro ponto na lei de tombamento federal que impediu sua efetivação na preservação arqueológica, que consiste no 23 MINC/ IPHAN, 1994, p. XII 73 entendimento de que as coisas tombadas não podem ser destruídas, demolidas, destruídas ou mutiladas, criando-se um conflito entre os instrumentos e ações de preservação do sítio acautelado e as atividades vinculadas à pesquisa de campo, que seriam definidas pela Lei n° 3924, de 1961. Em seu texto Contradições e esquecimentos nas imagens do passado, contido na coletânea Patrimônio e Cultura Material, FUNARI (2006) argumenta que os bens culturais reconhecidos como patrimônio pelas instituições oficiais estão vinculados à história das classes dominantes, e consequentemente, os monumentos preservados são aqueles associados aos feitos e à produção cultural dessas classes dominantes, sendo que a História dos dominados é raramente preservada. Desta forma, Funari considera que este posicionamento excludente atinge não só os excluídos, como também toda a sociedade, “reafirmando igualdades idealizadas e camuflando conflitos, o que subtrai dos homens a possibilidade de transformação” (FUNARI, 2006, p. 08). E ainda questiona: “preservar para quê?” (FUNARI, 2006, p. 10), propondo que se deve preservar para gerar informação, levar à reflexão crítica e assim transformar a sociedade. Para Funari, os esforços empreendidos na preservação do patrimônio também não podem ficar restritos aos órgãos patrimoniais, pois consistem em forças sociais que possibilitam que as exclusões consolidadas sejam contestadas. Apesar do processo de tombamentos nacionais ter se iniciado com núcleos urbanos, como se pode observar nas datas de inscrição nos Livros de Tombo, segundo MOTTA (1987), estes eram vistos como obras de arte acabada e não como organismos dinâmicos, pelo fato de consistirem em locais que não sofreram alterações geradas pelas transformações sócioeconômicas ocorridas em outras cidades do país. Conforme GONÇALVES (1988), a atuação do SPHAN neste momento inicial contribuiu para a consolidação do culto a Ouro Preto e demais cidades históricas de Minas, como também às obras de Aleijadinho, infundido pelos intelectuais modernistas nos anos vinte e trinta. A compreensão das contradições e constâncias da trajetória do IPHAN tem como chave a dualidade do fato: a preservação do patrimônio histórico e artístico brasileiro teve como protagonistas do seu nascimento a vanguarda do movimento moderno, com cita PESSÔA (1999). As ações dos modernistas da repartição são pautadas na noção de Linha Evolutiva da Arquitetura Civil, que tinha a arquitetura das cidades mineiras consolidadas no século XVIII como precursoras da arquitetura moderna. Os bens arqueológicos, no entanto, foram registrados pelo “olhar etnográfico” de Mário de Andrade, com a criação de vagas para arqueólogos no Conselho do 74 SPHAN. Na época da criação do SPHAN, conforme LIMA (2001), o diretor Rodrigo Melo Franco de Andrade, juntamente com Mário de Andrade, estabeleceu uma parceria entre o Serviço e o Museu Nacional, buscando a preservação do patrimônio arqueológico e etnográfico brasileiro. O Museu Nacional assumiu as atribuições do órgão referentes a relacionar jazidas a serem tombadas e elaborar mapas com distribuição geográfica de sítios a serem protegidos. Ao delegar esta responsabilidade ao Museu Nacional, o SPHAN não se estruturou para o cumprimento de suas atribuições na preservação do patrimônio arqueológico, fato com repercussão até os dias atuais. Desvirtuando a proposta original, o órgão transformou-se numa instituição que prioriza a preservação do patrimônio edificado. Somente em 1961 seria outorgada a Lei nº 3.924 que dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-históricos nacionais. Como já foi dito anteriormente, a criação desta lei embasou-se na Recomendação de Nova Délhi, de 1956. A Lei confere ao Poder Público a guarda e a proteção dos monumentos arqueológicos e pré-históricos, de qualquer natureza, existentes no território nacional. Em seu Artigo 2°, considera como monumentos arqueológicos: a) as jazidas de qualquer natureza, origem ou finalidade, que representem testemunhos da cultura dos paleoameríndios do Brasil, tais como sambaquis, montes artificiais ou tesos, poços sepulcrais, jazigos, aterrados, estearias e quaisquer outras não especificadas aqui, mas de significado idêntico, a juízo da autoridade competente; b) os sítios nos quais se encontram vestígios positivos de ocupação pelos paleoameríndios, tais como grutas, lapas e abrigos sob rocha; c) os sítios identificados como cemitérios, sepulturas ou locais de pouso prolongado ou de aldeamento “estações” e “cerâmicos”, nos quais se encontram vestígios humanos de interesse arqueológico ou paleoetnográfico; d) as inscrições rupestres ou locais como sulcos de polimentos de utensílios e outros vestígios de atividade de paleoameríndios24. Como mostra SILVA (2007), no artigo 2° da lei de 1961, estão definidas as categorias do que é considerado pelo texto como monumento arqueológico ou pré-histórico sob guarda e proteção do Poder Público, observando-se que os sítios de natureza histórica não estão especificados dentre os bens discriminados pela norma. Frente aos riscos e ameaças de destruição que se tornam cada vez mais frequentes na época atual, a preservação arqueológica de sítios históricos também merece ser regulamentada, como bem observa Silva. Segundo a autora, estudos estão sendo desenvolvidos para a criação de leis que incidam sobre esta categoria, assim como a complementação da lei específica sobre arqueologia, com o intuito de 24 LEI 3924/ 1961, Art. 2°. 75 ampliar sua proteção também aos registros arqueológicos de caráter histórico. Na década de setenta e início de oitenta, para suprir a falta de profissionais no quadro da agência, foram delegados títulos de “representantes do IPHAN para estudos de arqueologia” (LIMA, 2001, p. 4) a pesquisadores que em sua maioria eram vinculados às universidades federais, sem vínculo institucional, mas que atuavam em seu nome. Apesar de uma tentativa sem sucesso da gestão anterior em inserir a arqueologia na estrutura burocrática da instituição, somente em 1979, sob coordenação de Aloísio Magalhães, o IPHAN cria a Divisão de Arqueologia, sob direção de Regina Coeli Pinheiro da Silva, arqueóloga indicada pelo Museu Nacional. Ainda segundo Lima, alguns funcionários públicos federais lotados em outras instituições ou em outras divisões da própria SPAHN demonstraram interesse em se transferir para a nova área, constituindo informalmente o denominado Núcleo de Arqueologia. Em 1986, o Núcleo foi erigido à Coordenadoria, subordinada à Presidência da SPHAN/ FNpM, encarregada de identificar, proteger e valorizar os sítios arqueológicos. A Coordenadoria era desvinculada da Divisão de Tombamento e Conservação, pois como comenta Lima, para Aloísio Magalhães, a arqueologia não se enquadrava na área voltada para tombamentos. A criação da Coordenadoria possibilitou a criação das primeiras normas para o gerenciamento das pesquisas arqueológicas no território nacional. Nesta mesma década, os arqueólogos e gestores começam a relacionar as causas da depredação de sítios arqueológicos ao desenvolvimento urbano desordenado, ausência de estrutura de gestão, carência de documentação, invisibilidade desta categoria de patrimônio, falta de políticas públicas, e ausência de participação da sociedade. Apesar da necessidade do estabelecimento de regras bem restritas voltadas para as pesquisas arqueológicas, devido a esta crescente demanda relacionada ao processo de urbanização no Brasil, conforme mostra LIMA (2001), a comunidade de arqueólogos, representada pela SAB, opunha resistência às novas determinações da SPHAN. Segundo Lima, para estes arqueólogos: (...) as regras do jogo deveriam ser ditadas pela experiência dos pesquisadores e não por um órgão do Estado, soberano, assessorado por um corpo técnico academicamente ainda imaturo, sem dúvida, porém suficientemente adestrado em suas atribuições técnico-burocráticas e legalmente apto para exercê-las. (LIMA, 2001, p. 07). Como comenta a autora, nas divergências entre a SAB e a Coordenadoria, os arqueólogos perderam a oportunidade de se unir a um órgão federal de preservação e daí poder tirar proveito para a arqueologia brasileira. Outra consequência desta reação da comunidade de arqueólogos à atuação do corpo técnico da SPHAN, segundo Lima, foi a supressão das 76 intenções que porventura existissem referentes à pesquisa em arqueologia pré-histórica. Esta situação, no entanto, contribuiu para que a instituição enfocasse suas ações na arqueologia histórica (pouco explorada pela academia na época), complementando os trabalhos de restauro por ela promovidos. O termo Arqueologia de Restauração, como aponta NAJJAR25 (2005), surgiu na metade do Século XX para designar as pesquisas arqueológicas feitas com o intuito de fornecer informações para os trabalhos de recuperação de monumentos, servindo como auxílio para a arquitetura. As obras de restauração passaram a demandar a participação interdisciplinar de arquitetos, historiadores e arqueólogos, analisando a edificação como um super-artefato. Esta postura substituiu a noção do edifício como lugar onde estão depositados os objetos arqueológicos. Em algumas obras de restauração, no entanto, a arqueologia é realizada simplesmente com o intuito de auxiliar as demandas do projeto arquitetônico, ou seja, a pesquisa arqueológica complementa as lacunas do conhecimento sobre a edificação a ser restaurada. O potencial da participação da Arqueologia em um projeto de restauração é muito mais abrangente que elucidações imediatas, sendo ideal que as pesquisas arqueológicas se iniciem antes mesmo do projeto arquitetônico, produzindo conhecimento que contribua no desenvolvimento do projeto de restauração. Ainda com relação ao contexto de abertura política dos anos oitenta, propiciando a expressão de grupos sociais antes desconsiderados no ambiente cultural oficial, o conceito de patrimônio passa a incluir lugares, saberes e modos de fazer. O acervo nacional abrange, a partir de então, marcos naturais e manifestações culturais, e os bens culturais passam a ser registrados para a sociedade. A partir da Constituição brasileira de 1988 o patrimônio arqueológico passou a ser considerado bem da União. No entanto, em sua análise sobre a proteção do patrimônio arqueológico no Brasil, LIMA (2001), mostra que nos anos noventa as conquistas obtidas pela arqueologia dentro da SPHAN foram suprimidas pela reforma administrativa do governo Collor, que centralizou as decisões, extinguiu o Ministério Público e substituiu o sistema SPHAN/ FNpM pelo IBPC, Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural. Estas alterações dentro da instituição também incidiram no fim da Coordenadoria de Arqueologia, e suas atribuições ficaram a cargo das Superintendências Regionais, acarretando uma variação de regras de acordo com cada estado. Ainda segundo Lima, somente no final dos anos noventa 25 Rosana Najjar é arqueóloga da 6° Superintendência Regional do IPHAN 77 seria criada extraoficialmente, ou seja, fora do regimento interno do IPHAN uma Coordenadoria de Patrimônio Natural e Arqueológico, subordinada ao Departamento de Proteção Legal, o DEPROT, que em 2000 seria substituída pela Coordenadoria de Arqueologia (continuando a não constar no regimento interno da instituição), que se tornou a Gerência de Arqueologia. Em 2009 seria criado o Centro Nacional de Arqueologia, CNA, suprindo a necessidade de fortalecimento institucional na área de gestão do patrimônio arqueológico, sobretudo em relação ao aumento da demanda na análise de processos para obtenção de licenças ambientais, vinculados à apreciação e acompanhamento de pesquisas arqueológicas no país pela Portaria n° 230. O CNA consiste em um órgão descentralizado e gestor do Departamento de Patrimônio Material de Fiscalização, DEPAM, caracterizado como Unidade Especial e integrante do Comitê Gestor do Instituto. A estrutura do CNA, da qual fazem parte a Coordenação de Normas e Acautelamento, a Coordenação de Pesquisa e Licenciamento e a Coordenação de Socialização do Patrimônio Arqueológico, reflete os principais eixos norteadores da gestão: a proteção, o conhecimento e a difusão do patrimônio arqueológico brasileiro. Encontra-se em fase de desenvolvimento o Plano Diretor Estratégico, documento para orientação das ações do CNA, que deverá abarcar: - a definição de uma política nacional para o patrimônio arqueológico, em todos os seus aspectos – identificação, pesquisa, proteção, promoção e socialização; - a construção de um modelo institucional de gestão; - a definição das formas de articulação da área central (CNA) com as Superintendências do IPHAN nos estados para a gestão do patrimônio arqueológico; - o desenvolvimento de programa de tombamento de bens de natureza arqueológica; - a elaboração de instrumentos normativos e a atualização dos instrumentos já existentes; - a criação de um sistema informatizado de gestão do patrimônio arqueológico alinhado às novas tecnologias; - o estabelecimento de parcerias interinstitucionais e internacionais para a ampliação de experiências de gestão do patrimônio arqueológico; - a dotação de estrutura organizacional e física e de recursos humanos e financeiros compatíveis com a demanda da gestão do patrimônio arqueológico26. Estas propostas consistem em um desafio para o órgão, pois abarcam desde a elaboração de políticas e estratégias para a gestão do patrimônio arqueológico até a modernização dos instrumentos normativos e de acompanhamento das pesquisas arqueológicas (as quais aumentaram de cinco para quase mil ações por ano em duas décadas). Apesar da participação 26 Página eletrônica do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional: www.iphan.gov.br, acessado em 13/11/2010. 78 de comunidades locais permear a pesquisa arqueológica desde a década de oitenta, o maior desafio para o CNA, no entanto, será a democratização de suas ações nesta área, já que sua tradição caracteriza-se por legislar e fiscalizar. Foi a partir da criação do CNSA, Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos, em 1997, pertencente ao SGPAB, Sistema de Gerenciamento do Patrimônio Arqueológico, onde estão incluídos levantamento e registro sítios pré-históricos, que o IPHAN pôde iniciar um processo de conhecimento da abrangência deste patrimônio, para depois de mais de dez anos conseguir elaborar o plano de preservação acima citado. No ano seguinte, a Portaria nº 241 foi instituída e aprovou a Ficha de Registro de Sítio Arqueológico e Respectivo Manual de Preenchimento, anexos à Portaria. Até o momento atual, foram identificados em torno de dezessete mil sítios arqueológicos distribuídos por todo o país, segundo informações obtidas na seção do Patrimônio Arqueológico da página eletrônica do IPHAN27, dentre os quais foram tombados a nível nacional: Sambaqui do Pindaí, em São Luis/ MA; Parque Nacional da Serra da Capivara, em São Raimundo Nonato/ PI; Inscrições Pré-Históricas do Rio Ingá, em Ingá/ PB; Sambaqui da Barra do Rio Itapitangui, em Cananéia/ SP; Lapa da Cerca Grande, em Matozinhos/ MG; Quilombo do Ambrosio: remanescentes, em Ibiá/ MG; e Ilha do Campeche, em Florianópolis/ SC. A tabela e os gráficos abaixo mostram a evolução do número de sítios tombados pelo IPHAN ao longo dos anos, desde os primeiros tombamentos até 2010. Sítio Tombado pelo IPHAN Ano do tombamento Local do sítio Sambaqui do Pindaí 1940 São Luis/ MA Inscrições Pré-Históricas do Rio Ingá 1944 Ingá/ PB Sambaqui na Barra do Rio Itapitangui 1955 Cananéia/ SP Lapa da Cerca Grande 1962 Matozinhos/ MG *Parque Nacional da Serra da Capivara 1993 São Raimundo Nonato/ PI Ilha do Campeche 2001 Florianópolis/ SC Quilombo Ambrósio 2002 Ibiá/ MG Tabela 01: Lista dos sítios tombados pelo IPHAN ao longo dos anos. Fonte de dados: www.iphan.gov.br *O Parque Nacional da Serra da Capivara é o único dos sítios arqueológicos tombados pelo IPHAN que também foi instituído Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO. 27 Página eletrônica do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional: www.iphan.gov.br, acessado em 15/06/2010. Gráfico 05: Quantidade acumulada de sítios tombados pelo IPHAN desde 1938 até 2010. Gráfico 06: Quantidade de sítios tombados pelo IPHAN por décadas, desde 1938 até 2010. Através da interpretação da tabela e dos gráficos acima expostos, percebe de sítios tombados a nível nacional é bastante reduzida, e que para o IPHAN tem como principal enfoque o viveram no território brasileiro arqueológica, um deles classifica arqueológicos e cinco como sítios arqueológicos. Verifica instituição tem dado à arqueologia pré registros de ocupação pós cabralinos. Dentre os ben Fonte de dados: www.iphan.gov.br Fonte de dados: www.iphan.gov.br -se que a quantidade registro da cultura paleoameríndia, ou seja, dos povos antes do descobrimento. Dentre os bens tombados na categoria -se como paleontológico, sete como coleções e acervos -se que, se pouca atenção a -histórica, ainda menos foi realizado em relação aos s materiais produzidos a partir da 79 , a arqueologia que 80 ocupação do território nacional pelos portugueses, percebe-se a priorização dos tombamentos de edificações (862) em relação a ruínas (17). Dentre as dezessete ruínas tombadas, quatro consistem em remanescentes das edificações que fizeram parte das reduções, complexos que reuniam igreja, moradias, colégio e oficinas, sendo que os treze bens restantes são em sua grande maioria remanescentes da arquitetura luso-brasileira dos séculos XVI, XVII e XVIII, tombados entre os anos de 1938 a 1973. Todos eles estão inscritos no Livro do Tombo Histórico, sendo que dois também estão inscritos no Livro de Belas Artes. Dentre estas ruínas inscritos no Livro Histórico, encontra-se a Fabrica de Ferro Patriótica, localizada no Distrito de São Julião, Ouro Preto, MG, tombada em 1938. As ruínas da primeira fábrica de ferro do Brasil são conservadas pelo IPHAN como testemunho histórico da indústria siderúrgica nacional. No Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, encontram-se inscritos 119 bens, dos quais somente um deles refere-se a ruínas históricas, que consiste no bem intitulado Sítio do Físico, localizado em São Luiz do Maranhão, tombado em 1981. Este sítio arqueológico é composto por um conjunto de edificações do final do século XVIII e início do século XIX. A importância do lugar está no fato de ter abrigado a primeira indústria da região, para beneficiamento de couro e arroz, e também para fabricação de cera e cal, e posteriormente, de fogos de artifício. . 28 Esta descrição é semelhante à noção de meio ambiente apresentada por MIRANDA (2001) O IPHAN instituiu em 2009 a Portaria n° 127, que estabelece a chancela da Paisagem Cultural Brasileira: “Paisagem Cultural Brasileira é uma porção peculiar do território nacional, representativa do processo de interação do homem com o meio natural, à qual a vida e a ciência humana imprimiram marcas ou atribuíram valores” e empregada nas vias do Direto para fins protecionistas, a qual abrange todos os bens naturais e culturais de valor juridicamente protegido, desde o solo, as águas, a flora, a fauna, as belezas naturais e artificiais, o ser humano, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico, monumental, arqueológico, além das variadas disciplinas urbanísticas contemporâneas. A categoria de Paisagem Cultural promoveu a inserção de sítios arqueológicos de cunho histórico na lista de bens arqueológicos registrados. Conforme BASTOS (2010), um grande avanço no sentido de oferecer instrumentos para se estabelecer uma política voltada para a Arqueologia Histórica ocorreu no “Seminário Internacional de Reabilitação Urbana de Sítios Históricos”, realizado em Brasília no ano de 2002, sob organização do Departamento de Proteção do Patrimônio Material, DEPAM/ IPHAN. Dentre os grupos de discussão distribuídos, destaca-se o grupo 28 Portaria n° 127/2009 81 intitulado “Arqueologia aplicada ao processo de reabilitação”. Para a autora, se a abordagem do tema demonstra a preocupação da instituição em incluir a participação da Arqueologia no processo de reabilitação de sítios históricos, também mostra que a disciplina continua sendo vista como auxiliar da Arquitetura, não sendo reconhecida como agente fundamental na definição de parâmetros paradigmáticos para a reabilitação urbana. Como ponto positivo do Seminário, a autora aponta a formulação de definições e conceitos referentes a sítios arqueológicos históricos, para fins de gestão e manejo de áreas ou não. Constatou-se que os sítios arqueológicos inseridos em áreas urbanas podem ser pré-históricos ou históricos. Considerando que os sítios pré-históricos estão definidos na Lei 3924/61, a conceituação dos parâmetros para sítios arqueológicos históricos baseou-se no capítulo II, item 1 do Decreto-lei n° 25/37, no artigo 2° da Lei n° 3924/61, na Portaria n° 07/88, e ainda na Portaria n° 230/02, definindo-se que: Sítio arqueológico histórico em áreas urbanas são espaços geográficos delimitados pela presença de vestígios materiais oriundo do processo de processo de ocupação do território pós-contato, tais como: 1) Todas as estruturas, ruínas, e edificações construídas com o objetivo de defesa ou ocupação (buracos, baterias militares, fortalezas, fortins, quilombos); 2) Vestígios das infraestruturas (vias, ruas, caminhos, calçadas, ruelas, praças, sistemas de esgotamento de águas e esgotos, galerias, poços, aquedutos, fundações remanescentes das mais diversas edificações, dentre outras que fizeram parte do processo de ocupação iniciado nos núcleos urbanos e em outros lugares); 3) Lugares e locais onde possam ser identificados remanescentes de batalhas históricas e quaisquer outras dimensões que envolvam combates; 4) Antigos cemitérios, quintais, jardins, pátios e heras; 5) Estruturas remanescentes de antigas fazendas, senzalas e engenhos de cana – de - açúcar e farinha; 6) Estruturas remanescentes de processos industriais manufatureiros; 7) Vestígios, estruturas e outros bens materiais que possam contribuir na compreensão da memória nacional pós-contato. (BASTOS em OLIVEIRA e OLIVEIRA, 2010, p.10) Outro encontro importante para a atualização das discussões sobre o patrimônio arqueológico foi o I Fórum Nacional do Patrimônio Cultural, realizado em 2009 na cidade de Ouro Preto, onde produziu-se um relatório, Síntese Preliminar das Discussões, referente às discussões sobre desafios, estratégias e experiências para uma nova gestão do Sistema nacional de Patrimônio Cultural, com a intenção de subsidiar a II Conferência Nacional de Cultura. O evento foi organizado pelo IPHAN em parceria com Associação Brasileira de Cidades Históricas, ABCH e do Fórum Nacional dos Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura, FNSDEC, contando com a participação de gestores públicos, pesquisadores, profissionais 82 autônomos, entre outros membros da sociedade civil, ligados à gestão pública e patrimônio cultural. O relatório das mesas redondas vinculadas ao Patrimônio Arqueológico reafirma as orientações das Cartas Patrimoniais internacionais, sobretudo Carta de Lausanne, de 1990 e as Recomendações n.R (95) 9, de 1995, na busca pelo desenvolvimento sustentável, integrando aspectos econômicos, sociais, políticos e culturais nas ações de planejamento territorial. Segundo o item “e” das Considerações Iniciais: e. Considerando que o patrimônio arqueológico em meio urbano contém referências e informações sobre a trajetória das cidades, e que a arqueologia é um instrumento privilegiado e singular de acesso a essas referências, contribuindo sobremaneira para o conhecimento e enriquecimento dos significados dos bens culturais, inclusive os de caráter urbano29. Neste relatório, percebe-se também uma preocupação com as demandas do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento do Governo Federal) das Cidades Históricas e suas implicações sobre os recursos arqueológicos, de característica finita, presentes nos sistemas urbanos. Dentre as Ações Estratégicas especificadas para o ano de 2010, consta: a) Elaboração e edição de instruções normativas a serem oficializadas por meio de Portarias do IPHAN, para: 1) sistematização de procedimentos de referência para constituir protocolos de atuação, em especial frente às obras do PAC de Cidades Históricas; 2) normatização da realização de pesquisas patrimoniais em terras indígenas tradicionais (demarcadas ou não), a partir das especificidades técnicas, éticas e operacionais que lhe são intrínsecas; 3) normatização da realização de uso turístico e socialização de sítios arqueológicos; 4) regulamentação da guarda de acervos arqueológicos; b) Elaboração e implementação, em caráter emergencial, de um Sub-Programa Nacional de Arqueologia Urbana, inserido no planejamento geral do PAC das Cidades Históricas30; Nas Ações Estratégicas para os anos de 2010 a 2014, verifica-se uma preocupação em articular as diversas instâncias governamentais e os vários segmentos da sociedade civil na implementação de políticas públicas integradas à proteção e gestão do patrimônio arqueológico, sendo citados novamente os sítios arqueológicos urbanos. Dentre estas ações destacam-se: b)Criação de um Grupo de Trabalho (GT) para elaboração de um Plano Estratégico Emergencial voltado a articulação e transversalidade entre as diversas instâncias governamentais e outros segmentos da sociedade civil, visando a implementação de políticas públicas e de gestão do patrimônio arqueológico; d)Atualização do Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos, inclusive com a inserção dos sítios arqueológicos urbanos; 29 FÓRUM NACIONAL DO PATRIMÔNIO CULTURAL – SNPC, 2009, p. 23. 30 FÓRUM NACIONAL DO PATRIMÔNIO CULTURAL – SNPC, 2009, p. 29 83 e)Estabelecimento de parcerias para a capacitação de profissionais com especialização voltada a atuação da arqueologia, em ênfase na questão da arqueologia urbana; h)Incremento de ações compartilhadas de identificação, proteção e difusão do patrimônio arqueológico, desenvolvidas pelas três instâncias federativas, suplementares à incumbência legal do IPHAN no licenciamento ambiental31. O envio de uma equipe técnica do IPHAN à Cidade do México em 2010, para uma Missão Preparatória cuja finalidade era programar ações de capacitação e intercâmbio previstas em um acordo assinado em 2009 entre Brasil e México, também mostra uma preocupação do Instituto na capacitação de seu quadro de funcionários na área da Arqueologia. Um dos focos desta missão era planejar o envio da delegação brasileira composta por técnicos, dentre os quais arqueólogos, para capacitação e treinamento em intervenções referentes ao patrimônio arqueológico, através do Instituto Nacional de Antropologia e História, INAH. A necessidade de estruturação do IPHAN em relação à área da Arqueologia pode ser medida através as autorizações de pesquisa concedidas a arqueólogos no período circunscrito entre 2003 (após a promulgação da Portaria n°230/02) e 2010. Os dados aqui apresentados foram obtidos na pesquisa realizada por ZANNETTINI (2010), publicada no artigo Qual futuro desejamos para a Arqueologia no Brasil? Segundo esta pesquisa, na época analisada, foram concedidas 4.116 autorizações para pesquisas, sendo a maioria vinculada a projetos de licenciamento ambiental, tais como diagnósticos, programas de prospecção e resgate, renovações de permissões. Não foram computados na pesquisa pareceres e diagnósticos realizados sem a respectiva licença. As pesquisas de cunho eminentemente acadêmico compõem menos de 10% do total de solicitações. Conforme o Gráfico 07, apresentado por Zannettini, observa-se a partir de 2003 um crescimento médio anual do número de portarias de autorização de pesquisas, notando-se um pico de crescimento de 2007 para 2008. O pesquisador relaciona esta elevação ao anúncio e inicio pelo Governo federal de seu Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), que previa até o final de 2010 a implantação de mais de 1.800 empreendimentos. 31 FÓRUM NACIONAL DO PATRIMÔNIO CULTURAL – SNPC, 2009, p. 28 84 Gráfico 07: Número de licenças de pesquisa expedidas pelo IPHAN para arqueólogos em território brasileiro (janeiro de 2003 a agosto de 2010). Fonte: Diário Oficial da União Diante, em ZANNETTINE (2010) Diante do exposto, conclui-se que os tombamentos dos conjuntos urbanos colônias do final da década de trinta, apesar consistirem em ações emergenciais de salvamento, que impediram a perda de registros materiais como edificações e arruamentos setecentistas ameaçados pelo crescimento acelerado das cidades, por outro lado, deixaram de contemplar parte dos indícios materiais das transformações sócioeconômicas e culturais destas comunidades. O argumento da instituição sobre a necessidade de se priorizar o patrimônio edificado, frente aos riscos de degradação oriundos dos processos de urbanização acelerada, torna-se equivocado, pois estes são também a causa do aniquilamento do patrimônio arqueológico em todo o território brasileiro, patrimônio este cuja proteção também foi legalmente atribuída ao IPHAN. Esta postura contraria a noção de cidade de MENESES (1996), e de Arqueologia da cidade, como um artefato complexo produzido historicamente. A análise dos fatos acima expostos confirma a afirmação da arqueóloga Tânia Andrade Lima, de que o IPHAN se consolidou como uma “casa de arquitetos” (LIMA, 2001: p. 21), cujas ações de maior impacto e visibilidade focaram as edificações históricas num momento inicial e posteriormente os núcleos urbanos, priorização esta que debilitou a área de arqueologia, “(...) que padece de uma insuficiência crônica face à pesada demanda de um imenso território, extraordinariamente rico em sítios arqueológicos, ameaçado por impactos constantes e crescentes.” (LIMA, 2001, p. 21). Segundo a arqueóloga, em nenhum momento de sua trajetória o IPHAN chegou a lançar projetos voltados para a arqueologia, semelhantes ao Programa MONUMENTA/ BID, que é direcionado exclusivamente ao patrimônio edificado. FONSECA (2005), também menciona 85 que a atenção por parte do IPHAN à preservação de sítios e remanescentes arqueológicos permanece aquém de suas necessidades. Porém, como afirma ZANNETTINNI (2010), o Instituto tem estimulado o debate em torno da Arqueologia e preservação do patrimônio arqueológico, promovendo encontros, apoiando e patrocinando congressos e publicações. A questão é que tais ações não estão inseridas em um planejamento estratégico mais amplo, constituindo iniciativas pontuais, situação esta que começa a modificar-se recentemente, por exemplo, com a realização I Fórum Nacional do Patrimônio Cultural, a criação do Centro Nacional de Arqueologia, e o Grupo de Trabalho de Arqueologia Histórica. 86 3 O SÍTIO ARQUEOLÓGICO DO MORRO DA QUEIMADA 3.1 Apontamentos Históricos (...) Aqui as ruínas dominam as formas compostas do que lá embaixo, no seu encanto sinuoso, é a cidade. Galgam a escarpa, vão infatigavelmente à procura do céu, e adquirem uma espécie de monumentalidade negra, comburida, que nos oprime. Não têm a doçura um pouco vaporosa das ruínas românticas, de que o começo do século XIX impregnou a visão de velhos jardins, com suas colunas a beira-lago. São ásperas, cruéis, e se não vêm seguramente daquele dia de julho de 1720, em que a soldadesca do Conde de Assumar ateou fogo no arraial de Ouro Podre, pois Diogo de Vasconcelos alude a um arraial ali construído posteriormente e que por sua vez se converteu nesses escombros, não são por isso menos acerbas. Alguma coisa selvagem, própria da natureza, se incorporou aos pedaços de paredes, muros e corredores de pedra, remanescentes de técnicas primitivas de mineração, e que se estendem por um espaço não suspeitado a primeira vista. Sucessivas plataformas e dobras de morro ostentam restos de construções, aparentemente sem outro qualquer vestígio de presença humana. Em vão o olhar procura descobrir um desses humildes objetos que assinalam a vida de todos os dias, mediadores entre o homem e a natureza. Aqui havia casas, mundéus, ferramentas e vidas. Não há mais nada senão pedras negras, vegetação rala, musgo, flores insistentes que rompem de qualquer jeito. (...)32 Figura 03 (à esquerda): Ruínas das construções do arraial minerador setecentista. Figura 04 (à direita): Ruínas de um moinho. Fonte: Acervo fotográfico do Núcleo de Mentalidade e Memória - IFAC/ UFOP O Morro da Queimada, conhecido também como Morro do Paschoal ou Arraial do Ouro Podre, foi um dos primeiros arraiais a ser formado em Vila Rica, tendo sido destruído em 1720, após o levante em oposição aos aumentos dos impostos e à criação das Casas de Fundição pela Coroa Portuguesa, liderado por Paschoal da Silva Guimarães. O arraial, onde residiam quase todos os conspiradores, foi incendiado e recebeu a denominação de Morro da 32 ANDRADE, 1952. 87 Queimada. A insurreição teve como consequências o adiamento por quatro anos da instalação das casas de fundição em Minas Gerais e a divisão da Capitania de São Paulo e Minas Gerais em duas unidades administrativas. A versão histórica romantizada, criada no século XIX e até hoje recorrente, representa um movimento de cunho nacionalista, precursor da inconfidência mineira. No entanto, não se tratava de uma ação anticolonialista, mas sim uma tentativa de reformulação do poder local. O motim acabou fortalecendo a imagem e a presença do governo da capitania. Como apontam GUIMARÂES e MOREIRA (2010), para se compreender as origens da rebelião de 1720 torna-se necessário caracterizar o contexto histórico-social à qual esteve vinculada. No contexto da expansão mercantilista portuguesa, as expedições pelo território brasileiro, ocorridas a partir da segunda metade do século XVI, buscavam metais e pedras preciosas. E somente no final do século XVII seria encontrado ouro na região conhecida atualmente como o Estado de Minas Gerais, transferindo a base da economia colonial portuguesa da cana-de-açúcar para a mineração. A descoberta do valoroso metal fez com que grandes contingentes populacionais de dirigissem para a região de Minas Gerais. Assim, a sociedade mineira colonial possuía uma estrutura bastante diversificada. Ainda segundo Guimarães e Moreira, apesar da mineração consistir no que convencionou chamar de atividade nuclear, a economia colonial apresentava-se tão diversificada quanto à estrutura social. A existência da mineração exigia o apoio de outras atividades como a agricultura, pecuária, o comércio, o artesanato, e ainda, a construção civil. Estas atividades complementares foram capitais para a fixação dos colonos e para o desenvolvimento do sistema extrativista minerador. Segundo os pesquisadores, a conjunção entre a diversidade da economia e da estrutura social com a política colonial regida pelas imposições metropolitanas formou um contexto propício à ocorrência de conflitos. Neste contexto instável chegou o Conde de Assumar para assumir o cargo de governador do vasto território de Minas. Pelo fato de os governadores antecedentes haverem tido problemas com a insuficiência policial para fazer cumprir as determinações metropolitanas, o Estado português enviou seu reforço militar, aumentando a tensão e gerando conflitos armados entre a população e a Coroa. O Conde de Assumar instituiu a abertura das casas de fundição que iriam quintar33 o ouro, o que desencadeou uma série de rebeliões que iriam culminar na Sedição de 1720. Como represália à uma série de motins contra as alterações na tributação do ouro, o governador mandou atear 33 O Quinto consistia em um imposto cobrado pela Coroa portuguesa sobre o ouro encontrado em suas colônias, o qual correspondia a 20% do metal extraído e era recolhido pelas casas de fundição. 88 fogo no Arraial do Ouro Podre, área de mineração explorada por Pascoal da Silva Guimarães. Após a Sedição, o Conde de Assumar retornou à Portugal sem estabelecer as casas de fundição. Figura 05: Mapa de Ouro Preto - 1897 FONTE: Acervo PMOP Atualmente, o Morro da Queimada resguarda um valioso sítio arqueológico, registro material das primeiras tipologias arquitetônicas da cidade, vinculadas à exploração aurífera do início do século XVIII. O local ainda guarda vestígios materiais remanescentes de um dos mais dramáticos momentos da história do Brasil colonial. São ruínas de edificações, abrigos escavados na rocha, grandes galerias, bocas das antigas minas de ouro e sarilhos para suas ventilações, como também mundéus, que são construções feitas para a lavagem do ouro, pequenos açudes, segmentos de canais de captação de água, além de sistemas hidráulicos com canais utilizados para o transporte de água e de lama aurífera. Como apontam Guimarães e Moreira, os vestígios evidenciam um processo de ocupação em que a atividade mineraria era nuclear, porém denotam uma configuração urbana vinculada à dinâmica do contexto sócio- econômico do arraial que ali existiu. Este arraial era local de residência e trabalho dos mineradores, ou seja, onde eram desempenhadas atividades de suporte à mineração, como também aquelas ligadas ao cotidiano. A acentuada declividade do morro determinou a técnica de mineração utilizada, referente ao desmonte de grande quantidade de sedimentos por meio da ação de águas, o que originou o surgimento de cavas profundas no terreno. Este processo necessitou da construção de um sistema hidráulico para captação, armazenamento e transporte de água, aproveitando-se materiais oferecidos pelo ambiente, como terra pedras e madeira. O Morro da Queimada 89 acidente do terreno também foi aproveitado como parte integrante dos equipamentos, otimizando material e trabalho empregados. O crescimento da cidade nas últimas décadas, conjugado à falta tanto de políticas públicas quanto de planejamento urbano, acarretou o processo de depredação de grande parte do Morro da Queimada, área relativamente próxima ao centro, propensa a receber a instalação de uma população de baixa renda. No processo de ocupação desordenada, as ruínas foram sendo desmontadas para aproveitamento das pedras antigas como materiais de construção. As estruturas remanescentes também foram utilizadas como base das novas construções. Antigos canais de carregamento de lama aurífera são utilizados como passagem de esgoto a céu aberto. Segundo o arqueólogo Carlos Magno Guimarães, coordenador do projeto Levantamento Visual do Patrimônio Arqueológico do Morro da Queimada Ouro Preto/ MG, que consistiu no primeiro registro do sítio, realizado através do Laboratório de Arqueologia FAFICH, da Universidade Federal de Minas Gerais, publicado em 2004, os vestígios arqueológicos do Morro da Queimada não devem ultrapassar 10% de seu conjunto original. Como afirma o relatório, o poder público também vem contribuindo para a destruição do patrimônio arqueológico, na medida em que pavimenta ruas e construiu um reservatório de água com sua respectiva tubulação, a qual passa em meio às ruínas e as coloca em risco de desabamento. Figuras 06 e 07: Ocupação irregular das ruínas - segunda metade do século XX Fonte: Arquivo ETOP/IPHAN Em 1994 o Laboratório de Arqueologia da FAFICH/UFMG já havia apresentado o Laudo preliminar histórico-arqueológico sobre as ruínas do Morro da Queimada, atentando os órgãos públicos sobre os riscos de desaparecimento do sítio. Em outra pesquisa vinculada à Universidade Federal de Ouro Preto, publicada em 2001, os geólogos Frederico Sobreira e 90 Marco Antônio Fonseca verificaram que os impactos causados pela mineração do ouro durante os séculos XVII e XVIII, através de extração nos aluviões, trabalhos subterrâneos e atividades a céu aberto, provocaram alterações na morfologia dos terrenos (estratigrafia), havendo risco geológico de deslizamentos. A pesquisa dos geólogos também apontou as implicações negativas geradas pela ocupação desordenada no espaço urbano e em relação à preservação de sítios arqueológicos de Ouro Preto. As imagens apresentadas abaixo mostram a ocupação desordenada do sítio, desde 1953, quando este ainda se encontrava preservado, até 2007, quando a depredação já se encontra bem avançada: Figura 08: Foto Aérea de Ouro Preto. Fonte: Frederico Sobreira - Departamento de Geologia da Universidade federal de Ouro Preto/ Data: 1953. Bairro Morro da Queimada Praça Tiradentes 91 Figura 09: Foto Aérea de Ouro Preto. Fonte: Frederico Sobreira – Departamento de Geologia da Universidade federal de Ouro Preto / Data: 1978. Bairro Morro da Queimada Praça Tiradentes Fonte: Frederico Sobreira – Departamento de Geologia da Universidade federal de Ouro Preto / Data: 1986. Bairro Morro da Queimada Figura 10: Foto Aérea de Ouro Preto. 92 93 Figura 11: Imagem de satélite de Ouro Preto Fonte: GoogleEarth/ Data: 2007 – pesquisado em 2011. Apesar de o Plano Diretor de 1996 já ter previsto para o local a implantação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada, nas administrações seguintes, a causa foi abandonada, avançando o processo de depredação. Devido a este crescente processo de degradação do Conjunto Arquitetônico e seu entorno, no ano de 2003, a UNESCO enviaria a Ouro Preto uma missão de técnicos do Centro de Patrimônio Mundial para averiguar as condições de preservação da cidade. A missão considerou a preservação do sítio arqueológico do Morro da Queimada uma das medidas necessárias para deter a alarmante deterioração do patrimônio cultural e ambiental da cidade. Em decorrência destas recomendações da UNESCO, o Comitê Consultor de Ouro Preto, coordenado pelo IPHAN, organizou grupos de trabalho para o desenvolvimento do Projeto de Implantação do Parque Arqueológico Morro da Queimada, aprovado em 2005 pelo MINC, e atualmente em fase de desenvolvimento e implantação de algumas frentes de trabalho. A Bairro Morro da Queimada Praça Tiradentes 94 criação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada surgiu da necessidade de proteção de um patrimônio que está sendo aos poucos dilapidado, principalmente pela expansão urbana que se desencadeou nas décadas de cinquenta e sessenta, vinculada à exploração de minério de ferro e alumínio na região, intensificando-se a partir da década de oitenta, época em que o correu a ocupação a montante da encosta da Serra de Ouro Preto. Segundo GUIMARÂES (2004), a reabilitação de toda a área do sítio arqueológico original é praticamente impossível, embora grande parte ainda não tenha sido atingida. A ocupação atual já depredou o conjunto principal de ruínas, e este processo não apresenta sinais de ter sido estagnado. Segundo a pesquisa desenvolvida pelo arqueólogo, há dois contextos a serem levados em conta na preservação dos remanescentes do sítio arqueológico do Morro da Queimada: uma área ocupada por invasão, bastante degradada, onde se encontra a maior concentração de ruínas; e outra bastante preservada, do meio da encosta em direção ao topo, onde há menos concentração de ruínas. O trabalho de FONSECA e SOBREIRA (2001) apresenta o cálculo das taxas de ocupação da área do Morro da Queimada próxima à Rua XV de Agosto, onde se concentra a maior quantidade de ruínas (Figura 07). Conforme exposto pelos autores, as taxas foram calculadas a partir da análise de fotografias aéreas, num período compreendido entre os anos de 1950 e 1997. A pesquisa de Fonseca e Sobreira constatou que, entre 1950 e 1969 (19 anos) houve uma ocupação de um trecho da área de 4,3%; entre 1969 e 1986 (17 anos), houve uma ocupação de outro trecho da área de 26%; e entre 1986 e 1997 (11 anos) a ocupação de outra área correspondeu a 68,2%. Assim, observa-se que, na época compreendida entre o final dos anos oitenta e final dos noventa, houve um maior adensamento da área. 95 Figura 12: Mapa da evolução da ocupação do Morro da Queimada entre 1950 e 1997 Fonte: FONSECA e SOBREIRA, 2001. Figuras 13 e 14: Foto do Morro da Queimada de 1990 e 1998 respectivamente. Fonte: Arquivo E.T. Ouro Preto-IPHAN. 96 As primeiras iniciativas do poder público que envolvem a preservação do Morro da Queimada demonstram uma preocupação ambiental mais ampla, considerando o sítio arqueológico como componente de um sistema ambiental que também integra a área contígua do Parque Municipal da cachoeira das Andorinhas. Conforme o Relatório denominado Parque Municipal das Andorinhas e Morro da Queimada – Delimitação da Área de Proteção, produzido pelo Grupo Técnico instituído pela Audiência Pública realizada no dia 21/03/2001, promovida pela Comissão de Administração e Serviços Públicos da Câmara Municipal de Ouro Preto, em 1968 foi aprovada, pela Câmara Municipal de Ouro Preto, uma primeira lei dispondo sobre a criação do Parque Municipal das Andorinhas, que definia como área o raio de um km a partir da cachoeira existente no local. Tal lei, entretanto, não foi efetivada, como também não o foi o Decreto-lei municipal n° 27 de 1973, que definia áreas de preservação e conservação de bens histórico-artísticos e paisagísticos do Município, estando entre eles a Cachoeira das Andorinhas e proximidades. Em nível estadual, no ano de 1989 foi aprovado um Decreto-lei, dispondo sobre a implantação de Área de Proteção Ambiental (APA) da Cachoeira das Andorinhas, correspondendo a uma área de 18.700 hectares, abrangendo as nascentes altas do Rio das Velhas, onde toda a área da Cachoeira das Andorinhas está inserida. A proposta de criação de uma grande área de preservação que contemplava Área Municipal de Proteção Ambiental da Cachoeira das Andorinhas e Morro da Queimada foi elaborada em 1993. Em 1996 foi encaminhada para apreciação da Câmara Municipal de Ouro Preto, pelo então Prefeito Municipal, a Proposta de alteração dos limites do Parque Municipal Cachoeira das Andorinhas - área correspondente à porção sudeste da APA das Andorinhas. Ainda em 1996, o Grupo de Assessoramento Técnico (GAT) propõe anteprojeto de lei para criação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada. Neste mesmo ano é aprovada pela Câmara Municipal de Ouro Preto a Lei Complementar que institui o Plano Diretor do Município de Ouro Preto. Em seu texto, a Seção II – Das Zonas de Proteção do Distrito Sede, 2º parágrafo do artigo 26 determina que: “fica destinada área para criação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada”. E o seu parágrafo 3º diz: São admitidas no parque arqueológico do Morro da Queimada, apenas as atividades de pesquisa, lazer, educação ambiental e turismo, compatíveis com sua função de parque arqueológico, ficando vedada a exploração mineral e usos não condizentes com a destinação da área, bem como qualquer tipo de parcelamento do solo.34 34 Plano Diretor Municipal de Ouro Preto/1996. 97 650.000 652.000 654.000 656.000 658.000 660.000 662.000 7752.000 7750.000 7748.000 7746.000 7744.000 TRIPUÍ PARQUE CACHOEIRA DAS ANDORINHAS APA ANDORINHAS ÁREA PRESERVAÇÃO SÃO SEBASTIÃO VOLTA DO CÓRREGO VELOSO PIEDADE Pe.FARIA TAQUARAL QUEIMADA SANTANA MORRO DA CENTROBURACO QUENTE LAJES N 0 1Km DE DA SERRA DA BRÍGIDA Mapa de Localização do Parque Cachoeira das Andorinhas e sua relação com as demais UC's na região de Ouro Preto. Tal determinação, entretanto, na época não foi cumprida. Mais recentemente, em 2001, em audiência pública, foi aprovado o projeto de re-delimitação do Parque Natural Municipal das Andorinhas e o grupo técnico constituído por instituições públicas e associações – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), o atual CEFET-OP, Instituto Estadual de Floresta (IEF), CODEMA-OP, Projeto Manuelzão, Amigos do Meio Ambiente de Ouro Preto (AMA-OP), Associação de Proteção Ambiental de Ouro Preto (APA-OP), Associação de Bairro do Morro São Sebastião – ficou encarregado de executar a tarefa. Figura 15: Mapa de Localização do Parque Cachoeira das Andorinhas e sua relação com as demais UC’s na região de Ouro Preto. Fonte: Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto - IPHAN/ Data: 2001. Em nova audiência, em 2003, para a apresentação dos resultados de tal trabalho, ficou decidido que o melhor seria instituir dois parques – o Parque Municipal das Andorinhas e o Parque do Morro da Queimada – uma vez que as duas áreas apresentavam características distintas. Deste modo, o grupo de trabalho foi dividido em duas subcomissões: a das Andorinhas formada pelo IEF, Prefeitura Municipal de Ouro Preto (PMOP), Projeto Manuelzão, APA-OP e Associação de Bairro do Morro São Sebastião, e a do Morro da Queimada composta pelo IPHAN, UFOP, CEFET-OP, AMA-OP e Câmara Municipal de Ouro Preto. A partir de então, várias reuniões técnicas foram realizadas. Nesta fase, passou a integrar a equipe de trabalho a Câmara Técnica do Conselho Municipal de Desenvolvimento 98 Ambiental de Ouro Preto (CODEMA-OP). Embora várias etapas de trabalho tenham sido definidas, não chegaram a ser realizadas pelo Executivo Municipal. Uma minuta de Lei chegou a ser elaborada, discutida e aprovada em reunião extraordinária da CODEMA, mas a Lei propriamente dita não foi encaminhada para votação na Câmara Municipal. Em uma nova audiência pública realizada em fevereiro de 2005 foram discutidos temas referentes à preservação e criação do Parque da Cachoeira das Andorinhas e do Parque Arqueológico do Morro da Queimada – projeto que envolveu a Prefeitura Municipal de Ouro Preto e os Ministérios da Cultura, da Cidade, do Turismo, do Meio Ambiente e das Minas e Energia. Nesta ocasião, a Profª Dra. Yára Mattos, museóloga, do Departamento de Turismo da UFOP, Coordenadora do Projeto de Implantação do Ecomuseu, lançou pra o grupo as primeiras “ideias ecomuseológicas” – experiência antes inexistente em Minas Gerais. Neste mesmo ano, a Câmara Municipal aprovou o projeto de lei estabelecendo a nova demarcação do Parque das Andorinhas. Também foi em 2005 que o Ministério da Cultura do Governo Federal aprovou o Projeto de Implantação do Parque Arqueológico Morro da Queimada. Como consta no texto do Projeto, a criação do parque tem por objetivo: - ampliação das pesquisas históricas por meio da criação de programas de escavações arqueológicas possibilitando um conhecimento amplo sobre a cultura material e a história da mineração da época; - proteção e ordenamento das ruínas das primeiras edificações construídas com pedra e argamassa, detalhes em cantaria e os conjuntos de ruínas de currais e pátios constituídos de muros de pedra em junta seca; - ampliação dos conhecimentos sobre a atividade mineradora e dinâmica social dos primórdios da colonização de Ouro Preto e das Minas Gerais; - criação de um Museu Arqueológico das cidades surgidas durante o ciclo do ouro;35 A criação do parque tem ainda o objetivo de proporcionar a melhoria da qualidade de vida e inclusão social das comunidades vizinhas, com a geração direta e indireta de emprego e renda. O Projeto tem como proponente o Museu de Arte Sacra do Carmo e o Ministério da Cultura; é atualmente coordenado pela FIOCRUZ/Ministério da Saúde; patrocínio da Caixa Econômica Federal, Novelis do Brasil e Petrobras; e parceria com UFOP, Fundação Gorceix, IPHAN e PMOP. Conta ainda com o apoio da UNESCO, UFMG, Instituto Estadual de Florestas, Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, IEPHA, Instituto Federal de Educação - IFE, Câmara Municipal de Vereadores, Paróquia de Nossa Senhora do Pilar, 35 Projeto PRONAC – MinC, 12/2005, p. 07. 99 Paróquia de Santa Efigênia, Sociedade Soto Zen do Brasil, Associação de Proteção Ambiental de Ouro Preto - APAOP, AMA Ouro Preto, Associação de Amigos do Patrimônio Natural e Cultural de Ouro Preto – AMO Ouro Preto, Telecentro Auta de Souza, Associação de Moradores do Morro da Queimada e Federação das Associações de Moradores de Ouro Preto – FAMOP. Figura 16: Área levantada pelo Projeto de Implantação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada. Fonte: Projeto de Implantação do Parque Arqueológico Morro da Queimada/ 2005 Figura 17: Delimitação da área do Parque Arqueológico do Morro da Queimada e adjacências. Fonte: GoogleEarth/ Data: 2007 – pesquisado em 2010. 100 Este movimento de criação do parque integrou outras ações como o Ecomuseu da Serra de Ouro Preto, que concretiza um conceito museológico mais abrangente, que engloba manifestações as culturais locais e o ambiente onde vivem as comunidades, constituído por: espaço-testemunho, a ser formado a partir de escavações e contenção das ruínas remanescentes do antigo arraial; espaço cultural vivido, promovendo ações participativas junto à comunidade local, fomentando o desenvolvimento de consciência crítica; e lugar- ambiente, buscando desenvolver relações harmônicas entre homem e natureza. A área de implantação do Ecomuseu da Serra de Ouro Preto abrange a área que corresponde ao sítio arqueológico do Morro da Queimada e os morros vizinhos, a saber: São Sebastião, São João, Santana, Piedade e o próprio Morro da Queimada. Tais morros constituem, por sua vez, o entorno do Parque das Andorinhas. Várias frentes de atuação encontram-se em desenvolvimento: ações do Inventário Participativo, projeto de entrevistas “Memória de Vida”, e ações de desenvolvimento social com ênfase nas atividades direcionadas à juventude, como oficinas de arte e comunicação. Para estas comunidades, o lugar onde vivem só tem significado quando adquire valor de referência, de identidade, ou seja, quando transmitir sentimento de pertencimento. Como resultado deste longo processo de união e empenho das várias instâncias institucionais e dos vários setores da sociedade civil em prol da proteção do sítio em questão, em dezembro de 2008 foi instituída a Lei n° 465/2008, que dispõe sobre a criação do Parque Arqueológico Municipal do Morro da Queimada, de acordo com a determinação legislativa do Plano Diretor Municipal, abarcando uma área de 67 há (sessenta e sete hectares). A implementação do Parque tem por finalidade, segundo seu Artigo 2°: I - resguardar o sítio histórico e todas as minas e vestígios nele existentes, possibilitando o estudo e a compreensão do modo de vida e da forma de ocupação da população no inicio do século XVIII; II - proteger integralmente os recursos naturais, com a sua utilização para objetivos educacionais, científicos, recreativos e turísticos.36 Um avanço da Lei n° 465/2008 consiste em dispor sobre o projeto de zoneamento e o manejo do Parque, que segundo o Art. 4°, deverá basear-se em pesquisas ecológicas, históricas e arqueológicas, submetidas à apreciação do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural e Natural e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. §10 O plano de manejo administrativo-institucional devera conter as seguintes zonas: 36 Lei 465/2008 101 I - Zona de uso adensado, constituída pela área natural ou alterada pela ocupação, onde se localizarão os museus, o centro de visitantes com espaços necessários ao atendimento do visitante, e os demais serviços de apoio; II - Zona histórico-cultural, constituída pela área em que se encontram testemunhos de manifestações históricas e culturais, ou arqueológicas, que deverão ser preservadas, estudadas e apresentadas para o público em geral, servindo a pesquisa e a educação cientifica, sendo seu uso monitorado, com o objetivo de proteger o sítio histórico-arqueológico; III - Zona de proteção ambiental, constituída pelas áreas circunvizinhas ao Parque, pertencentes ou não ao poder público, cuja delimitação deverá ser regulamentada posteriormente, considerando as referências geográficas e urbanas locais (...)37 A definição do Zoneamento do Parque aproxima-se dos parâmetros da Conservação Integrada, na medida em que objetiva conciliar a preservação do sitio histórico arqueológico e seu entorno com a utilização atual da área para atividades de recreação e de educação cientifica e ambiental, buscando a harmonia com o ambiente natural e cultural da área. Diante do exposto, percebe-se que a existência de estudos e leis, desvinculadas de ações efetivas, não impediu a ocupação indevida e o desmonte das ruínas do Morro da Queimada, nem tampouco o desmatamento, ocupação indevida, poluição e degradação ambiental da cabeceira do Rio das Velhas, na região das Andorinhas. Como apontaram as pesquisas do Laboratório de Arqueologia da FAFICH/UFMG e do Departamento de Geologia da UFOP, a implantação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada tornou-se uma ação a ser executada com urgência para deter o processo de depredação do sítio. Valoriza-se o sítio arqueológico do Morro da Queimada como lugar de memória, enquanto testemunho material que não desapareceu completamente, permanecendo ruína, aproveitando-se a potencialidade da ruína, que deixa espaço para novas intervenções. 3.2 O IPHAN em Ouro Preto: o papel do patrimônio arqueológico para a instituição na época do tombamento e seus desdobramentos nas gestões posteriores No período inicial dos tombamentos de cidades históricas pelo SPHAN, a cidade de Ouro Preto foi tombada como conjunto urbanístico monumental, segundo critérios ainda vagos, sendo que para definir o perímetro de proteção estabeleceu-se que estariam submetidas à condição de tombamento as áreas “até onde a vista alcança” (grifo nosso). Somente em 1989 37 Lei 465/2008 102 é instituída a delimitação do perímetro de tombamento de Ouro Preto. O Conjunto Arquitetônico e Urbanístico da Cidade de Ouro Preto foi inscrito em 1938 no Livro de Tombo de Belas Artes, e posteriormente, em 1986, no Livro de Tombo Histórico e no Livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico. Segundo ANDRADE (1993), os critérios que ordenaram a conservação e a valorização do “colossal monumento” privilegiaram a homogeneidade, determinando a reconstituição dos setores urbanos e dos principais edifícios “que se encontravam perturbados por intromissões desrespeitosas (...)” (ANDRADE, 1993, p. 118). Para MENICONI (1999), mesmo antes do tombamento a cidade recebeu uma carga simbólica de identidade nacional, com a “construção/ reconstrução de um retrato de Minas e do Brasil” (MENICONI, 1999, p. 13), iniciando o processo de “monumentalizar-se” (MENICONI, 1999, p. 13) com a transferência da capital do Estado para Belo Horizonte. O esvaziamento populacional e econômico formou as bases para a criação deste simbolismo que lhe conferiria o título de Monumento Nacional já em 1933, através do Decreto n°. 22.928. Como mostra Meniconi, a partir do final dos anos sessenta, a postura inicial do IPHAN em tratar Ouro Preto como cidade museológica e monumental transforma-se numa abordagem que envolvia questões de dimensões urbanísticas. Esta visão teve como consequência uma articulação entre vários agentes e instituições, a partir dos anos oitenta, com o intuito de implementar um programa de conservação integrada para conter as ameaças de degradação que a cidade vinha sofrendo, causados principalmente pelo adensamento desordenado, efeitos negativos do tráfego pesado e poluição atmosférica advinda das industrias que desenvolvem atividades mineradoras e metalúrgicas. Assim como o traçado urbano, as relações sociais, econômicas e culturais de Ouro Preto sempre foram condicionadas pela atividade mineradora. No século XVIII, era a mineração do ouro e no século XX, do minério de ferro e da bauxita, matéria prima para a produção de alumínio. A pesquisa de Meniconi também aponta fatos decorrentes deste processo de urbanização descontrolada resultante da instalação destas empresas mineradoras na cidade, sobretudo a partir da década de cinqüenta, como a Aluminium Limited (atual Novelis do Brasil). Estes fatos referem-se à ocupação das áreas periféricas, como o Morro da Queimada, Alto da Cruz, Padre Faria, São José, Cabeças, e posteriormente Vila Aparecida, São Cristóvão e Veloso, formando-se aglomerações carentes de infra-estrutura urbana. Muitas destas áreas também apresentam problemas de declividade somada à instabilidade estrutural do solo. O pesquisador ainda salienta que o SPHAN, apesar de respaldar-se em legislação específica para a proteção do patrimônio, não possuía meios nem recursos para agir, frente à complexidade dos problemas ocorrentes. Para agravar a 103 situação, a Prefeitura Municipal não cumpria com suas responsabilidades institucionais de salvaguardar o patrimônio, relegando tal atribuição ao órgão federal ou ignorando as ocupações irregulares, e até mesmo incentivando-as com a cessão de terrenos e materiais de construção. Frente à constatação de que os métodos e procedimentos empregados até então eram insuficientes para conter os danos que o patrimônio edificado vinha sofrendo devido às rápidas transformações urbanas, o Governo Brasileiro solicitou à UNESCO o envio de técnicos para que fossem tomadas medidas mais enérgicas. No ano de 1968 o arquiteto português Viana de Lima é enviado pela UNESCO ao Brasil, e juntamente com os técnicos do Patrimônio elaborou estudos para tutela, recuperação e valorização de Ouro Preto, como aponta Meniconi. Esta ação resultou das buscas empreendidas pelo IPHAN visando ajuda internacional para conter as ameaças de desaparecimento da cidade. O relatório final deste trabalho foi publicado em 1970, e apresentava influências da Carta de Veneza, de 1964, e das Normas de Quito, de 1967, tendo como principal instrumento de salvaguarda o planejamento urbano, baseado em áreas de preservação restrita e expansão. Neste Plano, a delimitação do objeto a ser conservado foi ampliada, englobando ao ambiente urbano o paisagístico. A proposta de Viana de Lima apresentava uma rígida separação entre o centro histórico da cidade e as áreas novas, através da criação de um cinturão verde. O Plano também previa a aplicação de normas rigorosas e restritivas no centro histórico, determinado como zona “non aedificandi” (MENICONI, 1999, p. 117), assim como a execução de intervenções de “liberação” (MENICONI, 1999, p.117), que consistiam na demolição integral ou de partes de edificações considerados sem qualidade arquitetônica, buscando ressaltar o estilo colonial dos principais monumentos. Em áreas de expansão, no entanto, são permitidas “renovações urbanas” (MENICONI, 1999, p.117), procurando conter o adensamento e diluir as construções nos espaços verdes existentes, controlando gabaritos, materiais de construção e cores. Porém, como afirma Meniconi, apesar deste Plano ser um avanço em relação às ações precedentes, que possuíam abrangência imediatista e pontual, o enfoque estético e contemplativo que conferia ao centro histórico, assim como as diretrizes menos restritivas para as áreas de expansão não tiveram êxito, sendo que os processos de adensamento e transformação no interior do centro histórico não foram detidos, e as áreas de expansão foram intensamente ocupadas, sendo desconsideradas as orientações de controle de adensamento. 104 Dando continuidade às orientações do Plano Viana de Lima, em 1975 foi lançado o Plano de Valorização, Conservação e Desenvolvimento para Mariana e Ouro Preto, elaborado pela Fundação João Pinheiro, através de um convênio firmado entre o Ministério da Educação e Cultura (representado pelo IPHAN), o Estado de Minas Gerais (com participação técnica do IEPHA), com recursos da Financiadora de Estudos e Projetos, FINEP, e do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais, BDMG, com participação das Prefeituras Municipais de Ouro Preto e Mariana. Como afirma Meniconi, este Plano foi o primeiro desta envergadura a ser desenvolvido no Brasil. Este Plano caracterizava-se pelo detalhamento e abrangência, considerando os aspectos territoriais, urbanísticos e arquitetônicos, compreendendo tanto a conservação do patrimônio cultural quanto a qualidade de vida das comunidades locais. O Plano também inova ao indicar uma atuação conjunta dos órgãos institucionais nos três níveis de poder, e também não se limita à preservação do acervo edificado, englobando as questões referentes ao ambiente natural, saneamento, trânsito, estabilidade geológica e uso do solo. Assim como o Plano Viana de Lima, o Plano em questão cria novas áreas de expansão para assimilar as taxas de crescimento populacional projetadas, que poderiam acarretar a destruição dos núcleos tradicionais e afetar o equilíbrio ambiental da região. Em relação aos núcleos históricos, o PVCDMOP busca desestimular o uso residencial e impedir a construção de novas edificações. Para Meniconi, a execução do Plano tornou-se inviável devido à sua complexidade, como também aos entraves político-administrativos e ainda pelo alto valor dos recursos necessários à sua implantação. Segundo o pesquisador, também comprometeram a efetivação do Plano a desconsideração entre as diferenças históricas entre Mariana e Ouro Preto, a exclusão das comunidades locais do processo de elaboração, e principalmente, a falta de um redimensionamento da explosão populacional, de acordo com a estagnação do processo de industrialização na região. As Coordenações Regionais do IPHAN são criadas no ano de 1976, aproximando as instâncias de decisão das cidades históricas, sendo que até então os processos de Ouro Preto tramitavam no Rio de Janeiro, e na década de oitenta são instalados os escritórios das sub- regionais, atualmente denominados Escritórios Técnicos locais. Um convênio entre IPHAN (na época SPHAN - Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), UFOP, Universidade Federal de Ouro Preto e Prefeitura Municipal, denominado Projeto Ouro Preto, buscava conservar a cidade de modo global, através da restauração de edificações, preservação ambiental, intervenções no tráfego e definição de novas áreas de expansão, sendo elaboradas cartas geotécnicas e de rearborização, objetivando preservar e reconstituir a 105 paisagem natural do entorno do centro histórico, abrangendo também questões sócioeconômicas e referentes à infraestrutura. Ainda seguindo as explanações de Meniconi, nos anos oitenta foram realizadas várias ações destinadas a promover a conservação da cidade, aumentando a consciência de que os problemas urbanísticos exigem a formulação um programa funcional de intervenções. Neste sentido, integram-se nestes esforços o Ministério dos Transportes, EMBRATUR, Ministério da Agricultura, Instituto Estadual de Florestas e Comissão de Política Ambiental, visando à preservação das áreas verdes, resultando na criação das três unidades de conservação: Parque Estadual do Itacolomi, Estação Ecológica do Tripuí e Área de Proteção Ambiental (APA da Cachoeira das Andorinhas. Em 1980, Ouro Preto foi inscrita na lista de patrimônio cultural da humanidade da UNESCO, atendendo a solicitação encaminhada pelo governo brasileiro em 1978. Os valores que referenciam a cidade como monumento nacional confirma-se então a nível internacional. Contudo, nos anos noventa, como mostra Meniconi, percebe-se que os problemas referentes à carência de planejamento, estruturação institucional e gestão urbana continuam. Abandonando-se então os planos ambiciosos dos anos setenta, ocorre em Ouro Preto uma atuação conjunta entre o IPHAN e outras instituições responsáveis pela preservação do patrimônio urbano e ambiental, que resultou na criação do GAT, Grupo de Assessoramento Técnico, que atuava como um Conselho, sendo responsável, entre outras ações, pela elaboração do planejamento territorial e da legislação urbanística, segundo SIMÃO (1996). Além do IPHAN, o GAT era formado pela Prefeitura Municipal, de suma importância na efetivação das ações integradas do plano de desenvolvimento urbano e preservação do patrimônio, e também pelo IEPHA, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais, o IEF, Instituto Estadual de Florestas, e a UFOP, Universidade Federal de Ouro Preto. O governo municipal eleito em 1995 tinha como estratégia administrativa a valorização do patrimônio cultural como alavanca sócioeconômica para a melhoria da qualidade de vida da população ouropretana, potencializando atividades de apoio ao turismo e o uso do centro histórico pela comunidade local. Em 1996 é instituído o Plano Diretor Municipal, revisto em 2006, que contou com a participação do IPHAN, organiza um modelo de macrozoneamento, o qual prevê a criação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada. O Art. 17 inclui o patrimônio arqueológico dentre os bens patrimoniais a serem preservados: 106 Art. 17 – Devem ser protegidos e preservados todos os elementos integrantes do patrimônio natural, paisagístico, arqueológico e espeleológico do Município38. E o Art. 44 determina a proteção legal das áreas dotadas de remanescentes arqueológicos que estejam em processo ou sob ameaça de degradação através de sua delimitação como ZPAM, Zona de Proteção Ambiental. Art. 44. Considera-se como Zona de Proteção Ambiental (ZPAM) aquela a ser preservada ou recuperada em função de suas características topográficas, geológicas e ambientais de flora, fauna e recursos hídricos, e/ou pela necessidade de preservação do patrimônio arqueológico ou paisagístico39. A Portaria n° 122 do IPHAN, instituída em 2004, dispõe sobre diretrizes e critérios referentes a intervenções arquitetônicas e urbanísticas na área do Conjunto Tombado. O foco deste documento continua na preservação do acervo paisagístico-urbano-arquitetônico, pautando-se na originalidade deste patrimônio, na qualidade de conjunto que constitui esse patrimônio cultural, considerando também a beleza e a harmonia da paisagem na qual ele se insere. Este conjunto de original qualidade arquitetônica, ou seja, o centro histórico setecentista, coincide com a Zona de Proteção especial do Plano Diretor Municipal. Apesar de estar contido na área de Delimitação do Perímetro Tombado pelo IPHAN (1989), ao sítio arqueológico do Morro da Queimada não é feita nenhuma consideração específica, apesar do Plano Diretor Municipal de 1996 já prever a instalação de um Parque Arqueológico na área e defini-la como Zona de Proteção Ambiental. 38 Lei complementar n.° 01, 1996, Art. 17. 39 Lei complementar n.° 01, 1996, Art. 44. 107 Figura 18: Delimitação do Perímetro de Tombamento do IPHAN – 1989 – Anexo VII Portaria 122/2004 Fonte: Portaria 122 do IPHAN/ 2004. Figura 19: Delimitação do Perímetro da Zona de Proteção Especial do Plano Diretor Municipal de 1996 Fonte: Portaria 122 do IPHAN/ 2004. 108 A Portaria n° 312 - IPHAN, instituída em 2010, substitui a Portaria n° 122/2004, e no Título III – Da Setorização do Conjunto Tombado, em seu Art. 16, estabelece três áreas de preservação no sítio tombado: I – Área de Preservação Especial – APE II- Área de Preservação – AP III – Área de Preservação Paisagística, Arqueológica e Ambiental - APARQ40 Sendo que o Art. 19 define o que é considerado APARQ: Art. 19. A Área de Preservação Paisagística, Arqueológica e Ambiental - APARQ corresponde às áreas pouco urbanizadas e de baixa densidade construtiva, com relevante formação geológica, interesse arqueológico, histórico, paisagístico e/ou ambiental.41 O Capítulo IV estabelece diretrizes específicas para a Área de Preservação Paisagística, Arqueológica e Ambiental, e em seu Art. 60 determina ao poder público o encargo de promoção e valorização de estruturas remanescentes do sistema minerador do século XVIII: Art. 60. Na Área de Preservação Paisagística, Arqueológica e Ambiental - APARQ, a ação pública de preservação do patrimônio cultural tem como objetivo promover a valorização das qualidades paisagísticas, arqueológicas e ambientais que compõem este Patrimônio Cultural, compreendendo: I - Os remanescentes do sistema de mineração (mundéus, bocas de minas, ruínas, infraestrutura histórica, dentre outros) e áreas verdes de interesse histórico e/ou ambiental; (...)42 E especificamente sobre o acautelamento do Morro da Queimada, o Art. 62 determina: Art. 62. O Parque Arqueológico Morro da Queimada será objeto de plano de preservação específico, implicando em valorização e socialização do patrimônio arqueológico histórico.43 Desta forma, a Portaria n° 312/2010 consiste em um avanço na política de preservação dos Sítios Urbanos tombados pelo IPHAN. Amplia a noção de Sítio Urbano, antes limitada a conjunto arquitetônico composto por igrejas e casarões setecentistas, emoldurado por um cenário montanhoso, passando a incluir na descrição dos bens que compõe este sítio as áreas remanescentes da ocupação original e seus vestígios arqueológicos, e estabelecendo diretrizes específicas para a gestão deste patrimônio, incluindo-se sua sociabilização. Estas diretrizes poderiam ser ainda mais eficazes caso fossem embasadas em Cartas Arqueológicas da Arqueologia Urbana, compostas por cadastro, inventário e zoneamento de áreas com potencial arqueológico. 40 Portaria 312/2010 - IPHAN 41 Portaria 312/2010 - IPHAN 42 Portaria 312/2010 - IPHAN 43 Portaria 312/2010 - IPHAN 109 Dentre as ações do IPHAN, ressalta-se também que em novembro de 2008, o Morro da Queimada foi inscrito no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos, CNSA/SGPA, relacionado ao sítio de Santo Antônio, situado na cidade vizinha de Mariana, cuja ficha apresenta como descrição sumária: Sítio arqueológico de inestimável valor, por ser um testemunho material das primeiras tipologias arquitetônicas da cidade e guardar preciosos registros da exploração de ouro no início do século XVIII.44 A ficha ainda indica risco de destruição: Eminente devido a ocupação irregular e desordenada das encostas de Ouro Preto, MG.Nas últimas décadas, o Morro da Queimada vem passando por um processo de dilapidação. Na ocupação desordenada, por um lado as ruínas vêm sendo desmontadas para aproveitamento das pedras antigas como material de construção e, por outro, as estruturas remanescentes vêm sendo utilizadas como base das novas construções.A falta de proteção dos documentos arqueológicos do Morro da Queimada em Ouro Preto é o caso mais grave de abandono do patrimônio cultural pelos poderes públicos nas suas diversas esferas.45 E aponta como medida para preservação o Projeto de implantação do parque arqueológico do Morro da Queimada. A partir das explanações acima expostas, configura-se pertinente a afirmação de Meniconi, de que as questões referentes à preservação de Ouro Preto ultrapassam o nível local, e mesmo sendo importante a atuação municipal com participação ativa da comunidade, é necessária também a articulação multi-institucional por se tratar de um Patrimônio Nacional e Mundial. Para tanto, o autor sugere uma instância de planejamento permanente, multidisciplinar, englobando a Arquitetura, a História, as Ciências do Território, da Restauração e das Artes. Acrescenta-se dentre estas, a disciplina da Arqueologia. Políticas de preservação como o registro do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada no CNSA/SGPA e sua inclusão na Portaria n° 312/2010 indicam uma nova perspectiva de gestão dos Sítios Urbanos pelo IPHAN, aproximando-se do conceito de Arqueologia Urbana, na medida em que o patrimônio urbano é visto como resultado dinâmico de uma contínua ocupação humana nos territórios, como sistema construído historicamente em sua dimensão sócio-espacial. Estas ações ainda seguem os parâmetros da Conservação Integrada, buscando revalorizar as qualidades dos ambientes urbanos, incluindo no cotidiano da cidade uma área de parque arqueológico, revertendo uma situação de risco de desaparecimento. Procuram também ressaltar os valores culturais desses ambientes, ao buscar sociabilizar o patrimônio ali existente. 44 (CNSA: MG01005) 45 (CNSA: MG01005) 110 3.3 Análise da Pesquisa Documental realizada no Arquivo Administrativo da Casa da Baronesa, ETOP I – IPHAN, referente à preservação do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada A atuação do órgão responsável pela preservação do patrimônio cultural brasileiro foi analisada a partir dos valores e conceitos vigentes, e ainda, com base na jurisprudência disponível durante sua trajetória ao longo dos anos. Desta forma, após a explanação nos capítulos anteriores sobre conceitos e valores que nortearam o processo de seleção daquilo que deveriam ser acautelado como patrimônio cultural e sua forma de gestão, bem como da ampliação do conjunto de leis do Estado brasileiro, atinentes à proteção patrimonial, com ênfase no patrimônio arqueológico, este capítulo mostra a equivalência entre estes fatores e as mudanças ocorridas na forma de gestão do Instituto do Patrimônio Nacional. Na busca do entendimento da atuação do Instituto na preservação do patrimônio arqueológico inserido no Sítio Urbano de Ouro Preto, a pesquisa embasou-se na análise dos registros documentais contidos no Arquivo Administrativo da Casa da Baronesa, Escritório Técnico de Ouro Preto - IPHAN. O arquivo Administrativo dos Escritórios Técnicos do IPHAN consiste na memória da gestão do Sítio Urbano pela instituição, documentada em memorandos e ofícios referentes à aprovação de projetos, notificações de obras irregulares, atendimento às demandas da Justiça e do Ministério Público, entre outras ações. A análise deste arquivo administrativo permitiu a discussão sobre os instrumentos de preservação adotados pelo órgão e avaliar sua trajetória, enfocando o cumprimento de sua função ou sua omissão, quanto à preservação do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada. Foram consultadas 197 pastas do arquivo administrativo supracitado, desde 1982, época em que o Escritório Técnico foi efetivamente instalado na cidade de Ouro Preto, a 2009. Alguns documentos de grande valor para esta pesquisa, datados de épocas anteriores à instalação do escritório do IPHAN em Ouro Preto, também foram encontrados, como por exemplo, a cópia da pasta do Processo n ° 70-T-38, concernente ao tombamento do Conjunto Arquitetônico e Urbanístico da cidade, e a Pasta “Sítio Arqueológico do Morro da Queimada Ouro Preto – MG”, que contém documentos desde 1973 a 2001. Foi contabilizado um total de 38.294 folhas de documentos. Nesta consulta, foram encontrados 190 documentos sobre o Morro da Queimada, dos quais foram transcritos aqueles de maior relevância para esta pesquisa, apresentados em anexo. A apresentação dos documentos em ordem cronológica, tanto nas discussões deste capítulo quanto na organização dos anexos, tem a intenção de mostrar a 111 correspondência entre os fatos registrados e o contexto sócio-político e cultural em que ocorreram. Os gráficos abaixo mostram que, apesar de terem sido encontrados documentos referentes a Serra de Ouro Preto e ao Sítio Arqueológico do Morro da Queimada nas pastas das décadas de oitenta e noventa, percebe-se que foi somente a partir do ano 2000 que ocorreu um aumento substancial das informações registradas em ofícios e memorandos que demonstrassem uma preocupação em se preservar a área e os bens patrimoniais em questão. O período compreendido entre 2000 e 2009 apresentou 178 documentos referentes ao Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, enquanto que na época entre 1982 e 1999, foram encontrados somente 12 documentos; ou seja, nestes últimos dez anos o número de documentos encontrados foi quase 16 vezes maior que nos 18 anos anteriores. Conforme os Gráficos 08 a 10, o pico da quantidade de documentos sobre o referido sítio arqueológico foi nos anos de 2007 e 2008. Gráfico 08: Quantidade de documentos encontrados no Arquivo Administrativo ETOP/IPHAN, referentes ao Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, de 1936 a 2009, distribuídos anualmente. Fonte de informações: Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto – IPHAN 0 10 20 30 40 50 60 1 9 3 6 1 9 4 6 1 9 5 6 1 9 6 6 1 9 7 6 1 9 8 6 1 9 9 6 2 0 0 6 Anual Q u a n ti d a d e d e d o cu m e n to s (u n id a d e ) 112 Gráfico 09: Quantidade acumulada de documentos encontrados no Arquivo Administrativo ETOP/IPHAN, referentes ao Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, de 1936 a 2009. Fonte de informações: Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto – IPHAN Gráfico 10: Quantidade de documentos encontrados no Arquivo Administrativo ETOP/IPHAN, referentes ao Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009, distribuídos por décadas. Fonte de informações: Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto – IPHAN Os documentos também foram organizados por assunto, conforme a seguinte definição: A. Ocupação irregular do entorno paisagístico do centro histórico B. Legislação e documentos referentes à proteção ambiental da área B1. Legislação e documentos referentes à proteção do patrimônio arqueológico C. Aprovação de projeto arquitetônico em entorno de conjunto urbano tombado 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 1 9 3 6 1 9 4 6 1 9 5 6 1 9 6 6 1 9 7 6 1 9 8 6 1 9 9 6 2 0 0 6 Acumulado Q u a n ti d a d e d e d o cu m e n to s (u n id a d e ) Q u a n ti d a d e d e d o cu m e n to s (u n id a d e ) 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 1930 1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010 Década Q u a n ti d a d e d e d o cu m e n to s (u n id a d e ) 113 D. Documentos relacionados ao Ministério Público: Ação Civil Pública para apuração de negligência do IPHAN na proteção do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada. Os gráficos abaixo mostram que de 1980 a 1990 houve um predomínio de registros documentais referentes à ocupação irregular do entorno paisagístico do centro histórico, surgindo alguns documentos vinculados à preservação ambiental da Serra de Ouro Preto. Na década 90 a proteção ambiental da Serra de Ouro Preto foi o assunto predominante nos documentos encontrados sobre a área, também aparecendo o tema da preservação do patrimônio arqueológico, cuja incidência se fez mais presente na década de 2000. Além do predomínio de documentos referentes à preservação do patrimônio arqueológico, entre os anos de 2000 e 2009 observou-se a existência de ofícios de aprovação de projetos na área, como também de documentos ligados ao inquérito instaurado pelo Ministério Público sobre o cumprimento das atribuições do IPHAN na proteção do patrimônio histórico, cultural e arqueológico da área do Morro da Queimada. Gráfico 11: Quantidade de documentos organizados por assunto, encontrados no Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto-IPHAN, referentes à área do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009, distribuídos anualmente. Fonte de informações: Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto – IPHAN 0 10 20 30 40 50 60 1 9 7 0 1 9 7 5 1 9 8 0 1 9 8 5 1 9 9 0 1 9 9 5 2 0 0 0 2 0 0 5 2 0 1 0 anual D C B1 B A Q u a n ti d a d e d e d o cu m e n to s (u n id a d e ) 114 Gráfico 12: Quantidade acumulada de documentos, organizados por assunto, encontrados no Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto-IPHAN, referentes à área do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009. Fonte de informações: Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto - IPHAN Gráfico 13: Quantidade de documentos, organizados por assunto, encontrados no Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto-IPHAN, referentes à área do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, desde 1936 a 2009, distribuídos por décadas. Fonte de informações: Arquivo Administrativo do Escritório Técnico de Ouro Preto – IPHAN 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220 1 9 7 0 1 9 8 0 1 9 9 0 2 0 0 0 2 0 1 0 acumulado D C B1 B A Q u a n ti d a d e d e d o cu m e n to s (u n id a d e ) Q u a n ti d a d e d e d o cu m e n to s (u n id a d e ) 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 1970 1980 1990 2000 2010 década D C B1 B A Q u a n ti d a d e d e d o cu m e n to s (u n id a d e ) 115 Iniciou-se a análise com os documentos mais antigos do arquivo, armazenados na pasta do Processo n ° 70-T-38, SPHAN/DET, Seção de História, Conjunto Arquitetônico e Urbanístico da cidade de Ouro Preto, da qual fazem parte os Anexos de 01 a 15. O texto do Decreto n° 22.928 de 1933 (Anexo 01), que erige a cidade de Ouro Preto em Monumento Nacional, confirma as observações de Rodrigo Meniconi apresentadas no Capítulo 3, Item 3.2 O IPHAN em Ouro Preto: o papel do patrimônio arqueológico para a instituição na época do Tombamento e seus desdobramentos nas gestões posteriores. Para o autor, que também atuou como Diretor do IPHAN em Ouro Preto, de 1994 a 1996, o processo de “monumentalizar-se” (MENICONI, 1999, p.13) iniciou-se com o decreto de 1933, antes mesmo de a cidade ser tombada em 1938. Segundo o Decreto n° 22.928 de 1933, é dever do Poder Público defender o patrimônio artístico da Nação, do qual fazem parte os lugares em que se realizaram os grandes feitos da história de um povo. E esta monumentalização é vinculada aos valores artísticos e aos históricos, conforme as explanações do Capitulo 2, Item 2.2.3 Apontamentos históricos sobre o IPHAN, criação e trajetória da instituição até os dias atuais, focando a preservação do patrimônio arqueológico. O Decreto de 1933 considera a cidade de Ouro Preto como “teatro de acontecimentos de alto relevo histórico na formação de nossa nacionalidade”46, cujos velhos monumentos, edifícios e templos de arquitetura colonial correspondem a verdadeiras obras de arte a serem defendidas e conservadas. Percebe-se ainda uma postura de congelamento da cidade como obra de arte acabada, conforme os apontamentos apresentados no Item 2.2.3 do Capitulo 2, baseados em MOTTA (1987) e GONÇALVES (1988). Segundo o Art 4° do Decreto de 1933: Art 4° Em virtude deste decreto nenhuma alteração ou modificação advirá no organismo municipal da cidade de Ouro Preto (...)47 O Processo n° 70-T-38 SPHAN/DET, de tombamento do Conjunto Arquitetônico e Urbanístico da cidade de Ouro Preto/MG, é extremamente sucinto, e seguindo as determinações do Decreto-lei n°25/1937, compõe-se apenas da notificação por parte do SPHAN (Anexo 2), do documento de aceite por parte da Prefeitura Municipal (Anexo 3) e do documento que atesta a inscrição no Livro do Tombo de Belas Artes (Anexo 4). O texto da referida inscrição restringe-se a: Tendo sido cumprida a formalidade determinada no art. 5° do Decreto-lei n° 25 de 30 de novembro de 1937, inscreva-se. 48 46 Anexo 1, Decreto 22.928/1933 47 Anexo 1, Decreto 22.928/1933 116 A inscrição no Livro de Belas Artes mostra a intenção de proteção de monumentos arquitetônicos e sítios urbanos coloniais como obras de arte. Apesar de ter ocorrido o tombamento da Fábrica de Ferro Patriótica (ruínas de arqueologia industrial) no mesmo ano do tombamento de Ouro Preto, conforme citado no Capitulo 2, Item 2.2.3, as ruínas do sistema minerador existentes na Serra de Ouro Preto não foram o foco de interesse do órgão de preservação nacional. O texto intitulado “Igrejas e Capelas de Ouro Preto”, escrito em 12 de junho de 1938, de autoria do engenheiro Epaminondas Vieira de Macedo, documenta a intenção de se executar ações de conservação e restauração dos monumentos e ambientes históricos como “testemunhas mudas de uma era de glória e de esplendor.” (Anexo 07 – Igrejas e Capelas de Ouro Preto). Nesta exposição, o morro de Pascoal da Silva é mencionado como o local onde foram erigidos pelos bandeirantes “os primeiros simbolos da fé católica”49, as Capelas de São João e de Sant’Anna. Não há qualquer menção aos remanescentes das instalações do arraial minerador que originou “a cidade monumento”(grifo nosso). A inscrição de Ouro Preto no Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico tem como referência a Carta de Veneza, como atesta o documento Informação n°110/86 (Anexo 8), que demonstra a intenção do Diretor do Departamento de Tombamento e Conservação em ampliar o caráter do tombamento de Ouro Preto, que partiu de um enfoque artístico, para uma valorização da cidade como ambiente historicamente construído. Informação n°110/86 afirma que além do valor artístico, o acervo representa uma paisagem urbana50. O documento cita a Carta de Veneza, na afirmação de que “a conservação de um monumento implica a de uma moldura à sua escala”51. Os Anexos 9 e 10 são referentes ao processo de inscrição de Ouro Preto nos Livros do Tombo Histórico e Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico. Seguindo esta mesma postura, o Telex (061) 2743 (Anexo 11), de 19 de agosto de 1986, cita o interesse de tombamento da Serra de Ouro Preto para manutenção da moldura paisagística da cidade. Neste contexto, no ano de 1986 inicia-se o processo de delimitação do perímetro de tombamento da cidade, finalizado em 1991 (Anexos de 11 a 15). Conforme pode ser observado nos mapas abaixo e nos mapas que compõem os Anexos 12 e 13, a Serra de Ouro Preto, onde se situa o Morro da Queimada, está inserida do perímetro de tombamento. Porém, conforme atestam os documentos da época (Anexos de 11 a 20, e 22 a 23), o foco das ações 48 Anexo 4 - DOC. 1600 SPHAN ARQUIVO – MINISTÉRIO DA CULTURA 49 Anexo 7 – Igrejas e Capelas de Ouro Preto. 50 Grifo original 51 Carta de Veneza. 117 voltava-se para a manutenção da ambiência do centro histórico, emoldurado pela paisagem montanhosa. Na década de oitenta, as áreas periféricas e as encostas já se apresentavam ocupadas de forma desordenada, processo que se iniciou na metade do século XX. Conforme foi apresentado no Capítulo 3, Item 3.2 O IPHAN em Ouro Preto: o papel do patrimônio arqueológico para a instituição na época do tombamento e seus desdobramentos nas gestões posteriores, num trabalho conjunto entre o IPHAN e outras instituições públicas, foram realizadas uma série de ações em prol da conservação da cidade patrimônio, tanto em relação às páreas construídas, quanto em relação ao ambiente natural que a circunda. Apesar do Telex 149/86 (Anexo 21), emitido pela Coordenadoria de Arqueologia/SPHAN ao Setor de Arqueologia e Patrimônio Natural da 7° DR Ouro Preto, solicitar a inclusão no plano de trabalho dos anos de 1987, 1988 e 1989, de atividades referentes à preservação arqueológica, com base na Lei n° 3924/61, de acordo com as atribuições concernentes à instituição, nenhuma ação relativa à preservação de bens arqueológicos foi encontrada dentre aquelas citadas nos documentos analisados. Figura 20: Delimitação do Perímetro de Tombamento do IPHAN – 1987 Fonte: CD-ROM Arquivo E.T. Ouro Preto-IPHAN. 118 Figura 21: Delimitação do Perímetro de Tombamento do IPHAN – 1989 Fonte: CD-ROM Arquivo E.T. Ouro Preto-IPHAN. Assim, no período compreendido entre a época do tombamento de Ouro Preto até o início da década de noventa, a preocupação do IPHAN estava voltada na preservação do patrimônio de cunho arquitetônico e com conjuntos urbanos coloniais e respectivas molduras paisagísticas das áreas de entorno, conforme atesta a documentação analisada no arquivo administrativo da Casa da Baronesa, confirmando a hipótese original da pesquisa. A Serra de Ouro Preto, quando mencionada, refere-se somente à moldura paisagística do centro histórico. Conforme apresentado no Capítulo 2 desta dissertação, tanto os protocolos internacionais quanto a legislação nacional, na referida época, apresentam-se desenvolvidos sob o ponto de vista dos procedimentos técnico-científicos a serem utilizados nas pesquisas arqueológicas. No entanto, estes protocolos e leis consideram o bem arqueológico de um modo desvinculado das políticas de gestão das cidades. A Lei n° 3924/61, por exemplo, oriunda da Recomendação de Nova Delhi, como citado, dispõe sobre os métodos de escavação empregados, sobretudo, nas escavações dos achados de natureza pré-histórica. 119 Seria somente a partir do final da década de oitenta e início de noventa que surgem as questões relacionadas à preservação do meio-ambiente, considerando-se o ambiente natural conjuntamente com o ambiente construído. E como foi colocado no Capitulo 3, Item 3.2, no ano de 1980, Ouro Preto foi inscrita na lista de Patrimônio Cultural da Humanidade, seguindo as orientações da Convenção de 1972, que teve a intenção de preservar para a comunidade internacional as obras resultantes da interação entre ações humanas e natureza associadas ao patrimônio cultural, que estivessem em perigo iminente de destruição. Cabe aqui lembrar que na Carta de Lausanne, de 1990, o patrimônio arqueológico é considerado um recurso frágil e não renovável. O protocolo aborda a questão das políticas de Conservação Integradas, nas quais os projetos desenvolvimentistas são integrados às políticas de proteção patrimoniais, abrangendo os níveis local, regional e nacional, e contando com a participação de todos os setores da sociedade, sobretudo das populações cujo patrimônio estiver ameaçado, além de especialistas e pesquisadores, o poder público, as empresas privadas. Como foi apontado no Capitulo 2, Item 2.2.3, nesta época, os arqueólogos e gestores do patrimônio relacionaram as causas da depredação de sítios arqueológicos ao desenvolvimento urbano desordenado, e a questões como ausência de estrutura de gestão e falta de políticas públicas que englobassem a preservação dos sítios. Em relação à jurisprudência nacional, o surgimento de leis como a Resolução CONAMA n° 001/86, a Constituição de 88, a Lei n° 9605/98, que dispõe sobre crimes ambientais, a Portaria n° 230/2002-IPHAN, possibilitou às instituições públicas atuarem de modo mais integrado e com maior abrangência na preservação do patrimônio ambiental e cultural brasileiros. Em 1993, o Projeto de Criação da área Municipal de Proteção Ambiental Cachoeira das Andorinhas e Morro da Queimada (Anexo 24), consistiria no primeiro registro da preocupação do poder público com a depredação das ruínas do sistema minerador do século XVIII, existentes no Morro da Queimada, que como apontam os resultados da pesquisa de FONSECA e SOBREIRA (2001), mostrados no Capitulo 3, Item 301, a esta época já se encontrava bastante degradado. O Projeto previa a restauração do conjunto de ruínas e a recuperação paisagística e ambiental da área, de modo integrado à Criação da Área de Preservação Ambiental da Cachoeira das Andorinhas. Consistia numa ação conjunta entre a Prefeitura Municipal e outros órgãos públicos, inclusive o IPHAN, conforme foi visto no Capítulo 3, Item 3.2. Neste contexto, foram realizadas uma série de estudos científicos e inicia-se o movimento para criação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada (Anexos de 25 a 28), gerando documentos como o Laudo preliminar histórico- arqueológico sobre as ruínas do Morro da Queimada Ouro Preto, de 1994, realizado pela equipe do Laboratório de arqueologia da FAFICH/UFMG (Anexo 25). O Laudo aponta 120 criação de um Parque Arqueológico como a principal ação no sentido de deter a destruição das ruínas, implicando em delimitação da área, tombamento, implantação de infraestrutura turística, conjuntamente com a preservação ambiental do lugar. Estes estudos e ações implicaram na determinação legislativa de criação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada, através do Plano Diretor Municipal. O Relatório de Vistoria do Morro da Queimada, Informação ARQUEO n° 64/2000-IPHAN (Anexo 28), realizado pela arqueóloga Alenice Baeta e a Diretora do Escritório Técnico de Ouro Preto, e encaminhado à Superintendência Regional de Minas Gerais, foi o primeiro documento interno encontrado no arquivo do Instituto do Patrimônio, que fizesse referência ao Morro da Queimada como Sítio Arqueológico. O documento relata a importância dos remanescentes da mineração de ouro do século XVIII, constituído por ruínas de residências, mundéus, moinho, currais, dentre outros, além de um conjunto de condutos e suspiros de antigas minas associadas. Percebe-se ainda a preocupação das técnicas do IPHAN com a depredação das ruínas, cuja ocupação avançava em direção ao conjunto mais significativo e conservado, propondo uma ação preventiva para impedir a invasão da área pela comunidade carente do entorno, sugerindo uma reunião dos órgãos envolvidos com a Prefeitura no intuito de cessar a doação de material para construções no local, além de outras irregularidades observadas. Foi proposta também a implementação de um Programa de Revitalização e Valorização do “Parque Arqueológico Histórico”52. É citada uma vistoria conjunta realizada pelo IPHAN, ONG denominada AMA, Polícia Florestal e FEOP/ UFOP. Considera importante um contato com o Procurador da República em Minas Gerais, Dr. José Adércio Leite Sampaio, solicitando um apoio e parceria no sentido de impedir a continuidade das invasões no sítio. Este relatório foi encaminhado pela Chefe de Divisão Técnica da Superintendência Regional ao Superintendente, com a inclusão do seguinte texto: “Cabe lembrar, que o Plano Diretor da cidade de Ouro Preto prevê na Seção 2, artigo 26 o Morro da Queimada em Zona de Proteção Especial, caracterizada como área de interesse paisagístico, ambiental, arqueológico, histórico e de proteção de mananciais de abastecimento de água”53. Neste mesmo ano de 2000, a Fundação Educativa de Ouro Preto, FEOP/UFOP, encaminha ao Ministério Público Estadual ação cautelar (Anexo 29) para tutela do Patrimônio Histórico, visando instaurar ação civil pública, cujo objeto da ação seria a inércia do Poder Público, 52 Grifo original, Anexo 28. 53 Memorando, n.179/00 DT/13° SR/IPHAN, de 03 de outubro de 2000 121 representado pelo IPHAN, o Estado de Minas Gerais e a Prefeitura Municipal de Ouro Preto em deter a depredação do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada. A Municipalidade ainda é acusada de pretender construir uma estrada na área, ligando os morros Santana e São Sebastião. A ação cita a determinação constitucional sobre a competência comum da União, dos Estados e Municípios na proteção dos bens culturais, incluindo-se as paisagens naturais e os sítios arqueológicos. Cita também o Decreto-lei n° 25/37 e o fato do sítio arqueológico em questão situar-se no Município de Ouro Preto, tombado pelo IPHAN. A Constituição do estado de Minas Gerais também é mencionada, assim como o Art. 26. §2° do Plano Diretor Municipal, que dispõe sobre a criação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada. A Procuradoria do Estado de Minas Gerais solicita, então, ao IPHAN, informações que pudessem instruir a defesa do Estado neste processo (Anexo 30). A defesa do IPHAN frente à Ação Civil Pública movida pela FEOP foi realizada através do documento de Contestação da Procuradoria Jurídica do IPHAN (Anexo 31), encaminhada ao Poder Judiciário de Minas Gerais. Inicia-se o documento de contestação questionando-se sobre a competência da Jurisdição Estadual para julgar o caso, já que o IPHAN caracteriza-se como autarquia federal. A Procuradoria do IPHAN argumenta que foi realizada vistoria pela Diretora da 13° Sub- Regional/IPHAN Ouro Preto e pela arqueóloga prestadora de serviços da 13° Superintendência Regional/IPHAN ao sítio em questão, apresentando em anexo o Laudo de Vistoria (Anexo 28). Outro argumento apresentado fundamentou-se no reduzido quadro de funcionários com que contava o Escritório de Ouro Preto, composto pela Diretora, uma historiadora e dois servidores administrativos, insuficiente para atender as demandas geradas pela população, pelo Ministério Público e pela Justiça. Aponta a responsabilidade sobre o cercamento e a vigilância da área à Prefeitura Municipal, e a garantia da integridade do sítio à Polícia Militar de Minas Gerais. Entende que a abertura da estrada pela PMOP não seria aprovada pelo IPHAN, por não se enquadrar à legislação federal para a área. Manifesta-se a favor da previsão legal referente à criação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada. Ressalta que a área do sítio arqueológico, considerada como “área devoluta” (grifo original), deveria ser entregue ao IPHAN ou à UFOP, para que, como proprietários, ou ao menos como posseiros, se encarregassem de sua vigilância. E sugere à Secretaria do Patrimônio da União a demarcação da área das terras devolutas, bem como a definição de sua destinação. Dentre outros pedidos, o IPAN requer que o Município de Ouro Preto seja condenado à desocupação da área, que o Estado de Minas garanta a ordem pública do local, através de sua Polícia Militar, e ainda requer a exclusão do órgão do Patrimônio Federal da Ação Civil Pública, 122 argumentando que não houve negligência por parte do Instituto na vigilância da área do Morro da Queimada, e sim cooperação com a iniciativa de retomada da área invadida. Em documentos referentes ao ano de 2003, pela primeira vez aparece um ofício de notificação extrajudicial de obra irregular citando desmonte e construção sobre as ruínas do Morro da Queimada, como também ofícios comunicando o Ministério Público sobre as ocupações desordenadas da área (Anexos de 37 a 41; 47 a 49 e 71). O envolvimento da comunidade ouropretana na preservação do sítio é observada em correspondência transcrita no Anexo 42, da ONG re-GAR, demonstrando interesse em realizar projeto social envolvendo os moradores de baixa renda que invadiram a área do Morro da Queimada. Uma cópia de correspondência entre a Secretaria Municipal de Patrimônio e Desenvolvimento Urbano à Secretaria de Desenvolvimento Social (Anexo 69), de 2006, solicita a inserção de moradores do Morro da Queimada no Programa de Habitação Social, convênio firmado entre a 13° SR do IPHAN e a Escola de Arquitetura da UFMG. O Programa teve como objetivo desenvolver projetos para a regularização de imóveis pertencentes a moradores carentes do sítio arqueológico do Morro da Queimada que tiveram seus imóveis desapropriados para implantação do parque. Anexo ao documento encontra-se um relatório realizado pelo grupo de trabalho da Escola de Arquitetura, afirmando a importância da Arquitetura Pública para Ouro Preto, considerando- se que a cidade encontrava-se em situação de quase total irregularidade, onde poucos os imóveis são aprovados e regularizados pela Prefeitura Municipal e pelo IPHAN, e os imóveis contemplados pelo Programa representavam uma parcela mínima de tudo que precisa ser regularizado em Ouro Preto, havendo necessidade de ser ampliado com a participação de outras instituições interessadas no assunto. A Secretaria de Meio Ambiente, assim como o Ministério Público, foram acionados pelo IPHAN para auxiliar na preservação da mata nativa do Morro da Queimada (Anexos 65, 67 e 72). Também a Câmara Municipal encaminhou ao IPHAN documento que questionava sobre a depredação do Morro da Queimada e a falta de planejamento urbano e aplicação do Plano Diretor Municipal (Anexo 43). A resposta do IPHAN à Câmara Municipal reafirma a necessidade da utilização efetiva do Plano Diretor e aponta a criação do Parque Arqueológico como instrumento de preservação da área. A participação da Câmara Municipal neste processo também aparece no discurso proferido por seu presidente em 2004, “Ideias básicas para o Plano de Desenvolvimento de Ouro Preto”, onde foi proposto que se fizesse o levantamento arqueológico e se promovesse a reconstituição e proteção ambiental do sítio histórico do Morro da Queimada, em sua área de possível recuperação (Anexo 52). Observa-se então, que a partir de 2000 houve um grande empenho por parte do Escritório de Ouro Preto/IPHAN, no sentido de contribuir para a realização do Projeto de Implantação do 123 Parque Arqueológico do Morro da Queimada, assim como para a efetiva implantação do Parque, buscando-se o apoio da Superintendência de Minas Gerais e da Presidência do IPHAN, assim como de várias instituições públicas e setores da sociedade civil, para a realização deste empreendimento (Anexos de 44 a 46; 53 a 54; 57 a 59; 61, 64, 66, 70, 75, 76, 78, 83, 84, 86 a 88). Destaca-se o esforço do Escritório Técnico de Ouro Preto na captação de recursos junto a instituições como o BNDES e a Petrobrás, para que o Projeto pudesse obter a aprovação junto ao Ministério Público através do PRONAC (Programa Nacional de Apoio a Cultura). A partir da instauração da Ação Civil Pública de 2000, percebe-se também um aumento na quantidade de documentos arquivados pelo Escritório de Ouro Preto/IPHAN, relacionados à responsabilidade do Instituto na preservação do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, correspondências entre o IPHAN e o Ministério Público, tanto em nível Estadual quanto Federal, e também correspondências entre as várias instâncias administrativas do IPHAN (Anexos de 32 a 36; 50, 51, 55, 56, 60, 62, 63, 73, 74, 77, 79, 80, e 85). Com frequência anual, ou até no mesmo ano, percebe-se que o Ministério Público inquiriu e vem arguindo o IPHAN sobre a negligência ou o cumprimento de suas obrigações na proteção do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada. A partir de 2005, quando o Projeto de Implantação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada foi aprovado pelo Ministério da Cultura, o Ministério Público também passou a questionar o IPHAN sobre o andamento do processo de captação de recursos para realização do Projeto e sobre a implantação efetiva do Parque. Outro fato importante que impulsionou o IPHAN a realizar ações ou participar daquelas relacionadas à preservação do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada consistiu na vistoria dos técnicos do ICOMOS a Ouro Preto, onde foi feito um diagnóstico sobre o estado de conservação do Sítio Urbano. O relatório de vistoria da UNESCO requeria que a Municipalidade, o IPHAN e o IEPHA protegessem e preservassem o Sítio Arqueológico do Morro da Queimada (Anexos 62 e 63). Além da participação na aprovação da Lei 465/2008, do Projeto de Implantação do Parque arqueológico do Morro da Queimada junto ao PRONAC/MinC em 2005, a inscrição do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada no Cadastro Nacional de Sítios arqueológicos em 2008 significou um avanço na postura do IPHAN em relação à preservação de sítios arqueológicos inseridos em áreas urbanas tombadas, juntamente com a instituição da Portaria 312/2010. Apesar de tardiamente, o registro do Morro da Queimada mostra o reconhecimento por parte do Instituto do Patrimônio do valor do sítio como testemunho material das primeiras tipologias arquitetônicas da cidade, que guarda preciosos registros da exploração de ouro no início do século XVIII. A ficha do cadastro reafirma o diagnóstico dos documentos do início da década de noventa, como o “Laudo preliminar histórico-arqueológico sobre as ruínas do 124 Morro da Queimada - Ouro Preto”, do Laboratório de Arqueologia da FAFICH/UFMG, sobre a ameaça de destruição eminente do sítio, devido ao processo de ocupação irregular e desordenada das encostas de Ouro Preto, no qual as ruínas vêm sendo desmontadas para aproveitamento das pedras como material de construção, e as estruturas remanescentes vêm sendo utilizadas como base das novas construções. A falta de proteção dos documentos arqueológicos do Morro da Queimada em Ouro Preto é assinalada como o caso mais grave de abandono do patrimônio cultural pelos poderes públicos nas suas diversas esferas. Também é apontada como medida de proteção a criação do Parque Arqueológico, cujo apoio e participação no processo de implantação o IPHAN vem demonstrando empenho, apesar da dificuldade encontrada na captação de recursos para tal empreendimento, como mostram os documentos referentes aos últimos anos da década de 2000. 125 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A Arqueologia, que inicialmente manifestava-se através de abordagens elitistas, surgindo do interesse em encontrar peças valiosas e vestígios de monumentos vinculados à história das grandes civilizações, após a influência de outras ciências humanas tornou-se uma disciplina que busca explicar o comportamento social a partir de suas contradições, através da análise dos registros materiais. De forma semelhante à Arqueologia, a noção de patrimônio superou o enfoque sobre bens culturais artísticos e históricos, referenciado por fatos memoráveis, viabilizando a proteção de bens vinculados a atividades do cotidiano das populações. Em relação aos conjuntos urbanos, antes valorizados por representarem a manifestação arquitetônica de uma época áurea do Brasil colônia, com esta nova postura seriam analisados com base em uma noção mais abrangente, de sítios, nos quais estão incluídos os bens naturais, histórico-culturais e arqueológicos. Os protocolos internacionais de preservação, por serem documentos resultantes dos conceitos e valores da sociedade, assim como a estruturação disciplinar da Arqueologia e da gestão patrimonial, também se tornaram mais abrangentes. O primeiro documento publicado pelo Comitê Internacional ligado à preservação patrimonial na década de trinta, a Carta de Atenas, restringia-se às diretrizes técnicas para práticas de conservação, inclusive aquelas direcionadas à arqueologia, preocupando-se com intervenções em ruínas monumentais. O grupo que a redigiu era composto por especialistas em restauração que focavam a preservação de monumentos isolados. No final da década de sessenta, as orientações referentes à arqueologia eram específicas para os procedimentos da pesquisa. Somente no final da década de sessenta as discussões dos protocolos internacionais abrangeriam questões como a degradação de sítios arqueológicos vinculadas ao crescimento urbano sem planejamento, como atestado pelas Normas de Quito, cujas orientações baseavam-se na conservação integrada. Discussões conceituais sobre a definição de bem arqueológico também surgiram no final da década de sessenta e início de setenta, com a Convenção sobre Patrimônio Arqueológico e Convenção de Paris, cujo conceito de sítio arqueológico passa a ser visto como sendo resultante das ações humanas, ou seja, historicamente construídos sucessivamente por várias gerações. Nos anos seguintes, no entanto, os protocolos produzidos viriam a reafirmar e complementar as diretrizes dos documentos anteriores. Em relação à proteção legal dos bens de natureza arqueológica no Brasil, a Lei n° 3924 de 1961 significou uma conquista na área. A lei foi criada para conter a depredação dos sítios 126 arqueológicos alvo de interesse econômico, como os sambaquis, que estavam sendo utilizados na produção de adubos, cal, fertilizantes, corretivos de solo e pavimentação de estradas. Do processo de concepção da lei participou o arqueólogo Paulo Duarte, também engajado no processo de criação do Instituto de Pré-história da USP, em 1962. Por ter uma postura crítica em sua atuação profissional e politicamente ser contrário à ditadura militar, no final da década de sessenta, Paulo Duarte foi afastado do Instituto pela ditadura militar, que instituiu nesta época o Projeto Nacional de Pesquisa Arqueológica, PRONAPA, onde arqueólogos norte- americanos treinaram os brasileiros em uma prática de campo defasada e desvinculada de interpretações mais amplas, criando uma situação restritiva para a disciplina. Com o fim do regime ditatorial nos anos oitenta, a Arqueologia Histórica ganha força no Brasil, por estar vinculada à restauração das liberdades públicas, resgatando os vestígios, os ideais e os direitos de indígenas, negros e outros povos excluídos das narrativas oficializadas até então. Nos últimos anos as pesquisas realizadas por arqueólogos no Brasil passaram a envolver atividades educativas as quais permitem uma maior interação com a comunidade, assumindo sua responsabilidade social. Outra conquista da legislação brasileira na proteção do patrimônio arqueológico de modo geral foi a Resolução CONAMA n° 001/86, ao estabelecer que sítios e monumentos arqueológicos devem ser considerados nos processos de licenciamento ambiental, complementada em 2002 com a Portaria n°230, que vincula a este processo a exigência de pesquisa arqueológica. Destaca-se ainda a Constituição Federal de 88, que ampliou o conceito do que é considerado patrimônio brasileiro, incluindo os sítios de valor arqueológico, e instituiu novas formas de acautelamento, como inventário, registro e vigilância, além de considerar já tombados bens relevantes como documentos e antigos quilombos, e determinar que os bens arqueológicos são de propriedade da União Federal. Através da Carta Magna de 1988 tornou-se obrigatória a exigência de Estudos de Impacto Ambiental para a liberação de grandes obras de infraestrutura que pudessem provocar impactos negativos ao ambiente. Neste sentido, a Lei de Crimes Ambientais, Lei n° 9.605/ 98, consiste em um marco na legislação brasileira, ampliando a proteção ao patrimônio arqueológico e punindo com mais rigor os crimes contra o patrimônio protegido, tombado ou acautelado de alguma forma. Através desta lei, a exigência do tombamento tornou-se desnecessária, e o denominado meio ambiente sadio passou a abranger, além dos elementos naturais, aqueles de ordem histórica e cultural, que atribuem valores identitários às comunidades. A ampliação deste aparato jurídico, sobretudo em relação à legislação voltada para o meio ambiente, permitiu ao Ministério Público atuar como aliado dos órgãos de preservação, na investigação de processos referentes a delitos contra o patrimônio 127 arqueológico. Apesar de sua importância até os dias atuais, a Lei n° 3924/61, ao definir as categorias do que é considerado como monumento arqueológico ou pré-histórico sob guarda e proteção do Poder Público, não especifica os bens arqueológicos de natureza histórica. As leis vinculadas aos processos de licenciamento ambiental também ficam restritas aos centros urbanos de maior porte, pois são referentes aos grandes empreendimentos. Frente aos riscos e ameaças de destruição que se tornam cada vez mais frequentes na época atual, oriundos de crescimento desordenado e obras de infraestrutura urbana sem planejamento, a preservação de vestígios arqueológicos de natureza histórica, inseridos em Sítios Urbanos Históricos também necessita ser regulamentada. Estudos para a criação de leis que incidam sobre esta categoria de patrimônio estão em fase de desenvolvimento pelo IPHAN. Chega-se assim à análise da atuação do IPHAN, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, originalmente SPHAN, Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, criado em 1936. Desde a época da criação do Instituto até o final da década de setenta, o conceito de patrimônio vinculava-se à valoração pela excepcionalidade, e referia-se ao conjunto de bens móveis e imóveis que se enquadrassem nas categorias histórica e/ou artística. Somente no final da década de setenta, sob coordenação de Aloísio Magalhães, o IPHAN criaria a Divisão de Arqueologia, e somente no século XXI a Arqueologia Histórica deixaria de ser aplicada de maneira pontual nos monumentos e passaria a fazer parte das políticas da instituição de maneira integrada aos processos de reabilitação urbana de sítios históricos. Também é relevante observar que na época da criação do SPHAN, foi estabelecida uma parceria com o Serviço e o Museu Nacional, onde o Museu Nacional assumiu as atribuições do órgão referentes a relacionar jazidas a serem tombadas e elaborar mapas com distribuição geográfica de sítios a serem protegidos. Ao delegar esta responsabilidade ao Museu Nacional, o SPHAN não se estruturou para o cumprimento de suas atribuições na preservação do patrimônio arqueológico, desvirtuando a proposta original, o órgão. Este fato repercute na dificuldade de estruturação da área de arqueologia no IPHAN até os dias atuais, transformando-se numa instituição que prioriza a preservação do patrimônio edificado. Entre o final da década de setenta e início de oitenta, época marcada pelo crescimento desenfreado das cidades e ocupação desordenada das periferias e áreas rurais, vestígios arqueológicos localizados nestes locais de expansão foram destruídos. Para suprir a falta de profissionais no Instituto, foram contratados os chamados representantes do IPHAN para estudos de arqueologia. Ainda na década de oitenta foram criadas as primeiras normas para o gerenciamento das pesquisas arqueológicas em território nacional. A relação dos arqueólogos 128 do Instituto com os membros da SAB, Sociedade Brasileira de Arqueologia, criada na década de oitenta, também repercutiu na preservação do patrimônio arqueológico brasileiro. As discordâncias técnico-operativas ocorridas entre os mesmos ocasionaram um impacto negativo na proteção destes bens até os dias atuais. Com o aumento da demanda referente à análise de processos para obtenção de licenças ambientais, e para o fortalecimento institucional na gestão do patrimônio arqueológico, o IPHAN criou em 2009 o Centro nacional de Arqueologia. Outro avanço do Instituto no sentido de oferecer instrumentos para se estabelecer uma política voltada para a Arqueologia Histórica ocorreu no Seminário Internacional de Reabilitação Urbana de Sítios Históricos, realizado em 2002, organizado pelo Departamento de Proteção do Patrimônio Material, DEPAM/ IPHAN. A discussão do tema Arqueologia aplicada ao processo de reabilitação demonstra a preocupação do Instituto em incluir a Arqueologia no processo de reabilitação de sítios históricos. Porém, também mostra que a disciplina continua sendo vista como auxiliar da Arquitetura, não sendo reconhecida como agente fundamental na definição de parâmetros paradigmáticos para a reabilitação urbana. Um ponto fundamental do Seminário foi a formulação de definições e conceitos referentes a sítios arqueológicos históricos, para fins de gestão e manejo de áreas ou não. Constatou-se que os sítios arqueológicos inseridos em áreas urbanas podem ser pré-históricos ou históricos. Foram definidos como sítios arqueológicos históricos inseridos em áreas urbanas os espaços geográficos delimitados pela presença de vestígios materiais oriundos de processos de ocupação do território pós-contato, como estruturas construídas com o objetivo de defesa; vestígios de infraestrutura; locais onde ocorreram batalhas; antigos cemitérios, quintais, jardins, pátios e heras; estruturas remanescentes de antigas fazendas, senzalas e engenhos; estruturas remanescentes de processos industriais manufatureiros; e outros vestígios que possam contribuir na compreensão da memória nacional pós-contato. Também se destaca entre as ações do IPHAN a realização do I Fórum Nacional do Patrimônio Cultural, no ano de 2009 em Ouro Preto, onde foi produzido um relatório sobre desafios, estratégias e experiências para uma nova gestão do Sistema nacional de Patrimônio Cultural, com a intenção de subsidiar a II Conferência Nacional de Cultura. O relatório das mesas redondas vinculadas ao Patrimônio Arqueológico reafirma as orientações das Cartas Patrimoniais internacionais (Carta de Lausanne e Recomendações R(95) 9) na busca pelo desenvolvimento sustentável, integrando aspectos econômicos, sociais, políticos e culturais nas ações de planejamento territorial. Houve também uma preocupação com as demandas do PAC (Plano 129 de Aceleração do Crescimento do Governo Federal) das Cidades Históricas e suas implicações sobre os recursos arqueológicos presentes nos sistemas urbanos. A pesquisa confirmou a hipótese inicial de que inicialmente, as ações de maior impacto e visibilidade do IPHAN focaram as edificações históricas e núcleos urbanos coloniais, priorização esta que debilitou a área de arqueologia, apesar da demanda de um imenso território, rico em sítios arqueológicos, ameaçado por impactos constantes e crescentes, patrimônio este cuja proteção também foi legalmente atribuída ao IPHAN. Através do levantamento e análise da legislação pertinente à proteção do patrimônio arqueológico brasileiro e da proteção destes bens pelo Instituto do Patrimônio, conclui-se que até a década de oitenta, época em que a degradação dos vestígios arqueológicos tomou grande vulto devido ao crescimento desordenado das cidades e à exploração comercial indiscriminada dos recursos naturais, tanto a jurisprudência quanto a gestão do órgão responsável foram insuficientes para conter a perda irreversível desta parcela do patrimônio nacional. Desta forma, foi através da inserção dos bens de natureza arqueológica em leis ambientais criadas a partir da década de oitenta e do fortalecimento institucional do Ministério Público através da Constituição de 88, conferindo- lhe o instrumento da Ação Civil Pública, que o patrimônio arqueológico passou a ser efetivamente acautelado, principalmente quando este patrimônio estava vinculado à liberação de projetos e obras de infraestrutura impactantes. Em relação à gestão do Sítio Urbano de Ouro Preto pelo IHAN, a pesquisa documental comprovou o que a teoria afirma sobre o tombamento da cidade e enfoque inicial do Instituto do Patrimônio, de um conjunto urbano considerado como monumental obra de arte acabada, congelada e não como sistema dinâmico. Os documentos que registram a gestão do Escritório de Ouro Preto, desde o início da década de oitenta até os dias atuais, mostram que até a década de noventa predominava uma preocupação com a ocupação irregular do entorno paisagístico do centro histórico, surgindo alguns documentos vinculados à preservação ambiental da Serra de Ouro Preto. A partir da década noventa a proteção ambiental da Serra de Ouro Preto tornou-se o assunto predominante nos documentos encontrados sobre a área, também surgindo o tema da preservação do patrimônio arqueológico, cuja incidência se fez mais presente na década de 2000. Além do predomínio de documentos referentes à preservação do patrimônio arqueológico, também se observou que muitos destes documentos estavam ligados ao inquérito instaurado pelo Ministério Público sobre o cumprimento das atribuições do IPHAN na proteção do patrimônio histórico, cultural e arqueológico da área do Morro da Queimada. 130 O diagnóstico dos documentos do início da década de noventa e início de 2000, como por exemplo, o Levantamento Visual do Patrimônio Arqueológico do Morro da Queimada Ouro Preto/ MG, GUIMARÂES (2004), do Laboratório de Arqueologia da FAFICH/UFMG, e o próprio Relatório de Vistoria do IPHAN, Informação Arqueo. n° 64/2000 (Anexo 28), mostram a ameaça de destruição eminente do sítio, devido ao processo de ocupação irregular e desordenada das encostas de Ouro Preto, no qual as ruínas vêm sendo desmontadas para aproveitamento das pedras como material de construção, e as estruturas remanescentes vêm sendo utilizadas como base das novas construções. No caso do Morro da Queimada, os remanescentes arqueológicos e as marcas na paisagem demonstram a grande capacidade dos mineradores setecentistas em transformar o ambiente, ou seja, na época atual, estes vestígios atestam um impactante processo de degradação ambiental iniciado no século XVIII, onde a retirada dos sedimentos das cavas acarretou um processo de erosão do solo, provocando o assoreamento de leitos de rios e córregos e ainda a alteração das propriedades físico-químicas das águas. A captação por meio de canais também desviou o curso dos sistemas hídricos da região. Em um novo contexto sócioeconômico e de outras maneiras, a degradação ambiental do sítio do Morro da Queimada continua a acontecer, extinguindo os vestígios materiais que consistem em códigos de informações, mensagens de nossos antecessores, pelas quais poderíamos aprender sobre as potencialidades e fragilidades dos sistemas ambientais que compõem os sítios, e sobre a própria efemeridade de nossas organizações sociais, indissociáveis destes ambientes. A falta de proteção dos vestígios arqueológicos do Morro da Queimada em Ouro Preto é assinalada nos documentos pelo próprio IPHAN como o caso mais grave de abandono do patrimônio cultural pelos poderes públicos nas suas diversas esferas. Assim como os prognósticos das pesquisas científicas citadas, após décadas de omissão na salvaguarda do patrimônio arqueológico, os próprios ofícios e memorandos do IPHAN a partir de 2000 apontam como medida de proteção do Sítio Arqueológico do Morro da Queimada a criação do Parque. Os documentos mostraram que, apesar da dificuldade encontrada na captação de recursos para a efetivação de tal empreendimento, o Escritório Técnico de Ouro do IPHAN tornou-se, juntamente com a PMOP, o Ministério Público e outras instituições públicas e instâncias da sociedade civil, importante agente na proteção do sítio. Assim como afirmou MENICONI (1999) em relação à gestão do Sítio Urbano de Ouro Preto, dada sua amplitude, a criação do Parque Arqueológico do Morro da queimada ultrapassa o nível local, necessitando fazer parte de um planejamento estratégico. E mesmo sendo um empreendimento municipal, é necessária também uma articulação multi- institucional, envolvendo além dos poderes estadual e federal, o Ministério Público e 131 instituições de fomento. Esta interação entre as várias instâncias governamentais com a participação de arqueólogos também é necessária em ações mais amplas como o planejamento estratégico regional em todo o Estado de Minas Gerais, que concilie desenvolvimento e preservação. Minas Gerais consiste em uma das federações brasileiras de maior extensão territorial, sendo também um dos estados mais industrializados do país, com ênfase no setor da mineração, e que possui grande quantidade de sítios arqueológicos coloniais e pré-coloniais espalhados por todo território. A pesquisa de DELFORGE (2010) indica o uso de Sistema de Informações Georreferenciadas (SIG) de grande utilidade na gestão dos sítios arqueológicos no extenso território mineiro, para identificação, cadastro e monitoramento de riscos deste patrimônio, e assim como as Cartas Arqueológicas Urbanas, permitindo a elaboração de ações preventivas. Apesar dos estudos de Delforge concentrarem-se na gestão dos sítios pré-coloniais, não englobando aqueles referentes ao período a partir do contato europeu, os mapas apresentados pelo arqueólogo (Figuras 17 e 18) nos permitem visualizar que, no Estado de Minas Gerais, a maior incidência de sítios por município encontra-se na porção norte do estado, cuja concentração urbana ainda é mais baixa, fato que possibilita ainda a realização de ações preventivas. Por outro lado, regiões onde predominam o adensamento urbano e a alta exploração econômica, como a Região Central, das Minas e do Triângulo Mineiro, também apresentam grande número de sítios, necessitando de ações urgentes de salvamento. 132 Figura 22: Sítios por município – 1698 sítios pré-coloniais - Estado de Minas Gerais – 2010 Fonte: DELFORGE, 2010, p.76. Figura 23: 867 sítios pré-coloniais georreferenciados - Estado de Minas Gerais – 2010 Fonte: DELFORGE, 2010, p.74. 133 Segundo DELFORGE (2010), o uso do SIG foi incorporado no trabalho cotidiano do Setor de Arqueologia da Coordenação Técnica da Superintendência Regional do IPHAN de Minas Gerais, e já produziu e distribuiu informações internas e externas, sob demanda ao Ministério Público Federal através da Procuradoria da República e do Ministério Público Estadual, através de sua Promotoria Especializada de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico. Em 2009 foram enviadas as informações da primeira tabela de sítios pré-coloniais, com cerca de 430 sítios, e uma tabela com os sítios históricos, com cerca de 130 sítios. De acordo com o pesquisador, este sistema está sendo atualizado frequentemente. Segundo reportagem publicada no Jornal Estado de Minas, no dia 12 de junho de 2011, em agosto deste mesmo ano, o IPHAN irá divulgar o primeiro mapa arqueológico de Minas, com cadastro de 1.053 sítios que abrigam vestígios da época pré-colonial (WERNECK, 2011). Conforme o mapeamento do IPHAN, 213 municípios de Minas tem pelo menos um sítio registrado, sendo que 75% ainda são desconhecidos. O uso do SIG pelo IPHAN em Minas Gerais aponta para um avanço na gestão do patrimônio arqueológico no Estado, facilitando o registro de sítios até então desconhecidos ou não cadastrados no CNSA, como também possibilitando a análise de riscos frente a ameaças como grandes obras, extração mineral, como também ações de vandalismo, fornecendo subsídios para a elaboração de políticas governamentais de proteção ao patrimônio cultural. Além de ocorrências como alargamento das fronteiras agrícolas, mineração, construção de hidrelétricas, a expansão urbana sem planejamento também consiste em uma ameaça atual para o patrimônio arqueológico histórico e pré-histórico. Outra ação pioneira da Superintendência de Minas Gerais é o Termo de Referência que está sendo desenvolvido para a inclusão de bens culturais de qualquer natureza, não só arqueológica, nos processo de licenciamento ambiental. Esta abrangência auxiliaria na proteção dos bens arqueológicos históricos, que ainda não são claramente definidos pela legislação específica, como na Lei 3924/61, necessitando-se de recorrer também à lei de Crimes Ambientais, Lei 9605/98, que considera delito ao patrimônio ambiental os danos causados aos bens naturais e culturais que compõe o ambiente. A problemática da gestão dos sítios arqueológicos, urbanos ou rurais, de forma integrada às estratégias desenvolvimentistas pode ser ampliada ainda para o território brasileiro, onde os estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são menos adensados, com potencial arqueológico mais preservado, porém são locais onde empreendimentos econômicos agrícolas e industriais estão sendo ampliados, assim como as obras de infra-estrutura. E assim como a 134 porção centro-sul de Minas, o sudeste brasileiro já perdeu e continua perdendo grande parte de seu patrimônio arqueológico, demandando políticas urgentes de preservação. Apesar de não ser o foco da pesquisa, a análise da gestão dos sítios arqueológicos frente a contextos econômicos desenvolvimentistas poderia abarcar o grupo dos BRICS, composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, considerados no panorama internacional como países emergentes, cujas projeções de crescimento não priorizam questões como a finitude dos recursos naturais, deixando para segundo plano as análises de risco ambiental. 135 CONCLUSÃO A gestão do patrimônio arqueológico brasileiro ao longo do século XX e princípio do século XXI encontrou dificuldades iniciais como a falta de definição conceitual e científica da disciplina da Arqueologia, cerceada politicamente na época do governo militar, somando-se a isto a ausência de estrutura administrativa do IPHAN na área da arqueologia (prejudicada por intervenções políticas como a extinção do Ministério da Cultura juntamente com a Coordenadoria de Arqueologia nos anos noventa), e a ineficiência de leis que abarcavam de forma satisfatória a preservação do patrimônio arqueológico. Apesar de ainda haver alguns entraves como a necessidade de complementação de algumas leis de preservação do patrimônio arqueológico, abrangendo aqueles de natureza histórica, de ainda ser insuficiente o número de arqueólogos nos diversos setores do Instituto do Patrimônio Nacional (devido à extensão do território brasileiro e o grande número de sítios arqueológicos por ele espalhados), como também haver a questão da falta de qualidade na formação acadêmica de grande parte dos arqueólogos formados e lançados hoje no mercado de trabalho, ações como o registro de sítios históricos como o Morro da Queimada no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos e a inclusão deste sítio na Portaria n° 312/2010 indicam uma nova perspectiva de gestão dos Sítios Urbanos pelo IPHAN. Com esta nova postura, considera-se o patrimônio urbano como resultado dinâmico de uma contínua ocupação humana nos territórios, como sistema construído historicamente em sua dimensão sócio-espacial. Juntamente à implantação do Parque Arqueológico do Morro da Queimada, que ainda precisa ser efetivada, estas ações seguem os parâmetros da Conservação Integrada, pois incluem o sítio arqueológico no cotidiano da cidade, sociabilizando este patrimônio, revertendo uma situação de risco de desaparecimento. A proteção mais efetiva de vestígios arqueológicos inseridos em Sítios Urbanos Históricos, até o presente momento, ainda depende de diretrizes prescritas em portarias e normas criadas pelo IPHAN especificamente para uma determinada cidade ou em Planos Diretores Municipais. Torna-se necessária, desta forma, a criação de uma norma nacional que englobe políticas urbanas e arqueologia, como a regulamentação de obras de infra-estrutura e restauração arquitetônica em Sítios Históricos, vinculando os processos de aprovação e liberação à exigência de pesquisa arqueológica e acompanhamento da obra por um arqueólogo. 136 Outra medida de acautelamento seria o reconhecimento e registro pelo IPHAN do Sírio Arqueológico do Morro da Queimada como Paisagem Cultural, relacionando este sítio com o patrimônio imaterial ali existente, ou seja, as técnicas construtivas em pedra e cal e as técnicas de mineração. Ao ser inscrita em 1938 no Livro de Belas Arte, depois ser reconhecida como Paisagem Urbana em 1986, Ouro Preto concretiza a própria história do IPHAN na gestão do patrimônio cultural brasileiro. Desta maneira, o reconhecimento do Morro da Queimada como Paisagem Cultural Brasileira consistiria em uma atualização e uma maior abrangência conceitual do enfoque da instituição sobre o Sítio Urbano. A maior contribuição deste trabalho foi reunir e sistematizar informações sobre os instrumentos disponíveis de proteção do patrimônio arqueológico brasileiro, sobretudo em uma época em que projetos desenvolvimentistas como as obras do PAC são criados pelo governo federal. Ressalta-se ainda a apresentação inédita das informações contidas no Arquivo Administrativo da Casa da Baronesa, Escritório Técnico de Ouro Preto – IPHAN, referentes ao Sítio Arqueológico do Morro da Queimada, Ouro Preto, MG. O trabalho foi realizado através da análise dos documentos arquivados no Instituto do Patrimônio, tendo sido transcritos ou fotografados aqueles que possuíam informações sobre as políticas e ações específicas de preservação da Serra de Ouro Preto, e sobre as políticas que interviessem em sua preservação. Estes documentos foram apresentados como anexos desta dissertação. Como sugestão para novas pesquisas relacionadas ao tema, entrevistas com diferentes atores da área patrimonial poderiam possibilitar discussões além do conteúdo dos documentos analisados, fornecendo subsídios para a compreensão e associação das informações existentes nestes documentos. Entre estes atores estariam arqueólogos vinculados ao Instituto do Patrimônio Nacional, arqueólogos ligados às instituições de pesquisa e ainda aqueles que atuam como profissionais liberais, principalmente em pesquisas arqueológicas para Relatórios de Impacto Ambiental. Outros atores relevantes também seriam os promotores e procuradores do Ministério Público que atuam na proteção do patrimônio cultural e participaram de inquéritos sobre degradação do patrimônio arqueológico. Uma avaliação sobre a influência de cada dirigente na política do IPHAN também poderia ser avaliada, tanto em relação aos Escritórios Técnicos, como à Superintendência e à Presidência da instituição. A comparação com o caso da preservação do sítio arqueológico minerador de Mariana, que abrange os Morros de Santana e Gogô também poderia ser abordada em outra pesquisa sobre a preservação de sítios arqueológicos pertencentes a sítios urbanos coloniais tombados. 137 Assim, recomenda-se para outros trabalhos na mesma linha de pesquisa verificar a eficácia das políticas de preservação dos sítios urbanos e a preservação do patrimônio arqueológico neles inseridos, frente ao crescimento urbano, aos empreendimentos econômicos e aos projetos desenvolvimentistas governamentais da época atual. Pesquisas nesta área são importantes para se questionar as limitações das políticas atuais e para a proposição de formas de gestão integradas, mais abrangentes. 138 REFERÊNCIAS ACSELRAD, Henri. Discursos da Sustentabilidade Urbana. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, nº 1, p. 79-89, maio 1999. AGUIAR, José. 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Digitais do Tempo: Minas ganha seu primeiro mapeamento arqueológico, feito pelo Iphan, indicando os principais sítios Andrelândia, um deles, comemora 25 anos de preservação do Parque da Serra de Santo Antônio, in Jornal Estado de Minas, p. 26-27, em 12 de junho de 2011, Belo Horizonte, MG. Leis, Portarias, Resoluções e Recomendações Decreto n° 22.928/33 Decreto n° 24.735/34 - IPHAN Decreto-lei n° 25/1937 – IPHAN Decreto-lei n° 2848/40 Lei n° 3924/1961 Decreto-lei n° 227/67 Decreto-lei n° 27/73 - PMOP Lei n° 6513/77 Lei n° 7347/85 Lei n ° 7542/1986 Resolução n ° 001/1986 - CONAMA Constituição federal 1988 Portaria n ° 007/1988 - IPHAN Lei Complementar nº 01/1996 - PMOP. Portaria n ° 241/1998 - IPHAN 150 Lei de Crimes Ambientais n ° 9605/1998 Portaria n ° 230/2002 - IPHAN Portaria n ° 28/2003 - IPHAN Portaria n° 122/2004 – IPHAN Lei n° 465/2008 – PMOP Portaria n° 127/2009 – IPHAN Portaria n° 312/2010 – IPHAN Recomendação 01/2006 – MPF – PRMG Recomendação 04/2010 – MPF – PRMG Recomendação 06/2010 – MPF – PRMG Recomendação 08/2010 – MPF – PRMG Recomendação 10/2010 – MPF – PRMG Recomendação 11/2010 – MPF – PRMG Recomendação 03/2011 – MPF – PRMG Endereços eletrônicos: www.iphan.gov.br - IPHAN, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional www.inah.gov.mx - Instituto Nacional de Antropologia e História do México www.inc.perucultural.org.pe - Instituto Nacional de Cultura do Peru www.cmop.mg.gov.br – Câmara Municipal de Ouro Preto www.mp.mg.gov.br - Ministério Público do Estado de Minas Gerais www.sabnet.com.br - Sociedade de Arqueologia Brasileira http://carloschagas.cnpq.br – Plataforma Carlos Chagas http://www.morrodaqueimada.fiocruz.br/ - Parque Arqueológico do Morro da Queimada http://www.defender.org.br/carta-de-ouro-preto/ Defesa Civil do Patrimônio Histórico 151 APÊNDICES LISTA DE PASTAS PESQUISADAS NO ARQUIVO ADMINISTRATIVO DO E.T.O.P. I – IPHAN 1933-1991 • PROCESSO N°70-T-38 SPHAN/DET SEÇÃO DE HISTÓRIA – CONJUNTO ARQUITETÔNICO E URBANÍSTICO DA CIDADE DE OURO PRETO – VOLUME I 1982 • SUPAM/SEPLAN • 001-PREFEITURA MUNICIPAL DE OURO PRETO-RECEBIDA • Pasta sem referência • 035-DIRETORIA PRÓ-MEMÓRIA-RECEBIDA/EXPEDIDA • 095-REFLORESTAMENTO-PLANTIO DE ÁRVORES • 120-ICOMOS • 135-SÍNTESE DE NOTÍCIAS • RELATÓRIO/VISTORIA • 185-AÇÕES • 205-PRESERVAÇÃO E VALORIZAÇÃO DE OURO PRETO E MARIANA • 240-NOTIFICAÇÃO 1983 • NOTIFICAÇÕES • ATAS REUNIÕES • 001-PMOP-RECE4BIDAS • 005-PMOP-EXPEDIDAS • 050-CORRESPONDÊNCIA NUMERADA • 040-SUPAM/SEPLAN-RECEBIDAS-EXPEDIDAS 1983 • 080-ICOMOS • 085-CARTAS DE VÁRIOS 1983 1984 • CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1984 • 035-FNPM/RECEBIDAS-EXPEDIDAS 84 • 050-CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1984 CONTINUAÇÃO • FISCALIZAÇÃO DE OBRAS 1985 • OFÍCIOS 1985 • 001-ANOTAÇÕES DIVERSAS 1985 • 015-CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1985 • 060-OFÍCIOS/DESPACHOS-BH 1985 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA 1985 1986 • 001-CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA 1986 • 015-CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1986 152 • 020-OFÍCIOS/DESPACHOS-BH 1986 • 100-TELEX RECEBIDA 1987 • 001-CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • 005-CORRESPONDÊNCIA NUMERADA • 010-OFÍCIOS BH • 015-COMUNICADO INTERNO • CONTRATOS E CONVÊNIOS 1988 • 005-CORRESPONDÊNCIA NUMERADA • 010-OFÍCIOS BH 1989 • PARECER PROJETOS EM TRAMITAÇÃO • 02-CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1989 • 04-CÓPIAS OFÍCIOS BH 1989 1990 • 01-CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA 1990 • 02-CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1990 • 05-CÓPIAS OFÍCIOS BH 1990 1991 • CÓPIAS OFÍCIOS • RELATÓRIO DE VISTORIA • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1992 • CÓPIAS OFÍCIOS • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS • CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1992 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA-1992 1993 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • CORRESPONDÊNCIA NUMERADA • CONTRATOS E CONVÊNIOS • OFÍCIOS BH 1993 1994 • OFÍCIOS GAT • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 153 1995 • OFÍCIOS GAT • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1996 • OFÍCIOS GAT • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • CORRESPONDÊNCIA NUMERADA 1997 • OFÍCIO/GABINETE/BH • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • OFÍCIO/13° SRII-OURO PRETO • Pasta sem referência • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA/IPHAN 1998 • OFÍCIO BELO HORIZONTE • OFÍCIO OURO PRETO • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • ORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA IPHAN • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA IPHAN • OFÍCIOS 1999 • MEMORANDOS 1999-ATÉ AGOSTO • MEMORANDOS 1999-A PARTIR DE SETEMBRO 2000 • SÍTIO ARQUEOLÓGICO DO MORRO DA QUEIMADA OURO PRETO-MG • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS 13° SR • CORRESPONDÊNCIAS IPHAN • MEMORANDOS 2000 (ATÉ JUNHO) • MEMORANDOS 2000 (A PARTIR DE JULHO) • OFÍCIO 2000 (ATÉ JUNHO) • OFÍCIOS 2000 (A PARTIR DE JULHO) • OFÍCIOS BH • ATENDIMENTO-13° SUB-REGIONAL II-ANO: 2000 2001 • ATENDIMENTO-13° SUB-REGIONAL II-ANO:2001 • 13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO-MEMORANDOS 2001 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA 2001 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA/IPHAN 2001 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA 13° SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL • 13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO-MEMORANDOS A PARTIR DE JULHO/2001 • OFÍCIOS/BH 2001 154 • 13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO-OFÍCIOS 2001 • 13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO-OFÍCIOS A APRTIR DE AGOSTO/2001 2002 • ATENDIMENTO 2002-13° SUB-REGIONAL-OURO PRETO • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA-2002-13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA-13° SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL 2002-13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO • OFÍCIOS-BH-13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO • 13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO-OFÍCIOS-2002 • 13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO-OFÍCIOS A PARTIR/JULHO • 13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO-MEMORANDOS-2002 • 13° SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO-MEMORANDOS A PARTIR DE AGOSTO 2002 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA-IPHAN-2002-13°SUB-REGIONAL-IPHAN-OURO PRETO 2003 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA-IPHAN-2003-13°SUB-REGIONAL - IPHAN-OURO PRETO • ARTIGOS BENEDITO TADEU DE OLIVEIRA • 13° SUB-REGIONAL- CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL-2003 • OFÍCIOS 2003-PROJUR • OFÍCIOS 13° SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL/BH-2003-13°SUB-REGIONAL- IPHAN-OURO PRETO • 13° SUB-REGIONAL- IPHAN-OURO PRETO-2003-OFÍCIOS • 13° SUB-REGIONAL- IPHAN CONTINUAÇÃO OFÍCIOS 2003 • 13° SUB-REGIONAL- IPHAN CONTINUAÇÃO OFÍCIOS 2003-A PARTIR AGOSTO • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA 13° SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL/BH-2003-13° SUB-REGIONAL- IPHAN-OURO PRETO • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA-2003-13° SUB-REGIONAL- IPHAN-OURO PRETO • 13° SUB-REGIONAL- IPHAN-OURO PRETO-MEMORANDOS-2003 2004 • MEMORANDO/2004 • OFÍCIOS OURO PRETO/2004 • OFÍCIOS 2004-PROJUR • OFÍCIO OBRA IRREGULAR-2004 • OFÍCIOS/13° SR/BELO HORIZONTE/2004 • OFÍCIOS-2004-13° SUB-REGIONAL-IPHAN-A PARTIR DE JUNHO • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA/2004 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA-13° SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL/2004 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA IPHAN/2004 2005 • OFÍCIO-BH-2005 • OFÍCIOS 2005-234-430 • OFÍCIOS PROJUR-2005 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA IPHAN-2005 • OFÍCIO-2005 155 • OFÍCIOS 2005 A PARTIR 431 • CORRESPONDÊNCIA GAT-PMOP-2005 • OFÍCIO OBRA IRREGULAR-2005 • MEMORANDO-2005 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA 13° SR-IPHAN-2005 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA EXTERNA-IPHAN 2006 • GAT-PMOP-SMCP-CORRESPONDÊNCIAS 2006 • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS EXTERNAS-2006 • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS 13° SR-IPHAN-2006 • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS IPHAN-2006 • FORMULÁRIO DE ATENDIMENTO/2006 • OFÍCIOS OBRAS IRREGULARES 2006 • OFÍCIOS 140/2006 ATÉ 386/2006 • OFÍCIOS BH-2006 • OFÍCIOS PROJUR-2006 • OFÍCIOS 2006 • OFÍCIOS 2006 (A PARTIR 651) • OFÍCIOS 2006 (387 ATÉ 650) • MEMORANDOS 2006 2007 • OFÍCIO 2007 • OFÍCIOS 2007 PMOP-SMPDU (de 004 a 248) • OFÍCIOS 2007 PMOP-SMPDU (de 238 a 632) • OFÍCIOS 2007 PMOP-SMPDU (de 314 a 1182) • OFÍCIOS 2007 PMOP-SMPDU (de 630 a 889) • OFÍCIOS 2007 (A PARTIR DE JULHO) PMOP-SMPDU • OFÍCIOS-OBRAS IRREGULARES 2007 • FORMULÁRIO DE ATENDIMENTO/ 2007 • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS-IPHAN 2007 • OFÍCIOS/ BH 2007 • OFÍCIOS-PRJUR 2007 • OFÍCIOS 2007 (de 544 a 1176) • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS-13° SR-IPHAN-2007 • CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA EXTERNA 2007 • MEMORANDOS 2007 (a partir de 001) • MEMORANDOS 2007 2008 • OFÍCIOS-PROJUR 2008 • OFÍCIOS/ BH-2008 • OFÍCIOS 2008 • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS-IPHAN-2008 • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS-13° SR-IPHAN • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS EXTERNAS • OFÍCIOS-OBRA IRREGULAR-2008 • FORMULÁRIO DE ATENDIMENTO/ 2008 • MEMORANDO 2008 156 • MEMORANDOS 2008 • OFÍCIOS 2008 SMPDU – PMOP (de 002 a 227) • OFÍCIOS 2008 SMPDU – PMOP (de 278 a 569) • OFÍCIOS 2008 SMPDU – PMOP (de 567 a 974) • OFÍCIOS 2008 SMPDU – PMOP (de 975 a 1306) 2009 • MEMORANDO 2009 (de 001 a 474) • MEMORANDO 2009 (de 323 a 514) • OFÍCIOS 2087 SMPDU – PMOP (de 003 a 370) • OFÍCIOS 2087 SMPDU – PMOP (de 371 a 639) • OFÍCIOS 2087 SMPDU – PMOP (de 640 a 1017) • OFÍCIOS 2087 SMPDU – PMOP (de 1020 a 1256) • OFÍCIOS 2009 GAB/13° SR • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS-IPHAN-2009 • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS-13° SR-IPHAN-2009 • CORRESPONDÊNCIAS RECEBIDAS EXTERNAS-2009 • OFÍCIOS 2009 PROJUR • OFÍCIOS 2009 OBRAS IRREGULARES • Pasta sem referência (Ofícios) LISTA DE SIGLAS FNPM – Fundação Nacional Pró-Memória GAT – Grupo de Assessoramento Técnico COGEPROM – Coordenação-geral de Promoção do Patrimônio Cultural Brasileiro ICOMOS - International Council on Monuments and Sites IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional PMOP – Prefeitura Municipal de Ouro Preto PROJUR – Procuradoria Jurídica do IPHAN PRONAC – Programa Nacional de Apoio à cultura SEPLAN – Secretaria de Planejamento SEMMA – Secretaria Municipal de Meio Ambiente SMCP – Secretaria Municipal de Cultura e Patrimônio SMPDU – Secretaria Municipal de Patrimônio e Desenvolvimento Urbano SUPAM – Superintendência de Articulação com os Municípios 157 NOMENCLATURA E SIGLAS DO INSTITUTO DE PRESERVAÇÃO NACIONAL E RESPECTIVOS PERÍODOS DE VIGÊNCIA NOME SIGLA PERÍODO Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional SPHAN 1937 - 1946 Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional DPHAN 1946-1970 Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional IPHAN 1970 - 1979 Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional SPHAN 1979 - 1981 Subsecretaria do IPHAN SPHAN 1981 - 1985 Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional SPHAN 1985 - 1990 Instituto Brasileiro de Patrimônio e Cultura IBPC 1990 - 1994 Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional IPHAN 1994 - ... Fonte: Adaptado de CERQUEIRA (2006) QUADROS DE DIRIGENETES DO IPHAN PRESIDÊNTES DO IPHAN INÍCIO TÉRMINO Rodrigo Melo Franco de Andrade 1937 1967 Renato Soeiro 1967 1979 Aloísio Sérgio Magalhães 1979 1982 Irapoan Cavalcanti Lyra 1982 1985 Angelo Oswaldo de Araújo Santos 1985 1987 Oswaldo José de Campos Melo 1987 1988 Augusto Carlos da Silva Telles 1988 1989 Ítalo Campofiorito 1989 1990 Lélia Gontijo Soares 1990 1991 Jayme Zettel 1991 1993 Francisco Manoel Melo Franco 1993 1994 Glauco de Oliveira Campello 1994 1999 Carlos Henrique Heck 1999 2003 Maria Elisa Costa 2003 2004 Antônio Augusto Arantes 2004 2006 Luiz Fernando de Almeida 2006 ... Fonte: Adaptado de CERQUEIRA (2006) 158 SUPERINTENDENTES DE MINAS GERAIS INÍCIO TÉRMINO Cláudio A. Magalhães Alves 1987 1991 Regina Celi Correa Cardoso 1991 1991 Ricardo Samuel 1991 1993 Cláudia Márcia Freire Lage 1993 1998 Marília Machado Rangel 1999 1999 Sérgio da Silva Abrahão 1999 2002 Maria Izabel Braga da Câmara 2003 2003 Fabiano Lopes de Paula 2003 2006 Leonardo Barreto de Oliveira 2006 ... Fonte: Adaptado de CERQUEIRA (2006) DIRETORES DO E.T.O.P.I - IPHAN INÍCIO TÉRMINO José Thomaz Gama da Silva 1982 1985 Dimas Dario Guedes 1985 1987 Eduardo Beggiato 1987 1991 Janice Maria do Nascimento 1991 1994 Rodrigo Meniconi 1994 1996 Marcos Olender 1997 1998 Vanessa Araújo Braide 1998 2000 Maria Cristina Cairo e Silva 2000 2000 Marta D’Emery 2000 2002 Benedito Tadeu de Oliveira 2002 2009 Rafael Arrelaro 2009 ... Elaborado por: Maria Raquel Alves Ferreira, com base nos documentos pesquisados no Escritório Técnico de Ouro Preto – IPHAN, informações obtidas com a historiadora do ETOP Simone Fernandes, e consulta ao site http://lattes.cnpq.b