UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA MÁRCIO MOTA PEREIRA SABER E HONRA: A TRAJETÓRIA DO NATURALISTA LUSO-BRASILEIRO JOAQUIM VELOSO DE MIRANDA E AS PESQUISAS EM HISTÓRIA NATURAL NA CAPITANIA DE MINAS GERAIS (1746-1816) Belo Horizonte - MG 2018 MÁRCIO MOTA PEREIRA SABER E HONRA: A TRAJETÓRIA DO NATURALISTA LUSO-BRASILEIRO JOAQUIM VELOSO DE MIRANDA E AS PESQUISAS EM HISTÓRIA NATURAL NA CAPITANIA DE MINAS GERAIS (1746-1816) Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Doutor em História. Linha de Pesquisa: Ciência e Cultura na História Orientadora: Profª. Drª. Júnia Ferreira Furtado Belo Horizonte – MG Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais Programa de Pós-Graduação em História 2018 981.51 P436s 2018 Pereira, Márcio Mota Saber e honra [manuscrito] : a trajetória do naturalista luso-brasileiro Joaquim Veloso de Miranda e as pesquisas em história natural na capitania de Minas Gerais (1746-1816) / Márcio Mota Pereira. - 2018. 412 f. : il. Orientadora: Júnia Ferreira Furtado. Tese (doutorado) - Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Inclui bibliografia 1.História – Teses.2. Ciência – História - Teses. 3. História natural - Teses. 3.Miranda, Joaquim Vellozo de, 1733?-1816. 4. Minas Gerais – História - Teses. I.Furtado, Júnia Ferreira. II. Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. III. Título. Para minha mãe, Manoelina. Para minha esposa, Ana Carolina. Com amor! AGRADECIMENTOS Não poderia deixar de oferecer meu primeiro agradecimento à minha orientadora ao longo dos últimos anos, professora Júnia Ferreira Furtado, por ter me acolhido e depositado imensa confiança em minha proposta de pesquisa. A ela deixo expressa minha admiração pessoal e acadêmica, bem como uma imensa dívida pelos muitos créditos de aprendizagem, pelas sugestões, orientações, paciente leitura e re-leitura da Tese, assim como por sua generosidade em partilhar suas análises e considerações. Também sou grato aos docentes de quem fui aluno no Programa de Pós-Graduação em História, da Universidade Federal de Minas Gerais, a saber; Profº. José Newton Coelho Meneses, Profª. Júnia Ferreira Furtado, Profª. Kátia Gerab Baggio, Profº. Luiz Carlos Villalta, e Profª. Vanicléia Silva Santos. A vocês, agradeço por colaborarem com valiosas contribuições e reflexões sobre o tema de minha pesquisa, e pela oportunidade de aprender e compartilhar conhecimentos que tornaram a presente Tese um trabalho realizado por muitas mãos. À Edilene Oliveira e ao Maurício Mainart, agradeço pela sempre presente cordialidade na secretaria e imprescindível auxílio junto aos trâmites institucionais da Universidade. À professora Regina Horta Duarte e ao professor Caio César Boschi, presentes na Banca de Qualificação, agradeço pelas preciosas contribuições que com atenção procurei seguir. Também são seus meus mais sinceros agradecimentos. Não poderia deixar de agradecer aos colaboradores e colaboradoras dos vários arquivos, bibliotecas e demais instituições em que pesquisei. Assim, em Belo Horizonte, expresso minha gratidão aos funcionários do Arquivo Público Mineiro; do Setor de Obras Raras da Biblioteca Estadual Luiz de Bessa, e à Diná Marques, do Setor de Obras Raras da Biblioteca Central da UFMG, por me facultar o acesso ao valioso material sob sua responsabilidade. Em Ouro Preto, agradeço a Marco Antônio Ferreira Pedrosa, da Fundação Gorceix, pelo relatório de estudos técnicos realizados para a criação do Monumento Natural Jardim Botânico de Ouro Preto; à Bete e à Lúcia, do Arquivo Histórico do Museu da Inconfidência, “Casa do Pilar”, ao Márcio Freitas, residente que é no sobrado que foi de Joaquim Veloso de Miranda, e ao cordial Robson Campos, d“O Passo”. Em Mariana, agradeço aos funcionários da Casa Setecentista e do Arquivo Eclesiástico Dom Oscar de Oliveira, antigo Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana. No Rio de Janeiro, agradeço aos funcionários do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e principalmente da Fundação Biblioteca Nacional, pela sempre presente atenção e presteza ali existentes. Em Portugal, agradeço aos funcionários do Arquivo Histórico da Universidade de Coimbra e do Arquivo Histórico do Museu Bocage, pelo valioso auxílio, ainda que a distância. A Luís Beleza Vaz, de Vila Nova do Famalicão, agradeço pelo auxílio com a genealogia dos Veloso de Miranda. Em Santana dos Montes, agradeço ao José Geraldo, o “Bolão”, que coincidentemente encontrei e que compartilhou comigo seu interesse pela história do velho arraial do Morro do Chapéu. Neste local, também rendo meus agradecimentos ao Isaías, da Fazenda Cachoeira do Santinho, por seu auxílio e precisão na localização das ruínas da Fazenda de Mau Cabelo. À Creide e Patrícia, filhas do Sr. Josino Teixeira, agradeço pelas informações prestadas sobre a Fazenda do Mau Cabelo. Ao Sr. Josino, em especial, herdeiro que é das histórias desta fazenda, agradeço pelas horas de conversa sobre a velha propriedade que havia sido de seu pai, também por nome Josino, conhecido que era na região por Neném do Mau Cabelo, referência que assinala que há algum tempo este era importante e conhecido topônimo, conquanto os últimos anos e o destino tenham feito o mesmo cair no quase total esquecimento. No intercurso do doutorado, agradeço à professora Vanicléia Silva Santos, ao professor José Newton Coelho Meneses, e à minha orientadora de mestrado, professora Lucia Maria Lippi Oliveira, pelas cartas que gentilmente me concederam para pleitear uma permanência em Lisboa, por meio da Cátedra Jaime Cortesão, da Universidade de São Paulo. Concomitantemente, agradeço à minha orientadora, professora Júnia Ferreira Furtado, pelo incondicional apoio quando de minhas candidaturas ao estágio sanduíche. Em Portugal, não poderia deixar de agradecer a professora Ângela Maria Vieira Domingues, por sua cordialidade, atenção e por se disponibilizar, em duas ocasiões, a ser minha co-orientadora. Ao CNPq agradeço pelo valioso fomento, sem o qual não seria possível a realização desse extenso trabalho. De todos os agradecimentos, no entanto, os mais importantes são aqueles que expresso aos meus, ou melhor, às minhas. À minha mãe, Manoelina, pelo amor, pela vida e por não medir esforços para me proporcionar a melhor educação. Por ela eu sou o que sou hoje. À Ana Carolina, minha esposa, agradeço pelo amor, pela paciência e pela cumplicidade nos estudos. Ao meu pai, que virou saudades, mesmo estando longe, sei que você falava bem deste seu bacuri, e com orgulho do que eu faço, ou do que eu fiz. RESUMO O objetivo da tese é analisar as pesquisas realizadas pelo naturalista luso-brasileiro Joaquim Veloso de Miranda, durante as últimas décadas do século XVIII e primeiros anos do século posterior, na capitania de Minas Gerais. Para tanto, utilizamos de considerável acervo composto por fontes primárias, muitas das quais inéditas, e responsáveis por expor aspectos de sua formação acadêmica, de suas relações sociais e de suas pesquisas científicas, somadas à revisão bibliográfica, com a qual situamos esse personagem no âmbito de sua temporalidade. Ao longo do século setecentista, sob o signo do Iluminismo, vários mazombos, ou seja, naturais do Brasil e filhos de pais portugueses, partiram para a Europa para estudar nas instituições acadêmicas daquele continente, sobretudo a Universidade de Coimbra, onde pretendiam adquirir formação universitária e ascender socialmente por meio da educação, no intuito de servirem à Coroa, e auferirem não apenas as mercês decorrentes de tais práticas, mas também a honra por ser útil ao Estado português. Após sua permanência em Coimbra, Joaquim Veloso de Miranda, aqui historicizado no âmbito desse cenário, retornou à sua pátria, Minas Gerais, onde se tornou um homem de confiança da administração da capitania e um dos mais importantes naturalistas de sua geração. Nesse ínterim, procuramos corroborar a hipótese de que esse savant luso-brasileiro, assim como fizeram seus pares, utilizou da formação acadêmica e da produção de conhecimentos científicos para notabilizar-se no âmbito da sociedade portuguesa, tendo sido responsável por praticar e não apenas por reproduzir o fazer científico em sua Pátria. Palavras chave: Ciência Iluminista; História Natural; Joaquim Veloso de Miranda; Jardim Botânico; Minas Gerais. ABSTRACT The aim of the thesis is to analyze the researches carried out by the Portuguese-Brazilian naturalist Joaquim Veloso de Miranda during the last decades of the 18th century and the first years of the later century in the captaincy of Minas Gerais, Brazil. For this, we use a considerable collection of primary sources, many of them unpublished, and responsible for exposing aspects of their academic formation, social relations and scientific research, together with the bibliographical revision, with which we situate this person in the scope of its temporality. Throughout the Eighteenth century, several mazombos, that is, Brazilian natives and sons of Portuguese parents, went to Europe to study in in the various academic institutions of that continent, especially the University of Coimbra, where they wanted to acquire university education and to ascend socially through education, in order to serve the Portuguese Impire, and to receive not only the favors derived from such practices, but also the honor of being useful to the Portuguese State. After his stay in Coimbra, Joaquim Veloso de Miranda, here historicized under this scenario, returned to his homeland, Minas Gerais, where he became a man of confidence of the regional administration and one of the most important naturalists of his generation. In the meantime, we sought to corroborate the hypothesis that this Luso-Brazilian savant, as did his peers, used the academic carrer and the production of scientific knowledge to become famous in the Portuguese society, having been responsible for practicing and not just for reproduce the scientific knowledge in their homeland. Keywords: Enlightenment Science; Natural History; Joaquim Veloso de Miranda; Botanical Garden; Minas Gerais. LISTAS LISTA DE IMAGENS IMAGEM 1 Modelo de Diários Filosóficos para preenchimento pelos naturalistas viajantes 109 IMAGEM 2 Modelo de Diários Filosóficos para preenchimento pelos naturalistas viajantes 109 IMAGEM 3 Imagens atribuídas a Joaquim Veloso de Miranda, publicadas no Florae et Faunae Lusitanicae Specimen (1788), de Domenico Vandelli 163 IMAGEM 4 Imagens atribuídas a Joaquim Veloso de Miranda, publicadas no Florae et Faunae Lusitanicae Specimen (1788), de Domenico Vandelli 164 IMAGEM 5 Imagem atribuídas a Joaquim Veloso de Miranda, publicadas no Florae et Faunae Lusitanicae Specimen (1788), de Domenico Vandelli 164 IMAGEM 6 Imagem atribuídas a Joaquim Veloso de Miranda, em carta endereçada de Domenico Vandelli para Sir Joseph Banks 165 IMAGEM 7 Imagem atribuídas a Joaquim Veloso de Miranda, em carta endereçada de Domenico Vandelli para Sir Joseph Banks 165 IMAGEM 8 Imagem atribuídas a Joaquim Veloso de Miranda, em carta endereçada de Domenico Vandelli para Sir Joseph Banks 166 IMAGENS 9 Imagem atribuídas a Joaquim Veloso de Miranda, em carta endereçada de Domenico Vandelli para Sir Joseph Banks 166 IMAGEM 10 Imagem atribuídas a Joaquim Veloso de Miranda, em carta endereçada de Domenico Vandelli para Sir Joseph Banks 167 IMAGEM 11 Imagem atribuídas a Joaquim Veloso de Miranda, em carta endereçada de Domenico Vandelli para Sir Joseph Banks 167 IMAGEM 12 Prospecto dos jardins da Chácara e Cassa Episcopal, em Mariana 175 IMAGEM 13 Prospecto dos jardins da Chácara e Cassa Episcopal, em Mariana 175 IMAGEM 14 Equipamento hidráulico utilizado para retirar água das minas de ouro e diamantes 180 IMAGEM 15 Gravura do Jardim Botânico da Bahia 205 IMAGEM 16 Gravura da fonte e tanque do Horto e Jardim Botânico de Vila Rica 214 IMAGEM 17 Gravura da fonte e tanque do Horto e Jardim Botânico de Vila Rica 215 IMAGEM 18 Fotografia atual da antiga Casa de vivenda para o Horto e Jardim Botânico de Villa Rica 215 IMAGEM 19 Fotografia atual dos jardins do Horto e Jardim Botânico de Villa Rica 216 IMAGEM 20 Fotografia atual dos muros de contenção dos jardins do Horto e Jardim Botânico de Villa Rica 216 IMAGEM 21 Fotografia atual da fonte e tanque que pertenceram ao Horto e Jardim Botânico de Vila Rica 217 IMAGEM 22 Fotografia atuais das ruínas da Fazenda do Mau Cabelo 266 IMAGEM 23 Fotografia atuais das ruínas da Fazenda do Mau Cabelo 267 IMAGEM 24 Fotografia atuais das ruínas da Fazenda do Mau Cabelo 267 IMAGEM 25 Fotografia atuais dos antigos moinhos da Fazenda do Mau Cabelo 268 IMAGEM 26 Fotografia atuais dos antigos moinhos da Fazenda do Mau Cabelo 268 IMAGEM 27 Fotografia atual do “mais alcantilado dos rochedos” 269 LISTA DE MAPAS MAPA 1 Mapa das Salitreiras Naturais de Linhares, na Mata do Distrito da Formiga, vertentes do Rio São Francisco 189 MAPA 2 Plano [de Belém] do Pará e Horto de São José 203 MAPA 3 Mapa Topográfico do Orto Botanico do Ouro Preto 214 MAPA 4 Mapa da Conquista do Mestre de Campos Regente Chefe da Legião Inácio Correia Pamplona 245 LISTA DE TABELAS TABELA 1 Escravos de Joaquim Veloso de Miranda (1816), por suas origens étnicas e geográficas 279 TABELA 2 Escravos de Joaquim Veloso de Miranda (1816), por suas idades, valores e profissões 284 TABELA 3 Impressos da livraria particular de Joaquim Veloso de Miranda, por áreas de conhecimento 298 ABREVIATURAS 1 – Arquivos, Bibliotecas e outras Instituições ACL – Academia de Ciências de Lisboa ACMSP – Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo ACRL – Academia Real das Ciências de Lisboa AEDOO – Arquivo Eclesiástico Dom Oscar de Oliveira (Antigo AEAM – Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana) AHCSM – Arquivo Histórico da Casa Setecentista de Mariana AHEx – Arquivo Histórico do Exército Brasileiro AHI – Arquivo Histórico do Itamaraty AHMB – Arquivo Histórico do Museu Bocage AHMI – Arquivo Histórico do Museu da Inconfidência, “Casa do Pilar” AHU – Arquivo Histórico Ultramarino AML – Arquivo Municipal de Lisboa AMP – Arquivo do Museu Paulista ANRJ – Arquivo Nacional do Rio de Janeiro ANTT – Arquivo Nacional da Torre do Tombo APEP – Arquivo Público do Estado do Pará APM – Arquivo Público Mineiro AUC – Arquivo da Universidade de Coimbra BNP – Biblioteca Nacional de Portugal FBN – Fundação Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IEB – Instituto de Estudos Brasileiros IEPHA – Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais IHGB – Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro MCUL – Museu de Ciências da Universidade de Lisboa NHM – Museu de História Natural de Londres 2 – Fundos e Coleções AHU, BA – Arquivo Histórico Ultramarino, Bahia AHU, CE – Arquivo Histórico Ultramarino, Ceará AHU, ES – Arquivo Histórico Ultramarino, Espírito Santo AHU, MA – Arquivo Histórico Ultramarino, Maranhão AHU, MG – Arquivo Histórico Ultramarino, Minas Gerais AHU, MT – Arquivo Histórico Ultramarino, Mato Grosso AHU, PE – Arquivo Histórico Ultramarino, Pernambuco AMP, FJB – Arquivo do Museu Paulista, Fundo José Bonifácio ANRJ, CC – Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, Casa dos Contos APM, CC – Arquivo Público Mineiro, Casa dos Contos APM, CMOP – Arquivo Público Mineiro, Câmara Municipal de Ouro Preto APM, FCMM - Arquivo Público Mineiro, Fundo Câmara Municipal de Mariana. APM, RT - Arquivo Público Mineiro, Registro de Terras APM, SC – Arquivo Público Mineiro, Secretaria do Governo da Capitania APM, SG – Arquivo Público Mineiro, Secretaria do Governo da Província FBN, CC – Biblioteca Nacional, Casa dos Contos FBN, FA – Biblioteca Nacional, Coelção Freire Alemão 3 – Impressos e Periódicos AFBN – Anais da [Fundação] Biblioteca Nacional AMHN – Anais do Museu Histórico Nacional RAPM – Revista do Arquivo Público Mineiro RIHGB – Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro RIHGMG – Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais RIHGSJDR – Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei 4 – Gerais C.f.: Conferir Cx.: Caixa Doc.: Documento Fl./Fls.: Folha/Folhas Nº./nº.: Número P./p.: página Vol.: Volume SUMÁRIO INTRODUÇÃO 15 Apresentação do tema 15 Apresentação dos capítulos e Metodologia 27 PARTE 1 – DE MAZOMBO A “NATURALISTA A SERVIÇO DO REI”: A FORMAÇÃO DO ILUSTRADO LUSO-BRASILEIRO JOAQUIM VELOSO DE MIRANDA 39 CAPÍTULO 1 – JOAQUIM VELOSO DE MIRANDA E SEU TEMPO 40 1.1 – De qual Veloso vamos falar? 40 1.2 – Os Veloso de Miranda: um clã mazombo 52 1.3 – Joaquim Veloso de Miranda: entre a fé e as ciências 70 CAPÍTULO 2 – DA ESTOLA À HISTÓRIA NATURAL: A TRAJETÓRIA DE VELOSO DE MIRANDA NA UNIVERSIDADE DE COIMBRA 77 2.1 – Um mazombo vai para Coimbra 77 2.2 – A formação acadêmica de Joaquim Veloso de Miranda em Coimbra 80 2.3 – De aluno a mestre: um ano de professorado 93 CAPÍTULO 3 – O MOVIMENTO ILUSTRADO LUSO-BRASILEIRO: INSTITUIÇÕES, POLÍTICAS, PERSONAGENS E PROCEDIMENTOS PARA O ESTUDO DA HISTÓRIA NATURAL 98 3.1 – A Academia Real de Ciências de Lisboa 99 3.2 – A tipografia da Academia Real de Ciências de Lisboa 102 3.3 – As instruções para as viagens filosóficas e para o estudo da História Natural no além-mar 105 3.4 – Conhecer para dominar: os filósofos luso-brasileiros e as viagens filosóficas 115 3.4.1 – Alexandre Rodrigues Ferreira 115 3.4.2 – João da Silva Feijó 120 3.4.3 – Joaquim José da Silva 123 3.4.4 – Manuel Galvão da Silva 126 3.5 – A política ilustrada de Dom Rodrigo de Souza Coutinho 132 PARTE 2 – UM SAVANT MAZOMBO DE VOLTA ÀS MINAS 146 CAPÍTULO 4 – DAMIÃO DOS SAIS, VELOSO DAS VELLÓSIAS: ENTRE PESQUISAS BOTÂNICAS E MINERALÓGICAS 147 4.1 – De volta às Minas, um padre sem batinas 147 4.2 – Um naturalista pioneiro 159 4.3 – “Ao lento fogo, com que sábio tira, Os úteis sais da terra”: a mineralogia de Damião 177 CAPÍTULO 5 – UM HORTO E JARDIM BOTÂNICO EM VILA RICA 198 5.1 – Sobre hortos e jardins botânicos na América portuguesa 198 5.2 – Horto e Jardim Botânico de Vila Rica: um espaço de pesquisas em História Natural das Minas 209 CAPÍTULO 6 – ALVÉOLOS DE UMA GRANDE COLMEIA: VELOSO DE MIRANDA E SEUS AUXILIARES NAS MINAS 227 6.1 – Entre assessores e observadores privilegiados 227 6.1.1 – Antônio José Vieira de Carvalho, o cirurgião 229 6.1.2 – Luiz José de Godói Torres, o médico 235 6.1.3 – João Gomes da Silveira de Mendonça, o militar 239 6.1.4 – Manoel Ribeiro Guimarães, o engenheiro 244 6.1.5 – Apolinário de Souza Caldas, riscador e pintor 246 6.1.6 – José Gervásio de Souza Lobo, o riscador 248 6.1.7 – Escravos afeitos à História Natural 254 CAPÍTULO 7 – “FILÓSOFO NATURALISTA A SERVIÇO DO REI” E DE SI MESMO 257 7.1 – A Secretaria do Governo da Capitania (1799-1804) 257 7.2 – A Fazenda do Mau Cabelo e o legado que não foi 263 7.2.1 – A produção de salitre 270 7.2.2 – Milho, rezes e chapéus 276 7.3 – As mãos e os pés do naturalista 278 7.4 – “No remanso da filosofia”: o simples viver no Mau Cabelo 285 CAPÍTULO 8 – A BIBLIOTECA VELOSIANA 291 8.1 – Das livrarias e dos seus préstimos nos sertões do ouro 292 8.2 – A biblioteca velosiana 296 CONCLUSÃO 308 REFERÊNCIAS 322 15 INTRODUÇÃO Apresentação do Tema Essa tese se debruça sobre a vida do naturalista luso-brasileiro Joaquim Veloso de Miranda (1746-1816), com vistas a analisar sua formação e sua atuação no campo das Ciências Naturais, exercida no âmbito do império português, especialmente na capitania de Minas Gerais. Ao focar esse espaço americano, no contexto do Iluminismo, entre fins do século XVIII e início do século XIX, busca-se questionar as tradicionais noções de centro e periferia no campo da produção do conhecimento científico. Para além das questões concernentes ao desenvolvimento da ciência, pretendeu-se também compreender como sua trajetória intelectual contribuiu para sua ascensão social, intercambiando saber por honra. Veloso de Miranda, como outros ilustrados que atuaram na América portuguesa, por essa época, esquadrinharam a natureza local com o intuito a estuda-la e conhecê-la, com vistas ao seu aproveitamento econômico e, por meio dessa atuação, transformaram a antiga colônia portuguesa num vasto laboratório científico. Para compreender esse cenário, buscou-se discutir a interação que esse naturalista teve com o mundo social, político, econômico e científico que o cercava valendo-se, por vezes, de fontes ainda não estudadas pelos historiadores que até o momento se debruçaram sobre sua vida. Também buscou-se problematizar a relação metrópole versus colônia que foi estabelecida entre Portugal e a América portuguesa, recortando-se o espaço das Minas Gerais. Tal problematização tem sido feita nos campos da política, da economia, e da sociedade, que aqui também se abordou, mas a ênfase recaiu sobre as Ciências Naturais, mais precisamente a Botânica, enquanto área estratégica tanto para a formulação do conhecimento, quanto para a exploração econômica, vitais para o desenvolvimento do império em um momento de acirrada competição econômica entre as nações europeias, sob o signo do capitalismo nascente. 1 O tema desta pesquisa surgiu durante a redação de minha Dissertação de Mestrado, em 2012. Ao longo da pesquisa, investigando a Historiografia que trata da 1 C.f. CABRAL DE MELLO, Evaldo. A fronda dos mazombos: nobres contra mascates. Rio de Janeiro: Editora 34, 2003; FURTADO, Júnia Ferreira. Homens de negócio: a interiorização da metrópole e do comércio nas minas setecentistas. São Paulo: Hucitec, 2006; HESPANHA, Manuel; XAVIER, Ângela. As redes clientelares. MATTOSO, José (Org.). História de Portugal: o antigo regime. Lisboa: Editorial Estampa, 1993, vol. 4, p. 281-393, e LUNA, Francisco Vidal. Economia e sociedade em Minas Gerais (período colonial). Revista do Instituto de Estudos Brasileiros (24): 33 a 40, 1982; DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Aspectos da Ilustração no Brasil. RIHGB, vol. 278, 1968; RAMINELLI, Ronald. Viagens ultramarinas. Monarcas, vassalos e governo a distância. São Paulo: Alameda, 2008, e outros. 16 interação entre o homem e o ambiente ao longo da história brasileira, tomei ciência da participação de alguns naturalistas luso-brasileiros que se dedicaram, ao longo da segunda metade do século XVIII e dos primeiros anos do século seguinte, ao trato da História Natural nas conquistas portuguesas. Entre eles, estava José Vieira Couto, cuja trajetória se cruzava com um de seus pares, Joaquim Veloso de Miranda, até então desconhecido para mim. A partir de algumas pesquisas prévias sobre a participação destes personagens na historiografia luso-brasileira, abriu-se, então, um vasto e próspero campo de estudos, que despertou meu interesse. No intuito de visualizar a importância de Veloso de Miranda para a História das Ciências, torna-se necessário analisar o contexto cultural, social, econômico e científico em que este naturalista estava inserido, desde sua mais tenra idade, em época de primeiras letras, até quando de seu falecimento, em sua fazenda nos arredores de Ouro Branco, sendo este o recorte cronológico que circunscreve essa pesquisa, que se estende entre 1746 e 1816. Sabe-se que este foi um período de intensas mudanças políticas e econômicas tanto na Europa, quanto na América, com acontecimentos que repercutiram na vida de Veloso de Miranda. Ao contextualizar sua vida em relação ao mundo que o cercava, procurou-se responder algumas questões norteadoras, as quais versam, principalmente, sobre a influência dos saberes pragmáticos no seu percurso intelectual, sobre o círculo de letrados que frequentava tanto em Portugal quanto nas Minas, sobre sua produção intelectual, seus bens e, de modo geral, sua postura para com a sociedade em que estava inserido. Joaquim Veloso de Miranda era oriundo do arraial do Inficionado, termo da Cidade de Mariana. Enquanto mazombo, ou seja, natural da terra e filho de pai Reinol, alçaria desde as Minas a trajetória de letrado buscando, em Coimbra, após concluir seus estudos no Seminário da Boa Morte, na Cidade de Mariana, o complemento intelectual que almejava. O momento em que se estabeleceu em Portugal, contudo, era de mudanças, grande parte das quais relacionadas às ações reformistas colocadas em prática por Sebastião José de Carvalho e Melo (1699-1782), Conde de Oeiras a partir de 1759 e Marquês de Pombal a partir de 1769, e dentre as quais se pode destacar, pois repercutiram diretamente na sua formação e trajetória intelectual, a expulsão da Companhia de Jesus de Portugal e de seus domínios, a laicização do ensino e a reforma da Universidade de Coimbra. Nesta última, estruturou-se um feixe de cursos e instituições que promoveram o estudo da História Natural, formando quadros científicos capazes de esquadrinhar o Império, Veloso de Miranda entre eles, com o intuito de 17 avaliar suas potencialidades naturais, com vistas a sua utilidade econômica. 2 No que diz respeito à reforma de ensino, instituições que ofereciam cursos superiores foram fechadas, como a Universidade de Évora, visando a unicidade na formação intelectual superior, permanecendo aberta apenas a Universidade de Coimbra, que experimentou grandes alterações. Uma das primeiras ações realizadas foi a revisão de seus Estatutos. Kenneth Maxwell sintetiza da seguinte forma este processo: Para preparar os novos estatutos da universidade, criou-se a Junta da Providência Literária em dezembro de 1770. Dom João Cosme da Cunha, Arcebispo de Évora, tornou-se presidente da junta e o luso-brasileiro Francisco de Lemos, tornou-se o reitor da reforma. Francisco de Lemos e seu irmão compuseram os novos estatutos da universidade. João Pereira Ramos coordenou a parte jurídica em estreita colaboração com o marquês de Pombal, enquanto Francisco de Lemos concentrou-se nos novos estatutos relacionados com as ciências naturais e a matemática. Frei Cenáculo foi também membro da Junta da Providência Literária. A intervenção pessoal de Pombal colocou Cenáculo nessa comissão, onde Pombal tomou parte ativa em discussões, tendo ele próprio presidido algumas sessões da junta. A universidade foi fechada durante as fases finais da reforma e Pombal supervisionou pessoalmente a inauguração da instituição reformada durante uma estada de 32 dias em Coimbra, de setembro a outubro de 1772. 3 A Universidade reformada passou a dispor de seis cursos, a saber; Medicina, Leis, Cânones e Teologia, que já existiam antes das reformas, e outros dois, criados no âmbito das reformas: Filosofia e Matemática. A educação passou a ser “encarada como um dever público e destinava-se a instaurar a crença numa ordem universal de valores que compatibilizasse o progresso humano, no respeito da matriz cristã, com finalidade técnica decorrente da utilidade social da ciência”.4 Também passou a ser responsável pela formação de conhecimentos que eram, até então, restritos apenas às sociedades literárias e científicas, ou aos cursos secundários ministrados em alguns seminários. Dentre as inovações, foi construído um observatório astronômico, o qual estava 2 Mais tarde, resultante da formação de quadros com esse perfil, durante o ministério de Martinho de Mello e Castro (1777-1795) dar-se-ão as primeiras viagens filosóficas com esse intuito. Ver: PATACA, Ermelinda Moutinho. Mobilidades e permanências de viajantes no mundo português: entre práticas e representações científicas e artísticas. São Paulo: USP, 2016 (Tese de Livre-docência). 3 MAXWELL, Kenneth. Marquês de Pombal: paradoxo do iluminismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996, p. 110. 4 ARAÚJO, Ana Cristina. Dirigismo cultural e reformação das elites no pombalismo. In: ARAÚJO, Ana Cristina. O Marquês de Pombal e a Universidade. Coimbra: Imprensa da Universidade, 2000, p. 9-10. 18 planejado nos novos Estatutos. 5 A construção de tal espaço enquadrava-se, ao mesmo tempo, na ótica das Luzes e no projeto dinamizador da economia portuguesa, possibilitando a Universidade de Coimbra não apenas uma renovação da técnica e o aperfeiçoamento dos conhecimentos astronômicos e geográficos na preparação dos intelectuais portugueses, mas também o aprimoramento dos saberes aplicados a navegação. Neste período, o lente paduano Giovanni Dalla Bella (1726-1823) reuniu grande número de instrumentos científicos e outros maquinários que parecem ter pertencido ao Colégio das Necessidades ou ao Colégio dos Nobres, que possuíam seus próprios laboratórios, formando um novo Gabinete de Física Experimental. 6 Junto a este, foi organizado um laboratório químico para uso dos alunos, durante as aulas, e para que os professores pudessem realizar suas próprias pesquisas, avaliando as propriedades das espécies vegetais e a qualidade dos minerais oriundos do além-mar. Convém lembrar que a Académie Royale des Sciences, de Paris, ou a The Royal Society, de Londres, possuíam instalações semelhantes desde o início do século XVII. 7 Em Portugal, configurava-se como espaço análogo a Academia Real de História Portuguesa, possuidora de uma grande biblioteca e de outras instalações como laboratórios e observatórios, tendo respondido ainda por grande número de publicações desde sua fundação, em 1720, até meados do século. 8 Ainda que não respondesse sob o nome de Academia de Ciências, a Academia Real de História Portuguesa era, assim como suas congêneres europeias, instituição 5 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra, compilados debaixo da immediata e suprema inspecção d'el-Rei D. José I pela Junta de Providencia Litteraria e ultimamente coroborados por Sua Magestade na sua Lei de 28 de Agosto deste presente avnno, Vol. 3. Lisboa: Na Regia Officina Typografica, 1772, p. 213. Disponível em http://purl.pt/14235/4/. Acesso em 27 de dezembro de 2014. 6 Um estudo objetivo sobre o Gabinete de Física pode ser encontrado em ANTUNES, Ermelinda Ramos e PIRES, Catarina. O Gabinete de Física da Universidade de Coimbra. In: GRANATO, Marcus e LOURENÇO, Marta C. (Org.). Coleções Científicas Luso-Brasileiras: patrimônio a ser descoberto. Rio de Janeiro: Museu de Astronomia e Ciências Afins, 2010, p. 159-184. 7 FURTADO, Júnia Ferreira. Oráculos da Geografia Iluminista: Dom Luís da Cunha e Jean-Baptiste Bourguignon D’Anville na construção da cartografia do Brasil. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012, p. 72. Também VÉRON, Philippe. L'équatorial de la tour de l'est de l'Observatoire de Paris. Revue d'histoire des sciences, vol.. 56, nº. 1, p. 191-220, Janvier-Juin 2003. 8 KANTOR, Iris; BICALHO, Maria Fernanda; FERLINI, V. L. A. A Academia Real de História Portuguesa e a Defesa do Patrimônio Ultramarino (1648-1750). In: Modos de Governar: ideias e práticas políticas no Império Português XVI-XIX. São Paulo: Alameda, 2005, p. 257-276; FURTADO, Júnia Ferreira. “Bosque de Minerva: artefatos científicos no colecionismo joanino”. In: GESTEIRA, Heloisa Meireles; CAROLINO, Luís Miguel e MARINHO, Pedro (Orgs.). Formas do império: ciência, tecnologia e política em Portugal e no Brasil. Séculos XVI ao XIX. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014, p. 229-273; KANTOR, Iris. Cartografia e diplomacia: usos geopolíticos da informação toponímica (1750-1850). Anais do Museu Paulista. São Paulo, vol. 17, nº. 2, p. 39-61, Dez. 2009; . 19 destinada às elites letradas que ali realizavam discussões sobre assuntos diversos como política e ciências ou, como à época, filosofia natural. A multiplicidade de academias e instituições similares em toda a Europa deixa transparecer, conforme apontou Júnia Ferreira Furtado, “o Iluminismo como um fenômeno continental” e o “espaço das Academias como lócus de intercâmbio dessa sociabilidade” ao longo de todo o século XVIII. 9 Ademais, a simples existência de espaços ilustrados como este em Portugal antes mesmo de todas as reformas planejadas e executadas pelo Marquês de Pombal nos leva a outra discussão; aquela que defende que a introdução do Iluminismo em terras lusas tenha sido um movimento derivado daquele que surgiu em França sendo, portanto, tardio e, consequentemente, deformado ou incompleto. Tal discussão tem origem em fatores múltiplos, os quais foram discutidos pela historiadora como, por exemplo, a origem do termo “Iluminismo”, cunhado por filósofos franceses em meados do século XVIII; a visão de que o Iluminismo era, sobretudo, um conceito que surgiu “a partir de sua configuração pós-Revolução Francesa, quando sua feição antimonárquica e anticatólica se tornou efetivamente hegemônica na França”; a defesa que durante muito tempo se fez de que, conforme afirmou Robert Darnton, o Iluminismo “foi um fenômeno histórico concreto, situado no tempo e circunscrito no espaço: Paris na primeira parte do século XVIII” e, por fim, o fato de que parte da elite intelectual portuguesa da segunda metade do século XVIII comungava da ideia de que pertenciam a uma cultura “mergulhada na escuridão, engessada pela Inquisição, pelo arcaísmo da nobreza e pelo misticismo da Igreja Católica”.10 Francisco de Lemos de Faria Pereira Coutinho (1735-1822), o reitor-reformador não tardou a reestruturar fisicamente a Universidade de Coimbra: Para fundar este Estabelecimento [o Gabinete de Física Experimental], aplicou o Marquês Visitador a parte setentrional do Colégio [dos Nobres], que compreendia o refeitório, e as mais oficinas adjacentes. E não podendo também servir todos estes edifícios para o Laboratório, foi preciso demolir tudo (...). Acha-se feito o mesmo edifício, e só necessita de alguns ornatos e perfeições que não impedem o uso, que já se faz dele, para as Demonstrações e Processos químicos. Concomitantemente às reformas foi criado um novo gabinete de História Natural. Sua denominação, “gabinete”, remetia aos gabinetes de curiosidades, locais onde o clero, 9 FURTADO. Oráculos da Geografia Iluminista, p. 72. 10 Ídem, p. 72-74. 20 a nobreza e a aristocracia guardavam suas coleções de exemplares botânicos, zoológicos e minerais exóticos ou, através de uma análise mais crítica, os repositórios onde se exercia o “amadorismo do colecionismo privado e barroco”.11 Por essa época, as formas de organização dessas coleções passaram por uma revisão, para além das críticas recebidas por parte da nova elite letrada ilustrada, como Alexandre Rodrigues Ferreira, quando este se referiu ao “abuso da conchiologia” [atualmente conquiliologia ou conquiologia; sendo esta definida como a coleção ou estudo da estrutura externa dos moluscos] e da coleção meramente contemplativa de outros produtos naturais. 12 No novo gabinete, no entanto, a contemplação daria lugar ao estudo taxonômico de Lineu, à investigação sobre as propriedades das plantas medicinais e a utilização de minerais e metais que poderiam ser úteis à economia reinol. 13 O Jardim Botânico de Coimbra também aparece como espaço responsável por apoiar o Museu de História Natural e o Laboratório Químico enquanto repositório de plantas que seriam utilizadas para o desenvolvimento de estudos aplicados à farmacopeia. Possuía, assim, a não menos importante função de aclimatação das plantas oriundas das Colônias, as quais em Portugal seriam utilizadas para fins tão diversos, como a alimentação, a reprodução de madeiras utilitárias e de espécies ornamentais. Seu projeto arquitetônico dispôs os jardins em alamedas simétricas e patamares, respeitando a topografia do terreno, de acordo com os projetos arquitetônicos italianos. 14 Assim como a maioria dos naturalistas luso-brasileiros da segunda metade do século XVIII, Veloso de Miranda se formou em Filosofia na Universidade de Coimbra já reformada. Ele, contudo, não apenas presenciou as reformas pombalinas, mas vivenciou-as de perto. Segundo os registros universitários, ingressou em Coimbra como 11 CRUZ, Ana Lúcia Rocha Barbalho da. Verdades por mim vistas e observadas oxalá foram fábulas contadas: cientistas brasileiros do setecentos, uma leitura auto-etnográfica. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2004, p. 56 (Tese, Doutorado em História); CAMARGO, Téa. Colecionismo, Ciência e Império. CEDOPE. Ata da VI Jornada Setecentista. Curitiba: Aos Quatro Ventos, 2005, p. 576-587. 12 ALMEIDA, Manuel Lopes de. Notícias históricas de Portugal e Brasil (1751-1800). Coimbra: Coimbra Editora Limitada, 1964, p. 130. 13 Apesar da prática do colecionismo ser vigente também no século XVII em Portugal, os “velhos” gabinetes se multiplicaram por influência da Academia Real da História Portuguesa, criada por Dom João V em 1720 com o intuito de escrever a História de Portugal e reunir artefatos capazes de sintetizar a dimensão do Reino, como documentos históricos, livros e objetos da História Natural. “O ambiente da coleção, fruto de recolhas não especializadas, vivia de uma grande ideia, de um grande e utópico desígnio – reconstituir o universo numa só sala. Microcosmos magicamente apartado da realidade, cujo centro físico imaginamos ocupado pelo próprio colecionador, tal como é representado em inúmeras alegorias de origem flamenga”. In: BRIGOLA, João. Coleções, Gabinetes e Museus em Portugal no século XVIII. Coimbra: Fundação Calouste Gulbenkian; Gráfica de Coimbra Ltda., 2003, p. 64. 14 LOBODA, Carlos Roberto; DE ANGELIS, Bruno Luiz Domingos. Áreas verdes públicas urbanas: conceitos, usos e funções. Ambiência. Guarapuava, vol. 1, n. 1, p. 128, jan./jun. 2005. 21 aluno do curso de Cânones, em 1770. 15 Em 1772, ano das reformas, sem abandonar o curso em que estava matriculado, solicitou ingresso no curso de Matemática, sendo então admitido como aluno ordinário do Curso Filosófico. 16 Sua atenção parece ter ficado dividida entre o curso de Cânones e o novo curso pragmático, mas estava mais voltado à “utilidade que lhe [podia] provir das lições de Geometria”. 17 Adotou enquanto mestre (ou teria sido adotado por ele?) o paduano e lente de História Natural e Química, Domingos Vandelli (1730-1815). Veloso de Miranda não seria ao longo daquela década apenas mais um aluno de Vandelli, mas se transformaria em seu principal discípulo, sobressaindo em predileção ao mestre até mesmo aos outros naturalistas, muitos dos quais atualmente mais afamados, como Alexandre Rodrigues Ferreira. Em 1776, Veloso de Miranda daria por concluído o Curso Filosófico e alcançaria, dois anos depois, o grau de Doutor em Filosofia pela mesma instituição. No mesmo ano, foi admitido naquela universidade como professor substituto de História Natural, função que desempenhou por pouco mais de seis meses. Seu desempenho como aluno e docente na Universidade de Coimbra fizeram com que fosse admitido como sócio da Real Academia de Ciências de Lisboa, em 1779, 18 tornando-se sócio correspondente a partir de 1780, quando retornou para a América. 19 Uma vez no Brasil, Veloso de Miranda encontraria em Martinho de Melo e Castro (1716-1795) e em seu sucessor, Dom Rodrigo de Sousa Coutinho (1755-1812), secretários de Estado da Marinha e do Ultramar, considerável apoio para o desenvolvimento de suas pesquisas. Estes, dando continuidade ao projeto de Pombal, procederam a uma nova fase de institucionalização das ciências pragmáticas no Reino. O ponto de partida de Dom Rodrigo para estabelecer sua política foi a publicação de sua Memória sobre o melhoramento dos domínios de Sua Majestade na América, que veio a ser uma de suas principais obras. Nesta, expôs seu projeto político por meio do qual a Coroa deveria reconhecer a América portuguesa como sua mais importante colônia. Em particular, era um entusiasta do potencial econômico de Minas Gerais sem, contudo, ter 15 BOSCHI, Caio. Exercícios de Pesquisa Histórica. Belo Horizonte: Editora PUC Minas, 2012, p. 105. 16 Idem, p. 106. 17 AUC – Faculdade de Matemática. Matrículas (1772-1783). Cota: IV-1ª. D-15-7-1, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 105. 18 VANDELLI, Domingos. “Memórias sobre algumas producções naturaes deste Reino, das quaes se poderia tirar utilidade”. Memórias Econômicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa, Tomo 1. Lisboa: Na Officina da Academia Real das Sciencias, 1789, p. 177. 19 LIMA, Péricles Pedrosa. Homens de ciência a serviço da coroa. Os intelectuais do Brasil na Academia Real de Ciências de Lisboa (1779/1822). Lisboa: Universidade de Lisboa, 2009, p. 96 (Dissertação, Mestrado em História dos Descobrimentos). 22 conhecido o território pessoalmente, apesar de possuir propriedade na capitania, como descendente, por via materna, de Garcia Rodrigues Paes (165?-1738), filho primogênito do bandeirante paulista Fernão Dias Pais Leme (1608-1681). Por considerar necessário colocar a situação econômica do Reino e a importância da América portuguesa para Lisboa como principais “objetos de discussão” em sua nova política, tornou-se patrono de vários intelectuais formados na Universidade de Coimbra reformada que foram encarregados de pesquisas naturais. 20 Coube, salvo engano, a Francisco Adolfo Varnhagen (1816-1878) a primazia de destacar a existência de um grupo de letrados reunidos em torno de Dom Rodrigo de Sousa Coutinho. Segundo Varnhagen, com Dom Rodrigo, Portugal buscou abrir para o Império “um futuro de mais imediato esplendor e civilização”. Tratou logo de “rodear-se ele [o Ministro] de muitos brasileiros ouvindo-os, e facilitando-lhes a imprensa”, claramente fazendo menção às obras e traduções que foram escritas e realizadas a seu pedido a partir dos mais recentes estudos em áreas que abrangiam a Mineração, a Botânica e o beneficiamento de produtos de origem agrícola e animal. A maioria desses livros foi publicada pela Tipografia do Arco do Cego, então criada, cuja direção foi entregue ao também luso-brasileiro frei José Mariano da Conceição Veloso (1742-1811). A tipografia era parte de um grande projeto editorial que publicou quase uma centena de livros, muitos deles traduzidos do francês, do inglês e do latim, e outros tantos escritos por aqueles que tinham em Dom Rodrigo um porto seguro para suas empreitadas ilustradas. 21 Segundo Kenneth Maxwell, esses homens faziam parte da “geração de 1790”, a quem foi delegada a responsabilidade de reerguer Portugal do abismo econômico em que a Nação se encontrava. 22 Maria Odila Leite da Silva Dias, em seu Aspectos da Ilustração no Brasil, tratou de expandir outros vieses que cercavam esses homens das letras, mencionando não apenas suas responsabilidades para com a produção do conhecimento no final do século XVIII, mas destacando também a 20 COUTINHO, (Dom) Rodrigo de Souza. “Memória sobre o melhoramento dos domínios de Sua Majestade na América (1797)”. In: SILVA, Andrée Mansuy Diniz (Org.). Textos políticos, económicos e financeiros (1783-1811), vol. 2. Lisboa: Banco de Portugal, 1993. 21 VARNHAGEN, Francisco Adolfo. História Geral do Brasil. São Paulo: Melhoramentos, 1953, Vol. II, p. 238. Sobre o assunto, C.f. também BOSCHI, Caio César. “Politique et édition: les natifs du Brésil dans les ateliers réformistes d’Arco do Cego”. In: DUTRA, Eliana de Freitas e MOLLIER Jean-Yves (Dir.) L’imprimé dans la construction de la vie politique Brésil, Europe, Amériques, XVIIIe-XXe siècle. Rennes: Les PUR - Presses universitaires de Rennes, 2015, v. 1, p. 385-398; VILLALTA, Luiz Carlos. Livrarias e leituras nas Minas Gerais da 2ª metade do século XVIII: o problema das fontes. In: Leitura e escrita em Portugal e no Brasil: 1500-1970, III volume. Lisboa: Sociedade Portuguesa de Estudos da Educação, 1998. 22 MAXWELL, Op. Cit., p. 157-207. 23 importância de muitos no cenário político que teria como grand finale a Independência do Brasil, em 1822, a exemplo de José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838). 23 De volta a Veloso de Miranda, em 1779, quando ainda estava na qualidade de lente substituto na Universidade de Coimbra, solicitou ao reitor autorização para que pudesse voltar à América, onde pretendia resolver “problemas particulares”. Com a autorização concedida, partiu de Lisboa a 30 de outubro do mesmo ano, chegando ao Rio de Janeiro em janeiro do ano seguinte. 24 De volta as Minas, vivenciou por muitos anos uma carreira de viajante naturalista e, não por poucas vezes, se apresentou em público como “naturalista a serviço de Sua Majestade”, ou ainda como “encarregado da indagação e colheita dos produtos naturais da Capitania de Minas Gerais”.25 Com isso, fazia questão de publicizar a mudança de status que havia conquistado nos dez anos que estivera ausente. De filho de uma elite colonial mineradora que demandava reconhecimento e honra, passou a ser visto como homem integrado à administração régia, um verdadeiro representante da Coroa para os assuntos relacionados à História Natural nas Minas. Desde 1780 até os primeiros anos do século XIX, Veloso de Miranda tratou de enviar a Vandelli sua produção científica, entre relatórios e amostras, recebendo quase sempre calorosos agradecimentos da parte da Coroa. Ao conseguir satisfazer as instituições científicas portuguesas em suas demandas e gozando de considerável prestígio frente a Dom Rodrigo, fruto de sua expertise, não tardou para que um cargo na esfera política e administrativa colonial lhe fosse oferecido. Tal indicação aconteceu em 1798, quando de sua nomeação para o cargo de Secretário do Governo da Capitania de Minas Gerais, no qual deveria servir por tempo de três anos ou mais, de acordo com a vontade da Rainha, o que lhe permitia auferir um salário com o qual pudesse de manter, e somar honra a sua folha de serviços realizados a Sua Majestade. 26 Segundo Ângela Barreto Xavier e António Manuel Hespanha, a relação entre serviços e mercês no império luso se dava numa lógica clientelar, configurando uma “economia moral do dom ou da graça”, a qual era sustentada por uma tríade composta por “dar, receber e retribuir”, e deveriam ser compreendidas como integrantes de uma 23 DIAS, Op. Cit., 1968. 24 AMP, FJB. Cota: 29-276. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Domingos Vandelli. Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1780. 25 MATHIAS, Herculano Gomes. Um recenseamento na Capitania de Minas Gerais. Vila Rica–1804. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1969, p. XXIV. 26 APM, SC 283, Originais de Cartas Régias e Avisos (1798), Ordens e Portarias do Governador a Diversas autoridades da Capitania (1797-1809), p. 30-31. 24 ordem social natural, na qual cada personagem possuía função pré-estabelecida e que, salvo raras exceções, não poderia ser transposta. Essas relações que se reproduziam por meio das cadeias formais e informais de poder, segundo Júnia Ferreira Furtado, foram transportas para o além-mar, e na América portuguesa constituíram-se nos pilares que permitiram à Coroa estender seu poder nessa região, especialmente em Minas Gerais, onde a extensa malha administrativa, fiscal e militar oferecia um sem número de ofícios a serem exercidos pelos súditos. 27 Ainda que as posições fossem bem claras e definidas, eram intensas as dependências existentes entre estes extratos sociais, quase sempre reguladas pela lógica serviços versus mercês. 28 Quando o Rei ou a nobreza demandavam o serviço dos súditos, estes observavam não apenas os tratos comerciais ou os ganhos materiais que poderiam ser auferidos na relação que era estabelecida, mas principalmente os reflexos do ato de servir, traduzidos por ganhos simbólicos. “A economia de mercê constituía-se como um dos pilares do Estado Moderno, sustentada em larga medida pelo Império ultramarino, que também oferecia múltiplas oportunidades de serviços”.29 As relações entre os serviços prestados pelos naturalistas e a concessão de mercês pela Coroa podem ser observadas, por exemplo, quando Dom Rodrigo, ao expedir instruções para Manuel Ferreira da Câmara Bittencourt Aguiar e Sá (1762-1835), “que então partia para o Brasil, apela para as ‘suas grandes luzes e conhecido zelo’, ‘para tudo o que pudesse ser útil ao real serviço’, pedindo-lhe que opinasse sobre os melhoramentos que se possam introduzir a beneficio das culturas da capitania, ou por meio de melhores métodos de trabalho e adubar o terreno, ou por meio de melhoramentos introduzidos nas máquinas e nos fornos com que se prepara o açúcar e assim dos mais gêneros”.30 Assim como Veloso de Miranda, a relação que Câmara teceu com o Estado português foi pautada na tríade “dar, receber e retribuir”. Cederam ambos seus saberes ao Estado e deste receberam o pagamento pelos serviços prestados e alguma notoriedade e ascensão social, traduzidos nos cargos públicos que ocuparam, os quais lhes conferiam mais honra. Num viés iluminista, cada vez mais, o conhecimento angariava prestígio, e não mais apenas a preparação para a guerra e a administração dos 27 FURTADO. Homens de negócio... 28 XAVIER, Ângela Barreto Xavier; HESPANHA, Antônio Manuel. “As Redes Clientelares”. In: MATTOSO, José (Org.) História de Portugal... p. 122-32. 29 BICALHO, Maria Fernanda. “Conquista, Mercês e Poder Local: a nobreza da terra na América portuguesa e a cultura política do Antigo Regime”. Almanack Braziliense, n. 2, p. 22, novembro de 2005. 30 MENDONÇA, Marcos Carneiro de. O Intendente Câmara. São Paulo, 1958, p. 91, apud NOVAIS, Fernando. Portugal e o Brasil na crise do antigo sistema colonial. São Paulo: Hucitec, 1979, p. 261. 25 bens da Coroa. Concomitante a administração da Secretaria da capitania de Minas Gerais, Veloso de Miranda também seria responsável por uma obra de grande vulto: o planejamento, organização e construção de um horto botânico em Vila Rica, projeto que contou com a importante adesão de Dom Rodrigo, apontando mais uma vez seu amplo apoio aos letrados que buscavam colocar em prática sua política econômica de exploração e aproveitamento racional dos recursos naturais. Para compreender a ação e a produção intelectual de Veloso de Miranda nas Minas Gerais foi fundamental o conceito de “centro de cálculo”, proposto pelo filósofo francês Bruno Latour. Para este autor, desde as grandes navegações, o conhecimento passou a se disseminar por extensas redes de savants, posicionados em várias partes do velho e do novo mundo, e não apenas nas nações europeias tradicionais. A atuação de Veloso de Miranda frente à instituição que fundou, e como naturalista em Minas Gerais, em consonância com outros que também estavam a serviço da Coroa, como é o caso de José Vieira Couto, e com os setores na Corte responsáveis pela investigação científica do império revelam que, por essa época, o Brasil e, no caso particular, as Minas Gerais, se tornou um desses centros de cálculo, onde o conhecimento era formulado e não apenas reproduzido. 31 Não se pretende, contudo, esgotar os estudos sobre Joaquim Veloso de Miranda ou a prática das ciências naturais em Vila Rica e na Capitania, mas contribuir com a historiografia da História das Ciências, buscando compreender como se deu a sua relação com a sociedade em que vivia, tanto a local, quanto a Reinol. Sendo Veloso de Miranda possuidor de uma vida política e científica bastante ativa, era de se esperar que considerável número de fontes que o mencionassem fossem encontradas nos arquivos brasileiros e portugueses, principalmente nos arquivos do Jardim Botânico da Ajuda e da Real Academia de Ciências de Lisboa. Tais documentos ajudam a elucidar muitas das questões que são levantadas ao longo desse trabalho, e que tratam não apenas do relacionamento deste naturalista com a Corte lusa, mas também acerca de como a política de Dom Rodrigo procurou se apropriar dos recursos naturais das Minas, mote que nos sugere algumas perguntas, a saber: Como o trânsito de exemplares botânicos era realizado e discutido entre Lisboa e Minas? Quais plantas indígenas ou exóticas procurou-se transladar desde as Minas para a Europa e no sentido inverso? Como estes exemplares vegetais eram aproveitados no âmbito da botânica, da farmacologia, da 31 LATOUR, Bruno. Les ‘vues’ de l’esprit: une introduction a l’anthropologie des sciences et des téchniques. Culture Téchnique, n. 4, p. 5-29, 1985. 26 paisagística e da economia? Uma vez aclimatados e multiplicados em Lisboa, no Jardim da Ajuda, tais exemplares eram posteriormente redistribuídos às outras conquistas? Para analisar a vida e os feitos do naturalista luso-brasileiro Joaquim Veloso de Miranda procurando compreender sua importância enquanto um dos responsáveis pela institucionalização das Ciências Naturais na capitania de Minas Gerais, na virada do século XVIII para o século XIX, buscou-se a) analisar o perfil familiar de Joaquim Veloso de Miranda, compreendendo como as relações clientelares mantidas por sua família foram responsáveis por alçar o mesmo à notabilíssima personagem da história de Minas Gerais; b) verificar sua trajetória de letrado enquanto aluno e professor em Portugal, as pesquisas por ele realizadas, as relações acadêmicas e clientelares que mantinha no ambiente da Universidade de Coimbra, assim como as demais ações por ele desenvolvidas em Portugal; c) contextualizar a importância do envolvimento estatal para com as Ciências Naturais a partir da década de 1770 e, em especial, a influência de Dom Rodrigo de Sousa Coutinho e da Real Academia de Ciências de Lisboa, grandes responsáveis por promover as viagens filosóficas nos domínios ultramarinos de Portugal; d) analisar como se deu a inserção de Veloso de Miranda no âmbito da elite letrada mineira quando de seu retorno para Minas Gerais, assim como as ações que desenvolveu enquanto filósofo naturalista; e) apontar a importância do Horto e Jardim Botânico de Vila Rica enquanto espaço institucionalizado para a prática de pesquisas em história natural, bem como o envolvimento de Veloso de Miranda com o mesmo, em consonância com as atividades que desenvolvia enquanto secretário de governo da capitania de Minas Gerais; f) elucidar suas ações quando de sua saída da cena política vilariquense, sobretudo as pesquisas e as atividades que passou a desempenhar em sua propriedade rural, ao fim de sua vida; e g) compreender o perfil intelectual de Veloso de Miranda por meio da análise de seu Inventário post-mortem, com destaque para a sua livraria particular. A partir da contextualização necessária, e da busca pelas respostas que orientam essa pesquisa, procurou-se corroborar a hipótese de que assim como seus pares naturalistas, igualmente oriundos da América portuguesa, Joaquim Veloso de Miranda utilizou da formação acadêmica e da produção de conhecimentos científicos para notabilizar-se no âmbito da sociedade portuguesa, bem como foi responsável por praticar e não apenas por reproduzir o fazer científico em sua Pátria. 27 Apresentação dos capítulos e Metodologia Para tanto, a tese foi dividida em duas partes. A primeira, denominada “De mazombo a ‘naturalista a serviço do Rei’: a formação do ilustrado luso-brasileiro Joaquim Veloso de Miranda”, está dividida em 3 capítulos (1 a 3). A segunda parte, intitulada “Um savant mazombo de volta às Minas”, constam 5 capítulos (4 a 8). No primeiro capítulo, “Joaquim Veloso de Miranda e seu tempo”, buscou-se apresentar o futuro naturalista como um jovem de sua época; filho de um imigrante minhoto residente nas Minas, como tantos de sua geração, que após viver muitos anos de suas atividades no comércio, casou-se com a filha de um importante minerador português, fixando residência na freguesia do Inficionado. Desta união nasceram cinco filhos, sendo três rapazes e duas meninas. Como filho mais velho, coube a Joaquim receber a mais distinta educação que poderia ser ofertada nas Minas, pelo que deve ter recebido, desde tenra idade, as primeiras letras por parte de um professor secular ou leigo, para depois ser matriculado no Seminário da Boa Morte, na Cidade de Mariana, e, posteriormente, optando pela continuidade dos estudos no curso de Cânones, na Universidade de Coimbra. Nesse ínterim, buscou-se também discernir Joaquim Veloso de Miranda de outro ilustre naturalista de sua época, frei Mariano da Conceição Veloso. Igualmente dedicado aos estudos botânicos, frei Veloso, como ficou conhecido, tornou-se digno de considerável reconhecimento em função das obras que traduziu para a língua portuguesa e, sobretudo, da tipografia que dirigiu na Corte, pelo que durante muitos anos foi recorrente certa confusão tanto na memorialística quanto na historiografia envolvendo ambos os Veloso. No segundo capítulo, denominado “Da estola à História Natural: a trajetória de Veloso de Miranda na Universidade de Coimbra”, buscou-se tratar mais a fundo das reformas que foram propostas e realizadas no seio do sistema educacional português pelo Marquês de Pombal, as quais permitiriam ao Estado alcançar as mudanças econômicas propostas por ele ao aplicar uma visão pragmática e cientificista em diversos setores da sociedade. Entre elas, podem ser destacadas a extinção da Companhia de Jesus e na expulsão de seus membros de Portugal e de seus domínios, assim como pela criação, na Universidade de Coimbra reformada, de novos cursos e disciplinas, que deveriam privilegiar aspectos racionais em detrimento daqueles vinculados à espiritualidade. Os novos laboratórios e espaços congêneres criados em Coimbra refletiriam também a necessidade dos lentes e dos alunos de ambientes 28 destinados a solucionar as inquietações para com os diversos campos das ciências modernas. Outros espaços trazidos para dentro do ambiente universitário, como o Gabinete de Física, o Observatório Astronômico e o Teatro Anatômico foram analisados por João Carlos Brigola como sendo a materialização da “ciência moderna” e empírica na universidade, “cuja pedra de toque foi a aproximação às ciências exatas e naturais” e “o compromisso entre intelectuais ilustrados e políticos absolutista”.32 A importância do lente paduano Domenico Vandelli também é analisada, uma vez que esse ilustrado se revelou um dos principais agentes da reestruturação acadêmica pombalina. Feita a discussão sobre o novo panorama que se estabeleceu naquela Universidade, buscou-se compreender como se deu a interação acadêmica que Veloso de Miranda teve com a instituição. Importante ressaltar que o futuro naturalista desembarcou em Lisboa com a intenção de dar continuidade a seus estudos religiosos, por meio do curso de Cânones, e que as reformas realizadas naquela universidade foram, de certo modo, responsáveis pela mudança em sua trajetória acadêmica naquela instituição e, consequentemente, pelo destino profissional que daria em sua vida. Por fim, além da possibilidade de contemplar a formação que Veloso de Miranda teve em Coimbra, busca-se verificar como as reformas pombalinas foram responsáveis pela profissionalização dos naturalistas luso-brasileiros, por meio das pesquisas realizadas nos vários domínios lusos a partir da década de 1780, assim como pelas mudanças nas técnicas aplicadas nos setores da Mineração, da Agricultura e da indústria de beneficiamento. O terceiro capítulo, intitulado “O movimento ilustrado luso-brasileiro: instituições, políticas, personagens e procedimentos para o estudo da História Natural”, analisa as principais nuances ocorridas na vida de Veloso de Miranda no que diz respeito à sua atuação com naturalista, bem como a transformação que se deu no campo da História Natural em Portugal ao longo do último quartel do século XVIII. A primeira parte trata da participação de Veloso de Miranda como membro da Real Academia de Ciências de Lisboa, a partir de 1779, e nos anos seguintes, como membro correspondente. Convém lembrar que este período configura, para ele, momento de transição, quando deixa Portugal com uma bagagem teórica que deveria ser transformada em atividades práticas nas Minas. Antes de lançar-se a campo de forma 32 BRIGOLA. João Carlos, A introdução dos estudos de história natural na reforma pombalina o quadro cultural e o movimento das ideias. Texto adaptado do Livro Coleções, Gabinetes e Museus de Portugal no Século XVIII”,FCG/FCT,2003. Disponível em http://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/8325. Acesso em 18 de setembro de 2015. 29 independente, contudo, sabe-se que participou junto a seus pares de algumas pequenas viagens filosóficas, ainda em Portugal, que constituíram atividades de preparação para as futuras viagens. O resultado esperado para estas e para as vindouras viagens filosóficas era o efetivo conhecimento sobre o território visitado e sua dominação a partir da obtenção de conhecimentos geográficos e das potencialidades naturais, visando sua exploração. Para auxiliar os filósofos naturalistas nestas atividades, optou-se por dar maior atenção às obras específicas que tinham por finalidade instruir o viajante sobre os métodos mais adequados para recolher, preparar e transportar os exemplares até as instituições portuguesas. Grande parte desses impressos surgiu a partir do Instructio peregrinatoris, publicado em 1759 por Eric Anders Nordblad (1739-1810), orientando de Lineu, do qual derivam, inclusive, as Viagens Filosóficas ou Dissertação sobre as importantes regras que o Filósofo Naturalista nas suas peregrinações deve principalmente observar, publicada por Vandelli, em 1779, descrito por Pereira e Cruz como sendo um “verdadeiro manual de campo do naturalista aprendiz, provavelmente utilizado em suas aulas e nas viagens de formação dos naturalistas de Coimbra”.33 Esta qualidade de publicação impressa em Portugal tinha, na maioria das vezes, Vandelli por autor, ainda que William Simon acredite que muitas dessas instruções tenham contado com a contribuição de seus ex-alunos que atuavam no Jardim Botânico da Ajuda, 34 a exemplo do Méthodo de Recolher, Preparar, Remeter, e Conservar os Productos Naturais segundo o plano que tem concebido, e publicado alguns Naturalistas, para o uso dos Curiosos que visitam os sertões, e costas do Mar, escrito em conjunto pelos naturalistas do Museu da Ajuda, em 1781, e que ostenta, ao final, apenas a assinatura do naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira. 35 Os esforços para restaurar os ânimos da economia do império são novamente renovados quando, nos últimos anos do século XVIII, Dom Rodrigo de Souza Coutinho é designado para exercer o cargo de secretário de Estado da Marinha e do Ultramar (1795-1801), propondo a continuidade dos planos políticos e econômicos de Pombal para recobrar, de forma urgente, “a independência perdida (...) ao mercador inglês e 33 PEREIRA, Magnus Roberto de Mello & CRUZ, Ana Lúcia Rocha Barbalho da. O viajante instruído: os manuais portugueses do Iluminismo sobre métodos de recolher, preparar, remeter, e conservar produtos naturais. SANTOS, A. C. A.; DORÉ, Andrea. (Org.). Temas Setecentistas. Curitiba: UFPR/SCHLA, 2009, p. 224. 34 SIMON, Willian Joel. Scientific expeditions in the portuguese overseas territories – 1783-1808. Lisboa: IICT, 1983, p. 15. 35 PEREIRA; CRUZ. O viajante instruído..., p. 241-252. 30 alienada pelo sistema mercantil, que se congelara e se enrijecera num mundo em transformação” da qual Portugal parecia estar a margem segundo o entendimento dessa elite ilustrada da qual esse ministro era um dos expoentes. 36 Crítico dessa dependência, não hesitou em atribuir os efeitos da estagnação econômica ao Tratado de Methuen, de 1703, 37 ainda que também imputasse parte da culpa à inércia tecnológica em que se encontrava a exploração aurífera em Minas Gerais, situações que pretendia enfrentar por meio de reformas econômicas esclarecidas. 38 Para tanto, considerava o novo ministro ser necessária a criação de instituições de apoio às pesquisas em história natural nas colônias, sobretudo na América portuguesa, e o aparelhamento daqueles que se dedicavam às pesquisas em campo, pelo qual era de fundamental importância o estabelecimento de relações com naturalistas, como Alexandre Rodrigues Ferreira, José Vieira Couto e, claro, Veloso de Miranda, além da participação ativa dos governadores de capitanias, muitos dos quais igualmente ilustrados. 39 Na América portuguesa, não apenas os naturalistas filiados às instituições portuguesas e, indiretamente, a Dom Rodrigo, se mostravam animados com as atividades a serem realizadas. Alguns governadores coloniais como Bernardo José de Lorena (1756-1818), de Minas Gerais, e Luís de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres (1739-1797), do Mato Grosso, engrossavam a extensa rede de apoio na qual muitos dos naturalistas tinham um porto seguro para que pudessem desenvolver seus trabalhos com o devido apoio estatal. A partir da análise de algumas cartas expedidas por Dom Rodrigo, e que tinham como mote a exploração dos recursos naturais das colônias, foi possível desvelar a extensa rede que o Estado português mantinha para “conhecer de forma mais aprofundada e precisa os seus domínios na Europa, Ásia, África e, sobretudo, na América, ou seja, reconhecer os limites físicos dessa soberania, bem como as potencialidades econômicas do território administrado”. 40 A intensa troca de correspondência constitui-se, nas palavras de Alex Varela, como “material valioso para o historiador da Ilustração luso-americana, na medida em que permite observar a 36 FAORO. Os donos do poder... p. 227-228. 37 COUTINHO, Rodrigo de Sousa (Dom). Memória sobre a verdadeira influencia das minas de metais preciosos na industria das nações que as possuem, e especialmente na portuguesa. Memórias Econômicas da Academia, tomo I. Lisboa: Na Officina da Real Academia das Sciencias, 1789, apud MAXWELL, Kenneth. “A geração de 1790 e a ideia de império luso-brasileiro”... p. 180. 38 C.f. FIGUEIRÔA, Silvia Fernanda de Mendonça. Mineração no Brasil: aspectos técnicos e científicos de sua história na colônia e no Império (Séculos XVIII-XIX). América Latina en la historia econômica. Mineria, n. 1, enero-junio, 1994. 39 MAXWELL. “A geração de 1790 e a ideia de império luso-brasileiro”... p. 157-207. 40 DOMINGUES, Ângela. “Para um melhor conhecimento dos domínios coloniais: a constituição de redes de informação no Império Português em finais de Setecentos”. Ler História, n. 39, p. 20, 2000. 31 atuação de um naturalista [ou, em seu conjunto, de vários profissionais situados] em postos-chaves da administração do Império Português, sobretudo aqueles relativos às minas, matas e bosques, e rios”.41 Mais do que um mero incentivador das viagens filosóficas, Melo e Castro e Dom Rodrigo foram aqueles que tornaram esses empreendimentos possíveis ao disponibilizarem a estrutura do Estado que representavam aos naturalistas, tornando, assim, esses letrados homens a serviço da Coroa, e auxiliando-os com a concessão de mercês, soldos, patrocínios e tudo mais que fosse necessário para que realizassem as dispendiosas campanhas, nos mais distintos cantos do Império. A segunda parte se inicia com o retorno de Veloso de Miranda à América portuguesa, fato que ocorreu em outubro de 1779. No quarto capítulo, denominado “Damião dos sais, Veloso das Vellósias: entre pesquisas botânicas e mineralógicas”, buscou-se traçar a roteiro temporal percorrido pelo naturalista desde suas primeiras observações sobre o mundo natural, quando ainda se encontrava embarcado, passando por um curto período no Rio de Janeiro, onde providenciou a compra de alguns livros e escreveu uma correspondência a Vandelli, dando conta de tudo o que vira durante a travessia do Atlântico. 42 Depois do Rio de Janeiro, Veloso de Miranda tomou como norte a Capitania de Minas Gerais, de onde não mais sairia. Também buscou-se analisar a importância das indagações filosóficas que fez, ainda nos primeiros anos da década de 1780, recolocando-o no lugar de destaque que lhe cabe, enquanto um dos vetores fulcrais das pesquisas organizadas por Vandelli no além-mar, posto que vem sendo eclipsado pelos estudos que se concentraram na figura de Alexandre Rodrigues Ferreira. 43 Para tanto, foi realizada a análise dos estudos realizados por Veloso de Miranda na Capitania de Minas Gerais. Importante observar que estes são muitos e plurais, revelando a enorme capacidade do naturalista de atuar em várias frentes no campo da História Natural, desde a Zoologia, passando pela Mineralogia e pela Botânica, assim como por outros setores de interesse econômico, como a agricultura e a indústria, nascente. Tal amplitude era típica do seu tempo, onde a especialização num único campo do conhecimento estava em seus primórdios. 41 VARELA, Alex Gonçalves. “Juro-lhe pela honra de bom vassalo e bom português”: As cartas de José Bonifácio de Andrada e Silva para D. Rodrigo de Sousa Coutinho. RIHGB, vol. 174, nº. 460, p. 281-310, Jul./Set. 2013. 42 AMP, FJB. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Domingos Vandelli. Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1780. 43 Apenas Pataca validou Veloso de Miranda como sendo o primeiro naturalista da geração de 1790 a atuar na América portuguesa. In: PATACA. Coletar, preparar, remeter, transportar..., p. 5. 32 Foram não menos do que 24 anos de pesquisas efetivas desempenhadas na capitania de Minas Gerais – entre 1780 e 1804, em nome da Coroa portuguesa.44 Se, em alguns momentos, via-se atribulado com ordens para que realizasse estudos sobre a História Natural e, principalmente, sobre a Botânica, no entorno de Vila Rica; em outros, encontrava-se em viagem para os sertões do rio de São Francisco, com o intuito de analisar a existência de jazidas de salitre e suas qualidades. Ao longo deste período, ascende em importância até um determinado momento, o ponto máximo da curvatura que assinala o apogeu de sua vida enquanto pessoa pública – sua atuação no seio da esfera política em Minas Gerais, como Secretário de Governo da Capitania, 45 coroada com sua nomeação para as atividades de planejamento e gestão do Horto Botânico de Vila Rica. A partir das pesquisas e dos conhecimentos que Veloso de Miranda produziu em Vila Rica, e de toda a infraestrutura de que disponha, planejou o Horto e Jardim Botânico de Vila Rica, o qual será tema do quinto capítulo, intitulado “Um horto e jardim botânico em Vila Rica”, onde buscou-se analisar de forma vertical aquele que pode ser considerado o seu maior legado. Para tanto, houve a necessidade de se construir este espaço enquanto uma cópia diferenciada de outros estabelecimentos congêneres que haviam sido inaugurados, nas últimas décadas, em Lisboa, Coimbra e em outras capitanias da América portuguesa. Para entender a nova lógica que deveria ser aplicada a tal espaço, julgou-se ser necessário antes de tudo, compreender a função que os jardins botânicos coloniais possuíam e que era, por sua vez, distinta daquelas que regiam os metropolitanos. A crescente demanda portuguesa pelos saberes que poderiam ser construídos e acumulados a partir do que o mundo natural dispunha em seus domínios fez surgir toda uma infraestrutura – os aparatos de saberes setecentistas, no qual podemos incluir os espaços que foram estruturados dos dois lados do Atlântico para a produção de informações e conhecimentos de cunho científico e pragmático, e que vão desde o estabelecimento da Academia Real da História Portuguesa, em 1720, passando pelos laboratórios, observatórios e demais estruturas edificados junto à Universidade de Coimbra; pelas bibliotecas, públicas e privadas; pelos gabinetes de curiosidades, não 44 A partir de 1804, quando Veloso de Miranda deixa de ser um frequentador ativo de Vila Rica e passa a permanecer a maior parte do tempo em sua propriedade rural, a fazenda do Mal Cabelo, até 1816, ano de seu falecimento, o naturalista daria continuidade a várias pesquisas que haviam sido iniciadas ainda em Vila Rica, como as nitreiras artificiais. 45 C.f. BOSCHI. “Os Secretários do Governo da Capitania de Minas Gerais”. In: Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 59-100. 33 importando se formais ou informais, ou seja, institucionais ou coleções particulares de uso restrito; pelos seminários religiosos, onde a elite de além-mar recebia sua educação básica; pelas academias de ciências, como a Real Academia de Ciências de Lisboa, por exemplo, e pelos espaços de apoio às pesquisas, como viveiros, herbários, hortos e jardins botânicos e de aclimatação. Os hortos e jardins botânicos, em especial, foram tratados ao longo do século XVIII como espaços de acumulação de conhecimentos na forma de exemplares botânicos que, uma vez catalogados e estudados, estariam aptos a gerarem novas informações para fins diversos, como a farmacologia e a indústria, além de possuírem uma função social, como espaços destinados ao deleite e contemplação da natureza por parte da elite ilustrada. Ao compreender os hortos e jardins botânicos como aparatos de saberes, incluso aqui aquele estabelecido em Vila Rica por Veloso de Miranda, a partir de 1799, reafirma-se seu papel enquanto espaço destinado à produção de informações e conhecimentos, e não apenas à aclimatação e preparação de espécies botânicas para seu envio à Lisboa, como em diversos momentos a historiografia luso-brasileira tratou tais locais. 46 Ademais, pensar os hortos e jardins botânicos coloniais como espaços igualmente destinados à produção do conhecimento remete, mais uma vez, ao filósofo francês Bruno Latour, mais precisamente aos conceitos de “centro de cálculo” e “mobilização do mundo” que formulou a partir em seu artigo Les ‘vues’ de l’esprit, e que também estiveram presentes no mundo colonial e não apenas na Europa, como se pretende aqui discutir, uma vez que nesses espaços também havia a produção e a transmissão de inscrições, sob a forma de experimentos, relatórios – ou memórias, e pranchas, dentre outros suportes responsáveis por traduzir os conhecimentos acerca da botânica e da mineralogia mineiras. 47 Neste artigo, Latour buscou combater a ideia da existência de grandes divisões “como as que separam, por exemplo, as mentalidades científicas e as pré-científicas, o conhecimento universal e o local, a natureza e a sociedade, a ciência e as demais práticas sociais, o saber e o saber-fazer, a razão e a emoção, o centro e a periferia, a 46 HEYNEMANN, Cláudia. Beatriz. “História Natural na América Portuguesa - 2ª metade do século XVIII”. Vária História, vol. 20, março de 1999; NEPOMUCENO, Rosa. O Jardim de D. João: a aventura da aclimatação das plantas asiáticas à beira da lagoa e o desenvolvimento do Jardim Botânico do Rio de janeiro, que vence dois séculos de umidade, enchentes, transformações da cidade, novos padrões científicos e mantém-se exuberante, com seus cientistas e suas árvores. Casa da Palavra, Rio de Janeiro, 2007; e SANJAD, Nelson. Os Jardins Botânicos luso-brasileiros. Ciencia e Cultura. São Paulo, vol. 62, nº. 1, 2010. 47 LATOUR, Bruno. Les ‘vues’ de l’esprit: une introduction a l’anthropologie des sciences et des téchniques. Culture Téchnique, n. 4, p. 5-29, 1985. 34 civilização e a selvageria”.48 O autor também buscou estabelecer novos paradigmas para compreender outra importante característica comumente associada a espaços de ciências situados em regiões geograficamente ditas periféricas; a relação entre o centro versus a periferia, enquanto, respectivamente, lugares exclusivos de produção ou recepção de conhecimentos. Ao contrário, Latour propõe ao invés dessa dualidade, “uma relação estabelecida entre dois lugares, o primeiro, que se torna periferia, e o segundo, que se torna um centro, sob a condição de que entre os dois circule um veículo” a que chamou de inscrição”.49 A informação transmitida a partir dessa inscrição seria, pois, a relação estabelecida entre locais distintos, fossem eles próximos ou não geograficamente. Latour utiliza o exemplo da viagem do naturalista francês Pierre Sonnerat (1748-1814), que foi enviado para a costa da Nova Guiné para levar à Corte “desenhos, espécimes naturalizados, mudas, herbários, relatos e, quem sabe, indígenas. Tendo partido de um centro europeu para uma periferia tropical, a expedição traçou, através do espaço-tempo, uma relação muito particular que permitiu ao centro acumular conhecimentos sobre um lugar que até aí ele não podia imaginar”. Estes conhecimentos transpostos por Sonnerat do mundo natural para o papel seriam utilizados para que as elites letradas europeias pudessem “fazer uma ideia de outro lugar” que não aquele que habitavam. Ademais, a informação na forma de riscos permitia que a expedição se limitasse “à forma, sem ter o embaraço da matéria”. O papagaio e outros seres vivos permaneceriam na ilha e apenas “o desenho de sua plumagem, acompanhado de um relato, de um espécime empalhado e de um casal vivo”, a ser domesticado para o viveiro real, seriam levados. Para Latour, a viagem de Sonnerat produziria informações que não poderiam ser tratadas “como uma ‘forma’ no sentido platônico do termo, e sim uma relação muito prática e muito material entre dois lugares, o primeiro dos quais negocia o que deve retirar do segundo, a fim de mantê-lo sob sua vista e agir à distância sobre ele”.50 As redes de saberes criadas entre os homens letrados, as trocas de conhecimentos realizadas a partir da relação centro versus periferia e os ciclos de acumulação de informações seriam, enfim, responsáveis 48 LATOUR, B. “Give me a laboratory and I will raise the world”. In: MULKAY, M.; KNORR-CETINA, K. (Ed.). Science observed: perspectives on the study of science. London: Sage, 1983. p. 141-170, apud ODDONE, Nanci Elizabeth, et al. “Centros de Cálculo: A Mobilização do Mundo”. Informare. Caderno do Programa de Pós-Graduação de Ciências da Informação. Rio de Janeiro, vol. 6, n. 1, p. 30, 2000. 49 LATOUR, Bruno. “Redes que a razão desconhece: laboratórios, bibliotecas, coleções”. In: PARENTE, André (Org.). Tramas da rede: novas dimensões filosóficas, estéticas e políticas da comunicação. Porto Alegre: Sulina, 2013, p. 2. 50 LATOUR. Redes que a razão desconhece... p. 2-3. 35 por forjar o supracitado conceito de centro de cálculo. Nestes, se convergiriam, pois, as inscrições – e não apenas, mas também as materialidades – oriundas de diferentes periferias. Ao mobilizar nessa tese o conceito de centro de cálculo de Latour para as Minas, pretendeu-se analisar três instâncias produtoras e detentoras de informação cientificista e pragmática, a saber; os sertões de Minas Gerais, como local onde as informações poderiam ser encontradas; o Horto e Jardim Botânico de Vila Rica, instituição responsável por centralizar o conhecimento e, por fim, a pessoa de Joaquim Veloso de Miranda, observador privilegiado responsável por reunir o conjunto de inscrições oriundos dos observadores disciplinados e destituídos de privilégios, a quem transmitia parte de suas responsabilidades, produzindo, assim, conhecimento desde as Minas. Isso se coaduna com o que apontaram Nanci Elizabeth Oddone et al ao afirmar que seria exatamente pelo fato destes observadores (no caso das Minas, constituído por capitães-mores, camarários e outros membros da sociedade, instados a contribuir com o envio de espécies botânicas para o horto vilariquense) serem destituídos de privilégios que o observador no centro de cálculo, Joaquim Veloso de Miranda, poderia “elaborar um panótico (relatividade) e estar presente simultaneamente a tantos lugares onde de fato nunca esteve”.51 Pretendeu-se identificar, por meio de tal relação, como se deu o fluxo de informações sobre Botânica e outros assuntos da História Natural que foi construído por meio de cartas, ofícios e memórias, e não apenas em Minas Gerais, verificando também seus reflexos nos locais para onde convergiam os estudos elaborados e os exemplares colhidos e reunidos por Veloso de Miranda nas Minas, e por seus pares em vários outros espaços geográficos, sobretudo em Coimbra e Lisboa. As atividades que envolviam as pesquisas mineralógicas, a administração da Secretaria de Governo da Capitania e a direção do Horto Botânico de Vila Rica foram desempenhadas por Veloso de Miranda de forma concomitante até 1804, quando o naturalista foi substituído no cargo administrativo. Ainda que tenha acumulado várias funções, se mostrou bem sucedido em suas responsabilidades, tendo conquistado a credibilidade daqueles a quem estava subordinado, desde o governador da capitania, seu amigo de longa data, até Dom Rodrigo de Sousa Coutinho e da própria Rainha, Dona Maria. Ao longo do Capítulo 6, “Alvéolos de uma grande colmeia: Veloso de Miranda e seus auxiliares nas Minas”, buscou-se verificar como o conhecimento era construído em 51 ODDONE et al. Centros de Cálculo... p. 31. 36 Minas Gerais, ao longo das últimas décadas do século XVIII e os primeiros anos do século posterior. Joaquim Veloso de Miranda, como partícipe do Iluminismo, um avant la lettre de seu tempo, mostrava-se preocupado na resolução das indagações que a Filosofia Natural dispunha, e tinha ciência de que, sozinho, não seria capaz de resolver a maioria das incógnitas que lhe eram imputadas pela Coroa portuguesa ou por seu próprio conhecimento. Para além dos conselhos de Vandelli, que alcançava por meio de correspondência, soube tirar proveito do conhecimento de seus pares e subordinados para a execução e o aperfeiçoamento de seus projetos intelectuais. A colmeia a que o título deste capítulo faz menção faz referência à analogia que retrata o coletivo, na forma de alianças intelectuais que Veloso de Miranda procurou estabelecer nesta conquista, da qual participavam não apenas letrados igualmente formados em Coimbra, como o também naturalista José Vieira Couto (1752-1827) e o médico Luiz José de Godói-Torres (1761-1824), mas também qualquer outra pessoa de quem pudesse tirar proveito, seja político, intelectual ou pragmático. Nesse quadro figuram os próprios governadores mineiros, por meio dos quais o naturalista auferiu o apoio necessário para que pudesse colocar em prática suas ações, mas também outros tantos auxiliares, como os práticos de profissão, letrados não formados por Coimbra, como o médico Antônio José Vieira de Carvalho (17??-1818); militares, como João Gomes da Silveira Mendonça (1781-1827); profissionais de ofícios, como os riscadores e pintores Apolinário de Souza Caldas (1762/3-1806) e José Gervásio de Souza Lobo (1758?-1806) ou ainda seus próprios escravos, a quem ora delegava tarefas mais estafantes, ora o auxílio direto para herborizar. Veloso de Miranda estendeu suas pesquisas para além da Botânica e da Mineralogia, vindo a participar ativamente em estudos farmacológicos e industriais, numa plêiade de conhecimentos que proporcionava a ele e a seus auxiliares o compartilhamento de informações e, assim, a busca por um enaltecimento individual que era, inclusive, extensível aos colaboradores, o que é possível verificar tanto na ascensão intelectual e política de Silveira Mendonça, quanto na busca pela publicidade dos resultados das pesquisas de que participou, por parte de Godói Torres. No Capítulo 7, “‘Filósofo naturalista a serviço do Rei’ e de si mesmo”, procurou-se analisar as atividades que Veloso de Miranda desempenhou após se ausentar da Secretaria de Governo da Capitania e mesmo de Vila Rica, quando veio a se instalar em definitivo em sua propriedade rural, a fazenda do Mau Cabelo, situada nos sertões de Ouro Branco. Ali, instalou uma fábrica de salitre, onde deu continuidade às 37 pesquisas que já estava conduzindo sobre esse composto, e manteve, com a ajuda de seus escravos, outras atividades como a pecuária, a agricultura e as fabris de confecção e de chapelaria. Dessa forma, colocava em prática a transitividade esperada entre as atividades de pesquisa científica e a economia, aplicando seu conhecimento nas atividades produtivas primárias e secundárias. Buscou-se discutir também, neste capítulo, algumas peculiaridades da fazenda de Mau Cabelo, como sua importância enquanto centro produtor de gêneros diversos, principalmente alimentícios, os quais deveriam ser comercializados com os núcleos urbanos próximos, como Vila Rica, por exemplo. Nos chama a atenção em Mau Cabelo, ao analisar o inventário de Veloso de Miranda, alguns aspectos como as profissões que desempenhavam os escravos, sendo possível perceber que as atividades da propriedade eram divididas respeitando seus saberes originais. Ainda tomando como fonte este documento, outras surpresas como a existência de uma bem estruturada botica, de alguns instrumentos de uso científico e de uma grande quantidade de ferramentas de uso agrário revelam o perfil diverso das atividades ali realizadas. O inventário de Veloso de Miranda também foi de fundamental importância para a redação do oitavo e último capítulo, denominado “A biblioteca Velosiana”. Consta, neste documento, uma sucinta descrição dos livros que Veloso de Miranda possuía antes de falecer. Partindo do pressuposto que é impossível à luz da História das Ciências estudar um filósofo naturalista sem dar a devida atenção aos livros que o inspiraram, temos sua biblioteca particular enquanto um dos principais indícios das ideias que o embasavam. Logo, nada mais natural do que fazer com que este acervo seja parte deste mote, inserindo-o, pois, no contexto de sua produção intelectual e buscando, ainda, demonstrar sua importância enquanto diferencial de classe que afirmava seu proprietário como membro da elite política e intelectual vilariquense. Composta por 104 títulos em 260 volumes, certamente foi este um dos maiores acervos particulares existente naquele período nas vilas mineiras, e provavelmente não se tratava do total das obras que constavam na biblioteca velosiana, haja vista que era hábito comum no setecentos e no oitocentos – e ainda o é – o empréstimo de livros, de modo que várias obras de nosso naturalista podem ter permanecido ausentes desta lista por estarem fora do acervo quando do seu levantamento. Por fim, buscou-se ainda, analisar como letrados da estirpe de Veloso de Miranda se relacionavam com os impressos ao se apropriarem de saberes que o exercício cotidiano de suas profissões exigia. Ademais, sua posse também funcionava como um forte instrumento de distinção 38 social visto que, por essa época, sua aquisição era um procedimento extremamente dispendioso e muitas vezes complexo, seja pela falta de tipografias no Brasil e consequente demora na importação, ou ainda pela censura exercida pelo Estado português e pela Igreja, que classificavam muitas dessas obras como proibidas. Em suma, não foi minha intenção esgotar a trajetória de Joaquim Veloso de Miranda ou mesmo do estudo da Filosofia Natural nas Minas, no recorte temporal proposto, mas sim colaborar com o aprimoramento dessas discussões na historiografia luso-brasileira, corroborando ainda a ideia de que a América portuguesa e esta capitania foram, sobretudo, importantes não apenas pela riqueza mineral que enviaram à Europa, mas também pelos conhecimentos científicos que nela foram idealizados. 39 PARTE 1: DE MAZOMBO A “NATURALISTA A SERVIÇO DO REI”: A FORMAÇÃO DO ILUSTRADO LUSO-BRASILEIRO JOAQUIM VELOSO DE MIRANDA 40 CAPÍTULO 1 JOAQUIM VELOSO DE MIRANDA E SEU TEMPO 1.1 – De qual Veloso vamos falar? “Padre Veloso”, “Doutor Veloso” e “Veloso de Miranda”. Estas, entre outras, foram algumas denominações encontradas nas fontes e que remetem a um só homem – o religioso e filósofo naturalista mineiro Joaquim Veloso de Miranda. Quando falamos em naturalistas, nomes como Alexandre Rodrigues Ferreira, ainda no século XVIII, ou Saint-Hilaire, Eschwege e von Martius, no século seguinte, imediatamente nos veem à mente como os mais importantes expoentes do que alguns autores classificam como literatura de viagem. 52 O quadro corográfico da América portuguesa descrito por estes e por muitos outros homens foi responsável por forjar o imaginário que os brasileiros têm acerca deste território, uma impressão transmitida de acordo com o pensar e com o bico da pena de quem escrevia. 53 Muitos dos relatos que esses homens de ciência produziam, no entanto, passaram décadas em reservado, e apenas a partir da década de 1840, com o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, e novamente mais à frente, a partir das décadas de 1940 e 1960, começaram a ser redescobertos, traduzidos, impressos, estudados e melhor contextualizados. 54 E ainda que Joaquim Veloso de Miranda ou, de agora em diante, apenas Veloso de Miranda, não tenha escrito memórias tão conhecidas como aquelas produzidas por seus pares, sobretudo aqueles que visitaram o Brasil ao longo das duas primeiras décadas do século XIX, podemos facilmente perceber, nas entrelinhas das fontes consultadas, o quanto esse naturalista foi responsávelpor fornecer importantes subsídios 52 VARELA, Alex. “As viagens científicas realizadas pelo naturalista Martim Francisco Ribeiro de Andrada na capitania de São Paulo (1800-1805)”. Topoi, vol. 8, nº. 14, jan.-jun. 2007. 53 C.f. LEITE, Miriam Moreira. Livros de Viagem (1803-1900). Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997. 54 Vários estudos preliminares sobre a atuação desses naturalistas luso-brasileiros, assim como transcrições dos estudos (memórias econômicas) que realizaram começaram a ser produzidos a partir da segunda metade do século XIX, muitos dos quais saíram publicados na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, como PEREIRA, Joaquim José. Memória que contém a descrição e problemática da longitude e latitude do sertão da capitania geral de São Luiz do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, vol. 20. p. 165-169, 1904; e COSTA, A. de Souza. “O centenário Martim Francisco”. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, vol. 183, p. 252-267, abr./jun. 1944. C.f. também CORRÊA FILHO, Virgílio. Alexandre Rodrigues Ferreira: vida e obra do grande naturalista brasileiro. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1939. Sobre os relatos enquanto literatura de viagem, C.f. CHAVES, Castelo Branco. Os livros de viagens em Portugal no século XVIII e sua projeção europeia. Amadora: S/E, 1977. Para o Brasil, C.f. DOMINGUES, Ângela. “O Brasil nos relatos de viajantes ingleses do século XVIII: produção de discursos sobre o Novo Mundo”. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 28, nº 55, p. 133-152, 2008. Destaca-se o importante artigo de DIAS, Maria Odila da Silva. “Aspectos da Ilustração no Brasil”, 1968, que faz um apanhado desses naturalistas. 41 para o desenvolvimento do estudo da História Natural luso-brasileira em suas mais diferentes vertentes, da mineralogia à botânica; da farmacopeia às práticas agrícolas. 55 Obviamente esse estudo não é o primeiro a abordar a vida e a obra do “hábil naturalista”, como a ele se referiu Caio Boschi.56 Muitos outros já o fizeram, alguns desprendendo menor esforço e relegando-o às notas de rodapé e pequenas citações; outros, de forma mais verticalizada, fornecendo importantes informações sobre sua vida, ainda que não tenham utilizado todo o acervo documental existente. 57 Tais estudos, contudo, não deixaram de contribuir para aguçar ainda mais o interesse em um personagem tão carente do reconhecimento que faz jus. Diz o ditado que todo esforço é válido, ainda que muitas contradições possam ser observadas em alguns dos estudos que se debruçaram sobre a figura de Veloso de 55 Optamos por chamar Joaquim Veloso de Miranda de “Veloso de Miranda”, e não apenas de “Miranda”, como tem sido feito com José Vieira Couto, comumente denominado de “Couto”, não apenas de modo que o mesmo possa ser reconhecido de forma distinta a Frei José Mariano da Conceição Veloso, mas também por evitar que seja confundido com o português João Cardoso de Miranda, importante comerciante de escravos e dono de navios em Salvador, “que realizava o comércio com a costa da Mina e Guiné na primeira metade do século XVIII”, e que foi “cirurgião e inventor de um medicamento de grande eficácia e infalível virtude para escorbuto, doença conhecida também como ‘mal de Luanda’”. In: SILVA, Clarete Paranhos da. O desvendar do grande livro da natureza: um estudo da obra do mineralogista José Vieira Couto, 1798-1805. São Paulo: Annablume: Fapesp; Campinas: Unicamp, 2002, 168 p.; WISSENBACH, Maria Cristina Cortez. Cirurgiões do Atlântico Sul: conhecimento médico e terapêutica nos circuitos do tráfico e da escravidão (séculos XVII- XIX). Anais do XVII Encontro Regional de História – O lugar da História. Anpuh/Unicamp. Campinas, 6 a 10 de setembro de 2004. Cd-rom, p. 6; e ABREU, Jean Luiz Neves de. Nos domínios do corpo: o saber médico luso-brasileiro no século XVIII. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2011, p. 128. 56 “O hábil naturalista”; assim Caio Boschi chamou Veloso de Miranda em seu artigo homônimo, publicado em sua obra Exercícios de Pesquisa Histórica, apontando menção feita outrora pelo Governador da Capitania de Minas Gerais, Bernardo José de Lorena. In: BOSCHI, Caio. Exercícios de Pesquisa Histórica...; e BNRJ, Fundo Casa dos Contos, I - 26, 22, 012, rolo 70, documento microfilmado. Documentos de autoridades coloniais e metropolitanas sobre Historia Natural, Mineralogia e construção do Jardim Botânico de Vila Rica. Vila Rica, 31/07/1785 – 17/11/1801. 10 doc. (13 p.). Cópia. Ms. Inclui: Carta Régia do Príncipe Regente a Bernardo José de Lorena, de 19/08/1799, Ordem de Dom Rodrigo de Souza Coutinho a Bernardo José de Lorena de 22/11/1799, Termo da Junta da Real Fazenda, de 19/02/1800, Cartas da Junta da Real Fazenda à Rainha D. Maria I e ao Príncipe Dom João, de 07/08/1799 e 05/03/1800, respectivamente. Convém lembrar que mais que um epíteto, o “hábil” em questão parecia ser atribuído, à época, à maioria dos naturalistas e demais letrados de quem muito o Estado esperava. O “hábil mineralogista cavalheiro Napion” e “o hábil químico” doutor Bonvicino eram pretendidos pelo Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, Luís Pinto de Sousa Coutinho, para que fizesse produzir as ricas e abandonadas minas que Portugal possuía em África e na América. In: COUTINHO, D. Rodrigo de Sousa. Recompilação dos ofícios expedidos de Turim no ano de 1786. SILVA, Andrée Mansuy-Diniz (Org.). D. Rodrigo de Sousa Coutinho... p. 90, apud SANTOS, Nívia Pombo C. dos. O Palácio de Queluz e o mundo ultramarino: circuitos ilustrados. Portugal, Brasil e Angola, 1796-1804. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2013, p. 144 (Tese, Doutorado em História). 57 O primeiro autor a abordar o naturalista Joaquim Veloso de Miranda com maior verticalidade foi Carlos Stellfeld, em sua obra, Os dois Vellozo. Rio de Janeiro: Gráfica Editora Sousa, 1952. Mais recentemente, Caio Boschi realizou um estudo mais estruturado comparado àquele de Stellfeld. In: BOSCHI. Exercícios de Pesquisa histórica...; e, também FERREIRA, Gustavo Oliveira. As polêmicas Flores: Joaquim Veloso de Miranda e a prática científica nas Minas Setecentistas. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz, 2013 (Dissertação, Mestrado em História das Ciências e da Saúde). 42 Miranda. E não por má fé dos seus autores, mas sim pela complexidade em abordar um naturalista que frequentemente era – e continua sendo – confundido com seu quase homônimo, nascido na mesma capitania, em anos próximos, e que também escolheu o Reino vegetal como seu principal campo de estudo. Sendo assim, decidiu-se abordar, neste primeiro subcapítulo, a historiografia acerca de Veloso de Miranda, mote de nossa pesquisa, e a de seu conterrâneo, o também botânico José Mariano da Conceição Veloso, mais conhecido como frei Veloso. Ao longo da redação da tese, verificamos que tornou-se necessário distinguir ambos naturalistas, particularmente porque alguns acadêmicos defendem a existência de supostos laços consanguíneos entre eles, que, no entanto, jamais existiram. Foi possível observar que vários equívocos como esse figuram na bibliografia consultada, e mesmo nas obras mais recentes. Ao se distinguir suas trajetórias, percebe-se que os equívocos envolvendo Veloso de Miranda e frei Veloso parecem ter sido correntes e constantes e, em determinados momentos, chegaram a extrapolar estes personagens estendendo-se, inclusive, a suas obras e a seus legados. O agrônomo e botânico alemão Friedrich August Körnicke (1828-1908), em sua Monographiae Marantearum prodromus, inventariou várias espécies da flora brasileira, do qual foi estudioso e entusiasta. Muitas dessas espécies já estavam, inclusive, presentes na Flora Fluminensis, a mais famosa obra de Frei Veloso e que Körnicke, erroneamente, atribuiu como sendo de autoria do Frei Antônio de Arrábida (1771-1850), bibliotecário da Biblioteca Imperial e Pública da Corte – atual Biblioteca Nacional – e que, na verdade, atuou apenas como editor desta obra, após o falecimento de Frei Veloso. 58 Em outro momento, a mesma Flora Fluminensis haveria de ser atribuída a Veloso de Miranda, dessa vez pelo botânico inglês William Hooker, que mencionou também ser Veloso de Miranda o responsável por uma grande coleção de pinturas preservadas na biblioteca pública, no Rio de Janeiro. 59 José Pedro Xavier da Veiga (1846-1900), em seu Ephemérides Mineiras, apontou certo equívoco em catálogo de Martius, quando este naturalista alemão considerou o “Dr. Joaquim Velloso de Miranda como sendo o autor da Flora 58 KÖRNICKE, Friedrich. Monographiae Marantearum prodromus. Moscou: Typis Caesareae Universitatis, 1859-1862. Disponível em https://ia600204.us.archive.org/4/items/monographiaemara1859kr/monogra phiaemara1859kr.pdf. Acesso em 26 de dezembro de 2013. 59 HOOKER, William Jackson. Martius on the Botany of Brazil. The Journal of Botany, Vol. IV. London: Longman, Orme & Co. And William Pamplin, 1862, p. 5-6. 43 Fluminense”.60 Este autor acreditou ainda ter descoberto novo equívoco envolvendo os dois naturalistas mineiros ao mencionar um possível erro na segunda edição da História Geral do Brasil, de Varnhagen (1816-1878), quando este teria afirmado que Joaquim Veloso de Miranda era o “predileto discípulo de Vandelli” e que “escrevia em latim vários tratados acerca de diferentes assuntos da Flora Brasiliense”, referindo-se, na verdade, à obra de Frei Veloso. 61 Uma análise mais minuciosa da primeira edição de História Geral do Brasil, publicada 20 anos antes, contudo, nos leva a crer que tal improbidade é decorrente da reformulação do texto para a publicação de sua segunda edição, ocorrida poucos meses antes do falecimento de seu autor, haja vista que na primeira edição Varnhagen soube distinguir corretamente os dois naturalistas, mencionando ainda que Frei Veloso entregou-se exclusivamente ao trabalho da sua Flora Fluminense, hoje conhecida no orbe cientifico, e cujos desenhos foram copiados do natural por frei Francisco Solano. [Enquanto isso] Pelo mesmo tempo, outro naturalista de igual apelido (Joaquim Veloso de Miranda), predileto discípulo de Vandelli, escrevia em latim vários tratados acerca de diferentes assuntos da historia natural brasiliense. 62 (Grifo nosso). As confusões verificadas, no entanto, vão muito além da semelhança onomástica entre os dois naturalistas ou as dúvidas sobre a autoria da Flora Brasiliense, e se estendem à nomenclatura de determinada família de plantas e seu gênero, respectivamente Velloziaceae e Vellozia, homenagem prestada por Domenico Vandelli (1735-1816), lente de História Natural e Química na Universidade de Coimbra e professor de Veloso de Miranda naquela instituição a Veloso de Miranda, em reconhecimento de seus trabalhos como naturalista nos sertões das Minas Gerais. Não nos surpreende, contudo, verificar que, desde o século XIX é extensível à Velloziaceae os acertos e desacertos das descobertas e dos possíveis descobridores, manutenção que parece ter sido favorecida pela quase ausência de Veloso de Miranda nos anais da História Natural luso-brasileira, principalmente nas primeiras décadas após seu falecimento, momento este em que Frei Veloso passou a ser enaltecido enquanto responsável por grande parte das descobertas botânicas do final do século XVIII e primeiros anos do século posterior, incluindo muitas daquelas realizadas por Veloso de 60 XAVIER DA VEIGA, José Pedro. Ephemérides Mineiras. Ouro Preto: Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1897, p. 152. 61 VARNHAGEN. História Geral do Brasil... 1877, p. 1002. 62 Ídem, p. 262. 44 Miranda. Um destes enganos foi encetado pelo botânico e químico alemão Theodor Peckolt e por seu filho, Gustav Peckolt, em 1888, quando escreverem o livro História das Plantas Medicinais e úteis do Brasil, novamente impresso no ano de 2016 sem que fosse corrigido ou mesmo apontado o equívoco dos autores que creditaram as Velloziáceas como homenagem prestada ao Frei Veloso. 63 Ainda em 1888, o engenheiro e botânico mineiro João Barbosa Rodrigues (1842-1909) também atribuiu, erroneamente, a família Vellozia ao Frei, equívoco repetido por Barbosa Rodrigues ao colocar o nome Vellozia em determinada revista que lançou no Museu Botânico do Amazonas, em 1888: A Vellosia, como a Linnaea, a Malpighia, a Bomplandia, a Adansonia, a Lindenia, e outras, com os seus trabalhos, vêm também render um tributo de homenagem, perpetuando o nome do brasileiro notável que se chamou Frei José Mariano da Conceição Velloso, o primeiro botânico que no Brazil chegou a ter publicado o fruto dos seus fatigantes trabalhos. Na falta de um Mecenas, sirva o nome de um redivivo, e que as palmas que porventura colha, prestem para ornar o pedestal da sua gloria. 64 Os desacertos que envolvem a Vellozia perduraram por muitos anos podendo ser verificados ainda na década de 1940, quando dos preparativos para o segundo centenário de nascimento de Frei Veloso. Em um artigo denominado “O gênero Velloziella”, publicado na Tribuna Farmacêutica de Curitiba, a descoberta e o nome das plantas seriam, mais uma vez, atribuídos ao Frei Veloso. 65 Algumas décadas depois, o engenheiro agrônomo Adherbal Malta (?-1988), em breve artigo publicado na Revista do Instituto Histórico Geográphico de São João del-Rei, em 1987, alega sem apontar maiores referências que “Von Martius, Lineu, [e] a Sociedade Científica Portuguesa, Francesa e Brasileira resolveram homenagear o renomado Frei Veloso” com a criação da Família Vellosiácea. Particularmente ainda no que se refere a Frei 63 PECKOLT, Theodor; PECKOLT, Gustav. História das plantas medicinais e úteis do Brasil. Belo Horizonte: Fino Traço, 2016, p. 78. 64 RODRIGUES, João Barbosa. Vellosia. Contribuições do Museu Botânico do Amazonas, 2ª edição. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1891, p. VI. Apenas o primeiro número da Vellozia foi impresso, sendo reeditado e reimpresso no ano de 1981, em dois volumes. In: FERREIRA, Lúcio Menezes. Território primitivo: a institucionalização da arqueologia no Brasil (1870-1917). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2010, p. 35. 65 TRIBUNA FARMACÊUTICA. O gênero Velloziella. Vol. VIII, n°12. Curitiba, 1941, p. 279. 45 Veloso, Malta aponta sua data de nascimento como sendo o ano de 1792, quando, na verdade, este nascera exatamente meio século antes. 66 A despeito disso, alguns estudos publicados ao longo do século XIX souberam referenciar apenas os gêneros e espécies com que Frei Veloso teve contato, excluindo deles as velosiáceas. Tal é o caso, por exemplo, da Biographia do Botanico brasileiro José Marianno da Conceição Veloso, do engenheiro e botânico José Saldanha da Gama (1839-1905). 67 Saldanha estava certo ao afirmar que tal atribuição era equivocada visto que a planta é endêmica apenas do cerrado de Minas Gerais, região em que frei Veloso nasceu, mas que jamais estudou. Seus estudos botânicos foram realizados após se estabelecer no Seminário de Macacu, no Rio de Janeiro, de onde foi para São Paulo e, de lá, para a cidade do Rio de Janeiro. As Vellozias, no entanto, são naturais nos cerrados e campos rupestres de altitude e na época de Veloso de Miranda eram facilmente encontradas nos arredores do Inficionado, em Vila Rica, na Cidade de Mariana e em Ouro Branco, espaços geográficos em que passou sua juventude e, mais tarde, desenvolveu seus estudos botânicos. Ademais, foi Veloso de Miranda o principal responsável por enviar das Minas as remessas de produtos naturais de origem botânica para Vandelli, e somada a amizade entre ambos, é natural presumir que tal homenagem invariavelmente seria destinada do mestre ao seu principal discípulo e colaborador. Os esboços biográficos escritos sobre Veloso de Miranda não foram, entretanto, pautados apenas por desacertos. O naturalista botânico George Gardner, quando de sua passagem por Vila Rica, entre 1836 a 1841, coletou nas cercanias da cidade e, principalmente, na serra de Ouro Branco, “uma coleção especial de muitos curiosos e belos fetos (brotos), todas espécies novas, e de vários lindos Vellozia [...], plantas peculiares do Brasil [...] e que foram assim denominadas em honra do Dr. Joaquim Veloso de Miranda, jesuíta (sic), natural da Província de Minas Gerais, que dedicou muito de seus lazeres ao estudo da botânica de seu país”.68 Corrobora tal perspectiva outro apontamento do mesmo naturalista, quando de sua passagem pelo atual estado do Tocantins, mencionando a “Flora Fluminensis, a work published at the expense of the Brazilian government. The drawings from which the plates were executed, were 66 MALTA, Adherbal. “História e botânica”. RIHGSJDR, n° 5, p. 75-76, 1987. 67 GAMA, José Saldanha da. “Biographia do Botanico brasileiro José Marianno da Conceição Veloso”. RIHGB, tomo XXXI, 1868, p. 137-305. 68 GARDNER, George. Viagem ao interior do Brasil, principalmente nas províncias do Norte e nos distritos do ouro e do diamante durante os anos de 1836-1841. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EdUsp, 1975, p. 160. Apesar de acertar sobremodo a biografia de Veloso de Miranda, Gardner foi infeliz ao classificá-lo como jesuíta, ordem religioso que naquele momento se encontrava afastada dos domínios lusos. 46 prepared at Rio de Janeiro about the end of the last century (século XVIII), under the direction of a Jesuit of the name of [José Mariano da Conceição] Vellozo”.69 Apesar do acerto da atribuição, a afirmação de que Veloso de Miranda realizava seus estudos botânicos como “seus lazeres” reflete o preconceito que alguns naturalistas estrangeiros tinham em relação às ciências luso-brasileiras, e seus artífices, o que muito impregnou a literatura científica sobre o tema que se seguiu. 70 Raimundo da Cunha Matos (1776-1839), em sua Corografia Histórica da Província de Minas Gerais, de 1837, afirmou que Frei Veloso era “algumas vezes confundido com o padre Veloso”.71 O já citado Xavier da Veiga, em outro texto, procurou sanar as desordens que envolviam os dois naturalistas mineiros, dedicando pequena explanação sobre ambos: O padre Joaquim Veloso de Miranda foi contemporâneo de Frei José Marianno da Conceição Veloso, (tendo nascido, provavelmente, pouco depois deste e também pouco depois dele falecendo); ambos tiveram um cognome igual, ambos nasceram em Minas-Gerais e foram ambos notabilíssimos botânicos: daí a confusão em que por vezes andam os seus nomes nas citações e referencias, mesmo entre os homens de letras e em trabalhos bibliográficos. 72 É bem provável que Auguste de Saint-Hilaire tenha tomado contato com a Florae Fluminensis de Frei Veloso, ao desembarcar no Brasil, referindo-se à existência de “dois exemplares manuscritos na Biblioteca do Rio de Janeiro”. Mais tarde, rememorando suas andanças pela capitania de Minas Gerais, o naturalista francês enalteceria Frei Veloso em uma de suas publicações, afirmando que “seria fortemente desejável que se publicassem os magníficos desenhos”, e ressaltando que seu trabalho não deveria ser confundido com o de outro letrado, Veloso de Miranda. 73 Também Cônego Trindade (1883-1962), profundo conhecedor e efemeredista de Minas Gerais, atribuiu ao contato especial que Veloso de Miranda tivera com seu mestre, Vandelli, a 69 (…) “um trabalho publicado à custa do governo brasileiro. Os desenhos de onde foram executadas as placas foram preparados no Rio de Janeiro, no final do século passado (século XVIII), sob a direção de um jesuíta de nome [José Mariano da Conceição] Vellozo” (...). Nossa tradução. In: GARDNER, George. Travels in the interior of Brazil. London: Reeve, Benham and Reeve, 1849, p. 64-65. 70 GARDNER. Viagem ao interior do Brasil, p. 160. 71 MATOS, Raimundo José da Cunha. Corografia Histórica da Província de Minas Gerais, vol. 1. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo; Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1981 [1837], p. 45. 72 XAVIER DA VEIGA, José Pedro. Ephemérides Mineiras, vol. 3... 1897, p. 152. As verdadeiras datas de nascimento e falecimento de frei Veloso são 1727 e 24 de janeiro de 1784 respectivamente. Assim, perde a valia o “pouco depois” proposto por XAVIER DA VEIGA. 73 SAINT-HILAIRE, Auguste. Histoire des plantes les plus remarquables du Brésil et du Paraguay. Paris: Belin, 1824, p. 23. 47 razão para que este homenageasse como “Vellosia uma das muitas plantas estudadas por Veloso de Miranda”, gênero descrito na Florae lusitanicae et brasiliensis specimen, do lente paduano, em 1788”.74 Posteriormente, o botânico brasileiro Carlos Stellfeld (1900-1970) destacou-se como responsável pela primeira obra de maior complexidade publicada no intuito de sanar as confusões que ainda persistiam. 75 Apesar de seu livro ser quase todo dedicado a Frei Veloso, Stellfeld utilizou-se de considerável acervo documental sobre Veloso de Miranda, o que lhe permitiu dirimir vários equívocos, e fornecer importantes informações sobre ele. Os dois Vellozo, entretanto, trata Veloso de Miranda como sendo, nas palavras do autor, apenas o “outro Veloso”. No entanto, ciente da relação de Veloso de Miranda com as Vellosias, Stellfeld fez uma homenagem ao naturalista mineiro ao atribuir o nome “Vellozoa” a uma seção da Tribuna Farmacêutica, publicação da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Paraná, sob sua direção. Apesar das complexas relações envolvendo ora os dois naturalistas, ora a Flora Fluminensis, ora o gênero Vellosia, são acertadas as palavras de Xavier da Veiga para quem “nem por isso pode o Dr. Joaquim Veloso de Miranda deixar de ser respeitado e admirado, nas suas obras, como um grande naturalista, não somenos, talvez, ao seu conterrâneo e quase homônimo, o autor da Flora”.76 Por fim, o historiador português Rómulo de Carvalho, ao tratar em sua A História Natural em Portugal no século XVIII, publicada em 1987, acerca dos “Bacharéis de Filosofia que assistiam no Brasil” pelos idos de 1779, cita, entre eles, “Veloso, em Vila Rica”, mas, numa nota de rodapé, afirma que um destes naturalistas, “de apelido Veloso, a que nos referimos”, era “José Mariano” e não Joaquim.77 Devido a tantos equívocos, optou-se por fazer uma breve biografia de frei José Mariano da Conceição Veloso, com o intuito de dirimir as dúvidas que permanecem na biografia de ambos, referenciar as publicações que dizem respeito a cada um e confirmar a notoriedade desse naturalista que sempre concorreu em prestígio ao seu quase homônimo. Entretanto, não se pretende esgotar tal assunto. Pelo contrário, o objetivo é apontar o quanto Frei Veloso e Veloso de Miranda contribuíram para o 74 TRINDADE, (Cônego) Raimundo. Genealogias da zona do Carmo. Ponte Nova: Gutenberg. 1943, p. 345-346. 75 STELLFELD. Os dois Vellozo... 76 XAVIER DA VEIGA. Ephemérides Mineiras. Vol. 3, p. 152. 77 CARVALHO, Rómulo de. A História Natural em Portugal no século XVIII. Lisboa: Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1987, p. 88. 48 desenvolvimento da história natural, cada qual a seu modo, suscitando, assim, novas discussões que possam enriquecer ainda mais a temática. Frei José Mariano da Conceição Veloso nasceu em 1742, em São José del-Rei, atual Tiradentes, tendo sido batizado com o nome de José Xavier Veloso. É frequentemente relacionado às muitas funções que ocupou ao longo de sua vida, podendo ser enumeradas as de sacerdote, professor, tradutor, editor e diretor de Casa Tipográfica do Arco do Cego. Porém, é público que ocupou de forma mais ativa aquela que lhe dava maior prazer pessoal e, sobretudo, conferia a notoriedade que gozou em vida e após sua morte: a função de naturalista botânico. José Veloso partiu das Minas para a interior do Rio de Janeiro, onde, em 1761, tomaria o hábito de São Francisco, no convento de São Boaventura, que pertencia a freguesia de Santo Antônio de Macacu. Poucos anos depois, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde estudou Teologia e Filosofia, no Convento de Santo Antônio, ordenando-se frei franciscano, em 1766. Neste mesmo ano, mudou-se para São Paulo, onde passou a lecionar Retórica e Geometria, no Convento de São Francisco. Tanto no Rio de Janeiro, quanto em São Paulo, entre missais e obras de hagiografia e oratória, José sempre encontrou tempo para se dedicar ao estudo da botânica. Quando ainda se encontrava em São Paulo, Frei Veloso foi convidado a comandar algumas pequenas expedições pelo interior da capitania do Rio de Janeiro, o que viria a ocorrer entre 1783 a 1790. Na ocasião, realizou o trabalho pelo qual seria reconhecido pelo vice-rei Luiz de Vasconcellos e Sousa (1742-1809), devido à qualidade dos resultados apresentados. Os exemplares coletados foram enviados a museus e instituições congêneres em Lisboa e Coimbra, que buscavam reunir e centralizar os itens de História Natural remetidos d’além-mar. Ao término desse período, quando já residia no Rio de Janeiro, passou a lecionar História Natural em seu antigo seminário. Aos poucos, aperfeiçoou ainda mais sua grande coleção botânica, transformando, literalmente, seu claustro em um primoroso e diversificado herbário. Em 1790, frei Veloso partiu para Portugal, acompanhando o vice-rei, Luiz de Vasconcellos, que por término de suas atribuições retornava a Lisboa. Ao partir para a Europa, pretendia aprimorar seus conhecimentos em Botânica, no Museu da Ajuda e na Academia Real das Ciências de Lisboa. Mais tarde, quando de seu retorno ao Brasil, seria eleito membro correspondente desta última instituição. A relação entre Frei Veloso e a corte lisboeta, particularmente com Dom Rodrigo, o qual já era conhecedor das atividades realizadas pelo botânico mineiro, pode ser analisada à luz do compadrio 49 intelectual que também incluía Alexandre Rodrigues Ferreira, José Vieira Couto e o próprio Veloso de Miranda, dentre outros. Uma vez em Lisboa, frei Veloso passou a atuar como compilador e tradutor de impressos que se mostrassem interessantes para realizar os tão desejáveis “melhoramentos” para os “estabelecimentos do Brasil”,78 além de ter sido designado, em 1799, para atuar como diretor da Casa Literária do Arco do Cego. 79 A tipografia Casa Literária do Arco do Cego foi, na virada do setecentos para o oitocentos, uma das instituições portuguesas que melhor representou o fenômeno da ilustração lusa. Sua criação foi uma das estratégias encetadas pela Coroa com o intuito de dar prosseguimento ao processo de desenvolvimento e aprimoramento das técnicas de pesquisa e exploração dos recursos minerais, metalúrgicos, botânicos e agrícolas das conquistas, sobretudo do Brasil. No Arco do Cego, Frei Veloso desenvolveu não apenas ações de impressão tipográfica, mas também de tradução de obras, o que se revela na publicação de numerosos títulos de autoria de autores ingleses e franceses, traduzidos para o português. A tarefa de tradução incluía reescrita e reapropriação do conteúdo, distanciando-se da mera cópia, e em pouco mais de dois anos de operação, vieram à luz 83 títulos, grande parte de cunho técnico e pragmático. Sob sua batuta, a tipografia conseguiu materializar os anseios da sociedade letrada portuguesa de não depender mais somente das casas inglesas e francesas para ter acesso às publicações especializadas, tomando ainda o cuidado de manter o mesmo padrão gráfico de suas congêneres. 80 No Arco do Cego, Frei Veloso estabeleceu relações pessoais e profissionais com- importantes letrados, como Hipólito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça 78 LEME, Margarida Ortigão Ramos Paes. Um breve itinerário editorial: Do Arco do Cego à Imprensa Régia. In: CAMPOS, Fernanda Maria Guedes de (org). A Casa Literária do Arco do Cego (1799-1801). Bicentenário “sem livros não há instrução”. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda: Biblioteca Nacional, 1999, p. 77-90, apud GALVES, Marcelo Cheche. “Cultura letrada na virada para os oitocentos: livros à venda em São Luís do Maranhão”. Anais do XXVII Simpósio Nacional de História. Natal, 2013, p. 2. 79 MARCOLIN, Neldson. “O botânico que fazia livros na Corte”. Pesquisa FAPESP, n. 172, p. 9, junho de 2010. 80 SANTOS, Christian Fausto Moraes dos. “Das memórias do Arco do Cego: divulgação científica na América Portuguesa do século XVIII”. Revista Diálogos. Maringá: Universidade Estadual de Maringá, vol. 12, n° 1, p. 207-225, 2008. 50 (1774-1823), 81 e o poeta Manuel Bocage (1765-1805) que, naquela tipografia, atuaram como tradutores e revisores. 82 Ao assumir a direção do Arco do Cego, Frei Veloso passou a dispor de toda a infraestrutura necessária para concretizar a publicação de sua obra sobre a flora do Rio de Janeiro. Ao embarcar, é bem provável que já vislumbrasse sua possível impressão, pois tomou o cuidado de levar consigo todos os seus escritos e estudos. Esses, contudo, só começaram a ser impressos em 1825, após seu falecimento, com grande parte da obra sendo impressa muitos anos depois. Muitas outras obras de sua autoria ou que por ele foram traduzidas, contudo, chegaram a serem publicadas, ainda em vida, como O Fazendeiro do Brasil; Aviário brasílico ou o Extrato sobre os engenhos de açúcar do Brasil, todas no ano de 1800. Com o fim das atividades do Arco do Cego, em 1801, a Imprensa Régia assumiu o espólio material e os recursos humanos da antiga tipografia. Frei Veloso passou a compor a Junta Administrativa, Econômica e Literária, incumbida da sua direção. O religioso somente retornaria a América portuguesa enquanto integrante da Corte portuguesa, quando esta se mudou para o Brasil, em 1808. Novamente no Rio de Janeiro e ainda sob a proteção da Coroa, Frei Veloso continuou desenvolvendo pesquisas até o ano de 1811, quando faleceu de hidropisia, no convento de Santo Antônio. Sua biblioteca particular, composta por vários impressos e um grande número de manuscritos, foi doada para a Real Biblioteca do Rio de Janeiro, atual Biblioteca Nacional. Como dissemos, este curto fragmento biográfico tem o intuito não apenas de diferenciar Frei Veloso de seu quase homônimo, Joaquim Veloso de Miranda, mas também apontar a importância desse naturalista para o desenvolvimento das pesquisas em história natural na América portuguesa e, inclusive, nas Minas Gerais, destino de muitas das obras impressas na casa tipográfica que dirigiu. Por fim, em uma tentativa de esgotar maiores conflitos biográficos, somamos ainda a presença contemporânea a estes dois naturalistas do coronel José Veloso do 81 Hipólito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça criou, em 1808, o Correio Braziliense, primeiro periódico brasileiro impresso ainda em Londres. Um breve e elucidante estudo sobre o pioneirismo do Correio Braziliense e sobre as causas que levaram o mesmo a ser publicado em Londres pode ser verificado em LUSTOSA, Isabel. O nascimento da imprensa brasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004. 82 GONÇALVES, Adelto. “A casa onde nasceu Bocage e outras verdades que não pegam”. Colóquio Internacional Leituras de Bocage nos séculos XVIII-XXI. São Paulo: USP, 2005. 51 Carmo, o qual era possuidor de várias lavras no local denominado Morro do Ramos, 83 situado no então distrito das Cabeças, freguesia de Nossa Senhora do Pilar do Ouro Preto onde, em 1814, Eschwege (1777-1855) contabilizou a presença de “34 escravos” sob sua posse, além de “17 faiscadores livres”, que, juntos, produziam um total de 180 oitavas de ouro. 84 Além das minas do morro do Ramos, o coronel José Veloso do Carmo possuía outras áreas de mineração no morro de Santo Antônio, também em Vila Rica. 85 Na virada do século, em 1804, aos 76 anos, José Veloso do Carmo era o proprietário do maior plantel escravocrata de Vila Rica, com 125 cativos, ou seja, um dos principais homens bons de Vila Rica em seu tempo. 86 Ao contrário dos outros Veloso, este minerador não exerceu atividades relacionadas ao naturalismo filosófico. Sua relevância para o cenário vilariquense se situa na esfera política, onde foi presença marcante na Câmara municipal desde 1776, quando foi eleito vereador, até 1790, quando foi nomeado Juiz. Na primeira ocasião, ocupando o posto de capitão e, na segunda, o de coronel 87 nas companhias de ordenanças locais. 88 O antigo Morro do Ramos, onde estavam estabelecidas suas minas, é hoje um bairro de Ouro Preto conhecido pelo nome de “Veloso”, em alusão a esse antigo minerador. Mais recentemente, um logradouro deste mesmo bairro também foi batizado com seu nome. 89 Portanto, a atribuição de Veloso a esses logradouros de Ouro Preto, onde Joaquim Veloso de Miranda também vivera e ali fora responsável pelo estabelecimento do horto botânico, não se referem à sua pessoa. 83 A região que compreendia o então morro do Ramos é hoje o atual bairro do Veloso, provavelmente fazendo referência a seu antigo proprietário, o coronel José Veloso do Carmo. Já no ano de 1804, o morro do Ramos estava dividido entre 11 propriedades que compreendiam 41 habitantes. In: MATHIAS. Um recenseamento da capitania de Minas Gerais, p. 190-208. 84 ESCHWEGE. Pluto Brasiliensis, vol. 2. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1979, p. 9 e 20-21. Além de Eschwege, o naturalista austríaco Johann Emmanuel Pohl (1782-1834) também visitou as minas do coronel Veloso. In: POHL, Johann Emmanuel. Viagem ao Interior do Brasil. Belo horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1976, p. 425. Eschwege em outro momento classifica os faiscadores como sendo “gente misera, que não tendo lavras próprias, explora os restos deixados pelos mineiros”. In: ESCHEGE. Collectanea de Scientistas Extrangeiros, vol. 2. Belo Horizonte: Imprensa Official de Minas Gerais, 1932, p. 36-37. 85 ESCHWEGE. Pluto Brasiliensis, vol. 2, p. 9 e 20-21. 86 MATHIAS. Um recenseamento na Capitania de Minas Gerais, p. 178-179. 87 APM, CC, Cx. 77, rolo 524, Doc. 20064. Requerimento de José Veloso Carmo sobre a arrematação do ofício de juiz ordinário. 1780. 88 Sobre a importância desses cargos e o papel das companhias de ordenanças, C.f. COTTA, Francis Albert. No rastro dos Dragões: políticas da ordem e o universo militar nas Minas setecentistas. 2004. 302fl (Tese de Doutorado em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte). 89 DIÁRIO OFICIAL DE OURO PRETO. Lei n° 623, de 21 de dezembro de 2010. Ouro Preto, ano II, n° 223, 27 de dezembro de 2010. Dá denominação a Logradouro Público “Praça Cel. José Veloso do Carmo”. 52 1.2 – Os Veloso de Miranda: um clã mazombo ...nem sabe nem ouviu dizer dele palavra de casamento a ninguém; disse mais que o dito contratante fazia algumas vezes assistência na freguesia de Braga e algumas viagens a Guimarães e em todas as partes o conheceu sempre livre, e desimpedido, o qual conhece a vinte e quatro ou vinte e cinco anos, pouco mais ou menos, e disse ele que o dito contratante viera para o Brasil dois ou três anos primeiro que ele. 90 Com este depoimento, realizado pelos idos de 1740, o vigário do Inficionado, Antonio Sarmento de Vasconcellos, afirmou que conhecia Francisco Veloso de Miranda que, mais tarde, viria a ser pai de Joaquim Veloso de Miranda; e que ele era um homem bom, solteiro, e de fé, dentre outras coisas. Verificamos, contudo, que Francisco mentiu durante o processo matrimonial. Pretendendo contrair casamento com a menina Maria, “que era de idade quinze para dezesseis anos, pouco mais ou menos”,91 afirmou ter “vinte e oito anos pouco mais ou menos”. 92 As testemunhas, no entanto, alegaram que Francisco tinha “idade de quarenta anos para cima”...93 Ademais, constata-se que o nubente omitiu em seu depoimento o fato de ter tido uma filha em Portugal, de nome Rita, conforme confessou em testamento. 94 Mas quem eram Francisco e Maria, pais de Joaquim Veloso de Miranda? Filho de Jerônimo da Silva Guimarães e de Angélica de Miranda da Fonseca, Francisco era natural da vila de Guimarães, Arcebispado de Braga, tendo sido batizado na igreja de Nossa Senhora da Oliveira, conhecida à época como Colegiada de Guimarães, ou da Sé, freguesia de Oliveira do Castelo, atual centro histórico da cidade de Guimarães. 95 Seus pais, contudo, já eram falecidos quando desembarcou na América portuguesa, conforme 90 AEAM, Processo Matrimonial n° 2908, Francisco Veloso de Miranda e Maria Teresa de Nazaré, 1740, f. 12. 91 Idem, f. 10v. 92 Idem, f. 11v. 93 Idem, f. 12. 94 Francisco deixou “200 missas de esmola a cento e vinte reis cada uma pela alma de sua filha Rita, que faleceu em Lisboa”, em época não informada. In: ACSM. 1° Ofício, caixa 88, auto 1857, Inventário de Francisco Veloso de Miranda, 1764, fl. 3 e 3v. 95 Mesmo verificando o período compreendido entre os anos 1670 e 1720, infelizmente não encontramos o registro de nascimento de Francisco Veloso de Miranda no Livro de Batismo da freguesia de Oliveira, Arquidiocese de Braga. 53 declarou em seu testamento. 96 Como tantos outros reinóis nos trópicos, Francisco tinha como objetivo fazer fortuna a partir da prática do comércio ou da exploração do ouro em Minas Gerais, pretenção comum a muitos minhotos que, ao longo do século, emigraram. 97 Tal situação foi estimulada pela própria conformação socioeconômica daquela região, densamente povoada e possuidora de uma área de terras cultiváveis bastante restrita, conquanto possuísse um sistema cultural agrícola fruto da “combinação entre o trabalho do homem e os agentes naturais, pois, devido a sua constituição geológica, o solo do Minho é pobre, mas a abundância de água, os adubos orgânicos e os cuidados que o homem dedica às culturas permitem uma vegetação abundante e ‘luxuriosa’”.98 Nas proximidades de Braga, o núcleo urbano cabeça da região, quase todas as extensões de terras eram propriedade ou da nobreza, ou do clero, sobretudo da Mitra e do Cabido da Sé de Braga. Em meio a estas vastas extensões de terras, quase feudais, proprietários de pequenas quintas, denominadas por Margarida Durães de minifúndios, sobreviviam plantando e colhendo gêneros que lhes davam a subsistência e algum excedente, visando a comercialização e as trocas. 99 Se o clero e a nobreza controlavam as terras, restava aos pequenos camponeses o estabelecimento de contratos, posicionando-se como foreiros ou explorando as terras mediante o pagamento de pensões. As poucas terras produtivas eram consideradas “símbolos de prestígio social e 96 O testamento de Francisco Veloso de Miranda encontra-se no Arquivo histórico da Casa Setecentista de Mariana. Estatutos municipais da Ordem Terceira do Serafim Humano o Glorioso Patriarca São Francisco da Cidade de Mariana. Livros de registro de testamentos – 1º Ofício, livro 68, fl. 72. Uma cópia deste documento pode ser encontrada no inventário de Francisco Veloso de Miranda, localizado no ACSM, 1° Ofício, Livro de Registro de Testamentos n° 68, 1763-1765, fl. 71v. 97 Sobre a origem minhota de grande parte dos portugueses emigrados C.f. RAMOS, Donald. “Marriage and family in colonial Vila Rica”. Hispanic American Review, North Carolina, v. 55, p. 200-225, 1975; SCOTT, Ana Silvia Volpi. “Desvios Morais nas Duas Margens do Atlântico: o concubinato no Minho e em Minas Gerais nos anos setecentos”. População e Sociedade, Porto, vol. 7, p. 129-158, 2001. Sobre a presença minhota entre os comerciantes, C.f. FURTADO. Homens de Negócio. Para os portugueses da região norte, a imigração para a América portuguesa apresentava-se como uma das principais vias para a aquisição de fortunas ou ainda para a indissolubilidade dos bens familiares. Vitória Andrade, por exemplo, aponta que em meio aos testamentos minhotos pesquisados, “havia sempre um ou dois herdeiros residentes no Brasil”. In: ANDRADE, Vitória Fernanda Schettini de. “Do lado de lá e do lado de cá: natureza, economia e sistema sucessório. Uma análise comparada entre a Zona da mata mineira e Noroeste português”. Revista de História Econômica & Economia Regional Aplicada, vol. 6, n 10, Jan./-Jun. 2011, p. 131. 98 DURÃES, Margarida. Herança e sucessão: Leis, práticas e costumes no Termo de Braga (séculos XVIII-XIX). Braga: Universidade do Minho, 2000, p. 128 (Tese, Doutorado em História); e ALMEIDA, Carla Maria Carvalho de. Trajetórias imperiais: imigração e modelo de reprodução social das elites em Minas colonial. Actas do Congresso Internacional Espaço Atlântico de Antigo Regime: poderes e sociedades. Lisboa: Centro de História de Além-Mar; Instituto de Investigação Científica Tropical, 2008. 99 DURÃES. Herança e sucessão... p. 128. 54 poder”,100 e constituíam o principal bem de muitas das famílias locais. Estas optavam pelo seu não fracionamento, estabelecendo outras vias para equiparar a legítima que cabia a cada herdeiro, antecipando dotes, joias, doações em víveres, animais ou mesmo em espécie. Isso, juntamente a um capital simbólico, expresso na capacidade de ler e escrever, era o que, frequentemente proporcionava os meios para a imigração. Ademais, a permanência no Minho era vista como impossibilidade para a mobilidade social, fazendo com que a emigração fosse uma das principais escolhas de muitos minhotos. Esta, por fim, aliviava a pressão sobre o uso da terra e sua possível dissolução. Provavelmente foi uma destas situações que vivenciou Francisco Veloso de Miranda em sua terra natal. Uma vez na Minas, estabeleceu-se no arraial do Inficionado, situado a 4 léguas da vila do Ribeirão do Carmo, mais tarde Cidade de Mariana. 101 O arraial surgira por volta de 1702, a partir da descoberta, pelo paulista Salvador Faria de Albernás, de ouro na região e, em 1718, tornou-se freguesia, com o nome de Nossa Senhora do Nazaré do Inficionado. 102 Com certeza a vida em Minas lhe auferiu alguma renda, pois, por volta de 1740, casou-se com Maria, filha de um dos homens mais importantes do lugar, Paulo Rodrigues Durão (?-1743). Maria nasceu por volta de 1725, na freguesia do Inficionado. Seu pai, sargento-mor de ordenanças, era natural de São Tiago Maior de Évora, pequena vila próxima a Lisboa. Sua mãe, Ana Garcês de Morais, era filha de Antônio Simões Moreira [ou Morais?] e de Francisca Garcês, tendo sido batizada a 6 de agosto de 1690, na vila de Santos, São Paulo. 103 Ana casou, em primeiras núpcias, com Manuel da Assunção, conforme demonstrou Laura de Mello e Souza. 104 Em Minas Gerais, para onde emigrou não se sabe exatamente quando (mas provavelmente com seus pais), veio a conhecer Paulo. A união entre os dois não foi regularizada com os sagrados laços do matrimônio católico sendo, portanto, ilegítima, vivendo em regime de concubinato. Assim, Maria, a mãe de Joaquim Veloso de Miranda, era filha ilegítima dessa segunda 100 DURÃES. “Estratégias de sobrevivência económica nas famílias camponesas minhotas: os padrões hereditários (sécs. XVIII – XIX)”, p. 2. 101 OLIVEIRA, Ronald Polito de; LIMA, José Arnaldo Coêlho de Aguiar (Orgs.). Visitas pastorais de dom Frei José da Santíssima Trindade (1821-1825). Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1998, p. 83. 102 BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário Histórico e Geográfico de Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia, Belo Horizonte, S/E, 1971, p. 431. 103 AEDOO. Processo 1883, estante 3, gaveta 20. Processo de Habilitação De Genere et Moribus de Joaquim Veloso de Miranda e João Veloso de Miranda, 1761. 104 AEDOO, Devassas - 1721-1735, fls. 34, apud MELLO E SOUZA, Laura de. Desclassificados do ouro: a pobreza mineira no século XVIII. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1986, p. 152. 55 união de sua mãe. Após a morte de Paulo, Ana ainda estabeleceria uma teceria união, também na condição de amasiada, com Tomé Inácio da Costa Mascarenhas, que foi secretário de governo da capitania de Goiás. 105 Paulo Rodrigues Durão, como já dito, foi um dos primeiros moradores do Inficionado, onde conheceu rápida ascensão social sob o lastro das ricas minas que explorou na localidade. Em 1722, foi nomeado sargento-mor do Mato-Dentro, como recompensa pelo auxílio que forneceu a Pedro Miguel de Almeida Portugal e Vasconcelos (1688-1756), o 3º Conde de Assumar, governador da Capitania de São Paulo e Minas do Ouro entre 1717 e 1721, durante a repressão a quilombos e aos negros que, armados, assaltavam os viajantes nos caminhos do sertão do Piracicaba. Ocupou ainda o cargo de cobrador dos reais quintos, entre 1721 e 1725 e entre 1727 e 1730, sem que fossem ouvidas “queixas dos moradores”.106 Foi através das doações realizadas pelo sargento-mor Paulo Rodrigues Durão que o templo do arraial deixou de ser uma pequena capela e se transformou em matriz, tendo sido benzida em 1729, 107 e colada em 1752. 108 Os valores doados para a reforma e a ampliação do templo não refletiam apenas a sua benevolência, mas também sua estratégia para conquistar honra pública, haja vista que “ofertar era forma de torna-la”, a honra, “pública, extraindo daí status social e ganhos políticos”.109 Durão também lograria o reconhecimento da Coroa por participar na repressão da Revolta de 1720. Quando convocado pelo Conde de Assumar para combater os rebelados em Vila Rica, respondeu com a condução ao local da contenda de “todos os seus escravos armados, que são numerosos, e muitas pessoas brancas sustentando todos à sua custa no que fez considerável despesa de sua fazenda”. Em outra oportunidade, Paulo e seus escravos combateram um grupo de negros revoltosos, na região de Catas 105 FERREIRA. As polêmicas Flores... p. 33. 106 RAPM. Cartas patentes, código 1229, ano 4, fascículo 4, ano 1899. Patente de Paulo Rodrigues Durão, sargento-mor do Mato Dentro. 27 de outubro de 1722, p. 101-102. 107 BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário Histórico e Geográfico de Minas Gerais... p. 431. Germain Bazin informa que o atual templo de Santa Rita Durão não é a capela primitiva e que o Livro de Receita e Despesa da Irmandade do Santíssimo Sacramento faz alusão a vários trabalhos executados naquele templo na segunda metade do século XVIII. In: BAZIN, Germain. Arquitetura religiosa barroca no Brasil, vol. 2. Rio de Janeiro: Record, 1983, p. 100. Especula-se que o local onde teria sido construído o antigo templo foi encontrado por acaso em uma área recentemente desmatada sendo necessários, contudo, estudos arqueológicos que confirme tal afirmação. DESCOBERTA arqueológica em Santa Rita Durão. O Espeto. Passagem de Mariana: Mariana, p. 1-2, 15 de maio de 2014. 108 TRINDADE, Cônego Raimundo. Instituições de igrejas no Bispado de Mariana. Rio de Janeiro: SPHAN, 1945, p. 121. 109 FURTADO, Júnia Ferreira. “Uma correspondência de negócios nas Minas Gerais setecentistas: possibilidades de leitura”. In: ABREU, Márcia; SCHAPOCHNIK, Nelson (Org.). Cultura letrada no Brasil: objetos e práticas. Campinas: Mercado das Letras, Associação de Leitura no Brasil; São Paulo: Fapesp, 2005, p. 149. 56 Altas, que “andavam armados cometendo várias desordens, sem atenção aos bandos do Conde de Assumar, que havia proibido aos negros o uso de armas para praticar insultos que até sua chegada a estas Minas [se] sucediam”.110 Fez parte ainda da Câmara Municipal da Vila do Carmo, em 1729, na função de Juiz Ordinário, e novamente em 1735, como Vereador. 111 Já Ana Garcês era grande proprietária, no Inficionado, de terras e escravos. Uma de suas ex-escravas, em especial, veio a ser afamada por possuir supostos poderes místicos e espirituais. Trata-se de Rosa, nome aportuguesado de uma menina ou moça que, talvez ainda em tenra idade, foi escravizada na Costa de Mina, desembarcando no Rio de Janeiro em 1725, onde foi comprada por um senhor de escravos que muito a teria maltratado. Posteriormente, Rosa foi enviada para a capitania de Minas Gerais, onde foi adquirida por Ana Garcês. Conta Luiz Mott, que Rosa teria vivido dos 14 aos 29 anos como meretriz, deixando a vida de moça de fácil vida por volta dos trinta anos, ao contrair severa enfermidade. Acreditando sofrer de retaliações em decorrência da vida que levava, vendeu todos seus bens e adotou a vida de beata, sob o nome de Rosa Maria Egipcíaca da Vera Cruz, retornando ao Rio de Janeiro onde passou a ser conhecida pela população por seus poderes místicos e perseguida pela Igreja Católica. 112 Frei José de Santa Rita Durão era irmão de Maria, a mãe de Joaquim Veloso de Miranda, portanto tio seu. Durão passaria a posteridade pelo poema épico de sua autoria, intitulado Caramuru, que versa sobre o descobrimento da Bahia e foi uma das principais obras do período arcadista da literatura brasileira. 113 Certamente, a erudição do tio veio a exercer importante influência no espírito do jovem Joaquim. Mais tarde, em 1895, em homenagem ao Frei Santa Rita Durão, o arraial do Inficionado passou a se chamar Santa Rita Durão. Ainda que Maria fosse filha ilegítima e que Francisco fosse muito mais velho que ela, o casamento parece ter sido de interesse de todos, mesmo aos pais da noiva. Ademais, um genro maduro, com experiência no fazer comércio e disposto à lida com a mineração decerto seria considerado mais estável economicamente do que um jovem 110 RAPM. Cartas patentes, código 1229, ano 4, fascículo 4, ano 1899. Patente de Paulo Rodrigues Durão, sargento-mor do Mato Dentro. 27 de outubro de 1722, p. 101-102.. 111 FARIA, Simone Cristina. As redes dos “homens do ouro” das Minas: em busca de prestígio e legitimação do mando. Mnemosine Revista, vol. 1, nº 1, p. 128, jan/jun 2010. 112 MOTT, Luiz. Rosa Egipcíaca: uma santa africana no Brasil colonial. Cadernos IHU Idéias, ano 3, nº. 38. São Leopoldo: UNISINOS, p. 1-9, 2005. 113 DURÃO, (Frei) Santa Rita. Caramuru: poema épico do descobrimento da Bahia. Rio de Janeiro; Paris: Garnier, 1913. 57 mancebo. 114 Ao longo da vida, fruto de seu esforço e de suas redes clientelares, Francisco acumulou considerável patrimônio e distinções que o fizeram ser alçado ao posto de um dos principais homens bons do Inficionado, chegando a rivalizar em primazia com seu sogro. 115 É possível que, como muitos dos imigrantes oriundos do norte de Portugal, possuísse um valioso capital, não em espécie, mas expresso no domínio da leitura, da escrita e da matemática, essenciais para se colocar a serviço dos grandes homens de negócio, “expressão que designava os donos de grandes capitais que se dedicavam ao setor atacadista, o comércio por grosso”, emprestando dinheiro com a cobrança de juros e arrematando “da Coroa a cobrança de diversos impostos, entre outras atividades que exigiam investimentos de monta”,116 como era o caso de seu próprio sogro, até acumular seu próprio patrimônio. Era comum que esses migrantes, que começavam como caixeiros, ascendessem socialmente, acabando por se casar com uma das filhas de seu antigo patrão, herdando seus negócios por meio do dote feminino. 117 Quando Paulo Rodrigues Durão faleceu, a lavra da Cata Preta foi herdada por sua esposa, Ana Garcês. Esta, assistida por seu terceiro esposo, Tomé Inácio da Costa Mascarenhas, vendeu a lavra a uma sociedade, constituída por Francisco Moreira Pacheco, André Alves de Azevedo, Caetano da Cruz e o doutor Lopes da Silva. Contraída a dívida, os sócios realizaram alguns pagamentos, mas, após o falecimento de Tomé, em 1762, não mais a honraram. Em defesa de sua sogra, Francisco Veloso de Miranda moveu, em 1764, uma ação contra os sócios, vindo a adquirir o controle único 114 Para mais informações sobre os arranjos matrimoniais entre membros da aristocracia e demais homens de posse no Império português, C.f. MONTEIRO, Nuno Gonçalo. “Casamento, celibato e reprodução social: a aristocracia portuguesa nos séculos XVII e XVIII”. Revista Análise Social, vol. XXVIII, p. 921-950, 1993. 115 O arraial de Nossa Senhora de Nazaré do Inficionado, hoje distrito marianense de Santa Rita Durão, é considerado o local de nascimento de Joaquim Veloso de Miranda. Pequena freguesia dedicada à mineração aurífera, estava situada nas margens das vilas do ouro, Vila Rica e Vila do Carmo. Apesar de possuir ouro em quantidade relativa, sua qualidade era inferior àquele encontrado em Vila Rica sendo sua antiga denominação, Inficionado, uma alusão da contaminação do metal ali encontrado por outros elementos minerais. O frei José de Santa Rita Durão, em seu épico poema Caramuru, fez menção ao ouro daquelas paragens e sobre o próprio local: “Torrão que de seu ouro se nomeava / Por criar do mais fino ao pé das Serras / Mas que feito em fim baixo e mal prezado / O nome teve de 'Ouro Inficionado’”. In: DURÃO, (Frei) José de Santa Rita. Caramuru... p. 98. Posteriormente, o mineralogista Eschwege e o naturalista Pohl atribuíram à vila o mesmo significado dado pelo frei. In: ESCHWEGE. Pluto Brasiliensis, vol. 1. p. 43, e POHL. Viagem no interior do Brasil... p. 381, respectivamente. 116 FURTADO, Júnia Ferreira. Chica da Silva e o Contratador dos diamantes: o outro lado do mito. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 75. 117 Ver, a título de exemplo, o capítulo “Negociantes e caixeiros”, em FURTADO. Homens de negócio... p. 197-271. 58 da propriedade. 118 A riqueza dessa lavra pode ser atestada pelo fato de que no final da década de 1810, o naturalista Johann Emmanuel Pohl (1782-1834), ao passar pelas já decadentes lavras do Inficionado, descreveu a Cata Preta como sendo “uma das mais ricas da região”.119 Além da mineração, Francisco acumulou outros bens de valor, destacando-se seu plantel de escravos e a casa de sua morada, no Inficionado. Do matrimônio de Francisco e Maria, que durou cerca de 20 anos, até a morte do primeiro, nasceram cinco filhos, sendo Clara a primogênita. 120 A ela se seguiram Joaquim, João, Antônio e Ana. Alguns estudos genealógicos afirmam que o casal teria tido apenas quatro filhos, e que Joaquim seria o primeiro, o que não era verdade. 121 Tal equívoco deve-se, provavelmente, em parte, por sido tal genealogia estabelecida por meio da consulta ao testamento de Francisco, escrito em 1758, portanto, antes do nascimento de Ana, que ocorreu em 1762. De outra, pelo fato de Clara ter sido tomada como mais nova que Joaquim. O inventário de Francisco, no entanto, registra que o casal teve cinco filhos, e quando de seu falecimento, seus filhos tinham, respectivamente, as seguintes idades: Clara, 19 anos; Joaquim, 17; João 16; Antônio, 11, e Ana, 2 anos. 122 Francisco e Maria Teresa se esforçaram para oferecer a seus filhos homens a melhor educação existente. Sabiam que o status e a honra poderiam ser alcançados por diversos meios, como o enriquecimento ou a lealdade ao rei, e era “expressa não só na ocupação de diversos cargos e ofícios públicos, mas também na participação na conquista de novos territórios”, atividades estas que Joaquim Veloso de Miranda exerceria e que demandavam capacitação intelectual. 123 Com vistas a isso, os filhos foram matriculados nos Seminários da Vila do Carmo e de São Paulo. Quanto as filhas, não se sabe se frequentaram o Recolhimento de Nossa Senhora da Conceição do Monte Alegre de Macaúbas, uma das únicas instituições de ensino para meninas na capitania, ou se receberam as primeiras letras em casa, com os curas e professores locais. 118 VIEGAS, Arthur. O poeta Santa Rita Durão. Bruxelas; Paris: L’Édition D’Art Gaudio, 1914, p. 6; e ACSM. 2° Ofício, Notificação, códice 169, auto 4075, autor: Francisco Veloso de Miranda e réu: Francisco Moreira Pacheco. 1764. 119 POHL. Viagem no interior do Brasil, p. 383. 120 Ao contrário do que diz Boschi, que apontou Joaquim como sendo o primeiro filho. In: BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica... p. 104. 121 A nota genealógica mais famosa sobre Joaquim Veloso de Miranda e seu núcleo familiar encontra-se no seguinte endereço eletrônico: http://www.arvore.net.br/trindade/TitVelosodeMiranda.htm. Acesso em 31 de maio de 2014. 122 ACSM. 1° Ofício, caixa 88, auto 1857, Inventário de Francisco Veloso de Miranda, 1764, fl. 8v. 123 ALMEIDA, Carla Maria Carvalho; FRAGOSO, João Luís Ribeiro; e SAMPAIO, Antonio Carlos Jucá de (Orgs.). Conquistadores e negociantes: História das elites no Antigo Regime nos Trópicos. América lusa, séculos XVII a XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, p. 22. 59 Quanto à distribuição de bens entre os herdeiros, sabe-se que as famílias minhotas protegiam seus bens, principalmente os fundiários, e para tanto encontrava vários subterfúgios, vendendo previamente a terra a um dos herdeiros escolhido para dar continuidade às atividades familiares e compensando os demais com outros bens, ainda que a legislação filipina determinasse que a herança deveria ser partilhada igualmente pelos herdeiros legítimos. 124 O celibato clerical, a vida monástica, o dote feminino e o acesso à instrução eram outras formas de compensação dos demais herdeiros. Tal qual no Minho, as elites mineiras do século XVIII utilizavam dessas mesmas estratégias ao buscarem a proteção dos bens familiares, com o não fracionamento da herança, o que foi verificado por Carla Almeida em ocasiões diversas. 125 Em conformidade a este modelo, verificamos no âmbito dos Veloso de Miranda que Antônio, o terceiro filho homem, foi o escolhido, passando a responder, quando do falecimento de seus pais, por grande parte do que compunha o patrimônio familiar, tornando-se homem de negócios. Aos demais, coube a compensação pecuniária, na forma de adiantamentos de herança, como se verificou por meio do dote (matrimonial ou clerical), do acesso à educação e do pagamento em espécie. A Joaquim, o primogênito masculino, estava destinado a vida clerical e o acesso à educação superior, o que conferia muito mais honra e prestígio ao agraciado do que as atividades mercantis. Era trajetória bastante comum aos descendentes desses ricos mineradores e comerciantes em Minas, como se observa nos casos paradigmáticos do desembargador João Fernandes de Oliveira e de Cláudio Manoel da Costa, biografados por Júnia Ferreira Furtado e Laura de Mello e Souza, respectivamente, ainda que estes não tenham seguido a vida clerical. 126 Francisco redigiu e registrou seu testamento em 1758, portanto, cinco anos antes de seu falecimento. 127 Nele, pediu que sua alma fosse encomendada à Santíssima Trindade, e que seu corpo fosse sepultado com a mortalha de São Francisco, da qual era 124 Sobre esse aspecto, C.f. DURÃES, Margarida. “Qualidade de vida e sobrevivência económica da família camponesa minhota: o papel das herdeiras (séculos XVIII e XIX)”. Cadernos do Noroeste, 17, 2002, p. 131. 125 ALMEIDA, Carla Maria Carvalho. “Uma nobreza da terra com projeto imperial: Maximiliano de Oliveira Leite e seus aparentados”. In: ALMEIDA, Carla Maria Carvalho; FRAGOSO, João Luís Ribeiro; e SAMPAIO, Antonio Carlos Jucá de (Orgs.). Conquistadores e Negociantes: História das Elites no Antigo Regime nos Trópicos (América Lusa, Séculos XVI a XVIII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007, p. 155. 126 FURTADO. Chica da Silva e o Contratador dos diamantes...; e SOUZA, Laura de Mello. Cláudio Manoel da Costa. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. 127 ACSM. 1° Ofício, Livro de Registro de Testamentos n° 68, 1763-1765, Testamento de Francisco Veloso de Miranda, fl. 71v. 60 irmão terceiro. 128 Do montante de sua terça, o valor que podia ser destinado à sua salvação, instruiu que fossem rezadas por sua alma 300 missas em Minas, outras 300 em Portugal, além de 600 em nome de seus pais, também em Portugal, e tantas outras por familiares já falecidos e para outros de que há muito não tinha notícias, revelando a costumeira preocupação com a “boa morte”, norteando, ainda em vida, suas ações e, principalmente, seus recursos financeiros para tanto. 129 A inventariante de Francisco foi a esposa, Maria. Na descrição dos bens arrolados, podemos encontrar objetos em ouro lavrado, prata, estanho e cobre. Além de imagens religiosas, estavam presentes louças das Índias, uma grande quantidade de objetos da casa e de roupas, sendo muitas de seda. Ainda constam quatro armas de fogo, 16 cavalos de monta e muares, algumas poucas ferramentas e um admirável plantel de 64 escravos. Havia ainda alguns bens de raiz, como “uma casa ao pé do arraial e outra no largo da igreja”, esta última no centro do Inficionado, além da terça parte de duas lavras, avaliadas juntas em 4:000$000 réis; um sítio chamado Passa Dez, avaliado em 250$000 réis, e uma roça no Rio do Peixe, avaliada em 3:000$000 réis. No total, o monte-mor revela a considerável quantia de 14:326$346 ½ réis, ou seja, quatorze contos, trezentos e vinte e seis mil e trezentos e quarenta e seis réis e meio. O Auto de Partilha mostra que após o pagamento do funeral, de terceiros (as dívidas do falecido), das taxas administrativas e da meação, ou seja, a parte destinada à viúva, Maria Teresa de Nazaré, que foi de 6:982$142 réis, sobraram 5:357$061 ⅓ réis para serem divididos pelos 5 herdeiros, totalizando 1:071$412 ½ réis para cada. 130 Todos estes valores foram recebidos por Maria, tutora de seus filhos menores, a exceção da parte de Clara, que foi recebida por seu esposo, o sargento-mor Cosme Damião Vieira. 131 Na capa do inventário de Maria, há uma anotação, feita em giz de cera azul, que informa que ela era mãe do “Reverendo Doutor Joaquim Veloso de Miranda”. Ainda que tal lembrete seja bem posterior ao feitio do documento, revela que há muito alguém 128 Visualiza-se novamente o caráter elitista de Francisco Veloso de Miranda como membro da Ordem de São Francisco. Sobre o assunto, C.f. BARBOSA, Gustavo Henrique. Associações religiosas de leigos e sociedade em Minas colonial: Os membros da Ordem terceira de São Francisco de Mariana (1758-1808). Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2010 (Dissertação, Mestrado em História). 129 Para mais informações sobre ritos de morte e princípios escatológicos na América portuguesa setecentistas, C.f. FURTADO, Júnia Ferreira. A morte como testemunha da vida. In: PINSKI, Carla Bassanezi; DE LUCA, Tânia Regina. (Org.). O historiador e suas fontes. São Paulo: Editora Contexto, 2009, p. 106; e RODRIGUES, Cláudia. A arte de bem morrer no Rio de Janeiro setecentista. Revista Varia História. Belo Horizonte, vol. 24, n°. 39, p. 255-272, junho de 2008. 130 ACSM. 1° Ofício, caixa 88, auto 1857, Inventário de Francisco Veloso de Miranda, 1764, fl. 37v. 131 Ídem, fls. 53 e 12. 61 já buscara, na documentação, a ascendência do naturalista. Maria faleceu a 16 de julho de 1784, mais precisamente, 21 anos depois de seu esposo. Escolheu, ainda em vida, seu filho Antônio como inventariante e, caso esse viesse a ficar impedido, deveria transferir a função para seus outros filhos, Joaquim e João, respectivamente. Ao contrário de seu esposo, e talvez já convalescente e temerosa da morte, Maria redigiu seu testamento cerca de dois meses antes de falecer, a 14 de maio de 1784. Solicitou que, após sua morte, seu corpo fosse “amortalhado no hábito de São Francisco”, de quem era irmã da Ordem de Vila Rica, e, com os recursos de sua terça, que fossem rezadas missas em sua intenção no Inficionado, em Vila Rica e no Rio de Janeiro, mas curiosamente não em Santos, onde nasceu. Deixou ainda “doze oitavas de ouro”, que deveriam ser distribuídas aos pobres. 132 Os bens de raiz que possuía eram aqueles que herdou de sua mãe, quando de seu falecimento, acrescido da vultosa herança deixada por seu esposo, Francisco. 133 Constavam do seu inventário a sesmaria do Rio do Peixe, com suas benfeitorias, avaliada em 2:800$000 réis; metade do sítio Passa Dez, a 25$000 réis, 134 e a terça parte das “terras minerais e águas da lavra da Cata Preta”.135 Apesar de ter confeccionado um testamento, seu patrimônio já havia sido quase todo distribuído entre os filhos, na maioria das vezes em assistências, como a que fez a Joaquim, para que este fosse estudar em Portugal; ou a que concedeu a João, para que pudesse adquirir seus fardamentos militares no Rio de Janeiro. Observa-se que se reproduziam, em Minas, as estratégias minhotas concernentes a partilha de heranças. 136 A primeira filha de Maria e Francisco, Clara Veloso de Miranda, nascida no arraial do Inficionado, passou a assinar Clara Maria de Miranda ao se casar com o sargento-mor Cosme Damião Vieira da Silva. Em 1784, quando do falecimento de sua 132 ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 2-3. 133 O Monte-Mor do Inventário do Sargento-Mor Paulo Rodrigues Durão contabilizou expressivos 53:196$265 réis. In: ACSM, 1° Ofício, caixa 115, auto 2377, Inventário de Paulo Rodrigues Durão, 1743. 134 ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl 11v. Em primeira avaliação, o Juiz de Paz avaliou tal bem em 15$000 réis, retificando com um “dito” para o valor de 25$000 réis. Contudo, o engano parece ter permanecido uma vez que este bem foi avaliado quando do falecimento de Francisco em 250$000 réis. 135 Ídem, fl. 4. 136 DURÃES, Margarida. “No fim, não somos iguais: estratégias familiares na transmissão da propriedade e estatuto social”. Boletim de la Associación de Demografía Histórica, X, 3, p. 125-141, 1992; ANDRADE, Vitória Fernanda Schettini de. Do lado de lá e do lado de cá: natureza, economia e sistema sucessório. Uma análise comparada entre a Zona da mata mineira e Noroeste português. Revista de História Econômica & Economia Regional Aplicada, vol. 6, n. 10, Jan-Jun. 2011; e PEDROZA, “Manoela. Estratégias de reprodução social de famílias cariocas e minhotas”. Análise Social, vol. XLV (194), 141-163, 2010. 62 mãe, Clara, aos 39 anos, já se encontrava viúva, 137 e veio a falecer em Sabará, a 04 de outubro de 1792, cabendo o papel de inventariante de seus bens a seu irmão, Antônio. Aparentemente Clara e Cosme Damião não tiveram filhos ou se os tiveram, estes vieram a falecer precocemente. 138 Em consequência, seus irmãos tornaram-se seus herdeiros. 139 Seu inventário foi aberto a 06 de maio de 1793, e a ausência de um testamento sugere um falecido súbito, aos 48 anos de idade. A descrição de seus bens é sucinta e constam apenas bens móveis, entre eles “uma verônica de ouro com o peso de três quartos e quatro vinténs”, além de dezessete escravos, que resultaram num total de 1:169$000 réis. Há ainda outros bens móveis mais simples, como “um candeeiro velho”, “uma garrafa de vidro” e “uma faca e três garfos de latão”, dentre outros poucos mais. 140 Um animal de carga completa a avaliação resultando em um Monte-Mor de 1:297$749 réis, do qual seriam descontadas suas dívidas, que totalizavam pouco mais de 73 mil réis. Interessante lembrar que grande parte do patrimônio de Clara era composto pela herança que recebeu quando do falecimento de seu pai, no valor de 1:071$412½ réis. 141 Contudo, não figuram em seu inventário nenhum dos bens que herdou quando do falecimento de sua mãe. 142 João, terceiro filho de Francisco e Maria, também nasceu no arraial do Inficionado, por volta de 1748. Quando do falecimento de sua mãe, em 1784, contava com 36 anos, 143 e desde 1778 estava casado com Clara Maria da Trindade, com quem teve dois filhos: Maria José Velosina de Miranda e Luiz Veloso de Miranda, nascidos por volta de 1780 e 1790, respectivamente. Natural do arraial de São Caetano de Mariana, atual distrito marianense de Monsenhor Horta, Clara era filha de João da Silva Brandão e de Antônia Maria de Oliveira, e possuía outros seis irmãos. João cursou seus primeiros estudos no Seminário de Mariana. Ao término do 137 ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 5v. 138 ACSM, 1° Ofício, caixa 34, auto 892, Inventário de Clara Maria de Miranda, fl. 1. 139 Ídem, fl. 2. 140 Ídem, fl. 2 e 2v. 141 ACSM, 1° Ofício, caixa 88, auto 1857, Inventário de Francisco Veloso de Miranda, 1764, fl. 37v. 142 ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 5v. 143 Registro de batismo de João a partir de seu processo de emancipação: “Aos seis de maio de mil sete centos e quarenta e oito, nesta Matriz de Nossa Senhora da Nazareth do Inficionado, batizei e pus os Santos Óleos a João, filho legitimo de Francisco Veloso de Miranda e de Dona Maria Thereza de Nazareth. Foi padrinho o Coronel João Gonçalves Fraga. Avós Maternos Paulo Rodrigues Durão, natural da Villa de Évora Couto de Alcobaça do Patriarcado de Lisboa, Arcebispado de Óbidos, [e de] Dona Ana Garcês de Moraes, natural da Vila de Santos, Bispado de São Paulo. Avós Paternos, o Doutor Jerônimo da Silva Guimarães, natural da Villa de Guimarães, Arcebispado de Braga, e Angélica de Miranda e Fonseca, natural da Villa Nova de Famalicão, do mesmo Arcebispado, de que fiz este acento. Inficionado, dia, mês e ano supra. O vigário Pereira da Cunha.” In: ACSM, Justificação. Códice 296, auto 5935. Processo de Emancipação de João Veloso de Miranda, 1776, fl. 2. 63 curso, procurou constituir seu patrimônio para receber as ordens sacras apresentando enquanto doação de sua mãe a roça no Passa Dez, composta de “duas casas de vivenda, engenho e casa de moinho e paiol, tudo coberto de telhas”, e dois escravos; João Mulato e João Crioulo. Impossibilitado de dar prosseguimento ao processo pessoalmente por estar, à época, em 1766, no arraial de Guarapiranga, atual município de Piranga, delegou ao seu irmão, Joaquim, uma procuração para que este o fizesse. 144 Os passos seguintes para a efetivação da doação seriam a inquirição dos envolvidos, ou seja, da doadora e do habilitando, momento em que ambos seriam indagados acerca da autenticidade do processo por meio dos termos de non repetendo, por parte do doador, e de non alienando, por parte do habilitando, seguido do juramento por ambos de que não “há na instituição do patrimônio dolo, pacto oculto, fraude ou simulação que obste a sua validade”.145 No entanto, a julgar pela não apresentação de comprovação que confirmasse a posse dos bens pela doadora e, consequentemente, da não confecção do patrimônio, o processo foi dado por concluso sem que João chegasse a ser ordenado, 146 optando pela vida civil. Após o seminário, em 1764, aos 16 anos, João já estava com praça assentada como “soldado cadete”.147 De sua carreira militar não há maiores informações que não as assistências financeiras realizadas por sua mãe para que pudesse adquirir os primeiros fardamentos. Sabe-se que atingiu a patente de sargento, e depois a de coronel, conforme explicitado em seu inventário. 148 Além dos bens que adquiriu em vida, João teria recebido, enquanto doação de sua mãe, outros de considerável valor, como um relógio, uma pistola, e quatro escravos; uma mulatinha de nome Firmiana, João mulato, Joaquim e Miguel angolas. 149 Em 1776, contando com mais de 25 anos e passados 13 desde o falecimento de seu pai, João, cuja mãe ainda era sua tutora, solicitou a emancipação, pela idade assim o permitir e por julgar que já possuía capacidade para “bem reger e administrar sua pessoa e bens, sem 144 AEDOO. Processos De Genere, vitae et moribus 1026, Armário 06, pasta 1026. Processo De Genere, vitae et moribus de João Veloso de Miranda, fl. 2, e 6. 145 SILVA, Manuel Tavares da. Manual Ecclesiástico ou Collecção de Formulas para qualquer pessoa ecclesiastica ou secular poder regular-se nos negócios, que tiver a tratar no Fôro Gracioso ou livre; e contencioso da greja... São Luiz: Typografia do Progresso, 1860. 146 AEDOO, Processos De Genere, vitae et moribus 1026, Armário 06, pasta 1026. Processo De Genere, vitae et moribus de João Veloso de Miranda, fl. 7-7v. 147 ACSM, 1° Ofício, caixa 88, auto 1857, Inventário de Francisco Veloso de Miranda, 1764, fl. 8v. 148 Tais assistências financeiras podem ser resumidas na doação de dois fardamentos militares, um com o valor agregado de setenta e nove mil reis e outro com pequenos preparos, comprado no Rio de Janeiro e que custou cem mil reis; além de um cavalo, que custou quarenta e cinco mil e seiscentos reis. In: ARQUIVO ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 40. 149 ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 12. 64 precisão de tutor”.150 Já senhor de si, dois anos depois, contraiu matrimônio com Clara Maria da Trindade. Em 1796, enfermo e de cama, lavrou seu testamento, concluindo-o a 23 de junho. Nele, solicitou que o padre e mestre, Antônio José de Lima, morador na freguesia de São Miguel, fosse seu testamenteiro, deixando como segunda opção a sua esposa, Clara, o que veio a acontecer. Passado pouco tempo, quando contava quase 48 anos, a 30 de julho de 1796, Clara veio a falecer em sua propriedade rural, a Fazenda do Rio do Peixe, localizada na freguesia de São Caetano. 151 Dentre os bens que deixou por João há apenas um objeto confeccionado em ouro, “uma corrente de relógio de ouro com pedras topázio”, a qual sustentava um relógio, também inventariado. Vários outros objetos usuais compunham a relação, sendo alguns de destaque, por serem confeccionados em prata, como um jogo de talheres e um arreio de monta, ou mesmo por serem importados, como algumas louças da Índia e do Porto. Duas fardas de coronel, uma em bom uso e outra velha, eram resquícios de sua vida militar, além de uma sela, alguns correões e um martelo de ferrar, assessórios para arrear o seu cavalo. Já o fagote com punho e ponteira de prata revela seu pendor musical. Trinta e quatro enxadas, quinze foices e dezessete “foicinhas de cortar cana” eram destinados ao trabalho de lavoura em sua propriedade, onde ainda possuía seis serrotes e dois martelos. Lá estavam também vinte e cinco bois de carro, sessenta cabeças de porcos e algumas poucas ovelhas, mulas e bestas. Já o plantel de escravos era constituído de 42 homens e mulheres. Seu bem de raiz, em sociedade com seu irmão, Antônio, era a fazenda do Rio do Peixe, com suas benfeitorias, sendo “um engenho, um paiol, um moinho coberto de telhas, além de algumas áreas de matas e capoeiras” e dos “vários quartéis de cana ali plantados”. Essas terras faziam divisas com várias outras, dentre elas, a pertencente a Joaquim Veloso de Miranda, o que sugere que faziam parte de uma grande fazenda pertencente a seus antepassados, e que foi dividida a título de herança. Seu monte-mor totalizava 8:644$750 réis. Ao que parece, João soube acumular considerável patrimônio, pois herdara de sua mãe pouco mais de um conto de réis (1:180$191). 152 Antônio Veloso de Miranda, o quarto filho, foi batizado em 12 de novembro de 150 ACSM, Justificação. Códice 296, auto 5935. Processo de Emancipação de João Veloso de Miranda, 1776, fl. 2. 151 ACSM, 1° Ofício, caixa 79, auto 1686, Inventário de João Veloso de Miranda, 1796, fl. 8. 152 ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 40. 65 1753, na matriz do Inficionado. 153 Assim como seu irmão, Joaquim, não se casou, mas isso não o impediu de constituir prole. 154 Por “fragilidade e miséria”, como declarou em testamento, teve dois filhos: José Mariano de Sá Figueroa, nascido por volta de 1798, com Joana de Sá Figueroa, moradora na cidade de Mariana; e José Maria Veloso de Miranda, nascido cerca de um ano depois, desta feita com Luzia Antônia da Silva, moradora na fazenda do Rio do Peixe. Os dois filhos foram seus únicos herdeiros, sendo o mais novo escolhido como seu primeiro testamenteiro. 155 Assim como Joaquim e João, Antônio também estudou em um seminário, tendo frequentado, contudo, uma instituição em São Paulo. Parece que chegou a professar votos, pois, aos 11 anos, quando do falecimento de seu pai, em 1764, era “religioso de Santo Antônio”,156 mas a carreira eclesiástica não foi seu destino final e, como seu irmão João, ingressou na carreira militar. Esta teve início por volta de 1777, sendo que, ao longo dos 24 anos seguintes, serviu no 3º Regimento de Cavalaria de Milícias, em Vila Rica, onde ocupou as graduações e postos de Ajudante, Sargento-Mor e Coronel. 157 Foi o governador Bernardo José de Lorena (1756-1818) quem propôs a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, em 1799, a concessão dessa última patente, 158 confirmada no ano seguinte por alvará do Príncipe Regente Dom João. 159 Na década de 1780, Antônio encontrava-se na região leste de Minas Gerais, onde era responsável pela descoberta de novas terras minerais, principalmente auríferas, mas também pela abertura de novas picadas, pela divisão de sesmarias e datas de terras, e 153 AEDOO, Livro de Batismos do Inficionado, 1740-1806, fl. 87. 154 Possuía 32 anos quando da abertura do Inventário de Bens que ficarão pelo falecimento de sua mãe. In: ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 5v. 155 ACSM, 1° Ofício, caixa 91, auto 1909. Inventário de Antônio Veloso de Miranda, 1822, fl. 5. Idades dos filhos a partir de ACSM, 1° Ofício, caixa 91, auto 1909. Inventário de Antônio Veloso de Miranda, 1822, fl. 3. Interessante notar que ambas as mulheres não tiveram Inventários confeccionados por ocasião de seus falecimentos, pelo menos naquela cidade de Mariana. Da mesma forma, em momento algum Antônio nos revela se as mães de seus filhos são mulheres escravas ou livres, tão pouco seus filhos são em algum momento descriminados como pardos ou mestiços permanecendo assim certo mistério sobre suas origens maternas. 156 ACSM, 1° Ofício, caixa 88, auto 1857, Inventário de Francisco Veloso de Miranda, 1764, fl. 8v. 157 AHU, Minas Gerais. Cx. 169, Doc. 42, Nº Catálogo: 12641. Requerimento de António Veloso, coronel, morador no arraial de Inficionado, termo da cidade de Mariana, solicitando o posto de ajudante de ordens do governo de Minas Gerais ou o de 1º caixa dos Diamantes de Serro do Frio ou o de escrivão dos Órfãos ou dos Ausentes da cidade de Mariana, 1804, fl. 2. 158 AHU, Minas Gerais. Cx. 149, Doc. 45, Nº Catálogo: 11208. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, propondo António Veloso de Miranda para o posto de coronel do Regimento de Cavalaria de Milícias de Mariana. Vila Rica, 1799. 159 AHU, Minas Gerais. Cx. 153, Doc. 28, Nº Catálogo: 11487. Decreto do Príncipe Regente Dom João, nomeando António Veloso de Miranda, coronel agregado ao Regimento de Cavalaria de Milícias da cidade de Mariana, no posto de coronel efetivo do dito Regimento. Queluz – Portugal, 1800. 66 pelo combate dos índios bravios que ainda habitavam a região. 160 Nesse ínterim, também atuou na conquista dos campos dos Arrepiados e do Rio Pomba, sendo responsável por uma série de presídios que ali foram estabelecidos, os quais recebiam degredados de toda a Capitania. 161 Naquelas paragens, os conflitos com os gentios eram constantes. Enquanto comandante destes destacamentos, além de enfrentar os ataques e os saques dos indígenas às roças plantadas pelos “conquistadores”, Antônio ainda se defrontou com a insatisfação e a deserção dos homens enviados para trabalharem à força na região. 162 Em 1804, enviou um Requerimento solicitando ao Príncipe Regente o posto de Ajudante de Ordens do governo de Minas Gerais, o cargo de 1º caixa dos Diamantes de Serro do Frio ou a função de Escrivão dos Órfãos e Ausentes da cidade de Mariana anexando, para tanto, um vasto dossiê de 93 folhas, constituído de várias cartas de recomendação que havia recolhido entre as autoridades civis e militares locais desde 1801, bem como depoimentos que confirmavam sua boa conduta militar. 163 Não se sabe se alcançou a algum destes postos, mas tudo indica que pouco tempo depois deixou o serviço militar, quando contava pouco mais de 50 anos. Passou a cuidar da administração somente das propriedades que possuía, fixando residência em uma de suas sesmarias do Rio do Peixe, local que considerava ser o seu quartel interior, e onde residia quando confeccionou seu testamento. 164 Nele, concluído a 30 de maio de 1816, 160 APM, SC, Ofício de Antônio Veloso de Miranda para o Governador. [Presídio] dos Arrepiados, 23 de novembro de 1781, Cód. 224, fls. 79v-80v. 161 AGUIAR, José Otávio. “Revisitando o tema da guerra entre os índios puri-coroado da mata central de Minas Gerais nos oitocentos: relações com o estado, subdiferenciações étnicas, transculturações e relações tensivas no vale do rio Pomba (1813-1836)”. Mnemosine Revista, vol. 1, nº. 2, p. 107, jul./dez. 2010. Sobre o envolvimento de Antônio Veloso de Miranda com a administração dos presídio e aldeamentos da Zona da Mata, C.f. LANGFUR, Hal. The Forbidden Lands: Frontier Settlers, Slaves, and Indians in Minas Gerais, Brazil, 1760-1830. Stanford: Stanford Universitary Press, 2006. 162 Foram várias as cartas enviadas por Antônio Veloso de Miranda ao governador informando sobre os ataques indígenas, sobre as desordens e as providências tomadas como comandante militar. In: APM, SC. Informação de serviço de Antônio Veloso de Miranda sobre ataque de índios e falta de soldados na região do Presídio de Arrepiados. Barra do Bacalhau, 15 de dezembro de 1781, caixa 11, doc. 55; APM, SC. Informação de serviço de Antônio Veloso de Miranda a Dom Rodrigo José de Menezes, Governador, sobre as desordens, a falta de pessoas e de comida na conquista dos Arrepiados. Baguaçu (Manhuaçu), 10 de maio de 1783, caixa 13, doc. 33; e APM, SC. Fundo Secretaria do Governo da Capitania. Informação de Antônio Veloso de Miranda a Dom Rodrigo José de Menezes, Governador, sobre castigos que devem ser aplicados aos desertores enviados para a conquista. Piracicaba, 05 de maio de 1783, caixa 13, doc. 29. Para o contexto da colonização dos sertões do Leste das Minas recomenda-se a leitura de LANGFUR, Hal. The Forbidden Lands: Colonial Identity, Frontier Violence, and the Persistence of Brazil's Eastern Indians, 1750-1830. Redwood City: Stanford University Press, 2006. 163 AHU, Minas Gerais. Cx. 169, Doc. 42, Nº Catálogo: 12641. Requerimento de António Veloso, coronel, morador no arraial de Inficionado, termo da cidade de Mariana, solicitando o posto de Ajudante de Ordens do Governo de Minas Gerais ou o de 1º caixa dos Diamantes de Serro do Frio ou o de Escrivão dos Órfãos ou dos Ausentes da cidade de Mariana, 1804. 164 ACSM, 1° Ofício, códice 192, auto 3721. Testamento de Antônio Veloso de Miranda, fl. 5. 67 quando contava 64 anos, ou seja, cerca de 6 anos antes de falecer, Antônio deixou para seu filho, José Maria, um “prêmio de 200$000” réis pela função de testamenteiro, além do remanescente da sua terça, 165 depois que fossem pagas seis missas de corpo presente. Seu corpo deveria ser amortalhado com “o hábito de São Francisco”, de quem era “irmão professo”,166 na cidade de São Paulo. Antônio morreu a 2 de agosto de 1822 na cidade de Mariana, deixando considerável fortuna que gerou grande disputa judicial entre os dois herdeiros, 167 que trocaram acusações de que ambos ocultavam bens que lhe haviam pertencido, e que ainda não tinham sido arrolados ao processo, 168 permanecendo a desavença mesmo após o Auto de Partilha, ainda que, buscando a harmonia entre os seus, Antônio havia afirmado em seu testamento que renunciava a toda “nobreza de que gozava pela sua ascendência e posto”, para que não houvesse disputas após seu falecimento. Do monte-mor, avaliado em 10:570$795 réis, e quitados o funeral, os credores, as custas processuais e terceiros, coube a cada um 3:513$000 réis. 169 De sua vida militar ficaram não mais que alguns poucos apetrechos, como seus animais de montaria, algumas fardas e um fiel de espada. Os bens de raiz eram “um terço de uma morada de casa de sobrado na rua Nova” (em Mariana), “com quintal, e que foi avaliada no Inventário em 400$000” réis;170 “uma sesmaria de terras nas cabeceiras do Rio do Peixe, freguesia do Inficionado, a maior parte em mato virgem e algumas bem feitorias”, e que fazia “divisa com a sesmaria de dona Clara Maria da Trindade”, viúva de seu irmão João, tudo avaliado em 2:550$000 réis;171 outra “meia sesmaria insolidum”, “com uma casa, paiol, e moinho, tudo coberto de telha, e mais pertences”,172 avaliadas em 820$000 réis; “umas terras, e águas minerais no lugar chamado Chapada”, também em Mariana, avaliadas em 2:000$000 réis; e “uma morada de casas de sobrado, danificadas, na rua de São José”, em Vila Rica, a qual foi herdada de seu irmão, Joaquim Veloso de Miranda, 173 além de muitos bens móveis provenientes 165 Ídem, fl. 17v. 166 ACSM, 1° Ofício, códice 192, auto 3721. Testamento de Antônio Veloso de Miranda, fl. 4 e 5. 167 Ídem, fl. 4. 168 ACSM, 1° Ofício, caixa 91, auto 1909. Inventário de Antônio Veloso de Miranda, 1822, fl. 49 e 90. 169 ACSM, 1° Ofício, códice 192, auto 3721. Testamento de Antônio Veloso de Miranda, fl. 17v, 61v e 62. 170 ACSM, 1° Ofício, caixa 91, auto 1909. Inventário de Antônio Veloso de Miranda, 1822, fls. 4v, 7v e 10. 171 Ídem, fl. 31v. 172 ACSM, 1° Ofício, códice 192, auto 3721. Testamento de Antônio Veloso de Miranda, fl. 5. 173 ACSM, 1° Ofício, caixa 91, auto 1909. Inventário de Antônio Veloso de Miranda, 1822, 31v, 10 v e 11, respectivamente. 68 da “Fazenda do Mau Cabelo”, igualmente recebidos por herança do naturalista.174 Como nas terras de seu irmão João, nas suas propriedades do Rio do Peixe Antônio cultivava e beneficiava a cana-de-açúcar, como atestam a presença de “formas de fazer açúcar, colheres de garapa e tachos de cobre”, e criava gado, tanto como força motriz, como para produzir couro, pois possuía uma “canoa de curtir”. Seu plantel de escravos, diminuto para quem era possuidor de tantas terras, era constituído de apenas doze cativos. Gostava de música, pois possuía um piano, uma zabumba, e um cravo, 175 e provavelmente tinha sua própria orquestra particular, composta de escravos, tal qual a que possuía o desembargador João Fernandes de Oliveira. 176 Também chama a atenção sua livraria, em parte herdada de seu irmão, Joaquim, e que era composta de 64 títulos, divididos em 114 tomos. Saliente-se que a posse de uma livraria não é fator indicativo de leitura das obras, as quais podem ter sido recebidas como herança, como foi o caso de Antônio, ou ainda adquiridas com outras intenções, como a distinção social, e terem sido mantidas incólumes, sem serem lidas ou mesmo folheadas. Da mesma forma, deve-se lembrar que o livro era, também, um patrimônio econômico, e, não raro, servia apenas como “ornamento” para a casa, sendo frequentemente arrolado junto a outros bens “passíveis de ostentação”.177 Ana Justina de Miranda, a filha mais moça, nasceu em 1762, também no Inficionado, e casou-se com o guarda-mor Domingos Gomes Martins, 178 com quem teve quatro filhos: Manoel Gomes Martins, nascido em 1781; Antônia, 1793; Joana Velosina de Miranda, 1794, de sobrenome diferente dos demais, ao que parece em homenagem ao tio naturalista e ao Gênero das Velósias; e Ana Justina de Miranda, nascida em 1796. 179 Ana viveu os últimos quatorze anos de sua vida na freguesia de Catas Altas e sua transferência para essa localidade parece ter sido em decorrência de 174 ACSM, 1° Ofício, códice 192, auto 3721. Testamento de Antônio Veloso de Miranda, fl. 5v. Ao que parece, os bens provenientes da Fazenda do Mau Cabelo, de Joaquim Veloso de Miranda, foram incorporados por Antônio ao seu patrimônio antes mesmo da partilha, motivo pelo qual houve a necessidade de citá-lo em juízo para tal. In: APM, SC, Cx. 106, Doc. 44. Requerimento do Alferes Francisco da Costa Azevedo e outros pedindo que o herdeiro e Testamenteiro do falecido Dr. Joaquim Veloso de Miranda, Coronel Antônio Veloso de Miranda, apresentada a lista dos bens adjudicados entregue a Fazenda e todos os bens que nela contém para serem juntados ao processo de Inventário, como fizeram todos os outros herdeiros. Vila Rica, 2 de maio de 1819, 175 ACSM, 1° Ofício, caixa 91, auto 1909. Inventário de Antônio Veloso de Miranda, 1822, fl. 9, 9v, 10, 10v, 45, 50, 51 e 52. 176 FURTADO. Chica da Silva e o Contratador dos diamantes... p. 186. 177 VILLALTA, Luiz Carlos. “Os leitores e os usos dos livros na América portuguesa”, In: ABREU, Márcia (Org.). Leitura, história e história da leitura. Campinas: Mercado de letras/ALB; São Paulo: FAPESP, 1999, p. 201. 178 ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 20. 179 ACSM, 1° Ofício, caixa 30, auto731, Inventário de Ana Justina de Miranda, 1806, fl. 2. 69 seu casamento. 180 Quando do falecimento de sua mãe, em 1784, foi representada por seu esposo, como cabeça do casal. 181 Domingos faleceu na noite de 10 para 11 de janeiro de 1800, sem ter deixado testamento. Seu monte-mor foi avaliado em 12:127$700 réis, o que rendeu a cada herdeiro 1:515$962½ réis. Seu patrimônio era composto de 26 escravos, 182 algumas lavras, 183 uma propriedade “urbana” na freguesia em que vivia e duas outras rurais.184 Nelas, produzia café, tendo mil pés da planta; milho, em “cento e vinte alqueires” colhidos e “dois” plantados e cachaça, que naquele ano rendeu-lhe “cento e trinta barris”.185 Já Ana veio a falecer a 25 de fevereiro de 1806, tendo testado poucos dias antes. Pediu para ser amortalhada no hábito de Nossa Senhora do Monte do Carmo de Mariana, de quem era irmã, e sepultada na Igreja Matriz de Catas Altas. Duzentas missas deveriam ser celebradas em intenção de sua alma. Deixou vários pedidos de missas e sufrágios, assim como muitas esmolas, como “quatro oitavas de ouro” a “duas mulheres beatas, moradoras no arraial de Santa Barbara, ao pé da Ermida do Senhor do Bonfim”, cujos nomes ignorava; além de “trinta oitavas de ouro de esmola a Maria Francisca de Jesus, parda forra,” que assistira em sua companhia, por muitos anos.186 Manoel, primeiro filho de Ana, foi seu inventariante, e o monte-mor de sua mãe totalizou 7:943$814½ réis, que foram divididos entre os quatro filhos herdeiros, rendendo 1:188$969 1/12 réis a cada. Possuía 13 escravos, “uma outra morada de casas”187 em Catas Altas e outros bens de raiz, frutos de sua meação.188 180 Ídem, fl. 11v. 181 ACSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 5v. 182 ACSM, 1° Ofício, caixa 50, auto1147, Inventário de Domingos Gomes Martins, 1800, fls. 1, 13v e 4v-5v, respectivamente. 183 “Uma lavra na freguesia do Inficionado, com terras e águas minerais” avaliada em 1:200$000 réis; “uma dita (lavra) nesse Arraial de Catas Altas com terras e águas minerais, regos, moinho”, avaliada em 400$000 réis; e mais algumas “datas de terras minerais no rio Piracicaba”, avaliadas em 144$000 réis. In: ACSM, 1° Ofício, caixa 50, auto 1147, Inventário de Domingos Gomes Martins, 1800, fl. 7v-8. O processo do Inventario se arrastaria por longos 16 anos até que fossem definidos os limites das terras minerais da Cata Preta (Inficionado). In: ACSM, 1° Ofício, caixa 50, auto 1147, Inventário de Domingos Gomes Martins, 1800, fl. 34. 184 “Uma fazenda de engenho com casas, paiol, moinho, bananal, terras de plantar”, avaliada em 1:040$000 réis, e “uma outra fazenda com casas de vivenda, moinho e paiol, tudo coberto de telhas e mais terras de cultura” avaliada em 500$000 réis. In: ACSM, 1° Ofício, caixa 50, auto 1147, Inventário de Domingos Gomes Martins, 1800, fl. 7v. 185 ACSM, 1° Ofício, caixa 50, auto 1147, Inventário de Domingos Gomes Martins, 1800, fl. 7v. 186 ACSM, 1° Ofício, caixa 30, auto 731, Inventário de Ana Justina de Miranda, 1806, fl. 1, 11, 11v e 12, respectivamente. 187 ACSM, 1° Ofício, caixa 30, auto 731, Inventário de Ana Justina de Miranda, 1806, fl. 6-7v e 8. 188 Uma lavra em Catas Altas e as outras mencionadas no Inventário de seu falecido esposo assim como o sobrado em naquele mesmo arraial e as duas fazendas. Ídem, fl. 7-8v. 70 Os Veloso de Miranda constituíam um núcleo familiar bastante similar aos que compunham a elite colonial mineira dessa época. Sua importância, de um lado, ancorava-se nas posses materiais, expressas nos plantéis de escravos, nas lavras de ouro, nos bens imóveis, urbanos e rurais. De outro, na honra que acumularam, manifesta nos cargos ocupados nas câmaras municipais, nas patentes militares, no acesso a carreira eclesiástica e na qualidade da educação recebida, seja nos seminários locais ou na Universidade de Coimbra, como foi o caso de Joaquim, que se revela na caligrafia esmerada e na posse de livros. 189 Nesse sentido, o capital intelectual que seus pais lhes proporcionaram foi mais um dos mecanismos empregados em sua ascensão social. 1.3 – Joaquim Veloso de Miranda: da fé às ciências A 20 de outubro de 1746, na pequena capela dedicada a Sant’Ana, na fazenda do Engenho do Piracicaba, de propriedade de Paulo Rodrigues Durão, 190 o vigário José Felipe conduziu a cerimônia de batismo de Joaquim Veloso de Miranda, neto do proprietário. Esse assento de batismo dirime muitas dúvidas que a historiografia possuía sobre a data e o local de seu nascimento. Caio Boschi, 191 Gustavo Ferreira 192 e Ermelinda Pataca 193 já haviam afirmado que ele havia nascido no Inficionado, questão já resolvida a partir de várias fontes, como seu processo De Genere e inventário. Sua 189 ALMADA, Márcia. Das artes da pena e do pincel: caligrafia e pintura em manuscritos no século XVIII. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2011, p. 260 (Tese de Doutorado em História) 190 ACSM, 1° Ofício, caixa 115, auto 2377, Inventário de Paulo Rodrigues Durão, 1743, p. 9. 191 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica. 192 FERREIRA. As polêmicas Flores... 193 PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas (1755-1808)... 71 data de nascimento, no entanto, durante muito tempo continuou incerta, 194 haja vista ser raro que os registros de batismo fizessem referência ao dia do nascimento da criança, como é o caso do de Joaquim, mas as Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia determinavam que o batismo deveria ocorrer até o oitavo dia. 195 Talvez o batismo tenha ocorrido às pressas, com Joaquim correndo algum perigo de vida, pois o vigário que conduziu a cerimônia não fez o registro naquele momento, sendo o mesmo feito a posteriori, mediante testemunho dos participantes do evento. Joaquim foi levado a pia batismal por seus pais, Francisco e Maria Teresa, e por seus padrinhos, o reverendo José de Macedo Neto, de quem não se tem maiores notícias, e Ana Garcês de Morais, a avó materna. 196 A escolha desses padrinhos, como era costume à época, não era fortuita, mas servia para estreitar os laços de família e amizade, os quais também serviriam para amparar o filho espiritual ao longo de sua vida. O apadrinhamento consistia em um renascimento no qual “os batizandos deveriam dispor 194 Apesar de tecerem comentários bastante perspicazes sobre Joaquim, o Cônego Trindade e Varnhagen também não conseguiram apontar fontes capazes de revelar tais informações. In: TRINDADE. Genealogias da zona do Carmo... p. 345-346, e VARNHAGEN. História Geral do Brasil,... 1877, p. 1002. A Universidade de Coimbra afirma, em seu site, que Joaquim Veloso de Miranda teria nascido no ano de 1736 (o apontamento mais retroativo por nós encontrado) e que teria falecido em 1817, ou seja, um ano após sua verdadeira data de passagem. Também de forma errônea esta instituição coloca-o como sendo nato de Vila Rica. In: http://www.uc.pt/org/historia_ciencia_na_uc/autores/MIRANDA_ joaquimvelosode. Tarquínio J. B. de Oliveira em seu Cartas Chilenas aponta o ano de 1742 como sendo aquele de nascimento de Joaquim. In: OLIVEIRA, Tarquínio J. B. de Oliveira. Cartas Chilenas. São Paulo: Referência, 1972, p. 88. Tal data foi igualmente mencionada por Boschi, ao que parece baseado nos apontamentos de Oliveira e no fato do casamento dos pais de Joaquim ter acontecido a 29 de fevereiro de 1740. Este autor afirma ainda que “apesar das buscas, não se localizaram registros a esse respeito”. In: BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica... p. 104. O ano de 1749 também foi mencionado por Almeida que utilizou, para tanto, fontes diversas. ALMEIDA, Palmira Morais Rocha de. Dicionário de Autores no Brasil Colonial. Lisboa: Edições Colibri, 2003, p. 292. Outros autores preferiram apontar o ano de 1750 (ainda que sem mencionar as fontes) como sendo aquele de nascimento de Joaquim, como GAUER, Ruth Maria Chittó. A Influência da Universidade de Coimbra na Formação da Nacionalidade Brasileira. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1995 (Tese, Doutorado em História); MOTOYAMA, Shozo. Prelúdio para uma história: ciência e tecnologia no Brasil. São Paulo: Edusp, 2004, p.113; e SEGAWA, Hugo. Ao amor do público: jardins no Brasil. São Paulo: Studio Nobel, 1996, p. 129. Por fim, mesmo os trabalhos mais recentes como a Tese desenvolvida por Ermelinda Pataca ou a dissertação de Gustavo Ferreira não lograram êxito em apontar a referida data. Essa autora mencionou por “volta de 1742”, e nada mais. In: PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas (1755-1808)... p. 116 dos anexos; e FERREIRA. As polêmicas Flores... p. 33, respectivamente. 195 O registro de batismo de Joaquim Veloso de Miranda foi encontrado em versão eletrônica, digitalizada. FAMILYSEARCH. Brasil, Minas Gerais, Registros da Igreja Católica, 1706-1999, Santa Rita Durão, Nossa Senhora de Nazaré, Batismos Nov. 1740-Mar 1806, imagem 51 de 87, (ou fl. 48v do documento), 1846. Disponível em https://www.familysearch.org. Acesso em 10 de outubro de 2014. O livro se apresenta truncado. Infelizmente não foi possível localizar a sua versão manuscrita, seja no distrito de Santa Rita Durão, ou no Arquivo Eclesiástico Dom Oscar de Oliveira. Antes da localização deste acento batismal, realizando o confronto com outras fontes, havíamos proposto o ano de 1747 como sendo o de seu nascimento, pois foi registrado que Joaquim tinha 17 anos quando do falecimento de seu pai, em 1764. In: ACSM, 1° Ofício, caixa 88, auto 1857, Inventário de Francisco Veloso de Miranda, 1764, p. 8v. 196 AEDOO, Livro de Batismo da Freguesia do Inficionado (Santa Rita Durão), nov. 1740-mar. 1806, fl. 48v ou 53v (dupla paginação). 72 de novo vínculo filial, agora definido através dos pais espirituais”, relação que, em algum momento, poderia significar privilégios e deveres de ambas as partes, “os quais eram reconhecidos através da obediência, fidelidade e reverência”.197 O contato do jovem Joaquim com sua avó e madrinha deve ter sido, no entanto, restrito, haja vista que após o falecimento de seu então companheiro e avô do recém-nascido, o sargento-mor Paulo Rodrigues Durão, Ana passou a viver com o advogado Tomás Inácio da Costa Mascarenhas. Na ocasião, ele assistia na Vila do Carmo e, mais tarde, seria designado secretário de governo da capitania de Goiás, ausentando-se o casal para esse local. Em 1749, Ana, em companhia de seu novo companheiro, foi madrinha, por procuração, no Inficionado, demonstrando que provavelmente já havia se mudado. No entanto, ela continuava a ser proprietária, naquela paragem, da lavra herdada de seu segundo companheiro, bem como de alguns escravos, como Ana e Tomé, que figuram nos livros de batismo da localidade. 198 Para além de ser reflexo da fidelidade e zelo à religião católica, possuir uma capela curada em sua propriedade rural era símbolo de distinção. A ela concorriam os vizinhos para assistir os ofícios religiosos, como acontecia com o sargento-mor João Fernandes de Oliveira, possuidor de uma capela dedicada a Nossa Senhora da Conceição, situada em sua primeira fazenda, denominada “da Vargem”, localizada nas proximidades do pico do Itacolomi, nas cercanias da vila do Carmo, onde foi batizado seu filho, João Fernandes de Oliveira, futuro desembargador e contratador dos diamantes; ou ainda a própria capela que o jovem desembargador e quarto contratador erigiu na casa em que viveu com Chica da Silva, no Tejuco. 199 Assim como os Fernandes de Oliveira, pai e filho, Durão procurou tornar público sua importância. A capela de Santana ficava distante duas léguas do arraial do Inficionado e, em 1823, quando foi visitada pelo bispo dom Frei José da Santíssima Trindade, ainda se apresentava em estado decente, com seus ornamentos em prata “mas sem forro, nem campamento no corpo”.200 A capela e o engenho, provavelmente contíguos à mina de Cata Preta, configuravam-se como uma estrutura que foi classificada como sendo “uma típica propriedade desse período em que conjugar a extração mineral com a produção 197 VENÂNCIO, Renato Pinto; SOUZA, Maria José Ferro de; e PEREIRA, Maria Teresa Gonçalves. “O compadre Governador: redes de compadrio em Vila Rica de fins do século XVIII”. Revista Brasileira de História. São Paulo, vol. 26, nº 52, p. 276, 2006. 198 AEDOO. Livro de Batismo da Freguesia do Inficionado (Santa Rita Durão), nov. 1740-mar. 1806, fl. 68-68v, 73-73v (dupla paginação). 199 FURTADO. Chica da Silva e o Contratador dos diamantes... p. 77 e 131. 200 OLIVEIRA, Ronald Polito de; LIMA, José Arnaldo Coelho de Aguiar (Orgs.). Visitas pastorais de dom Frei José da Santíssima Trindade (1821-1825)... p. 83. 73 agropecuária parecia ser a opção econômica mais viável para a maior parte daqueles que tinham possibilidade de acesso à terra e à mão-de-obra escrava”.201 Joaquim era um mazombo, termo pejorativo que designava “um europeu extraviado em terras brasileiras”,202 e que recorrentemente foi empregado nos Autos da Devassa da Inconfidência Mineira para designar os nascidos no Brasil que manifestavam seu amor a essa pátria de nascimento. Mais tarde, já na sua vida adulta, Joaquim faria parte de um grupo que Júnia Ferreira Furtado denominou de “República dos Mazombos”, uma “sociedade de pensamento” constituída por letrados, a maioria deles nascidos na América portuguesa e que, tendo frequentado a Universidade de Coimbra, acreditava na capacidade de seus compatriotas para administrar o império. Seus membros compartilhavam, entre si, laços de camaradagem intelectual e política e frequentavam as mesmas academias científicas. 203 Alguns possuíam inclinações libertinas ou eram maçons. Patriotas, se identificavam com o estilo de administração do marquês de Pombal. A exaltação das riquezas da terra, que lhes promovera o enriquecimento pessoal e de seus antepassados, como foi o caso de Francisco, pai de Joaquim, era outra característica que os unia. 204 Por volta do início da década de 1760, “com o fim de prevenir algum passo inconsiderado da mocidade”, os pais de Veloso de Miranda “o fizeram tomar ordens até Epistola”,205 e assim foi matriculado no seminário de Nossa Senhora da Boa Morte, em Mariana, fundado dez anos antes. Não se sabe se a opção pelos estudos religiosos foi escolha pessoal ou imposição familiar, mas certamente o exemplo do tio Frei Durão não pode ser descartado. Ademais, não era incomum que alguns ali matriculassem seus filhos apenas para aperfeiçoar seus conhecimentos, e saliente-se, também, que o seminário era também a única instituição de ensino na capitania que cumpria os pré-requisitos para a entrada na Universidade de Coimbra. A instituição, por seu turno, não impedia-lhes o ingresso, pois as contribuições destes era revertida para financiar os 201 ALMEIDA, Carla Maria Carvalho de. Ricos e pobres em Minas Gerais: produção e hierarquização no mundo colonial, 1750-1822. Belo Horizonte: Argvmentvm, 2010, p. 75. 202 MOOG, Clodomir Vianna. Bandeirantes e Pioneiros. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1969, p. 122, 124 e 125. 203 FURTADO. República de Mazombos... p. 291, 321 e 299, respectivamente. 204 FURTADO, Júnia Ferreira. Seditious Books and Libertinism in the Captaincy of Minas Gerais (18th century Brazil): the Library of Naturalist José Vieira Couto. Revista Complutense de Historia de América, vol. 40, p. 113-136, 2014. Também em FURTADO. República de Mazombos... p. 291-321; e CABRAL DE MELLO, Evaldo. A fronda dos mazombos... 205 FBN, CC, I – 28, 09, 054. ALEMÃO, Francisco Freire. Notícias a respeito do naturalista Joaquim Veloso de Miranda e José Mariano da Conceição Veloso, colhidas de vários informantes. 1849. Coleção Freire Alemão. 74 alunos mais pobres, com verdadeira vocação sacerdotal, que não possuíam recursos para custear seus estudos. Algumas condições para a admissão nos seminários eram comuns a estas instituições, como possuir a idade mínima de doze anos, ser filho legítimo, saber ler e escrever e ser oriundo da mesma diocese a qual pertencia o seminário. 206 As regras sob as quais viviam os alunos nessa instituição, promulgadas por seu fundador, dom Frei Manuel da Cruz, eram restritas. Os estudantes eram acordados ao romper da aurora e estudavam até o início da missa matinal. Em seguida, às oito horas, começavam as aulas. Essas eram encerradas para o almoço, realizado em silêncio, depois de rezarem a oração a Nossa Senhora. Após o almoço, os estudantes se recolhiam a seus cubículos até as três horas da tarde, quando retornavam para novas aulas. Essas terminavam às 6 horas da tarde, na hora do ângelus, momento em que rezavam a Ave Maria, e voltavam a seus cubículos para estudarem a ladainha para, finalmente, ir cear. Seguia-se uma palestra moral ou prática espiritual, ou uma visita à via sacra, dependendo do dia da semana. O dia terminava com as preces noturnas, com o respectivo exame de consciência individual, seguido do ato de contrição. Em seguida, todos retornavam a seus cubículos, e eram obrigados a apagar os candeeiros e dormir. As manhãs de domingo, os dias santos e os feriados escolares eram guardados para o estudo, seguidas de missa, e alguma recreação depois das três da tarde. De modo geral, os alunos deveriam se comportar com cortesia e modéstia, e somente podiam ir à cidade acompanhados do padre reitor, além de serem proibidos de visitarem uns aos outros em seus cubículos, de falarem com alguém à porta, ou mulheres, mesmo sendo parenta. Os estudantes voltavam para casa somente no único mês de férias que dispunham, quando eram também suspensas as classes de Filosofia e Gramática. 207 Em 31 de setembro de 1761, em Mariana, foi dada a entrada no processo De Genete et Moribus de Joaquim que contava, naquele momento, com seus 15 anos, e de seu irmão mais moço, João, primeiro passo para se habilitarem à carreira eclesiástica. 208 Nele, averiguava-se a vivência do interessado, seus ascendentes na fé católica, e se não haviam sido cometidos crimes contra Deus ou contra a Coroa. Nesse momento, sob a gestão de Dom Frei Manuel Ferreira Freire da Cruz, a seleção era realizada de maneira 206 SELINGARDI, Sérgio Cristóvão. Educação religiosa, disciplina e poder na terra do ouro: a história do Seminário de Mariana, entre 1750 e 1850. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2007, p. 94 (Dissertação, Mestrado em Educação). 207 TRINDADE, (Cônego) Raimundo. Breve noticiário dos seminários de Mariana. Mariana: Arquidiocese de Mariana, 1951, p. 24, 27 e 26, respectivamente. 208 AEDOO, Armário 06, Auto 1026. Processo De Genere, vitae et moribus de Joaquim Veloso de Miranda e João Veloso de Miranda. Também em STELLFELD. Os dois Vellozo, p. 231-232. 75 bastante criteriosa e os dois meninos preencheram todas as exigências. 209 As inquirições sobre a pureza de sangue de seus antepassados começaram no mesmo ano e, depois das investigações realizadas em Mariana e no Inficionado, prosseguiram pelas vilas de São Paulo e Santos, de onde era oriunda a avó materna, Ana Garcês de Morais. Em todos os locais, todas as testemunhas confirmaram que não havia sinais de traço judeu, mouro, mourisco, mulato ou cristão novo herege nesse tronco familiar, sendo o processo concluído em novembro do mesmo ano. 210 No Seminário de Nossa Senhora da Boa Morte Veloso de Miranda deve ter tido sua iniciação nas ciências botânicas, pois lições básicas de História Natural eram ensinadas nessas instituições. Isso ocorria, por exemplo, no Seminário de Olinda, em fins do século XVIII. 211 Quando os meninos se matricularam, era reitor o cônego José dos Santos, que deixou a instituição em 1763, sendo substituído pelo cônego Francisco Gomes de Souza, que ficou até 1767. Ali, devem ter sido colegas de Antônio Rodrigues Dantas, que se matriculou em Filosofia, em 1764, e que depois de formado, foi alçado ao posto de professor de latim e, em 1768, ao de reitor; e de José Basílio da Gama, que entrou pouco tempo depois. 212 Eram nos primeiros anos escolares que se teciam os primeiros laços de convívio que se levava para toda a vida. Em janeiro de 1766, Joaquim solicitou que fosse avaliada sua declaração de bens de modo a poder receber as ordens sacras. Todo o processo foi realizado com a inquirição das testemunhas e do próprio interessado e, em 29 de julho de 1766, o cônego Inácio Corrêa de Sá deu seu aval ao pedido de Veloso de Miranda, deferindo-o. 213 Dado por concluído o período de estudos no seminário, as fontes sobre Veloso de Miranda começam a se escassear. Parece que, na ocasião, tomou de fato as ordens sacras, pois, em 1788 e 1790, respectivamente, foram protocolados dois pedidos 209 VILLALTA, Luiz Carlos; RESENDE, MARIA E. L (Orgs.). As Minas Setecentistas, Vol II. Belo Horizonte: Autência; Cia. do Tempo, 2007, p. 41. 210 ACMSP, Processo 1883, estante 3, gaveta 20. Processo de Habilitação De Genere et Moribus de Joaquim Veloso de Miranda e João Veloso de Miranda, 1761. 211 ALMEIDA, Argus Vasconcelos de; MAGALHÃES, Francisco de Oliveira; CÂMARA, Cláudio Augusto Gomes da; e SILVA, Jadson Augusto de Almeida da. “Pressupostos do ensino da Filosofia Natural no Seminário de Olinda (1800-1817)”. Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciencias, vol. 7, nº. 2, 2008. Disponível em http://reec.uvigo.es/volumenes/volumen7/ART12_Vol7_N2.pdf. Acesso em 12 de outubro de 2015. 212 TRINDADE. Breve noticiário dos seminários de Mariana... p. 66-67 e 29. 213 AEDOO, Procesos De Genere, vitae et moribus Armário 06, pasta 1026. Processo De Genere, vitae et moribus de Joaquim Veloso de Miranda. Também em BOSCHI, Caio. Exercícios de Pesquisa Histórica. Belo Horizonte: Editora PUC Minas, p. 104-105. 76 para habilitar-se a uma paróquia vacante na capitania. 214 Somente após sua chegada a Portugal, no início da década de 1770, já como estudante em Coimbra, as fontes voltam a se tornar mais numerosas. Sua partida encerrou o primeiro ciclo de sua vida, aquele no qual sua identidade foi forjada a partir do seu pertencimento ao círculo familiar no qual nascera. De Mariana, onde ingressou na carreira eclesiástica e adquiriu o preparo acadêmico necessário, Veloso de Miranda partiu para a Universidade de Coimbra, em Portugal, decisão que seria responsável por lhe abrir muitas portas, as quais serão exploradas nos capítulos a seguir. 214 AEDOO, Armário 8, prateleira 2 – Livro de Registro das Bulas Apostólicas do (...). Livro 2° do Cabildo de Mariana, fl. 30v, apud BOSCHI. O Cabildo da Sé de Mariana (1745-1820): documentos básicos. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro/Editora PUC Minas, 2011, p. 452. 77 CAPÍTULO 2 DA ESTOLA À HISTÓRIA NATURAL: A TRAJETÓRIA DE VELOSO DE MIRANDA NA UNIVERSIDADE DE COIMBRA 2.1 – Um mazombo vai para Coimbra A partida de Veloso de Miranda para Portugal representou, para o jovem religioso, não apenas o prosseguimento de seus estudos, mas também a continuidade de uma tradição familiar iniciada 20 anos antes quando, em 1756, seu tio, o frei Santa Rita Durão, tornou-se doutor em Filosofia e Teologia pela Universidade de Coimbra. 215 No início de sua jornada, é bem provável que Veloso de Miranda tenha se deslocado desde as Minas para o Rio de Janeiro como integrante de alguma tropa de comércio ou militar, ainda no primeiro semestre de 1770. Percorreu, ao longo dos primeiros dias, o Caminho Novo no sentido contrário àquele feito por seu pai 30 anos antes, passando pelas proximidades da fazenda do Mau Cabelo, onde pode até ter pernoitado, como era o costume, pois a viagem, geralmente, era realizada à paulista, ou seja, marchava-se desde o amanhecer até o início ou meio da tarde, dependendo das condições climáticas, quando então se arranchava para passar a noite. Anos mais tarde, já na virada do século, Veloso de Miranda comprou a Mau Cabelo, fazendo dela seu bastião de pesquisas filosóficas, de trabalho e de repouso, até o fim de seus dias. Depois de cruzar a Mantiqueira, atravessou o rio Paraibuna entrando na capitania do Rio de Janeiro e em poucos dias deveria chegar ao Porto da Estrela, descendo o rio Iguaçu em uma pequena embarcação em direção à baia da Guanabara, cruzando-a até o porto dos Mineiros, no centro da capital. 216 Do Rio de Janeiro, Veloso de Miranda embarcou em um dos vários navios que seguiam para Lisboa, com parada em Cabo Verde ou outro arquipélago a meio caminho. Após desembarcar no reino, como era comum com outros estudantes que se dirigiam do Brasil para Coimbra, pode ter gasto um tempo para se habituar a cidade de Lisboa, e para descansar da viagem por alguns dias na casa de algum familiar ou de alguém que fosse devedor de favores à família, como fez o estudante baiano Antônio Álvares Pereira quando foi para Coimbra, em 1695. O trajeto de Lisboa a Coimbra, em montaria, 215 PERES, Edna Castilho. Caramuru de Santa Rita Durão: edição adaptada em prosa e anotada. Assis, 2006, p. 27 (Tese de Doutorado em Letras, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho). 216 FURTADO. Chica da Silva e o contratador dos diamantes. 78 era normalmente realizado em cinco dias, um percurso tão incômodo como aquele de mês e meio embarcado através do Atlântico, conforme mencionou Álvares Pereira. 217 É bem provável que entre Lisboa e Coimbra, Veloso de Miranda tenha realizado uma estada em Porto de Mós, onde residia um seu tio-avô, o padre Bonifácio de Beja, presbítero secular na vila. 218 Uma vez em Coimbra, a dedicação aos estudos, a perspectiva de conclusão do curso e da ascensão social funcionavam como estímulos aos alunos, sobretudo àqueles que não tinham perspectiva de retornar ao seio familiar até a conclusão dos estudos. Para estes, os primeiros meses deveriam ser os mais desconfortáveis e angustiantes, e não apenas pela distância dos familiares, mas também pelas características que distinguiam o viver em Portugal do viver na América. Veloso de Miranda, como fez Álvares Pereira, em 1695, deve ter escrito ao pai, informando de sua chegada à Coimbra e, talvez, queixando-se, entre outras coisas, do rigor do inverno europeu, como fez o estudante baiano: […] o frio que há nesta terra é insuportável, e sempre estamos juntos ao fogareiro, e andamos tremendo com os pés cheios de frieiras, as unhas das mãos e dos pés parecem que saltam fora, tudo é gemer, tudo tremer, e não pode uma pessoa fazer nada por amor do frio que é o mal que tem Portugal. 219 Outra dificuldade era a “escassez de alimentos, provocada por seu alto custo”, particularmente difícil “para os jovens provenientes do Brasil, que contavam tão-somente com a mesada enviada pelos pais”.220 Aqueles que não tinham fazendas para manter uma cozinheira particular valiam-se das chamadas casas de pasto, estabelecimentos que serviam almoço e jantar. Já para os alunos possuidores de largos cabedais, fazendas não faltavam para sua manutenção em Coimbra, inclusive para manter uma criadagem, pois “cada dois ou três estudantes têm uma ama e, às vezes, três criados”, conforme observara, alguns anos antes, Ribeiro Sanches. “Se é cavalheiro, tem um cozinheiro, um criado e um pajem ou, pelo menos, um negro”.221 Também não era raro que um ou outro despendesse maiores esforços para conduzir consigo parte de seu 217 RUSSELL-WOOD, Anthony John. Relato de um caso Luso-Brasileiro do século dezessete. Studia. 36, 1973, p. 35. 218 ANTT. Fundo Desembargo do Paço (Estremadura). Maço 1338, doc. 4, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 120. 219 RUSSELL-WOOD. Relato de um caso Luso-Brasileiro do século dezessete, p. 35. 220 FURTADO. Chica da Silva e o contratador dos diamantes, p. 94. 221 CRUZEIRO, Maria Eduarda. “Costumes estudantis de Coimbra no século XIX: tradição e conservação institucional”. Análise Social, vol. XV, nº. 60, 1979, p. 813. 79 mobiliário. 222 Só para se ter uma ideia dos custos de manter um estudante brasileiro em Coimbra, em 1790, o bacharel em Leis por Coimbra, Francisco de Souza Guerra Araújo Godinho, por essa ocasião ouvidor na comarca do Rio das Velhas, já havia despendido o equivalente a um conto de réis para custear os estudos de seu irmão, João Luciano de Souza Guerra Araújo Godinho, na mesma universidade, 223 valor que à época correspondia a 10 escravos jovens (entre 18 e 25 anos) e sadios, 224 ou a uma casa de sobrado no Centro de Vila Rica, como aquela que Veloso de Miranda viria a adquirir quando de seu retorno às Minas. 225 De modo a atenuar as dificuldades do dia a dia, a solidão e as saudades da família, “estabelecia-se na universidade uma [relação] de camaradagem entre os estudantes brasileiros, muitas vezes discriminados pelos reinóis, e os mais antigos se encarregavam de apresentar os mais novos a professores e alunos”. Valiam-se, assim, do companheirismo e da hospitalidade dos que lá estavam há mais tempo “para inserir-se no círculo social da instituição, onde o mérito valia menos que as recomendações que os recém-chegados traziam de casa”. 226 As relações de favores e contrafavores, de lealdade, de obediência e de respeito existentes na sociedade portuguesa se faziam, por extensão, presentes na Universidade de Coimbra. Em Coimbra, grande parte dos estudantes morava em casas alugadas, localizadas na sua grande maioria nas proximidades da Sé Velha ou na freguesia de Almedina. Justamente nessa época, a Universidade empreendeu grande esforço para recuperar muitos desses imóveis de modo a hospedar os estudantes “que chegavam de todas as partes do império”. De qualquer modo, segundo Fernando da Fonseca, “Coimbra ‘dificilmente poderia absorver – alojando e alimentando em permanência – a totalidades dos matriculados’, sendo parte da população estudantil sempre ‘itinerante’”.227 222 VALADARES, Virgínia Maria Trindade. Elites mineiras setecentistas: conjugação de dois mundos. Lisboa: Edições Colibri, 2014, p. 75. 223 APM, CC. Carta a Francisco de Souza Guerra Araújo Godinho avisando que já mandou cerca de um conto de réis para o sustento e pagamentos dos estudos de seu irmão. Coimbra, 02 de julho de 1790. 224 AHCSM, 1º Ofício, Auto 610, Inventário de João Lopes da Rocha, 1791, fl. 4. 225 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 9v. 226 FURTADO. Chica da Silva e o contratador dos diamantes, p. 94 227 FONSECA, Fernando Taveira da. A Universidade de Coimbra (1700-1771): estudo social e económico. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1995, p. 368-369, apud CRUZ, Ana Lúcia Rocha Barbalho da & PEREIRA, Magnus Roberto de Mello. “Ciência, identidade e quotidiano. Alguns aspectos da presença de estudantes brasileiros na Universidade de Coimbra, na conjuntura final do período colonial”. Revista de História da Sociedade e da Cultura, 9, 2009, p. 212. 80 2.2 – A formação acadêmica de Joaquim Veloso de Miranda em Coimbra Veloso de Miranda assentou sua matrícula no curso de Cânones em 1° de outubro de 1770 228 e a julgar pelos Estatutos, não deve ter despendido os valores correntes para tal, uma vez que os eclesiásticos eram isentos de taxas de matrículas e assentos, visto que desde 1766 estava investido das ordens sacras. 229 Durante os primeiros dias de aula do curso, ele e os outros estudantes recém chegados devem ter sido alvo das práticas de socialização universitárias, as chamados “troças”, “investidas” ou “caçoadas” – hoje denominadas “praxes” –, a menos que fosse recebido e resguardado por um conterrâneo, o que poderia atenuar o peso das “brincadeiras”. Os brasileiros, em especial, em maior número dentre os cidadãos lusos d’além-mar, eram os alvos preferidos dos portugueses.230 A verdade é que o acesso ao ensino universitário em Coimbra sempre fora o mais preferido investimento daqueles que tinham fazendas para matricular e manter seus filhos na Corte. Segundo Walter Cardoso, “o fluxo de brasileiros à Universidade de Coimbra, no período em epígrafe”, ou seja, ao longo do século XVIII, pode ser “melhor compreendido atentando-se para as condições econômico-educacionais da Colônia”, e as consideráveis fortunas que se construíam por mineradores e comerciantes, bem como pela falta de universidades na América portuguesa. 231 Ainda segundo este historiador, no período que precede as reformas, entre os anos de 1761 e 1770, “assentaram matrícula na Universidade de Coimbra 288 estudantes oriundos do Brasil”, sendo “178 no curso de Cânones”, recorte histórico e curso que se enquadra Veloso de Miranda. 228 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 105. Pataca, no entanto, aponta a matrícula de Joaquim no curso de Cânones como realizada no ano de 1769. In: PATACA, Ermelinda. Terra, água e ar nas viagens cientificas portuguesas (1755-1808). Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2006, p. 72 (Tese de Doutorado em Geociências, Universidade de Campinas). 229 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra. Coimbra: Officina de Thomé Carvalho impressor da Universidade, 1654, p. 135. Também em ANTUNES, Maria do Carmo Garcia Faria Gaspar. O ensino na Faculdade de Cânones. Universidade(s): História, memórias, perspectivas. Coimbra: Comissão Organizadora do Congresso “História da Universidade”, 1991, vol. 1, p. 123. 230 Algumas práxis envolviam hábitos do cotidiano da universidade. No “grau”, “paródia à cerimónia de doutoramento, o calouro era fechado numa sala tal qual acontecia nas provas, competindo-lhe defender uma tese caricata perante um júri. Após os discursos do padrinho, era investido com um penico na cabeça”. Também era comum a prática do discurso, no qual “o orador deveria tratar de um ‘tema do tipo qual nasceu primeiro, o ovo ou a galinha’”. In: NUNES, António Manuel. “As praxes académicas de Coimbra: uma interpelação histórico-antropológica”. Sociedade e Cultura, 6, Cadernos do Noroeste, Série Sociologia, Vol. 22 (1-2), 2004, p. 139. Também em CRUZEIRO, Maria Eduarda. Costumes estudantis de Coimbra no século XIX: tradição e conservação institucional. Análise Social, vol. 15, No. 60 (1979), pp. 795-838. 231 CARDOSO, Walter. Estudantes da Universidade de Coimbra nascidos no Brasil (1701-1822): procedências e graus obtidos. Universidade(s): História, memórias, perspectivas. Coimbra: Comissão Organizadora do Congresso “História da Universidade”, 1991, vol. 2, p. 165. 81 A cidade de Mariana, sede de um bispado desde o ano de 1745, “onde se instalara o seminário entre 1748 e 1750, tendo-se convertido no centro cultural mais importante das Gerais”, era a cidade que mais enviava alunos para Coimbra na época em que Minas dominava o cenário econômico colonial. 232 Nas Palavras de Russell-Wood, “o título universitário elevava não somente o próprio recipiendário, dando-lhes certos privilégios e acesso à classe dominante na colônia, mas constituía meio de ascensão social de toda a família”. Ainda segundo Furtado, a partir do século XVIII não apenas a elite agrária da colônia mandava seus filhos para as universidades no Reino, mas também os comerciantes em ascensão financeira e os proprietários de minas, como bem sabemos. 233 Logo, a presença crescente de alunos luso-brasileiros na Universidade de Coimbra ao longo do setecentos pode ser vista não apenas como reflexo da maior condição financeira das elites da América portuguesa, mas também como espaço por meio do qual os alunos oriundos d’além-mar buscavam possibilidades de ascensão social ao servirem ao Rei, após formados, nas mais distintas atividades, geralmente administrativas, e de se tornarem merecedores de mercês e de privilégios específicos como cartas de nobreza, hábitos religiosos e pensões. Cruz e Pereira corroboram tal perspectiva salientando o quanto os alunos brasileiros viam no ensino superior “uma das vias para voltar para a terra com um emprego garantido”.234 Assim, podemos pensar o ingresso de Veloso de Miranda no curso de Cânones da Universidade de Coimbra como parte de uma estratégia pensada há alguns anos, quando foi matriculado no Seminário de Mariana, com vistas a honrar aos seus com a existência de um membro do clero na família. No entanto, ao invés de assumir uma capela após concluir sua formação no seminário, sua família dilata essa estratégia enviando Veloso de Miranda para Coimbra, onde poderia aprofundar seus conhecimentos e adquirir uma formação que lhe permitiria exercer o direito canônico ou, quem sabe, alçar a algum posto administrativo mais distinto. O curso de Cânones em que Veloso de Miranda assentou matrícula era regido pelos Estatutos Filipinos, de 1598, revisto e confirmado por D. João IV, em 1653, e possuía um currículo que privilegiava as leis da Igreja, em detrimento das de ordem 232 FONSECA, Fernando Tavares da. “O saber universitário e os universitários no ultramar”. História da Universidade em Portugal, I Volume, Tomo II (1537-1771). Coimbra: Universidade de Coimbra; Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 1024. 233 FURTADO. Chica da Silva e o contratador dos diamantes, p. 303. 234 CRUZ; MELLO. Ciência, identidade e quotidiano... p. 226. 82 política e econômica, o que de acordo com os preceitos iluministas, então em ascensão, prejudicava grosso modo a formação de profissionais com competência para atuar junto à administração do Império e aos negócios públicos, críticas que já haviam sido, inclusive, ajuizadas por António Nunes Ribeiro Sanches (1699-1783), em sua Cartas sobre a educação da mocidade. 235 Em 1770, o curso canônico e o curso de Leis eram integrantes do curso jurídico, a diferença é que neste último as disciplinas eram distribuídas no sentido do ensino do Corpus Iuris Civilis, ou seja, privilegiava a evolução do direito cível, enquanto no primeiro dominava o Corpus Iuris Canonici, 236 que constituía o direito clássico da Igreja Católica e sua evolução. Esse englobava desde as normas mais antigas, às mais modernas, dispostas em Livros, Coleções e nos Decretos de vários Pontífices, 237 sendo estudadas em seis cadeiras, distribuídas de acordo com a nomenclatura das horas canônicas, ou seja, Prima, Véspera, Terça e Noa, sendo as duas primeiras de Decretais, a terceira de Sexto e a quarta de Clementinas. Havia ainda duas outras catedrilhas – cátedras destinadas aos que se iniciavam na carreira docente - de Decretais. 238 Integrante das “Faculdades Maiores”, como o também era a Medicina, os cursos jurídicos eram previstos para ser realizados em seis anos; 239 o ensino era ministrado em latim e o método utilizado consistia na leitura e no comentário sumário pelos professores, então designados lentes. 240 É bem provável que Veloso de Miranda tenha tido como professores nos primeiros anos do curso canônico Custódio Manuel da Silva e Rocha e Manuel Gomes Ferreira, ambos religiosos com privilégios de lente, ou ainda Caetano Correa de Seixas, natural da Cidade da Bahia, doutor em Cânones e lente de uma das catedrilhas. 241 Dois anos depois de Veloso de Miranda assentar matrícula na Universidade de Coimbra, à meio do curso, iniciou-se a reforma na instituição, sob a égide pombalina, a 235 SANCHES, Antônio Nunes Ribeiro. Cartas sobre a educação da mocidade. Coimbra: imprensa da Universidade, 1922, p. 67. 236 MASSAÚ, Guilherme Camargo. “A reforma dos Estatutos da Universidade de Coimbra: as alterações no ensino jurídico”. Prisma Jurídico. São Paulo, vol. 9, nº. 1, p. 169-188, p. 171, jan./jun. 2010. 237 MADALENO, Aurora. “Breve introdução ao estudo das Leis Canónicas”. Gaudium Sciendi, nº 4, Julho de 2013. 238 ALVES, Dora Resende Alves; CASTILHOS, Daniela Serra. A evolução da universidade portuguesa – da sua origem ao século XVIII. Disponível em http://repositorio.uportu.pt/jspui/handle/11328/1270. Acesso em 20 de março de 2017. 239 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra. Coimbra: Officina de Thomé Carvalho impressor da Universidade, 1654, p. 142-143. 240 ALVES; CASTILHOS. A evolução da universidade portuguesa... 241 MERÊA, Paulo. Estudos de História do ensino jurídico em Portugal (1772-1902). Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 2005, p. 343. 83 qual ele não pôde deixar de acompanhar com interesse e curiosidade, pois os novos rumos conferidos à instituição modificavam o panorama dos estudos que então empreendiam. Com as reformas, a Universidade de Coimbra passou a dispor de seis Faculdades, a saber; Medicina, Leis, Cânones e Teologia, já existes, e outras duas recém criadas; as faculdades de Filosofia e de Matemática. Os cursos jurídicos, no entanto, tiveram seu tempo de duração reduzidos de oito para cinco anos. Ademais, tornou-se obrigatório o ensino das disciplinas Física, Geometria, História Natural e Química para todos os cursos tornando, assim, o aprendizado sobre as ciências naturais um lugar comum para aqueles que frequentassem a instituição: Entendendo-se compreendidas na Medicina todas as Ciências, que pertencem à Filosofia do corpo humano são, e enfermo: Na Matemática todas as Ciências, que tratam da quantidade em geral, e em particular, com a Teoria mais sublime da Física, que fora de um profundo de Matemática se não pode estudar, nem entender: E na Filosofia Natural todos os conhecimentos de facto, que pela observação se tem achado na Natureza, e formam o Corpo da Historia Natural, com tudo o mais, que por experiências se tem descoberto acerca das qualidades dos diferentes produtos da mesma Natureza; ficando também anexos, e agregados a esta última Profissão os Estudos da Filosofia Racional, e Moral; de sorte que se forme um Sistema completo das Ciências Filosóficas. 242 Em suma, previa-se que a partir de então, todos aqueles que deixassem Coimbra diplomados estariam aptos a exercer as atividades correspondentes à sua formação, a administração pública e as indagações filosóficas, principalmente aquelas destinadas ao reconhecimento das potencialidades econômicas no âmbito da História Natural. Foi nesse contexto que a 10 de dezembro de 1772, já tendo finalizado os dois primeiros anos do curso de Cânones, que equivaliam ao curso de Instituta, 243 Veloso de Miranda decidiu pedir sua transferência para a nascente Faculdade de Filosofia, com vistas a se matricular no novo curso de Matemática, “persuadido da utilidade que lhe 242 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra, 1772, vol. 3, p. 4. 243 Revista Brasília. Coimbra, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra/Instituto de Estudos Brasileiros, 1949, p. 277. Suplemento ao volume IV, apud FURTADO, Júnia Ferreira. O retorno como missão: o mulato Cipriano Pires Sardinha e a viagem ao Daomé. Anais Eletrônicos do 14º Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia – 14º SNHCT. Belo Horizonte, Campus Pampulha da Universidade Federal de Minas Gerais, outubro de 2014. 84 [podia] provir das lições de Geometria”.244 A matrícula era realizada mediante uma petição endereçada ao Reitor da Instituição, onde os candidatos deveriam informar se pretendiam ser matriculados como Ordinários, ou seja, “os quais se destinarão a estudar a Filosofia por si mesma” ou apenas “para instrução”, ou então como Obrigados, onde deveriam estudar “toda a Filosofia ou parte dela como subsídios e preparação para as Faculdades. 245 A Faculdade de Filosofia possuía suas especificidades, as quais deveriam ser observadas antes mesmo do requerimento para ingresso. Para que a matrícula em algum de seus cursos fosse aceita, os candidatos deveriam “ter feito previamente um curso completo de Humanidades”, ou seja, serem capazes de entender e escrever a língua latina – o que Veloso de Miranda havia aprendido no Seminário em Mariana, e possuir conhecimentos em língua grega. Para os candidatos que não apresentassem declarações de que já haviam cursado tais disciplinas, os exames de latim e grego deveriam ser realizados antes da primeira Matrícula. Já os alunos que pretendiam cursar Medicina, por sua vez, deveriam igualmente prestar o exame de latim antes da Matrícula, conquanto fosse possível realizar o de grego em um momento posterior, de acordo com o regimento interno do curso. 246 Os alunos interessados em frequentar os cursos oferecidos na Faculdade de Filosofia passaram a ser divididos em duas categorias; os ordinários, que demonstravam interesse próprio na aquisição de conhecimentos filosóficos e os obrigados que, como o nome diz, estavam ali apenas para estudar a Filosofia, “ou parte dela, como subsídio, e preparação para as [outras] Faculdades a que se destinarem”.247 Nesse ínterim, apesar de ter solicitado transferência de curso em 1772 e de frequentar as cadeiras do curso filosófico tão logo passaram a ser oferecidas, apenas a 27 de maio de 1774, quase 2 anos após o início das reformas, Veloso de Miranda foi oficialmente admitido, por meio de 244 ARQUIVO DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA – Faculdade de Matemática – Matrículas (1772-1783). Cota: IV-1ª. D-15-7-1, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 105. Sobre essa mudança, Álvaro Antunes fala que Veloso de Miranda foi “tocado pelo espírito de sua época”. In: ANTUNES, Álvaro de Araújo. Pelos pés de Francisco: caminhos e encruzilhadas da instrução escolar na segunda metade do século XVIII, em Minas Gerais. FONSECA, Thais Lima de Lima e (Org.). As reformas pombalinas no Brasil. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2011, p. 135. 245 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra, compilados debaixo da immediata e suprema inspecção d'el-Rei D. José I pela Junta de Providencia Litteraria... ultimamente roborados por sua magestade na sua Lei de 28 de Agosto deste presente anno. Lisboa: Na Regia Officina Typografica, 1772, vol. 3, p. 226. 246 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra..., 1772, vol. 3, p. 225. 247 PRATA, Manuel Alberto Carvalho. Ciência e sociedade: a Faculdade de Filosofia no período pombalino e pós-pombalino (1772-1820). Universidade(s): História, memórias, perspectivas. Coimbra: Comissão Organizadora do Congresso “História da Universidade”, 1991, p. 197. 85 despacho emitido pelo Reitor, como aluno regular do curso de Filosofia, na condição de voluntário ou por obrigação, concluindo, neste mesmo ano, as disciplinas nas quais se encontrava matriculado “com inteiro cumprimento das obrigações” inerentes às mesmas. 248 A inserção de Veloso de Miranda no universo da Filosofia e da Matemática, cursos que habilitavam à prática das Ciências Naturais e da Astronomia, respectivamente, sugerem que o jovem padre talvez não era possuidor de pendor para a vida clerical, ou que simplesmente se mostrava deslumbrado pelas novas oportunidades acadêmicas que se abriam na instituição, sendo o ato de “servir ao Rei” por meio das pesquisas em História Natural uma das funções que vislumbrou, atraindo-o. 249 O trânsito entre os cursos que Veloso de Miranda se submeteu não foi, no entanto, um caso isolado. Até 1772, aquela universidade tinha seus alunos concentrados majoritariamente nos cursos de Leis e Cânones, pois estes atraíam os estudantes em função dos altos “cargos que profissionalmente lhes eram destinados”,250 e por “uma melhor e mais rápida colocação no mundo de trabalho de então, uma vez que preparava quer para o foro civil, quer para o foro eclesiástico”. 251 As reformas pombalinas, entretanto, mudariam tal cenário, ocasionando uma retração na percentagem de alunos matriculados nos cursos jurídicos de 80% para não mais que 52% do total dos estudantes, conforme apontam Cruz e Pereira. 252 Os rudimentos da História Natural passaram a ser ministrados em todos os cursos da Universidade, e todos os estudantes adquiriam as habilidades da 248 ARQUIVO DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA – Processos de Cartas (Provas) de curso – 2ª Série – Cx. 37; Livro de Matrículas dos Estudantes da Faculdade de Leis do ano de 1773 para o de 1774 – Cota: IV-1ª D-2-3-nº 69 – 2º Ano do curso de Leis, fls. 39; Livro de Matrículas da Faculdade de Teologia – Ano letivo de 1772 para 1773. Cota: IV-1ª. D-2-3-68, fls. 14 e 29, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 106. 249 Aqueles que concluíssem o curso de Matemática, por exemplo, estariam aptos a servir na Marinha ou na Engenharia, “sem proceder outro algum Exame”. In: UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra, 1772, vol. 3, p. 149. 250 BRIGOLA, João. Curso de Philosophia Natural, profissionalização do viajante-naturalista e ‘conflito de faculdades’ (1772-1808). Coimbra: Universidade de Coimbra, 2012, p. 11. 251 ANTUNES, Maria do Carmo Garcia Faria Gaspar. O ensino na Faculdade de Cânones. Universidade(s): História, memórias, perspectivas. Coimbra: Comissão Organizadora do Congresso “História da Universidade”, 1991, vol. 1, p. 129. 252 CRUZ; MELLO. Ciência, identidade e quotidiano, p. 208. 86 observação e da experiência, de formular as bases do conhecimento da natureza, daí a justificativa das construções que foram efetuadas para assegurar a nova proposta da universidade, como a criação do Hospital, do laboratório de anatomia, do jardim botânico, do gabinete de física, do museu de história natural, do laboratório de química e do observatório astronômico. 253 Isto é, estabeleceu-se uma relação direta entre a teoria, ensinada nas cadeiras teóricas, e a prática, aprendida nos laboratórios específicos. A tudo presidia a observação empírica da natureza. Em relação ao novo curso de Filosofia, procurou-se “a investidura do progresso das investigações através da experiência e da vivência do pesquisador, com o objetivo de se chegar a novas conclusões a partir da gestação experimental do outro”.254 Assim, o curso de Filosofia buscava trazer para o seio da universidade o conhecimento empírico, experimental, pragmático e científico. As aulas de Filosofia e História Natural, em particular, passaram a despertar os interesses dos alunos principalmente pelo efeito prático que possuíam. Baltasar da Silva Lisboa (1761-1840), em seu Discurso histórico, político e econômico dos progressos, e estado atual da Filosofia Natural portuguesa, acompanhado de algumas reflexões sobre o Brasil, chamou a atenção para a atração que a História Natural exercia em conjunto com as reflexões filosóficas, relação esta que teria sido responsável pela coopção de muitos estudantes para os nascentes cursos, entre eles seu irmão José da Silva Lisboa, e também o futuro naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira. 255 O tempo previsto para a conclusão do curso filosófico era de cinco anos, sendo abolidas “todas e quaisquer mercês remissivas de anos”, de modo que não era possível concluir o curso em menor tempo. A graduação era alcançada quando o aluno fosse aprovado nos exames de todas as disciplinas que cursara. Aqueles que quisessem obter os graus de Licenciado e Doutor deveriam cursar um ano a mais para cada habilitação, assistindo novamente as lições do terceiro e quarto anos do curso filosófico. 256 O primeiro ano de curso filosófico vivenciado por Veloso de Miranda era quase todo destinado à aquisição de conhecimentos teóricos, e estava reservado à introdução à 253 GAUER, Ruth Maria Chittó. A modernidade portuguesa e a reforma pombalina de 1772. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1993, p. 115. 254 NUNES, Cristiane Tavares Fonseca de Moraes. A política educacional pombalina. Anais do VI Congresso Brasileiro de História da Educação. Vitória: Ed. UFES, 2011. 255 LISBOA, Baltasar da Silva. Discurso histórico, político e econômico dos progressos, e estado atual da Filosofia Natural portuguesa, acompanhado de algumas reflexões sobre o Brasil. Lisboa: Na Officina de Antônio Gomes, 1786, p. 13-14. 256 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra, 1772, vol. 3, p. 227-228. 87 Filosofia, onde eram apresentados os princípios da Filosofia Racional (Lógica e Metafísica) e da Filosofia Moral. Ao longo do segundo ano, o enfoque era direcionado à Geometria, sem a qual o aluno não poderia ser matriculado no Terceiro ano, e à História Natural, compreendendo esta os estudos sobre a Botânica, a Mineralogia e a Zoologia. Neste ano, também eram comuns os exercícios práticos, como a distribuição pelo lente a seus alunos de algumas produções dos três Reinos, para que eles se afeiçoassem às mesmas vis a vis, ou seja, aos olhos, e “se acostumassem a descrevê-las com exatidão, e a observá-las com destreza e sagacidade”. Apenas depois de compreendidas “as verdades conhecidas pela observação”, o curso prosseguiria com as observações por meio de ações mais práticas, com a utilização de instrumentos e também por meio de experimentos. 257 Durante o terceiro ano, deveriam ser frequentadas as cadeiras de Física Experimental, com enfoque nas propriedades da água, do ar, da luz e de outros fenômenos físicos. O quarto e o quinto ano de curso eram destinados ao estudo da química teórica e prática, incluindo aqui as atividades de laboratório, onde os lentes propunham a condução de “experiências físicas e químicas, procurando inspirar nos seus Discípulos a Ciência” e “a tirar dela todas as vantagens que forem possíveis”.258 O ano letivo tinha duração de nove meses, com início em outubro e término em junho do ano seguinte. O mês de julho era reservado aos exames finais do ano letivo, aos atos administrativos e às defesas públicas. As aulas tinham duração de três horas pela parte da manhã e outras três horas no período da tarde. Os meses de agosto e setembro eram aqueles em que os alunos gozavam férias. 259 Os exames relativos ao término do período letivo eram conduzidos pelo lente daquele ano findo, sendo obrigatória a presença na arguição de outros três lentes, cada um podendo realizar perguntas ao aluno pelo prazo máximo de vinte e cinco minutos. Já o exame do último ano era realizado “com mais vigor porque pelo merecimento dele se há de conferir o Grau de Bacharel”. Neste caso, o aluno deveria escolher um lente para ser o Presidente do Ato e outros três lentes haveriam de compor a banca, cada qual com não mais que trinta minutos para arguir o concludente. Sendo aprovado, o estudante receberia o grau de “Bacharel formado”.260 O modo acelerado como se deram as mudanças acabou gerando sérios 257 Idem, p. 225, 378 e 229, respectivamente. 258 Idem, p. 4, 257 e 258, respectivamente. 259 Idem, p. 231-232. 260 Idem, p. 259-261. 88 problemas na nascente estrutura universitária; problemas estes que só seriam sanados com o tempo. Em 1772, durante o ano letivo que transcorria concomitantemente às reformas, não foram ofertadas as lições de Ética no curso filosófico “pela razão de não haver compêndio próprio e aprovado, perguntando-se aos estudantes nos exames apenas sobre Lógica e Metafísica, que se haviam explicado”.261 Apesar da presença dos novos lentes contratados, ainda havia a demanda por pessoal técnico. Por falta de um profissional demonstrador para a cadeira de Química, “em fevereiro de 1774, a congregação da Faculdade de Filosofia nomeou para a função Manuel Henriques de Paiva, estudante do segundo ano [daquele curso], por se julgar que tinha capacidade e suficiência para se servir interinamente”. Manuel seria “promovido, em 1775, a mestre de oficina do Laboratório Químico, por ter-se revelado competente” para a função, exercendo-a até 1783. 262 Para além dos estudos desenvolvidos em sala de aula e nos laboratórios, outra importante atividade realizada pelos alunos da Faculdade de Filosofia em Portugal eram as viagens filosóficas, consideradas uma oportunidade para que os estudantes pudessem exercitar seus conhecimentos de forma prática ao visitarem territórios pouco conhecidos cientificamente, onde poderiam recolher gêneros da História Natural para posterior estudo ou ainda descobrir novas jazidas mineralógicas. A realização dessas viagens filosóficas passou a ser, inclusive, prevista nos Estatutos da instituição: E como as especulações tranquilas do gabinete, e os conhecimentos adquiridos pelos livros, não podem formar um naturalista completo; terá o lente grande cuidado, e atenção em formar os seus discípulos no gosto, e arte de observar; para se fazerem verdadeiramente hábeis na História do Mundo sensível pelo grande livro da mesma natureza. 263 As primeiras viagens filosóficas, por motivos práticos, foram realizadas principalmente nas proximidades de Coimbra, 264 sendo o território a ser investigado posteriormente alargado. Em 1775, por exemplo, Veloso de Miranda realizou uma viagem filosófica à Serra de Buçaco, ao Norte de Coimbra, informações que procedem de uma carta escrita por Vandelli, o principal professor do curso e responsável por muitas das novidades 261 FONSECA, Thais Lima de Lima e. As reformas pombalinas no Brasil. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2011, p. 187-188 262 Apesar de sua creditada capacidade intelectual, Manuel haveria de ser denunciado ao Santo Ofício por heresia e libertinagem, em 1779. In: FONSECA. As reformas pombalinas no Brasil, p. 184 e 193. 263 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra, 1772, vol. 3, p. 358. 264 PATACA. Terra, água e ar nas viagens cientificas, p. 72. 89 introduzidas, e endereçada ao Marquês de Pombal, na qual o lente tratou de descrever a viagem de dois dos seus alunos, Luís António Furtado de Castro do Rio de Mendonça e Faro (1754-1830), futuro Visconde de Barbacena e governador da capitania de Minas Gerais, e Veloso de Miranda, realizada pelos idos do Natal. Mais do que tratar sobre a viagem de Mendonça e Faro e Veloso de Miranda, Vandelli objetivava dar contas dos depósitos minerais de granito e pórfiro encontradas, das amostras de terra verde e roxa, muito procuradas para o feitio de tintas, e de jaspe vermelho, por eles trazidas e que foram classificadas pelo lente como “melhores que os orientais”.265 Observa-se, dessa forma, que tais viagens, para além de contribuírem para a formação dos alunos, serviam para investigar as potencialidades naturais do espaço esquadrinhado, em proveito dos interesses da Coroa. No ano seguinte, Veloso de Miranda viajou a região de Porto de Mós, nas proximidades de onde residia seu tio-avô, o padre Bonifácio de Beja, encontrando ali jazidas de mármore preto e carvão de pedra, ou carvão mineral, descobertas que foram relatadas por ele em carta enviada ao colega Mendonça e Faro que, por sua vez, em outra carta, transmitiu a notícia a Vandelli, que a reproduziu em uma de suas memórias. 266 Em 1778, Veloso de Miranda realizaria ainda outra “viagem geognóstica”, dessa vez à Serra da Estrela, região Nordeste de Coimbra, acompanhado pelo também aluno e colega, Teotônio José de Figueiredo Brandão (1756-?). 267 Segundo Baltasar da Silva Lisboa, outras tantas viagens filosóficas teriam sido realizadas à época, participando também dessas empreitadas Manoel Joaquim de Paiva, Estácio Goulart, Alexandre Rodrigues Ferreira, José da Silva Lisboa, Manoel Luís Álvares de Carvalho, José Antonio de Sá, Antonio Ramos da Silva e Francisco José 265 BRIGOLA, João Carlos Pires. Colecções, gabinetes e museus em Portugal no século XVIII. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003, p. 143, apud PATACA. Terra, água e ar nas viagens cientificas portuguesas, p. 72. 266 VANDELLI, Domingos. Memórias sobre algumas producções naturaes deste Reino, das quaes se poderia tirar utilizadade. Memórias Econômicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa, Tomo 1. Lisboa: Na Officina da Academia Real das Sciencias, 1789, p. 180. https://books.google.com.br/books?id=d54EAAAAQAAJ&pg=PA177&lpg=PA177&dq=m%C3%A1rmo re+dendr%C3%ADtico+de+Tapeus&source=bl&ots=Z8XZF_Y7Ki&sig=UX5qQkUueg81SwkIEQLMd 7qEQhU&hl=pt-BR&sa=X&ei=5J6qVMnJKMKqNvKxgagP&ved=0CCIQ6AEwAA#v=snippet&q= joaquim&f=false. Também em BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 108. 267 FERREIRA, M. Portugal. O Museu de História Natural da Universidade de Coimbra (Gabinete ou Secção de Mineralogia) desde a reforma pombalina (1772) até a República (1910). Universidade(s): História, memórias, perspectivas. Coimbra: Comissão Organizadora do Congresso “História da Universidade”, 1991, vol. 2, p. 73. 90 Maria, todos alunos da Faculdade de Filosofia e discípulos de Vandelli. 268 Entre os locais mais visitados, as fontes revelam que as Serras da Estrela e a de Gerês eram os cenários mais utilizados pelos alunos coimbrenses para as práticas em História Natural, 269 ainda que outras regiões também tenham sido investigadas, como o Alentejo, para onde se dirigiu o padre Joaquim Fragoso Monteiro, também discípulo de Vandelli, que ali observou e recolheu “minas, pedras e cristais”.270 Tendo aproveitado as disciplinas que havia cursado no curso de Cânones, em 18 de junho de 1776, seis anos após seu ingresso na Universidade de Coimbra e passados quatro anos desde que solicitara sua transferência, Veloso de Miranda prestou os exames referentes às disciplinas do quarto ano do curso filosófico. Três dias depois seria examinado nas disciplinas do quinto ano, sendo aprovado Nemine Discrepante, ou seja, por unanimidade pelos lentes avaliadores, o que lhe conferiu o grau de bacharel em Filosofia. 271 É bem provável que, nesta época, Veloso de Miranda já fosse considerado um urso, epíteto aplicado aos alunos com desempenho exemplar. 272 No mesmo ano, Manuel Galvão da Silva, seu colega e também futuro naturalista, concluiu o curso de Filosofia Natural. Um ano depois seria a vez de Alexandre Rodrigues Ferreira e de João da Silva Feijó, conforme observou William Simon. 273 O ano de 1777 é cheio de acontecimentos para os destinos de Portugal e, em especial, para Veloso de Miranda, tendo sido marcado pelo falecimento de Dom José I e pela coroação de dona Maria I, que, entre outras mudanças políticas, trouxe de volta à 268 AFBN, 9,1,31. Discurso Político sobre a História Natural Portuguesa, feita pelo Dr. Balthazar da Silva Lisboa. Graduado na Faculdade de Leis, e opositor às cadeiras da mesma faculdade em a Universidade de Coimbra. 1786, apud PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 71. 269 É sabido que Joaquim Veloso de Miranda, já enquanto professor em Coimbra foi um dos que utilizaram estes ambientes enquanto “laboratórios naturais” para o desenvolvimento e aperfeiçoamento de técnicas de pesquisa, classificação e de coleta de exemplares dos três reinos. José Álvares Maciel, também naturalista, graduado em Coimbra e que esteve envolvido nas ações de sedição em Minas Gerais no final do século em questão, assim como Veloso, também desenvolveu pesquisas relacionadas aos minerais, à botânica e à química na Serra da Estrela, tendo este por acompanhante um auxiliar arborista. In: CRUZ, Lígia. Domingos Vandelli: alguns aspectos da sua actividade em Coimbra. Separata do Boletim do Arquivo da Universidade de Coimbra. 1976, p. 15. Ressalta-se que a Serra da Estrela, mais que a Serra de Gerês, apresentava-se como cenário de fácil acesso aos filósofos naturalistas, estando situada pouco mais de 100 km ao Leste de Coimbra enquanto a outra, mais ao norte do território português, está situada na divisa de Portugal com a Espanha. 270 ARAÚJO, Ana Cristina. O Marquês de Pombal e a Universidade. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2014, p. 194. 271 ARQUIVO DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA – Processos de Cartas (Provas) de Curso – 2ª Série – Cx. 37, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 106. 272 Segundo Virgínia Valadares, “na Universidade de Coimbra, os alunos de bom estudo e bom comportamento eram distinguidos, entre os próprios colegas, com a denominação de ursos. Ser urso na definição clássica ‘era ser quase lente e menos que gente’”. In: VALADARES, Virgínia Maria Trindade. Elites mineiras setecentistas: conjugação de dois mundos. Lisboa: Edições Colibri, 20014, p. 82. 273 SIMON. Scientific expeditions in the portuguese overseas territories, p. 13 e 79. 91 Corte frei Durão, tio-avô do estudante mineiro, nomeado lente da cadeira de Teologia da Universidade de Coimbra. 274 No ano seguinte, Veloso de Miranda ainda se encontrava em Coimbra, com vistas a dar prosseguimento à sua carreira acadêmica. Para tanto, ele deveria se submeter ao Exame Privado, o segundo Ato Grande da universidade, responsável por abrir “o caminho e dar acesso imediato aos Graus Superiores de Licenciado e Doutor”, o que deveria ser “feito com todo o rigor, e que nele se explorem bem a aptidão, e ciência do Defendente”.275 Como afirmou o Reitor reformador, em carta endereçada ao Visconde de Vila Nova de Cerveira, datada de 23 de janeiro de 1778, havia a “necessidade de o quanto antes se constituir o corpo docente próprio para a Faculdade de Filosofia, indicando algumas pessoas para serem doutorados”. Nesta correspondência, constavam os nomes de alguns estudantes como Alexandre Rodrigues Ferreira, José Antônio Frota, Teotônio José de Figueiredo Brandão, Manuel Galvão da Silva, Francisco Antônio Ribeiro da Silva e Joaquim Veloso de Miranda, considerados os “seis bacharéis mais distintos e que mais louvadamente se empregavam no estudo e progresso da referida faculdade”.276 Mas não apenas o mérito alcançado em decorrência dos estudos realizados na Faculdade de Filosofia teria conduzido o nome de Veloso de Miranda a figurar em uma lista de futuros doutores, estimulando-o a permanecer em Coimbra. Também suas indagações em História Natural, realizadas como aluno, podem ter influenciado Veloso de Miranda a investir num doutoramento. Assim, sem pendor para a vida clerical, já evidente, e visando um cargo de professor na universidade, decide-se por postergar, mais uma vez, seu retorno à América, onde haveria de assumir uma capela, o destino mais comum dos que ingressavam na carreira eclesiástica, assegurando-lhes a sobrevivência. Já evitara essa trajetória mais comum quando se formara no seminário 274 À época, a simples lembrança de Frei Durão entre a nobreza religiosa portuguesa, no entanto, poderia se tornar um “tiro no pé” para Veloso de Miranda. Explica-se. Em 1759, o bispo de Leiria, Dom João Cosme da Cunha (1715-1783), ávido por ascender a altos cargos políticos e conhecendo a fama de escritor de Frei Durão, trouxe-o para seu convívio solicitando que o mesmo escrevesse uma pastoral que denegrisse a atuação dos membros da Companhia de Jesus no Reino e acusando-os da tentativa de regicídio contra Dom José I. Após tal documento gerar enorme incômodo entre os homens da Igreja, Dom João passou a denegrir Durão ao mesmo tempo em que se eximiu de qualquer culpa sobre a feitura do documento. Em 1761, mal visto em Portugal e se mostrando arrependido, frei Durão se refugia na Espanha e depois em Roma, onde foi pedir o perdão papal. BIRON, Berty Ruth Rothstein. A aula inaugural de Frei José de Santa Rita Durão. Cadernos do Congresso Nacional de Linguística e Filologia, vol. XVII, nº 03, 2013, p. 12; RIBEIRO, Maria Aparecida. Brasileiros em Coimbra, Coimbra nos Brasileiros: viagem e torna-viagem da Univer(C)idade na literatura. A Universidade de Coimbra e o Brasil: percurso iconobibliográfico. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2012, p. 81. 275 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra, 1772, vol. 1, p. 314. 276 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 108-109. 92 em Mariana, agora a repetia para prosseguir na carreira acadêmica. Ainda no ano de 1778, no dia 21 de julho, na Real Capela da Universidade, Veloso de Miranda submeteu-se aos novos exames, tendo como “padrinho o professor Domingos Vandelli, lente da cadeira de História Natural e substituto da cadeira de Química”, fato que aponta sua alta capacidade intelectual, abrindo-lhe várias portas a seguir, sendo arguido pelo mesmo e por João Dalla Bella. 277 Tendo sido aprovado, foi outorgado a Veloso de Miranda o grau de licenciado, etapa intermediaria que lhe conferia autorização para exercer a Filosofia e para receber, se fosse aprovado, o grau de doutor. Vandelli, como veremos, tornou-se para muitos estudantes da Universidade de Coimbra não apenas um padrinho formal, quando aqueles estavam prestes a realizar seus exames, mantendo, para com seus pupilos, uma relação de proximidade que encontrava justificativas no desejo que compartilhavam do estudo da História Natural, pelo que podemos supor que os destinos de Veloso de Miranda e de alguns de seus pares, ainda estudantes, tenham sido, de algum modo, influenciados pela proximidade que mantinham para com o lente paduano. Após receber o grau de Licenciado, Veloso de Miranda solicitou ao Reitor uma Petição para o “Ato de Repetição”, evento com tempo estipulado de um dia, em horário letivo, onde deveria ser interpelado sobre assunto previamente determinado, com vistas a receber o grau de Doutor. 278 No dia 26 de julho de 1778, transcorridos cinco dias da avaliação que prestara na Real Capela para obter o grau de licenciado, Veloso de Miranda apresentou para julgamento sua Theses ex Universia Philosophia. Tal cerimônia ocorreu na Sala dos Capelos, a principal da universidade, onde eram – e ainda são – realizadas as mais importantes cerimônias acadêmicas. Com a presença do Reitor, de seus padrinhos acadêmicos e dos professores doutores, ouviu-se como de costume a missa do Espírito Santo, momento em que o candidato realizava um juramento à Imaculada Conceição. Logo após, Veloso de Miranda defendeu sua arguição tendo a mesma sido aprovada, recebendo seu capelo de cetim azul ferrete, com franja, 277 ARQUIVO DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA – Livro dos assentos dos exames, actos e graus da Faculdade de Filosofia (1773-1778), fls. 179v – Cota: IV-1ª D-3-3-nº. 48; e CADERNO para os Pontos do 1º, 2º e 3º Anos do Curso Filosófico (1773-1774/1782-1783) – Cota: IV 1ª. D-2ª. D-8-3-nº 1; Cf., também, do mesmo Arquivo: Faculdade de Filosofia – SR: Pontos (1773-1774 a 1782-1783) – Cota: IV-2ª. D-8-4-44, apud, BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 106. 278 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra, 1772, vol. 3, p. 263-264. 93 acompanhado de uma “pequena capa com ‘um longo capuz a cair pelas costas’”279 e murça de veludo azul (uma espécies de sobretudo), com alamares (um tipo de presilhas, ou botões), 280 feitos na Itália, vestimenta símbolo de sua nova posição; doutor em Filosofia. 281 Sua tese, representação máxima de suas pesquisas em Portugal, infelizmente se perdeu no tempo, pelo o que não nos é possível conhecer um pouco mais os estudos que realizara no reino. No mesmo dia, outro orientando de Vandelli, Teotônio José de Figueiredo Brandão, também alcançaria o grau de Doutor em Filosofia. Ambos foram, a seguir ao futuro Visconde de Barbacena, os primeiros a alcançar tal graduação no novo curso da Faculdade de Filosofia. 282 2.3 – De aluno a mestre: um ano de professorado Em 21 de novembro de 1778, poucos meses após receber o título de Doutor em Filosofia, e em consonância à carta do Reitor ao Visconde de Vila Nova de Cerveira, por meio da qual sugeria que a Faculdade de Filosofia constituísse corpo docente próprio, 283 Veloso de Miranda foi nomeado lente demonstrador substituto e interino para as cadeiras de História Natural e Física Experimental, pelo qual deveria receber rendimentos no valor de cento e vinte mil reis anuais. 284 Depois de deixa-las, essas cadeiras seriam preenchidas por Teotónio José de Figueiredo e pelo mineiro, Vicente Coelho de Seabra Silva Telles, respectivamente. 285 Em comum, além do fato de terem sido discípulos do mestre paduano, todos viriam a se tornar sócios da Academia Real das Ciências de Lisboa. Mesmo assumindo as funções de docência, Veloso de Miranda não deixou de 279 HOMEM, Armando Luiz de Carvalho. O traje dos Lentes: Memória para a história da veste dos universitários portugueses (séculos XIX-XX). Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2006. 280 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, Vila Rica, 1816, fl. 6 e 26, respectivamente. 281 PAIVA, José Pedro & BERNARDES, José Augusto Bernardes. A Universidade de Coimbra e o Brasil, uma relação de Passado com Futuro. A Universidade de Coimbra e o Brasil: percurso iconobibliográfico. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2012, p. 19. 282 ARQUIVO DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA – Processos de Cartas (Provas) de Curso, 2ª. Série, Cx. 37, apud GUEDES, Maria Estela. Lápis de carvão. Lisboa: Apenas Livros Editora, 2005; BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 107; e RODRIGUES, Manuel Augusto. Memoria Professorum Universitatis Conimbrigensis, 1772-1937. Coimbra: Arquivo da Universidade de Coimbra, 1992, v. 2, p. 284. 283 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 108-109. 284 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Actas das Congregações da Faculdade de Filosofia (1772-1820). Coimbra: Universidade de Coimbra, 1978, p. 14-15, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 108. 285 ALMEIDA. António Gomes de. “A introdução da teoria de Lavoisier em Portugal: o Primeiro Compêndio Anti-flogístico português”. Revista de Química Pura e Aplicada. Série III, ano 2 (1925), p. 48. 94 realizar viagens filosóficas e outras práticas de campo em Portugal. Nesse ínterim, em 1779, o novo lente foi responsável pela descoberta de grande e excelente quantidade de mármore preto na região de Porto de Mós, material que, nas palavras de Vandelli, seria capaz de receber “bom polimento”, atributo valoroso para esse mineral.286 Tinham se passado nove anos desde sua chegada a Portugal, no ano de 1770. Nesse intervalo, em detrimento dos ganhos que podiam ser auferidas como padre nomeado em alguma capela em Minas Gerais, sua família investira vultuosas fazendas para que Veloso de Miranda permanecesse na Corte. Tais dispêndios foram gastos na obtenção da melhor educação disponível, com vistas a inseri-lo na elite pensante do reino, contribuindo para sua ascensão social. 287 As reformas pombalinas, sob o signo iluminista, defendiam a ascensão de indivíduos não nobres de nascimento que, por suas capacidades intelectuais e formação educacional, cujo patamar mais alto era alcançado ao se graduar em um dos cursos universitários de Coimbra, especialmente os da Faculdade de Filosofia, voltados para as Ciências Naturais, empregavam seus conhecimentos para o serviço da Coroa e engrandecimento do império. Mas, no segundo semestre de 1779, depois de concluir o doutorado e de ter se tornado lente em Coimbra, ao contrário do que se podia a princípio esperar, Veloso de Miranda retornou à América. Para tanto, por meio de uma carta, solicitou ao reitor um período de licença para “compor certos negócios importantes da sua Casa” e que, para isso, “lhe era muito necessário transportar-se por algum tempo ao Brasil”. No mesmo pedido, com o intuito de influenciar a decisão que seria tomada sobre seu futuro, alegou que uma vez no além-mar, desejava servir ao Rei, fazendo “grandes jornadas por dilatadas Províncias daquele continente”, e se mostrar 286 VANDELLI, Domingos. Memórias sobre algumas produções naturais deste Reino, das quais se poderia tirar utilidade. In: Memórias Econômicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa, Tomo 1. Lisboa: Na Officina da Academia Real das Sciencias, 1789, p. 177. Disponível em https://books.google.com.br/books?id=d54EAAAAQAAJ&pg=PA177&lpg=PA177&dq=m%C3%A1rmo re+dendr%C3%ADtico+de+Tapeus&source=bl&ots=Z8XZF_Y7Ki&sig=UX5qQkUueg81SwkIEQLMd 7qEQhU&hl=pt-BR&sa=X&ei=5J6qVMnJKMKqNvKxgagP&ved=0CCIQ6AEwAA#v=snippet&q=joaq uim&f=false. Acesso em 12 de março de 2015. 287 Outro exemplo de ascensão social através dos estudos é aquele que se verifica em no mestiço Cipriano Pires Sardinha. Nascido no arraial do Tejuco, provavelmente no ano de 1749, filho da negra forra Francisca Pires e sem pai declarado quando do batismo, ainda que posteriormente arrolado como herdeiro do médico português Manoel Pires Sardinha, Cipriano estudou no seminário em Mariana, onde aprendeu o latim, e mais tarde, em Coimbra, frequentando os dois primeiros anos do curso de Cânones, tornando-se posteriormente integrante de uma missão diplomática ao Reino de Daomé. FURTADO, Júnia Ferreira. “O retorno como missão: o mulato Cipriano Pires Sardinha e a viagem ao Daomé”. Anais Eletrônicos do 14º Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia – 14º SNHCT. Belo Horizonte, Campus Pampulha da Universidade Federal de Minas Gerais, outubro de 2014; _____. “The eighteenth-century Luso-Brazilian journey to Dahomey: West Africa through a scientific lens”. Atlantic Studies: Global Currents, 11: 2, 256-276, 2014. 95 útil à Faculdade em que se achava incorporado, conservando com ela uma correspondência literária, sem interrupção alguma, por tempo de sua ausência, remetendo várias e escolhidas amostras dos produtos naturais até agora pouco conhecidos, de que abundam aqueles países; fazendo todas as averiguações possíveis, que, conforme as intenções da mesma congregação [da faculdade] pudessem contribuir para o progresso [e] adiantamento destes conhecimentos de que justamente se esperam grandes vantagens para as Artes, Comercio e felicidade dos vassalos de Sua Majestade. 288 O documento revela que, como estratégia para alcançar a licença pretendida, Veloso de Miranda buscou associar seu desejo de retorno à demanda da Coroa de conhecer, de forma mais aprofundada, a natureza de seus domínios. É provável ainda, como insinua o texto, que pretendesse ficar apenas um tempo no Brasil, mantendo à sua disposição o cargo docente na universidade, pois pede apenas uma licença e não seu afastamento definitivo. Mas tal retorno à Europa jamais ocorreu. Para mitigar sua ausência temporária, a correspondência seria a maneira eficaz de manter o contato com a república de letras portuguesa, mantendo ambos os lados atualizados das novas descobertas, como era corrente entre as da Europa e do além-mar. 289 Ele não menciona as razões que o levaram a abandonar a carreira intelectual ascendente que percorria no Reino, apenas alega motivos particulares, que não podem ser identificados por este ou outro documento. Este revela ainda que, uma vez no Brasil, pretendia, como fizera no reino, fazer viagens de pesquisa em Minas Gerais e em outras capitanias, intenção que praticamente não se realizou, uma vez que a esmagadora maioria delas se restringiu à regiões de Minas e fez apenas umas poucas observações no Rio de Janeiro, quando de sua chegada ao Brasil. Para sua felicidade, seu pedido foi aprovado já que, por sua vez, a Coroa viu no seu retorno uma oportunidade ímpar para que um letrado com alta capacidade intelectual, um dos primeiros naturalistas formados segundo as novas concepções vigentes, fosse enviado ao Brasil, particularmente a Minas Gerais, então a capitania mais rentável do império devido a seus recursos mineralógicos, para realizar estudos em História Natural. Assim, a 11 de setembro, o reitor informa à Faculdade de Filosofia seu parecer favorável, ressaltando que Veloso de Miranda “deveria pautar seus trabalhos no 288 Carta em que se concede licença ao Doutor Joaquim Veloso de Miranda para sair ao Brasil, e durante a qual ele se obriga a remeter para a Universidade com as clarezas necessárias varias, e escolhidas mostras de produtos naturais. Coimbra, 11 de setembro de 1779. Publicada em CRUZ, Ligia. Domingos Vandelli. Alguns aspectos da sua actividade em Coimbra. Coimbra, S/E, 1976, p. 66. Fragmento textual também presente em BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 110-111. 289 FURTADO. Oráculos da geografia iluminista... 96 Brasil pelas instruções que lhe seriam entregues, além de dar conta de tudo o que fizesse e obrigar-se a remeter amostras de tudo o que descobrisse”. Observa-se aqui que instruções específicas para sua viagem deveriam ser redigidas, provavelmente por Vandelli. O reitor ainda o advertiu as autoridades régias que esperava que, o naturalista “obtivesse irrestrito apoio e favorecimento dos ‘senhores governadores e capitães-generais, das câmaras, justiças e todas as mais pessoas, de qualquer ofício, emprego ou jurisdição’”.290 Seu passaporte foi expedido a 25 de outubro de 1779 e nele está escrito que, de comum acordo com as recomendações dadas pelo reitor, o ex-lente e naturalista deveria se colocar a serviço da Coroa ao “diligenciar o processo e adiantamento da Química e História Natural com as produções daqueles países”.291 O relacionamento que Veloso de Miranda estabeleceu, durante sua permanência em Portugal, com alguns de seus colegas também se mostraria de grande importância para seu futuro. Tal foi o caso das relações de amizade e de camaradagem que ele, um mazombo, filho de um português emigrado e de uma brasileira nativa, que se dedicavam à agricultura e à mineração, estabeleceu com o futuro Visconde de Barbacena, filho de uma das mais importantes casas da nobreza lusa, e com o também português, Bernardo José Maria Lorena e Silveira (1756-1818), que ingressara em Coimbra, no ano de 1772, vindo a concluir seus estudos em 1778 para, em seguida, dar início à sua carreira administrativa. Ambos, bacharéis em Filosofia como ele, seriam, ao longo das décadas seguintes, nomeados para servir ao Rei enquanto governadores da capitania de Minas Gerais, onde Veloso se estabelecera de forma definitiva. Não por acaso, serão eles os responsáveis por sua mais produtiva fase de indagações e de viagens filosóficas, ao lhe concederem total apoio para que se dedicasse às pesquisas botânicas e mineralógicas, exercendo grande influência em suas atividades e cooptando-o, inclusive, para participar da administração colonial. Para além das amizades que fez com alunos oriundos de influentes famílias do Reino, também há de se destacar o apoio que Veloso de Miranda recebeu, em Portugal, de seus familiares ali residentes, ainda que jamais tivesse visto pessoalmente muitos dos mesmos antes de sua chegada na Corte, como o seu tio-avô, o padre Bonifácio, que no ano de 1775 doou a Veloso de Miranda “bens livres e desembaraçados, então avaliados 290 CRUZ. Domingos Vandelli, alguns aspectos da sua actividade em Coimbra, p. 66, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 113-114. 291 AHU, Passaportes, Cód. 804, fl. 86v, apud LAPA, Manuel Rodrigues. As Cartas Chilenas: um problema histórico e filológico. Rio de Janeiro: Ministério da Cultura, Instituto Nacional do Livro, 1958, p. 160. 97 em quatrocentos mil réis”, e que certamente foram fundamentais para sua permanência no Reino. 292 Também após 1777, com o retorno à Coimbra de seu outro tio-avô, o frei Durão, Veloso de Miranda passou a contar com o seu apoio naquela cidade, justamente às vésperas de importante período de sua formação acadêmica, pouco antes de tornar-se licenciado e doutor. Durante os nove anos em que permaneceu na Universidade de Coimbra, Veloso de Miranda construiu considerável carreira acadêmica, percorrendo quase todos os patamares da instituição, desde o alunato ao professorado. Além de seu retorno à América portuguesa, o ano de 1779 marcaria também o seu ingresso na Real Academia de Ciências, instituição da qual seria membro correspondente por vários anos, assunto que trataremos no capítulo seguinte. 292 ANTT. Fundo Desembargo do Paço (Estremadura), Maço 1338, Doc. 4, apud BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 120. 98 CAPÍTULO 3 O MOVIMENTO ILUSTRADO LUSO-BRASILEIRO: INSTITUIÇÕES, POLÍTICAS, PERSONAGENS E PROCEDIMENTOS PARA O ESTUDO DA HISTÓRIA NATURAL Neste capítulo, nos afastamos momentaneamente, mas não completamente de Veloso de Miranda, no intuito de tratar de assuntos que são de suma importância no âmbito das futuras atividades a serem desempenhadas pelo naturalista quando do seu retorno à América portuguesa. Nesse ínterim, instituições como a Academia Real de Ciências de Lisboa e sua tipografia assumiriam crucial importância para o desenvolvimento das Ciências no Reino, sendo responsáveis por proporcionar aos ilustrados luso-brasileiros a ela associados consideráveis auxílios na forma de patrocínios para a realização das indagações filosóficas, ou ainda na publicação das memórias, resultados de suas pesquisas. Ainda que sejam vários os savants de origem luso-brasileira contemporâneos a Veloso de Miranda que, como ele, partilharam de trajetórias semelhantes após concluírem seus respectivos cursos na Universidade de Coimbra, ao se dedicarem a estudar aspectos diversos da História Natural de Portugal e de suas conquistas, nem todos se tornaram merecedores de maior repercussão na historiografia luso-brasileira e foram, durante muitos anos, mantidos ao largo das discussões historiográficas. Reviver ainda que brevemente suas trajetórias em conformidade com aquela cursada por Veloso de Miranda nos oferece pequeno vislumbre das vicissitudes que destoavam ou que eram comuns a tais personagens, como a proteção e o incentivo que vários deles gozavam junto a Dom Rodrigo de Souza Coutinho que, com sua política ilustrada, valorizou os saberes científicos e deles procurou tomar parte para potencializar a Economia do Reino. Contextualizar esse cenário é, pois, de fundamental importância para distinguir uma trajetória profissional que, salvo alguns caracteres, não era própria ao naturalista que é mote desta Tese, mas que era corrente e comum a todos que eram considerados aptos a servir ao Rei por suas letras e saberes. 99 3.1 – A Academia Real de Ciências de Lisboa A Academia Real de Ciências de Lisboa, fundada a 24 de dezembro de 1779 a partir das reflexões de Vandelli, de outros letrados da Universidade de Coimbra e de nobres habituados às Ciências, como D. João Carlos de Bragança e Ligne de Sousa Tavares Mascarenhas da Silva (1719–1806), o Duque de Lafões, seu primeiro Presidente; 293 José Francisco Correia da Serra (1750-1823), mais conhecido como Abade Correia da Serra, o primeiro Secretário, 294 e o futuro Visconde de Barbacena, colega de Veloso de Miranda, estava prevista para funcionar como uma sociedade intelectual e econômica dedicada ao cultivo das Ciências, da História e da Arte, bem como de suas implicações na Economia, 295 similar àquelas que existiam em outras Nações europeias, como a Société des Sciences, de l'Agriculture et des Arts de Metz, fundada em 1760, ou a Real Sociedad Bascongada de Amigos del País, da Espanha, de 1765. 296 Assim como as instituições congêneres em que se espelhava, a Academia Real de Ciências de Lisboa pretendia ser responsável pelo patrocínio de estudos pragmáticos, concursos de memórias e publicação de obras de caráter filosófico e econômico que se mostrassem capazes de proporcionar o desenvolvimento da agricultura, do comércio e das indústrias, com vistas a consolidar e expandir as reformas ilustradas que haviam sido iniciadas por Pombal nos campos da Ciência e da Economia. Segundo seus estatutos, a Academia Real deveria se ater ao estudo de assuntos circunscritos a três classes específicas: Ciências Naturais, Exatas e Morais, “encabeçadas respectivamente por Domingos Vandelli; Dom João de Almeida Portugal (1726–1802), o Marquês de 293 Ressalte-se que quando da criação da Academia, o Duque de Lafões, considerado seu fundador, foi o “facilitador político” e promotor da instituição junto da Coroa, providenciando o caução necessário ao sucesso do empreendimento. In: SILVA, José Alberto Teixeira Rebelo da. A Academia Real das Ciências de Lisboa (1779-1834): ciências e hibridismo numa periferia europeia. Lisboa, 2015, p. 41 e 94 (Tese de Doutorado em História, Universidade de Lisboa). 294 Sobre o Abade Correia da Serra, ver SIMÕES, Ana; DIOGO, Maria Paula, e CARNEIRO, Ana. Cidadão do Mundo. Uma Biografia Científica do Abade Correia da Serra. Porto: Porto Editora, 2006. 295 Até a sua criação, as atividades de reflexão científica, ou filosófica, eram desenvolvidas nas sessões do observatório de Astronomia, nos laboratórios da Universidade de Coimbra e círculo dos Ericeira. In: CRUZ, Ana Lúcia Rocha Barbalho da. Verdades por mim vistas e observadas oxalá foram fábulas contadas: cientistas brasileiros do setecentos, uma leitura auto-etnográfica. Curitiba, 2004 (Tese de Doutorado em História, Universidade Federal do Paraná). 296 Na Espanha e na França as sociedades se desenvolveram em cidades distintas. Destacavam-se, na Espanha, aquelas estabelecidas em Granada e Almería. In: ALÍAS, Inmaculada Arias de Saavedra. Las sociedades económicas de amigos del país: proyecto y realidad en la España de la ilustración. Obradoiro de Historia Moderna, nº 21, 2012, 219-245. Disponível em http://www.usc.es/revistas/index.php/ ohm/article/viewFile/689/678. Acesso em 22 de janeiro de 2015. 100 Alorna, e Dom Miguel Lúcio de Portugal e Castro, Cônego em Lisboa”.297 Ângela Domingues, ao analisar a demanda portuguesa em aumentar os conhecimentos sobre as conquistas do além-mar ao longo da segunda metade do século XVIII, afirmou que tal processo demandava conhecimentos científicos, algo que a Universidade de Coimbra poderia prover, mas também saberes técnicos e pragmáticos ou, em outras palavras, considerava-se que o “saber científico, tal como era entendido após a renovação cultural ocorrida no Portugal setecentista do triunfo do Iluminismo e da racionalidade, tinha caráter eminentemente prático”.298 Caberia então, à Academia Real, fazer o meio termo e a união entre a erudição da universidade e o pragmatismo da técnica. Suas primeiras atividades se deram a 16 de janeiro de 1780, com a eleição dos cargos a serem ocupados. Sua primeira sessão pública, no entanto, ocorreu apenas a quatro de julho. Neste dia, foi proferida uma oração e realizado um discurso inaugural pelo padre Teodoro de Almeida (1722-1804), escolhido “por seu prestígio junto a uma parcela da elite intelectual portuguesa do período pós-pombalino para o cargo de orador oficial”.299 Fato é que a criação de uma tertúlia destinada às observações filosóficas e pragmáticas, bem como à busca por soluções para os problemas econômicos do Reino já era mote presente nos Estatutos da Universidade de Coimbra reformada, onde encontra-se a proposta da criação de uma Congregação Geral, responsável por “trabalhar no progresso, adiantamento e perfeição das mesmas Ciências do modo que felizmente se tem praticado, e pratica nas Academias mais célebres da Europa”.300 Segundo José Silva, o Plano de Estatutos da Academia Real, 301 de 1780, documento anterior aos Estatutos consolidados, previa a existência de cinco tipos de sócios, denominados 297 SANTOS, Eugênio. Para a história da cultura em Portugal no século XVIII. Oração de abertura da Academia das Ciências de Lisboa do padre Teodoro de Almeida. Arquipélago. Série Ciências Humanas, nº. 2. Ponta Delgada, Açores, janeiro de 1980, p. 54. 298 DOMINGUES, Ângela. “Para um melhor conhecimento dos domínios coloniais: a constituição de redes de informação no Império português em finais do Setecentos”. História, Ciências, Saúde: Manguinhos, vol. VIII (suplemento), 2001, p. 287. 299 LEAL, Ferreira, Breno Ferraz. “Oração e memórias na Academia das Ciências de Lisboa: Introdução e coordenação editorial de José Alberto Silva”. Varia História, vol.31, nº 55, Belo Horizonte, Jan./Abril de 2015, p. 291-294. 300 UNIVERSIDADE DE COIMBRA. Estatutos da Universidade de Coimbra, 1772, vol. 3, p. 5. 301 ACADEMIA REAL DE CIÊNCIAS DE LISBOA. Plano de Estatutos com que convierão os primeiros sócios da Academia das Sciencias de Lisboa, com beneplácito de Sua Magestade. Lisboa: Na Regia Officina Typografica, 1780. 101 honorários, no máximo de 12, eleitos de entre as “Pessoas condecoradas com as maiores Dignidades e Empregos do Estado”; sócios estrangeiros, também no máximo de 12, escolhidos entre os “Estrangeiros insignes pelas suas letras e famosos pelas suas Obras”; sócios efetivos, oito por cada uma das três classes num total de 24, que teriam de ser residentes pelo menos uma boa parte do ano em Lisboa, excetuando 2 por cada classe, os quais poderiam ser escolhidos entre os “empregados pelo Reino no ensino público” ou “tirados do Corpo da Universidade, e que tinham a seu cargo o “governo económico da Sociedade”; sócios supranumerários, ou livres, “sujeitos hábeis” recebidos supranumerariamente pela Academia, cujo número não foi definido no Plano e que, tal como os efetivos, deveriam morar em Lisboa e apresentar todos os anos, pelo menos, uma memória ou “algum outro testemunho da sua aplicação”; e, por fim, os sócios correspondentes, em número máximo de cem, “tanto do Reino como fora dele, aos quais há de ser devedora de grande parte de seus progressos. 302 Foi nessa última qualidade de sócio que Veloso de Miranda, por essa época em Minas Gerais, seria admitido como membro. Segundo Varnhagen, Veloso de Miranda foi eleito sócio correspondente da Academia Real em 22 de maio de 1780. 303 O historiador, no entanto, desconhecia o fato do ex-lente ter retornado à América portuguesa no segundo semestre do ano anterior, afirmando ainda que sua viagem teria ocorrido apenas após a eleição. A informação de que Veloso de Miranda era membro correspondente da Academia Real haveria de ser confirmada por Vandelli em outro momento, quando faz referência, em uma memória, às descobertas realizadas pelo “nosso Correspondente, o Doutor Joaquim Veloso”.304 Ao lado de Veloso de Miranda, no mesmo dia seriam eleitos sócios correspondentes os também luso-brasileiros Manuel Inácio da Silva Alvarenga (1749-1814), mestiço e de 302 SILVA, José Alberto Teixeira Rebelo da. A Academia Real das Ciências de Lisboa (1779-1834): ciências e hibridismo numa periferia europeia. Lisboa, 2015, p. 47-48 (Tese de Doutorado em História, Universidade de Lisboa). Grifo nosso. 303 VARNHAGEN, Francisco Adolfo. Botanica. Os dois Vellosos. Gazeta Médica da Bahia, série II, vol. V. Bahia [Salvador]: Litho-typographia de João Gonçalves Tourinho, 1881, p. 74. Tal informação nos é confirmada por Péricles Lima. In: LIMA, Péricles Pedrosa. Homens de ciência a serviço da coroa: os intelectuais do Brasil na Academia Real de Ciências de Lisboa (1779-1822). Lisboa, 2009, Apêndice II (Dissertação de Mestrado em História dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa, Universidade de Lisboa). 304 VANDELLI, Domingos. Memórias sobre algumas producções naturaes deste Reino, das quaes se poderia tirar utilizadade. In: Memórias Econômicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa, Tomo 1. Lisboa: Na Officina da Academia Real das Sciencias, 1789, p. 177. 102 origem humilde, e Simão Pires Sardinha (1751-?), filho de Chica da Silva. 305 O acesso aos candidatos a membros procedentes da Universidade de Coimbra se dava mediante a apresentação, em sessão aberta, de uma tese ou memória. Ana Cruz afirma que “Veloso Miranda apressou-se em apresentar sua tese à Academia de Ciências de Lisboa, sendo admitido como sócio daquela confraria de cientistas e intelectuais”.306 Sua admissão é, de fato, incontestável. A apresentação que deveria ter realizado para ser admitido como membro, no entanto, é questionável, uma vez que Veloso de Miranda retornou à América portuguesa nove meses antes de sua inauguração, sendo provável que Veloso de Miranda tenha apresentado sua Tese por intermédio de um procurador ou ainda ingressado na instituição por intermédio de Vandelli. 3.2 – A tipografia da Academia Real de Ciências de Lisboa Importante estabelecimento que seria instituído no âmbito da Academia Real foi sua tipografia, efetivada no ano de 1782. Nos dois anos que antecederam sua criação, no entanto, a Academia Real se valeu de outra tipografia para a impressão de suas memórias e de demais obras. O “primeiro texto publicado pela Academia haveria de ser, também, seu primeiro programa posto a concurso”,307 seguido de “seus primeiros Estatutos e mais dois programas, estes com uma configuração que se manteria daí em diante, a saber, com os vários temas para o concurso distribuídos pelas três classes da Academia”, todos impressos pela Régia Oficina Tipográfica, em 1780.308 A partir deste novo empreendimento, várias obras advindas de estudos dos acadêmicos e dos concursos ali realizados seriam publicadas, assim como suas publicações seriadas, como o Almanach de Lisboa (1782-1823), 309 as Ephemerides 305 FURTADO. O retorno como missão...; LIMA, Péricles Pedrosa. Homens de ciência a serviço da coroa: os intelectuais do Brasil na Academia Real de Ciências de Lisboa (1779-1822). Lisboa, 2009, Apêndice II (Dissertação de Mestrado em História dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa, Universidade de Lisboa). Disponível em http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/514/4/20178_ulfl 064849_tm_apendice.pdf. Acesso em 22 de janeiro de 2015. As listas dos membros da Academia Real foram publicadas de forma esporádica, com a instituição buscando mantê-las atualizadas, estando presentes em várias publicações, como nas Ephemerides náuticas, ou Diario astronomico para o anno de 1792. Lisboa: Na Officina da mesma Academia, 1791, p. 133-150; ou nas Memórias da Academia Real das Sciencias de Lisboa. 306 CRUZ. Verdades por mim vistas e observadas oxalá foram fábulas sonhadas..., p. 158. 307 SILVA, José Alberto Teixeira Rebelo da. A Academia Real das Ciências de Lisboa (1779-1834): ciências e hibridismo numa periferia europeia. Lisboa, 2015, p. 149 (Tese de Doutorado em História, Universidade de Lisboa). 308 SILVA. A Academia Real das Ciências de Lisboa (1779-1834), p. 149 309 Incluía em suas páginas observações astronômicas, os dias de audiência e os assuntos que seriam discutidos na Academia Real bem como listas nominais de pessoas da melhor sociedade portuguesa. In: BIBLIOTECA Nacional de Portugal. Os sucessores de Zacuto: o almanaque na Biblioteca Nacional do século XV ao XXI. Lisboa: Biblioteca Nacional, 2002, p. 13. 103 Nauticas (1788-1824), 310 as Memórias de Agricultura (1788-1791), as Memórias Económicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa (1789-1815), as Memorias de Literatura Portugueza (1792-1812) e as Memórias da Academia Real das Sciencias de Lisboa (1797-1856), todos importantes instrumentos de comunicação para assuntos de caráter científico, tecnológico e econômico entre os autores, a Academia e a comunidade letrada portuguesa. Diferentemente das memórias propostas pelas extintas academias dos Esquecidos e dos Renascidos, que tinham por finalidade a construção de obras críticas para uma História Universal da América Portuguesa, 311 as memórias publicadas pela Academia Real deveriam se ater a assuntos científicos que se mostrassem relevantes para o desenvolvimento econômico de Portugal ou, nas palavras de Oswaldo Munteal Filho, para elaborarem “projetos de recuperação econômica da metrópole baseados nas riquezas naturais das colônias”.312 Nesse ínterim, as instruções para viajantes naturalistas se transformariam em um gênero literário bastante difundido entre os letrados em toda a Europa, na maioria das vezes publicadas por autores vinculados a universidades ou academias científicas, com a finalidade orientar os responsáveis pelas viagens quanto aos procedimentos a serem observados durante as indagações filosóficas, mais precisamente quando das atividades de coleta, descrição, catalogação e transporte das amostras de História Natural. De todas as publicações que mantiveram uma maior continuidade editorial, as Memórias Económicas se revelam como um dos mais importantes boletins da Academia Real, reunindo memórias de letrados portugueses e estrangeiros, entre estudos inéditos e traduções, e podem ser compreendidas como reflexos da mentalidade portuguesa de um momento em que a Coroa buscava não se ater apenas a sua vocação agrícola e comercial, e avançar no que concerne a uma política manufatureira. 313 Por meio dos estudos publicados nas Memórias Econômicas, também é possível 310 Tinha por título “Ephemerides Nauticas, ou Diário Astronómico para o anno de (...)”. Com publicidade anual, buscava promover um maior conhecimento da astronomia aplicada à náutica em Portugal e se tornou uma publicação diretamente relacionada ao Observatório Astronómico da Academia Real, instalado no Castelo de São Jorge em 3 de janeiro de 1787. In: FIGUEIREDO, Fernando. O observatório astronómico da Universidade de Coimbra (1772-1837). Actas do Colóquio Espaços e Actores da Ciência em Portugal (XVIII-XX). Lisboa: Universidade Nova de Lisboa, 2012. 311 KANTOR, Iris. Esquecidos e renascidos: historiografia acadêmica luso-brasileira (1724-1759). São Paulo: Hucitec, 2004. 312 MUNTEAL FILHO, Oswaldo. A Academia Real de Ciências de Lisboa e o Império Colonial Ultramarino In: FURTADO, Júnia Ferreira (Org.) Diálogos oceânicos: Minas Gerais e as novas abordagens do Império Ultramarino português. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2001, p. 501. 313 MORAIS, Fernando. Portugal e Brasil na crise do Antigo Regime (1777-1808). São Paulo: Hucitec, 1985, p. 129. 104 visualizar o quanto a Academia Real era heterogênea no que toca aos pensamentos de seus membros. Enquanto Dom Rodrigo de Souza Coutinho propunha a revitalização da atividade mineradora, buscando reafirmar a influência desta indústria no destino econômico das Nações, 314 Vandelli destinava suas reflexões ao mundo natural, e como a sociedade lusa poderia dele se beneficiar, propondo, por exemplo, um maior investimento financeiro e intelectual nas atividades agropecuárias, ao mesmo tempo em que criticava a “falta de gente ocupada” na agricultura, sugerindo ainda a criação de “pastos artificiais” para se animar a criação de ovelhas e o mercado da lã.315 Enquanto as Memórias Econômicas buscavam contribuir para o desenvolvimento de Portugal conjugando as Ciências e a Economia, as Memórias da Academia Real das Ciências, impressas a partir de 1797, foram destinadas a receber publicações relacionadas à História Natural, compreendendo esta os estudos químicos, botânicos, físicos, astronômicos e matemáticos, como a memória denominada Flore Lusitaniae et Brasiliensis specimen (...), 316 escrita por Vandelli um ano antes por meio das informações transmitidas desde Minas Gerais por Veloso de Miranda, em sua correspondência, amostras e anotações enviadas, e que seria premiada na sessão de 2 de agosto de 1789”,317 ou a Observações Fysicas por ocasião de seis raios, que em diferentes annos cahírão sobre o Real Edificio junto á Vila de Mafra, de dom Joaquim da Assunção Velho, responsável por instalar um conjunto de para-raios naquele edifício. 318 Posteriormente, a partir de 1799, a Academia Real viria a fracionar as Memórias da Academia Real das Sciencias de Lisboa, divindindo-a em três periódicos distintos; a Memorias de Literatura Portugueza, as Memórias Económicas e as Memórias de Mathematica e Phisica, 319 o que nos sugere a intenção da instituição em oficializar 314 COUTINHO, Dom Rodrigo de Souza. Sobre a verdadeira influencia das Minas dos Metaes preciosos na Industria das Nações que as possuem, e especialmente da Portugueza. Memórias econômicas (...), tomo II. Lisboa: Na Officina da Academia Real das Sciências, 1790, p. 237-243. 315 VANDELLI, Domingos. Memória sobre algumas produções naturais deste Reino, das quais se poderia tirar utilidade. Memórias econômicas (...), tomo I. Lisboa: Na Officina da Academia Real das Sciências, 1789, p. 177 e 184. Reflexões vandellianas mais acentuadas sobre o investimento que deveria ser dado à agricultura podem ser encontradas na obra de sua autoria: Sobre a preferência que em Portugal se deve dar à Agricultura sobre as Fábricas. Memórias econômicas (...), tomo II. Lisboa: Na Officina da Academia Real das Sciências, 1790, p. 244-253. 316 VANDELLI, Domenico. Flore Lusitaniae et Brasiliensis specimen (...). Coimbra: Typographia Academico-Regia, 1788. 317 VALADARES, Virgínia Maria Trindade. Elites mineiras setecentistas: conjugação de dois mundos. Belo Horizonte: Ed. PUC Minas; Lisboa: Ed. da Universidade de Lisboa, 2004, p. 387. 318 ARCL. Memórias de Mathematica e Phisica da Academia Real das Sciencias de Lisboa, tomo I. Lisboa: Na Typografia da Academia, 1797, p. 37-79 e 286-304, respectivamente. 319 ARCL. Memórias de Mathematica e Phisica da Academia Real das Sciencias de Lisboa. 105 publicações específicas para distintas áreas do conhecimento. 3.3 – As instruções para as viagens filosóficas e para o estudo da História Natural no além-mar Sendo as viagens filosóficas uma atividade que demandava vasto planejamento entre estudos cartográficos, rotas a serem percorridas e metas a serem alcançadas, fazia-se necessária ainda uma formação acadêmica abrangendo teorias e práticas, que deviam ser de domínio do naturalista viajante, mas também o reforço de uma pequena biblioteca quando em viagem, para que pudesse quando em visita a territórios desconhecidos e diante de espécies que jamais havia visto ou que, quando muito, apenas tomara conhecimento por meio de leituras, dirimir dúvidas e esclarecer imprecisões acerca seus temas de estudo, pretextos que justificam e explicam a multiplicação das instruções para naturalistas viajantes, ao longo da segunda metade do século XVIII, como gênero de literatura. A Instructio peregrinatoris, publicada em 1759 por Eric Nordblad, discípulo de Lineu, é considerada uma das primeiras obras dedicadas a regular as atividades que deveriam ser colocadas em prática pelo filósofo naturalista. 320 Mais do que normatizar o modus operandi do naturalista, sua obra pretendia homogeneizar o próprio naturalista, ao tecer comentários sobre as qualidades necessárias aos viajantes do ponto de vista físico e intelectual, 321 e serviu de inspiração a várias outras publicações do gênero nas décadas seguintes, como a Avis pour le transport par mer des arbres, des plantes vivaces, des semences, et de diverses autres curiosites d’histoire naturelle, escrita por Henri-Louis Duhamel du Monceau (1700-1782) e publicada em Paris, no ano de 320 Frederico Abdalla propõe que a Instructio peregrinatoris, de Eric Anders Nordblad, teria sido o mais paradigmático texto utilizado para o desenvolvimento de outras memórias sobre a coleta, a preservação e o transporte de exemplares de História Natural. In: ABDALLA, Frederico Tavares de Mello. O peregrino instruído: um estudo sobre o viajar e o viajante na literatura científica do iluminismo. Curitiba, 2012, p. 33-34, (Dissertação de Mestrado em História, Universidade Federal do Paraná). 321 BILBAO, Cristina. La ciencia del hombre en el siglo XVIII: Jauffret, Cuvier, Degérando y outros. Buenos Ayres: Centro Editor de América Latina, 1991. 106 1753, 322 e a Memoire instructif sur la maniere de rassembler, de preparer, de conserver, et d'envoyer les diverses curiosites d'histoire naturelle (...) (1758), de Etienne Francois Turgot (1721-1789). 323 Sua popularização, contudo, se dá na década de 1770, quando estas obras passam a ser publicadas em diferentes línguas, na intenção de serem acessíveis ao maior número possível de pessoas, podendo ser justificada também pela existência, a partir deste recorte histórico, de um maior número de letrados interessados em estudar a História Natural. Foi nessa década, após a criação do Real Gabinete de Historia Natural, em 1771, que as instruções para naturalistas viajantes como gênero começaram a ser publicadas na Espanha, com o apócrifo Instruccíon hecha de orden Del Rey N. S. para que lós Virreyes, Gobernadores, Corregidores, Alcaldes mayores e Intendentes de Provincias em todos lós Dominios de S. M. puedan hacer escoger, preparar y enviar a Madrid todas las producciones curiosas de Naturaleza (...), de 1776, 324 seguidas da Advertencias que deberán observar lós encaregados y conductores para cuidar, regar y transportar las plantas por mar (...), publicada entre os anos de 1776 e 1779 por 322 DUHAMEL DU MONCEAU, Henri-Louis. Avis pour le transport par mer des arbres, des plantes vivaces, des semences, et de diverses autres curiosites d'histoire naturelle. Paris: de L’Impremerie Royal, 1753. Disponível em https://books.google.com.br/books?id=mf4CAAAAYAAJ &printsec=frontcover&hl=pt-BR&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false. Acesso em 21 de abril de 2014. No início do século em questão, outras obras com teor comum já haviam sido publicadas, como as seguintes: JACOBS, P. de Simon. Des commencements, des progrès et du terme des voyages entrepris par les savans. S/L: S/E, 1705, ou ainda MERVEILLEUX, Charles Fréderic. Mémoires instructifs pour un voyageur dans les divers états de l'Europe. Amsterdã: H. du Sauzet, 1718. Disponível em http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k5530992c. Acesso em 21 de abril de 2014. Importante ressaltar, no entanto, que estas obras foram publicadas sem as influências de Lineu e do sistema de catalogação que criou. Outra obra da década de 1750 comumente associada às instruções para naturalistas viajantes é a Instructio Musei Rerum Naturalium (1753), escrita por David Hultman. Esta, no entanto, tinha como finalidade instruir os responsáveis pela organização dos gabinetes e museus de História Natural da Suécia, e não o transporte para aclimatação. HULTMAN, David. Instructio Musei RerumNaturalium. Upsala, 1753. Disponível em http://fmhibd.library.cmu.edu/HIBD-PDF/ LinnaeanDiss/Liden-051.pdf. Acesso em 21 de abril de 2014. 323 TURGOT, Etienne Francois. Memoire instructif sur la maniere de rassembler, de preparer, de conserver, et d'envoyer les diverses curiosites d'histoire naturelle; auquel on a joint un memoire intitule Avis pour le transport par mer, des arbres, des plantes vivaces, des semences, & de diverses autres curiosites d'histoire naturelle. Paris: J. M. Bruyset, 1758. Disponível em https://archive.org/details/mmoireinstruct00turg. Acesso em 21 de abril de 2014. 324 ESPANHA. Instruccíon hecha de orden Del Rey N. S. para que los Virreyes, Gobernadores, Corregidores, Alcaldes mayores e Intendentes de Provincias em todos lós Dominios de S. M. puedan hacer escoger, preparar y enviar a Madrid todas las producciones curiosas de Naturaleza que se encontraren em las Tierras y Pueblos de SUS districtos, a fin de que se coloquen em el Real Gabinete de Historia Natural que S. M. há estabelecido em esta Corte para beneficio e instruccíon pública. Disponível em: http://www.cervantesvirtual.com/obra/instruccion-hecha-de-orden-del-rei-ns-para- que-los-virreyes-gobernadores-corregidores-alcaldes-mayores-e-intendentes-de-provincias-en-todos-los-d ominios-de-sm-puedan-hacer-escoger-preparar-y-enviar-a-madrid-todas-las-producciones-curiosas-de-nat uraleza-que-se-encontraren-en-las-tierras-y-pueblos-de-sus-distritos-a-fin-de-que-se-coloquen-en-el-real- gabinete-de-historia-natural-que-sm-ha-establecido/. Acesso em 23 de abril de 2014. 107 Casimiro Gómez (1741-1818), 325 para ser utilizada na viagem filosófica de Hipólito Ruiz López e José Antonio Pavón y Jiménez ao Vice-Reinado do Perú, em 1777, e a Instrucción sobre el modo más seguro y económico de transportar plantas vivas, do mesmo autor, publicada em 1779. 326 Em relação a esta obra, o autor, correspondente de Vandelli, 327 demonstrava Ciência da importância do estudo da História Natural e, em particular, da Botânica, bem como o quanto tais Ciências poderiam ser benéficas aquele reino: A la vista de tan loables ejemplares antiguos y modernos, así de nuestra Nación, como de las extrangeras, seria mengua de los que hemos venido después, no imitarlos, y aun procurar aventajarlos en ocasión tan oportuna como la que ofrece la singular protección de nuestro Soberano hácia la Botánica, aspirando a asegurarnos en los diversos temples del benigno clima y terreno Español la posesión de todas las riquezas vegetables esparcidas por los vastos dominios del Rey, y demas países del mundo, especialmente las de la América Española, que se están reconociendo de orden y á expensas de su Ministro de las Indias el Excelentísimo Sr. D. Josef de Galvez. Al ilustrado zelo de S.E. se debe también la publicacion de esta Obrita dirigida al mas facil y seguro método de transportar por mar y tierra las plantas vivas, según se explica en los dos primeros Artículos: en el tercero se indican los vegetables, que entre los que se desean adquirir en España, merecen la preferencia por sus apreciables virtudes, ó por su uso en el Comercio, en la Agricultura, ó en las Artes y las Ciencias Físicas. 328 Ainda que os letrados lusos tivessem ciência da existência dessas publicações e fizessem uso delas, apenas em 1779 surgiria a primeira instrução em língua portuguesa, um opúsculo denominado Viagens Filosóficas ou Dissertação sobre as importantes regras que o Filósofo Naturalista nas suas peregrinações deve principalmente observar, de autoria de Vandelli, um “verdadeiro manual de campo do naturalista aprendiz” que, contudo, não chegou a ir a prelo, mas que deve ter sido utilizado com frequência nas atividades de campo organizadas pelo lente paduano. 329 325 ORTEGA, Casimiro Gómez. Advertencias que deberán observar los Encargados y Conductores para cuidar, regar y transportar las Plantas que lleguen á los Puertos de España. S/L: S/E, S/A. Disponível em http://bibdigital.rjb.csic.es/spa/Libro.php?Libro=3730. Acesso em 23 de abril de 2014. 326 _____. Instrucción sobre el modo más seguro y económico de transportar plantas vivas. Edição fac-símile. Madri: Fundación Ciencias de la Salud, 1992 [1779]. 327 RAMINELLI, Ronald. Viagens ultramarinas: monarcas, vassalos e governo a distância. São Paulo: Alameda, 2008, p. 128. Segundo Magnus Pereira e Ana Lúcia Cruz, Ortega era o equivalente espanhol do botânico paduano. In: PEREIRA, Magnus Roberto de Mello; CRUZ, Ana Lúcia Rocha Barbalho da. O viajante instruído: os manuais portugueses do Iluminismo sobre os métodos de recolher, preparar, remeter, e conservar produtos naturais. SANTOS, A. C. A.; DORÉ, A.. (Org.). Temas setecentistas: Governos e Populações no Império Português. Curitiba: UFPR/SCHLA, 2009, p. 246. 328 ORTEGA. Instrucción sobre el modo más seguro y económico de transportar plantas vivas, p. 10. 329 PEREIRA; CRUZ. O viajante instruído, p. 244. 108 Em 1781, também sob a influência de Vandelli, outra instrução seria escrita sem que igualmente fosse publicada. Trata-se do Méthodo de Recolher, Preparar, Remeter, e Conservar os Productos Naturais (...) que, segundo Russell-Wood, seria uma publicação de autoria conjunta dos “naturalistas do Real Museu e Jardim Botânico de Lisboa”.330 Faz-se importante mencionar o fato de que neste opúsculo há, no final, a assinatura do naturalista luso-brasileiro Alexandre Rodrigues Ferreira, demonstrando ser esta uma obra em que efetivamente houve a participação dos discípulos de Vandelli em sua confecção. No mesmo ano viria a prelo um importante impresso; as Breves instrucções aos correspondentes da Academia das Sciencias de Lisboa (...), 331 de considerável relevância histórica por se tratar de uma das primeiras publicações da recém-fundada Academia Real das Ciências de Lisboa. Em sua esteira, outra publicação do mesmo ano; o Compendio de observaçoens que se tórnão o plano da viagem política, e filosófica (...), de autoria de José António de Sá, membro da Academia Real. Ao contrário das Breves instrucções, o Compendio de observaçoens é uma obra robusta e complexa que se atém a assuntos que já eram notórios aos filósofos naturalistas, e que procurou descrever a importância dos relatos a serem feitos quando das viagens, sugerindo, também, a existência de diários de campo para aspectos filosóficos e políticos. Apontava ainda a importância dos instrumentos que o naturalista deveria conduzir em sua viagem filosófica, bem como da necessidade em se fazer uma “perfeita e exata descrição de suas observações” evitando, para tanto, a “superfluidade das palavras e as redundâncias”. Sá também não mediu palavras para falar da importância do risco dos objetos que a narração não era capaz de descrever com clareza, considerando tal instrumento uma das principais preciosidades que deveriam compor o Museu Nacional, quando fossem impossíveis a descrição ou sua remessa. 332 330 Ídem, p. 245. 331 BREVES instrucções aos correspondentes da Academia das Sciencias de Lisboa sobre as remessas dos produos e notícias pertencentes à história da natureza para reformar hum Museo Nacional. Lisboa: na Regia Officina Typographica, 1781. 332 SÁ, José António de. Compendio de observaçoens que se tórnão o plano da viagem política, e filosófica, que se deve fazer dentro da patria. Lisboa, Officina de Francisco Borges de Sousa, 1783, p. 209-210. 109 Imagem 1– Modelos de diários, com exemplo de preenchimento, proposto por José António de Sá em seu Compendio de observaçoens (...). In: SÁ, José António de. Compendio de observaçoens que se tórnão o plano da viagem política, e filosófica, que se deve fazer dentro da patria. Lisboa, Officina de Francisco Borges de Sousa, 1783, Prefácio. Imagem 2 – Modelos de diários, com exemplo de preenchimento, proposto por José António de Sá em seu Compendio de observaçoens (...). In: SÁ, José António de. Compendio de observaçoens que se tórnão o plano da viagem política, e filosófica, que se deve fazer dentro da patria. Lisboa, Officina de Francisco Borges de Sousa, 1783, Prefácio. 110 Apesar de destinadas aos filósofos naturalistas, estas publicações despertaram o interesse de outros letrados, de curiosos e não raro das elites políticas, na Corte e nas conquistas, muitas das quais habituadas aos métodos ali prescritos, por terem sido instruídas em Filosofia Natural quando de suas formações na Universidade de Coimbra. Além da formação em História Natural, obrigatória como vimos a todos os alunos coimbrões, tais assuntos despertavam o interesse dos administradores de alta patente de Portugal por serem, também, mote do maior interesse da Coroa, o que foi responsável, segundo Ângela Domingues, por estreitar as relações estabelecidas entre os filósofos naturalistas e seus superiores hierárquicos. Segundo a historiadora, no sentido de se obter maior eficácia e eficiência, os governadores eram, simultaneamente, comissários-gerais das partidas de demarcações de limites e, como consequência, aqueles a quem astrônomos e engenheiros-cartógrafos prestavam, no território, contas das suas observações; davam, igualmente, instruções aos viajantes-naturalistas sobre alguns percursos e prioridades a considerar e ordenavam às instituições competentes, como a Fazenda Real, os administradores das companhias monopolistas, as câmaras ou os diretores das povoações,que financiassem e auxiliassem com embarcações, remeiros, carregadores e alimentos os expedicionários; determinavam, de igual forma, o envio de remessas e a elaboração de textos e relatórios sobre as missões científicas. Logo, as recomendações para o bom andamento das viagens filosóficas poderiam ser transmitidas em múltiplas oportunidades. Primeiramente pelos lentes nas universidades, mas também pelas autoridades metropolitanas e por membros das instituições científicas, como a Academia Real, ou ainda nas conquistas, quando era normal que ao se apresentarem às autoridades locais, os filósofos naturalistas recebessem outras instruções, muitas das quais corroborando aquelas que já haviam sido transmitidas na Corte. De fato, muitos delegados do Estado português atuantes nas periferias da América se mostravam conhecedores de tais códigos e de sua importância para o sucesso das viagens filosóficas. Por exemplo, ao desembarcar em Belém, para dar início a sua viagem filosófica pela Amazônia e Centro-oeste, Alexandre Rodrigues Ferreira recebeu instruções do governador da capitania do Grão-Pará, João Pereira Caldas (1724 – 1794), que lhe daria “preciosas informações sobre agricultura e povoamento nativo”, 333 certamente utilizando de forma constante os mapas e os impressos que estavam previstos em seu 333 RAMINELLI. Ciência e colonização, p. 5-28. 111 “Rol dos instrumentos, drogas e mais utensílios pertencentes à História Natural, Física, e Química que são indispensáveis a um naturalista que viaja”, como as obras de Duhamel du Monceau, Piso e Marcgrave. 334 Diferentemente de Bernardo José de Lorena e de Antônio Pires da Silva Pontes Leme, governador da Capitania do Espírito Santo, que haviam frequentado a Universidade de Coimbra, João Pereira Caldas não o fez. De origem fidalga, ingressou na carreira das armas com treze anos de idade e aos dezesete, pouco antes de embarcar para o Pará, já havia recebido o hábito da Ordem de Cristo. Em 1753, em Belém, tornou-se auxiliar direto do então governador e capitão-general, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, vindo a participar nas ações de demarcação dos limites entre os territórios de Portugal e Espanha, no âmbito do Tratado de Madri, e tornando-se ele próprio governador entre 1772 e 1780. 335 Mais tarde, já na Capitania do Mato Grosso, Ferreira teria a oportunidade de consultar a Histoire naturelle, de Buffon, presente na “biblioteca de Joaquim José Cavalcanti de Albuquerque Lins, colega da Universidade de Coimbra e secretário do governo daquela capitania, bem como em consultar alguns relatórios redigidos pelos antigos governadores para se ater às minúcias do território, e principalmente dos assuntos relacionados à fronteiras entre a o território luso-brasileiro e as áreas de domínio espanhol. 336 Posteriormente, em 1798, Caetano Pinto de Miranda Montenegro (1748-1827), governador da capitania do Mato Grosso entre os anos de 1796 e 1803 e graduado em Leis pela Universidade de Coimbra, informou a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho das providências que tinha tomado para se fazer conhecer a árvore da quina na região. Para tanto, mandou riscar em papel alguns exemplares da espécie em questão e distribuí-la entre “as pessoas de melhor discernimento, e que moram pelos arraiais deste distrito, onde os espanhóis a costumam achar”. O governador reclamou ainda da falta de filósofos – Alexandre Rodrigues Ferreira havia deixado o Mato Grosso 6 anos antes – e da ignorância entre os mineiros da região, desconhecedores das técnicas mais modernas 334 SIMON. Scientific expeditions in the portuguese overseas territories, p. 133-137. 335 Sobre João Pereira Caldas, C.f.: SANTOS, Fabiano Vilaça dos. Os governadores do Estado do Grão-Pará e Maranhão: perfis sociais e trajetórias administrativas (1751-1780). In: DORÉ, Andréa; SANTOS, Antonio Cesar de Almeida. (Org.). Temas setecentistas: governos e populações no império português. Curitiba: UFPR-SCHLA/Fundação Araucária, v. 1, p. 153-167, 2008; _____. Da Paraíba ao Estado do Maranhão: trajetórias de governo na América portuguesa (séculos XVII e XVIII). Revista de História, nº 161, p. 59-83, 2º sem. 2009; _____. Uma vida dedicada ao Real Serviço: João Pereira Caldas, dos sertões do Rio Negro à nomeação para o Conselho Ultramarino (1753-1790). Varia História, v. 44, p. 499-521, 2010. 336 RAMINELLI. Ciência e colonização, p. 5-28. 112 de prospecção da terra, propondo ainda a criação de uma cadeira de História Natural para Vila Bela, em substituição à de Lógica, Metafísica e Ética, que estava para ser criada e regida por um professor eclesiástico vindo de São Paulo. 337 Em ocasião semelhante, o então ouvidor da comarca do Rio das Velhas, Francisco de Souza Guerra Araújo Godinho, informou ao governador da capitania de Minas Gerais, Bernardo José de Lorena, das remessas de produtos naturais que havia sido incumbido de enviar à Villa Rica. Em carta, dizia que estava aguardando o envio de algumas remessas que haviam sido prometidas pelo então capitão-mor da freguesia do Curral d’El Rey, Thomé da Rocha, que, por sua vez, disse que as coletaria em época própria do ano, mencionando ainda, na ocasião, a falta de resposta por parte de outros administradores menores, a quem havia incumbido missões semelhantes, como os capitães-mores das vilas de Taquaruçu, Sete Lagoas e Pitangui. 338 Muitas das cartas enviadas por Lorena às principais vilas e freguesias das Minas solicitavam a recolha e o envio de exemplares dos três Reinos, acompanhados de estudos ou de simples anotações sobre os mesmos. 339 Para os exemplares do Reino vegetal, em especial, o governador procurou deixar clara a necessidade em se incorporar às coletas uma pequena memória, constando os nomes dos exemplares recolhidos, seus usos tradicionais no âmbito da farmacopeia e, em especial, que fossem relacionados os conhecimentos com origem nas culturas indígenas. 340 Apesar de algumas missivas enviadas por Lorena ao reino não terem tido 337 AHU, MT, Cx. 34, Doc. 1791. Ofício do [governador e capitão general da capitania de Mato Grosso] Caetano Pinto de Miranda Montenegro ao [secretário de estado da Marinha e Ultramar] Rodrigo de Sousa Coutinho, informando que distribuiu desenhos da árvore da Quina para facilitar a sua descoberta; da falta de naturalistas; da necessidade de criação de uma cadeira de História Natural nas capitais do Brasil. Vila Bela, 14 de junho de 1798. 338 APM, SC, Cx. 41, Doc. 17. Informação de serviço de Francisco de Souza Guerra Araújo Godinho, ouvidor da Comarca, ao Governador sobre a impossibilidade de enviar as remessas de produtos naturais, plantas e frutos do Curral del-Rei. Sabará, 17 de dezembro de 1798. 339 A exemplo das amostras de enxofre e outros sais enviados desde a freguesia do Curral del-Rei e da chamada Lapa dos Morcegos, provavelmente um abrigo cavernícola hoje situado no Parque Estadual do Pico do Itambé, em Santo Antônio do Itambé, Minas Gerais. AHU, MG, Cx. 147, Doc. 10, Cód. 11332. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando os caixotes números 2 e 3 com amostras de salitre e suas respectivas notas e informando ter feito diligências para fazer análise ao ferro pantanoso. Vila Rica, 12 de janeiro de 1799. 340 A obra General Heads for a Natural History of a Countrey, Great or Small, Imparted Likewise, do filósofo naturalista irlandês Robert Boyle (1627-1691), previa a divisão dos aspectos naturais a serem observados em três classes; “supraterraneous”, “terrestrial” e “subterraneous”. Sobre a água, deveriam ser observados, por exemplo, o mar, sua profundidade, a salinidade e as correntes. Já sobre a terra, apontamentos sobre as direções dos ventos, as produções naturais, os habitantes, as montanhas, os vales, a declinação magnética em vários lugares, as frutas, os vegetais, as ervas, as flores, seus habitantes e suas artes eram considerados fundamentais. BOYLE, Robert. General Heads for a Natural History of a Countrey, Great or Small, Imparted Likewise by Mr. Boyle. Philosophical Transactions, vol. 1, 1665-1666, pp. 186-189, published 1 January 1665. Disponível em http://rstl.royalsocietypublishing.org/ content/1/1-22/186.full.pdf+html. Acesso em 17 de novembro de 2016. 113 resposta, sabe-se que grande parte de seus ofícios foram destinados a pessoas na capitania que se dedicaram a cumprir suas solicitações, o que pode ser justificado perante o desejo de se mostrar útil à Coroa ou mesmo de se tornarem recipiendários de futuras mercês, como forma de agradecimento. Também Veloso de Miranda, ao ocupar a função de secretário de governo em Minas Gerais, entre 1799 e 1806, auxiliou Lorena na expedição de cartas e de recomendações, solicitando o auxílio das autoridades menores de vilas, arraiais e freguesias para o adiantamento dos estudos em História Natural na capitania. Em carta datada de 5 de fevereiro de 1801, Veloso de Miranda tecia instruções ao capitão-mor do termo de Mariana, Antônio Álvares Pereira, sobre a lista de plantas que deveriam ser enviadas ao jardim botânico recentemente construído em Vila Rica. Dentre as espécies solicitadas, Veloso de Miranda indicava bromélias de Passagem de Mariana, amendoins de Mariana, tamarindos de Piranga e outras tantas plantas ornamentais e frutíferas, como palmitos, ameixas, pitangas e araticuns, recomendando que as remessas fossem realizadas por meio de “condutores de mantimentos, ou de quaisquer gêneros, que hajam de vir para esta vila, mas com tal moderação que se lhe não embarace o seu negocio”, e que fossem enviadas em pequenas remessas, e observadas as recomendações, “afim do que cheguem vivas e bem acondicionas”.341 Em outro ofício, João Rodrigues de Sá e Melo Meneses e Souto Maior (1756-1814), o Visconde de Anadia, sucessor de Dom Rodrigo de Sousa Coutinho na secretaria de Estado da Marinha e Ultramar, tecia recomendações a Lorena, sobre “as plantas mais raras” existentes nas Minas, que deveriam ser enviadas à Corte. Em anexo, uma pequena instrução, ainda hoje inédita, provavelmente escrita pelo nobre português, sobre o método e os cuidados com “a escolha, preparação, e remessa das sementes, e cebolas das plantas, que se mandarem vir de África, e do Brasil”. O Visconde recomendava que os frutos fossem “bem nutridos, e maduros; com o sabor, cheiro e cor naturais”; colhidos em “tempo seco”, que não estivessem mordidos “por ratos ou formigas”, nem furadas de vespas ou outros insetos. Quanto à preparação, refutava a “preparação dos antigos”, que previa que as folhas e as sementes fossem secas à sombra, indicando o procedimento ao sol, de forma de conservassem “suas cores 341 APM, SC 279, Ofícios S/N°, ano 1801, p. 30-30v. Carta de Joaquim Veloso de Miranda ao capitão-mor do Termo de Mariana, Antônio Álvares Pereira, sobre o envio de plantas para o Jardim Botânico de Vila Rica. Vila Rica, 5 de Fevereiro de 1801. 114 vivas, e brilhantes; e cheiro, e outras propriedades essenciais”.342 Quanto ao transporte, recomendava que as sementes fossem embrulhadas de acordo com o tamanho, em “papel forte de folha dobrada e encerada”, amarrados “em maços” e colocados em caixas de folhas de flandres ou em bocetas de couro. Para o transporte de sementes pequenas, era usual armazená-las em garrafas ou vasos de vidros bem tampados e lacrados. Já as sementes maiores eram transportadas em caixas, acomodadas em areia bem seca e fina, método que também era utilizado para as cebolas (bulbos). Caso as sementes estivessem “gretadas”, ou seja, em processo de germinação, recomendava sua disposição em caixões de terra, tratando-as “como plantas vivas até chegarem ao lugar do seu destino”.343 Com a maior divulgação dos conhecimentos e dos procedimentos necessários para se estudar a História Natural, ao longo das últimas décadas do século XVIII, por meio das aulas na Universidade de Coimbra, das instruções impressas ou ainda por parte das recomendações das autoridades, em cartas e ofícios, constata-se que tais assuntos passaram a ser habituais ou se tornaram correntes, e não apenas entre os filósofos naturalistas. A aquisição de tais conhecimentos e o seu aperfeiçoamento por meio da leitura e de seu exercício eram, ainda, fundamentais para a principal etapa do processo de estudo filosófico; a prática em campo, entendida como processo fundamental do fazer ciência, onde a teoria deveria ser aplicada, desde a coleta dos exemplares, aos procedimentos para o transporte, passando pela catalogação, por sua acomodação e pelo feitio dos diários de viagem. Dada sua importância, não raro os filósofos conduziam consigo exemplares destas obras, no intuito de exercer suas atividades em consonâncias às publicações e para rememorar qualquer mote porventura esquecido. 342 APM, SC 300, Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-64, Gav. G-4. 1802-1803, p. 104-107v. Ofício de João Rodrigues de Sá e Melo Meneses e Souto Maior, Visconde de Anadia, ao governador da Capitania de Minas Gerais, Bernardo José de Lorena, sobre o envio de plantas, sementes e cebolas para Lisboa. Acompanha pequena instrução/memória. Palácio de Queluz, carta de 11 de Outubro de 1802 e memória de 18 de Outubro de 1802. 343 APM, SC 300, Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-64, Gav. G-4. 1802-1803, p. 104-107v. Ofício de João Rodrigues de Sá e Melo Meneses e Souto Maior, Visconde de Anadia, ao governador da Capitania de Minas Gerais, Bernardo José de Lorena, sobre o envio de plantas, sementes e cebolas para Lisboa. Acompanha pequena instrução/memória. Palácio de Queluz, carta de 11 de Outubro de 1802 e memória de 18 de Outubro de 1802. 115 3.4 – Conhecer para dominar: os filósofos luso-brasileiros e as viagens filosóficas 3.4.1 – Alexandre Rodrigues Ferreira Após Veloso de Miranda se deslocar para Minas Gerais, em outubro de 1779, dando início no ano seguinte às indagações filosóficas, conforme recomendações que havia recebido, em 1783 outro letrado luso-brasileiro, Alexandre Rodrigues Ferreira (1756–1815), partiria para o além-mar em uma missão semelhante. Também graduado e doutor em Filosofia pela Universidade de Coimbra, Ferreira embarcou em Lisboa, em 1º de setembro de 1783, na charrua Águia e Coração de Jesus, desembarcando em Belém em 21 de outubro do mês seguinte. Na mesma embarcação estavam presentes o futuro governador da capitania do Grão-Pará, Martinho de Souza e Albuquerque, e o futuro bispo da Arquidiocese de Belém, Dom Frei Caetano Brandão. 344 Em sua bagagem, Ferreira conduzia vasta e indispensável equipagem como resmas de papel para escrever, petipés (escalas), facas, cozinha de campanha, vidros com substâncias diversas (anil, azougue, salitre, pedra hume...), espátulas, armamentos variados e bússolas, dentre outros, assim como uma pequena biblioteca composta por obras que versavam “sobre plantas e animais escritas por Jean Baptiste Aublet, Margrave e Piso, Carl Lineu, Valerio, Antoine Baumé e Giovanni Antonio Scopoli”,345 obras tidas como referências em botânica e em zoologia à época, mas que se revelariam extraordinariamente inadequadas em tais ambiente, em tudo distintos do europeu. 346 Diferentemente de Veloso de Miranda, Ferreira se fazia acompanhar por numeroso grupo de auxiliares, como o jardineiro Agostinho Joaquim do Cabo (?–1789), e os riscadores Joaquim José Codina (?–1791) e José Joaquim Freire (1760–1847), incorporando à tropa, em Belém, numeroso efetivo composto por militares portugueses e da terra, bem como por carregadores, remadores e mateiros, muitos dos quais indígenas. Ferreira empreenderia a maior viagem filosófica jamais realizada por Portugal em suas conquistas, em um território que há muito despertava o interesse de várias Nações europeias, tendo sido colonizado por portugueses, espanhóis, franceses, ingleses e holandeses, que disputavam territórios cujas fronteiras avançavam e retraíam no prazo 344 PATACA, Ermelinda Moutinho. A confecção de desenhos de peixes oceânicos das Viagens Philosophicas (1783) ao Pará e à Angola. História, Ciências, Saúde: Manguinhos, vol. 10, nº 3, set.-dez., 2003, p. 980; 345 SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 141-144. 346 RAMINELLI. Ciência e colonização, p. 160. 116 de poucos anos ou meses. A busca pela afirmação da presença na região por uma ou outra Nação pode ser melhor compreendida não apenas por meio de sua história militar, das disputas navais, das fortificações erigidas e dos tratados e limites estabelecidos puramente por meio da cartografia, quase sempre não in locus, mas também a partir dos inúmeros relatos que legados pelos letrados que representando suas pátrias, teceram comentários sobre sua geografia, o clima, a diversidade e as qualidades das produções amazônicas. Ainda que Portugal desse início a uma maior efetivação sobre o território apenas no século XVII, com a criação do Estado do Maranhão e Grão Pará (1621) e a ereção de vilas e aldeamentos, somente do século posterior a Corte viria a incentiva maiores investimentos naqueles domínios, estimulando sobretudo as atividades de comercio e agricultura, sobretudo das drogas do sertão. 347 Nesse ínterim, torna-se inseparável do processo de colonização da Amazônia a presença dos religiosos da Companhia de Jesus na região, dentre os quais, o padre João Daniel (1722-1776). 348 João Daniel ingressou na Companhia de Jesus em 1739, em Portugal, e deu continuidade à sua formação eclesiástica no colégio jesuítico de São Luís, atuando como missionário na catequização dos gentios amazônicos, entre os anos de 1741 e 1757. Preso por ordem de Pombal, quando da expulsão dos inacianos dos domínios lusos, foi enviado à Corte e mantido preso no Forte Almeida e na Torre Julião, em Oeiras, onde escreveu suas memórias, por nome Tesouro Descoberto no Máximo Amazonas, 349 relato do que observou naquelas terras. Ainda que seus escritos sejam minuciosos, é conveniente lembrar que foram tecidos por um homem da Igreja, em um contexto em que o mesmo estava mais preocupado com suas atividades profissionais do que com o estudo da flora e da fauna local, sendo estas meramente revividas em suas lembranças. Maria de Fátima Costa afirma serem os estudos realizados por Ferreira na Amazônia, a partir de 1783, como os primeiros a trazer “grande avanço para ampliação do conhecimento sobre a geografia” da região, por agregar “inúmeras informações acerca dos reinos animal, vegetal e mineral”, e por contribuir “para desfazer mitos 347 MARCOS, Rui de Figueiredo. As Companhias pombalinas: contributo para a história das Sociedades por acções em Portugal. Coimbra: Almedina, 1997. 348 BOXER, Charles Ralph. A igreja e a expansão ibérica (1440-1770). Lisboa: Ed. 70, 1978. 349 DANIEL, (Padre) João. Tesouro Descoberto no Máximo Amazonas, vol. 2. Rio de Janeiro: Contraponto, 2004. 117 fantasiados por alguns cronistas anteriores”. 350 Entretanto, como ressaltou a historiadora, tais empreitadas não foram suficientes “para desvendar as terras interiores” que, a exceção da grande calha do Rio Solimões e Amazonas, não eram suficientemente conhecidos. 351 Os percursos traçados pelo naturalista compreenderam primeiramente a ilha do Marajó e, posteriormente, o interior do continente, 352 percorrendo a capitania de São José do Rio Negro (1784), o Alto Rio Solimões (1785) e os rios Madeira e Guaporé (1788), chegando, por fim, à capitania do Mato Grosso, onde permaneceria por alguns meses antes de retornar a Belém, de onde empreenderia novamente a viagem transatlântica para Lisboa, tudo isso em nove anos. Sua empreitada rendeu cerca de 200 volumes que foram enviados em 13 remessas, entre caixas, pacotes, tonéis e pipas contendo exemplares dos três Reinos da natureza, 353 realizadas à custa do capitão Luiz Pereira da Cunha. 354 Rendeu, também, dezenas de memórias e correspondências, nas quais o filósofo teceu comentários sobre a História Natural e sobre o cotidiano daquele território, bem como numerosa quantidade de pranchas e aquarelas, confeccionadas em tinta sobre papel e que mostravam o quanto 350 Valemos, por exemplo, da obra do padre João Daniel. Tesouro Descoberto no Máximo Rio Amazonas. Rio de Janeiro: Contraponto, 2004; ou ainda de Cristóbal de Acuña. Novo descobrimento do grande rio das Amazonas. Rio de Janeiro: Agir, 1994. 351 COSTA, Maria de Fátima. “Alexandre Rodrigues Ferreira e a capitania de Mato Grosso: imagens do interior”. História, Ciência, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, vol. VIII (suplemento), p. 993-1014, 2001. 352 PATACA, Ermelinda Moutinho. A Ilha do Marajó na Viagem Philosophica (1783-1792) de Alexandre Rodrigues Ferreira. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Série Ciências Humanas, Belém, vol. 1, nº. 1, p. 149-169, jan-abr. 2005. 353 PRESTES, Maria Elice Brzezinski. A investigação da natureza no Brasil colônia. São Paulo: Annablume; Fapesp, 2000, p. 89. Cristina Bruzzo afirma terem sido “dezenove remessas de caixotes, frascos, barris e caixas de Flandres”, para além de “um conjunto notável de aquarelas, feitas pelos desenhistas da expedição, Joaquim José Codina, e José Joaquim Freire, e algumas oferecidas por [Antônio José] Landi”. Rômulo Carvalho, por sua vez, fala que Alexandre enviou a Lisboa “142 volumes de material recolhido e quase seis centenas de desenhos”. In: BRUZZO, Cristina. A participação dos museus de História Natural na formação dos membros das expedições filosóficas portuguesas no século XVIII. Anais do XXII Simpósio Nacional de História. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 2003, p. 5; CARVALHO, Rômulo. A História Natural em Portugal no século XVIII. Lisboa: Instituto de Cultural e Língua Portuguesa, 1987, p. 102. 354 Ao ouvir do capitão Luiz Pereira da Cunha que com as fazendas que dispendeu para tais envios, poderia casar uma filha, Alexandre Rodrigues Ferreira teria dito a seguinte frase: “Isso não servirá de embaraço a seu casamento; eu serie quem receba essa sua filha por mulher”. Assim, a 16 de setembro de 1792, antes de retornar à Lisboa, Alexandre se casaria com Germana Pereira da Cunha e Queiroz com quem teve três filhos; Germano (1795), Maria das Mercês (1801) e Guiomar Joaquina (1807), esta afilhada de Vandelli. In: CARVALHO, José Cândido de Melo. Viagem filosófica pelas capitanias do Grão Pará, Rio Negro, Mato Grosso e Cuiabá (1783-1793): Uma síntese no seu bicentenário. S/L: CNPq; Museu Paraense Emílio Gueldi, S/D, p. 14-15. 118 era rica, diversificada e exótica a flora e a fauna daquela região. 355 Suas memórias também abordam temas tão diversos quanto a administração colonial, problemas da medicina local e aspectos da geologia amazônica que tanto o encantaram o naturalista, 356 assuntos que correspondiam às demandas da sociedade letrada europeia, ávida por conhecimentos científicos e excentricidades da natureza vindas de territórios distantes. Ferreira também rendeu observações sobre os gentios e o tratamento que o governo português dispensava aos coloniais, e não por poucas vezes teceu críticas e ofereceu sugestões sobre as reduções e os aldeamentos realizados a mando da Coroa, para que gentios fossem habituados ao sedentarismo e ao trabalho para o Estado português. 357 Também memórias sobre a geopolítica local foram feitas pelo naturalista, sendo o Tratado Histórico do Rio Branco uma das principais, fundamentada em correspondências e em obras que Alexandre teve acesso antes ou durante sua viagem filosófica, e que se revela uma perspicaz e contundente análise da presença portuguesa na região homônima, dos avanços espanhóis, da construção de fortalezas às margens dos rios e das alianças que os portugueses faziam com os gentios para que o território fosse mantido sob a bandeira lusa. 358 De volta a Lisboa, Ferreira colheria os frutos de sua grande viagem filosófica, tendo sido agraciado com o “Hábito de Cristo, com sessenta mil réis de tença”,359 a indicação para exercer diversos cargos administrativos e políticos, como a administração das Reais Quintas da Bemposta, Caxias e Queluz; 360 do Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda, onde deveria se responsabilizar por inventariar e catalogar o acervo que produziu na Amazônia, atividade que não era realizada desde o falecimento do jardineiro-real, Júlio Matiazzi, e os cargo de deputado da Real Junta do Comércio e 355 Ou, nas palavras de Ronald Raminelli, “caberia também a Alexandre Ferreira verificar as condições materiais das vilas e fortalezas destinadas a suportar as possíveis invasões estrangeiras. Obstinado agente da administração lusa, Ferreira chegou ao requinte de arrolar as roupas dos padres, os paramentos para missa, o estado das igrejas e as condições dos cemitérios locais (...) [e] nada escapava, portanto, a esse fiel agente colonial”. RAMINELLI. Ciência e colonização, p. 157-82. 356 Como as memórias Viagem à Gruta das Onças e Viagem à Gruta do Inferno, ambas publicadas na RIHGB, Vol. 12, 1874, p. 87-95, e Vol. 4, 1863, p. 363-367, respectivamente. 357 FERREIRA, Alexandre Rodrigues. Enfermidades endêmicas da Capitania do Mato Grosso. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2008, 176 p.; _____. Notícias da voluntária redução de paz e amizade da feroz nação do gentio mura nos anos de 1784, 1785 e 1786. RIHGB, Vol. 36, t. 1, p. 323-392. 358 FBN, Manuscritos, Códice 21, 2, 001. FERREIRA, Alexandre Rodrigues. Tratado Histórico do Rio Branco, 1786. 359 Carta informando da mercê do Hábito de Cristo de que é merecedor Alexandre Rodrigues Ferreira, assinada por José de Seabra da Silva. Palácio de Queluz, 8 de julho de 1784. GOELDI, Emilio. Ensaio sobre Dr. Alexandre R. Ferreira, mormente em relação as suas viagens na Amazônia e sua importância como naturalista. Pará: Editores Alfredo Silva, 1895, p. 16-17. 360 RAMINELLI. Ciência e colonização, p. 157-182. 119 de Oficial da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra do Reino de Portugal, onde passaria a atuar diretamente sob a tutela do então secretário, Luís Pinto de Sousa Coutinho (1735-1804). Prevendo que os estudos que Ferreira deveria realizar fossem prejudicados pelas novas atribuições administrativas, Vandelli “propôs que Ferreira fosse liberado dos cargos burocráticos para se dedicar aos estudos para os quais estava habilitado”, o que não aconteceu. 361 Como consequência, passados alguns anos, a maior parte das produções enviadas para Lisboa ainda se encontrava guardadas em seus caixões e pacotes, como se tivessem sido desembarcadas há pouco. “Muitos animais, e principalmente insetos se perderam por não estarem expostos a vista, (...) entre os quais muitos minerais das colônias e reino, que ainda se devem encaixar” nas correspondentes nomenclaturas. 362 Ângela Domingues propõe que a acumulação do vasto acervo oriundo das viagens filosóficas e a não utilização dos mesmos em fins científicos ou econômicos se deve a certa “inabilidade estatal em coordenar e aplicar os novos conhecimentos”, haja vista que aparentemente o Estado e as instituições científicas portuguesas não se esforçaram para levar ao público as produções naturais ou os resultados críticos que delas foram escritos, quando o foram. 363 E apesar de ter escrito várias memórias, Ferreira não chegou a ver seus estudos no prelo, ainda que muitos deles tenham servido de subsídios para as publicações de Vandelli. Em 1808, o naturalista deixou de embarcar com a Corte para a América por ver a oportunidade de ter seu esforço reconhecido em França, por meio da publicação de suas memórias, o que não aconteceu. 364 Pelo contrário, grande parte do material enviado pelo naturalista baiano para Lisboa foi confiscado pelos franceses, quando da invasão a 361 BRIGOLA, João Carlos. Coleção, gabinetes e museus em Portugal no século XVIII. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian; Ministério da Ciência e do Ensino Superior, 2003; DOMINGUES, Ângela. Para um melhor conhecimento dos domínios coloniais: a constituição de redes de informação no Império português em finais do Setecentos. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, vol. VIII (suplemento), 823-38, 2001; e RAMINELLI, Ronald. Viagens ultramarinas: monarcas, vassalos e governo a distância. São Paulo: Alameda, 2008, dentre outros. 362 ANTT, Ministério do Reino, Maço 44. Domenico Vandelli. Relação da origem, e estado presente do real Jardim Botânico, Laboratório Químico, Museu de História Natural, e Casa do Risco, 1795. Documento publicado na íntegra em VANDELLI, Domingos. Memórias de História Natural. Coordenação de José Luís Cardoso. Porto: Porto Editora, 2003, p. 51-58, apud RAMINELLI. Viagens ultramarinas, p. 128-129. 363 DOMINGUES, Ângela. Para um melhor conhecimento dos domínios coloniais: a constituição de redes de informação no Império português em finais do Setecentos. História, Ciências, Saúde: Manguinhos, vol. VIII (suplemento), 2001, p. 833. 364 AMARO, Adriana Ferreira da Silva. Os índios Muras na iconografia de Alexandre Rodrigues Ferreira: o cientista, os índios e artefatos. Rio de Janeiro: UniRio, 2002, p. 24. 120 Portugal, fragmentando ainda mais o já desorganizado acervo que havia coletado. Outra parte do material, no entanto, foi mantido em reservado pelo naturalista, provavelmente em sua residência, tendo sido entregue a Félix de Avelar Brotero, em 1815, por sua esposa, Dona Germana, já viúva. Trata-se de um catálogo contendo dezoito folhas, onde foram relacionados “231 manuscritos, 8 mapas geográficos, 15 desenhos, 997 estampas e 97 gravuras”.365 A viagem filosófica de Alexandre Rodrigues Ferreira alcançaria reconhecimento particular na Corte não apenas pelas produções naturais que recolheu, ou em função das correspondências e memórias que escreveu, mas principalmente pelas observações que fez sobre a necessidade do Estado português se fazer presente em um território tão vasto e que era, salvo as vilas, arraiais e freguesias, significativamente desprovido de ocupação e à mercê de qualquer sorte. O ineditismo do naturalista em percorrer um território tão vasto seria responsável por valer ao mesmo o reconhecimento como um dos principais homens de ciências de Portugal setecentista. Obviamente, a duração de sua viagem, realizada de forma intermitente, a grande quantidade e diversidade de produções da História Natural por ele recolhidas e, principalmente, o grande número de memórias e outros registros que legou contribuíram para que fosse percebido como tal. 3.4.2 – João da Silva Feijó Os outros naturalistas designados por Vandelli para as viagens filosóficas nas conquistas em África também procuraram cumprir suas atribuições filosóficas com esmero, ainda que não tenham alcançado resultados semelhantes àqueles de Ferreira, o que pode ser justificado pelo conjunto de atividades administrativas que desempenhavam de forma concomitante. Natural do Rio de Janeiro, João da Silva Feijó (1760-1824) foi incumbido, em 365 SOARES, José Paulo Monteiro (Org.). Viagem ao Brasil de Alexandre Rodrigues Ferreira. Coleção Etnográfica, vol. 1. Rio de Janeiro: Kapa Editorial, 2005. 121 1783, de realizar uma viagem filosófica ao arquipélago de Cabo Verde, 366 tendo se submetido às atividades de instrução e preparo para as viagens filosóficas, realizando pesquisas na companhia de Ferreira nas “minas de carvão de Buarcos”, 367 e nas proximidades do cabo Mondego, numa expedição que durou cinco dias e resultou em um “diário como algumas ilustrações da mina”.368 Assim como o colega Ferreira, Feijó viajou com o único pretexto de exercer a função de naturalista, conquanto se encontrasse sem auxiliares, ao contrário de seus pares que “conduziam equipes compostas por jardineiros e desenhistas”.369 Uma vez em Cabo Verde, no entanto, Feijó se submeteu a vários infortúnios. Durante os primeiros meses de permanência nas ilhas, reclamou que não possuía “qualquer poder como naturalista, nem acesso à administração, com a qual, aliás, entra em litígio, por as suas remessas não serem embarcadas”, além de permanecer meses sem receber “qualquer ordenado”. Em meio a todo esse cenário desconcertante, Feijó podia contar apenas com a ajuda de Júlio Mattiazzi, seu amigo, que chegou inclusive a socorrer financeiramente a sua “esposa e um filho de tenra idade”, deixados em Portugal. 370 Lorelai Kury atribui os desentendimentos entre Feijó e a administração local ao fato do naturalista ter desembarcado naquela conquista apenas “na condição de homem 366 Passados pouco mais de dois séculos, ainda hoje figuram suspeitas de que Feijó não pertenceu efetivamente ao quadro de alunos da Universidade de Coimbra, uma vez que seu nome encontra-se ausente da relações de alunos oriundos do Brasil formados naquela Universidade, e que teria cursado apenas a Academia Militar de Lisboa. Antônio Oliveira, no entanto, busca corroborar a pertença de Feijó à universidade alegando que teria sido naquele estabelecimento de ensino que o futuro naturalista teria conhecido e estabelecido vínculos de amizade com Bernardo Manoel de Vasconcelos, futuro governador da Capitania do Ceará entre 1799 a 1802, e provável responsável por convencer Lisboa a realizar uma viagem filosófica ao Ceará, atribuída a Feijó. MORAIS, Francisco de. Estudantes brasileiros na Universidade de Coimbra. Anais da Biblioteca Nacional, 62, 1940, p. 137-335; NOBRE, Geraldo Silva. João da Silva Feijó: um naturalista no Ceará do Ceará. Fortaleza: Instituto Histórico do Ceará/GRECEL, 1978; OLIVEIRA, Antonio José Alves de. Viagens filosóficas e representações do mundo natural nos escritos de João da Silva Feijó – Capitania do Ceará (1799 – 1816). Anais do XXVII Simpósio Nacional de História. Natal, julho de 2013; SILVA, Clarete Paranhos. As Viagens Filosóficas de João da Silva Feijó (1760-1824) no Ceará. História: Questões & Debates, n. 47, Curitiba: Editora UFPR, 2007, p. 179-201. 367 FERRAZ, Márcia Helena Mendes. As Ciências em Portugal e no Brasil (1772 – 1822): o texto conflituoso da química. São Paulo: Educ/Fapesp, 1997, p. 170. 368 SIMON. Scientific expeditions in the portugueses overseas territories, apud PATACA, Ermelinda. Mobilidades e permanências de viajantes no mundo português. São Paulo, 2013, p. 88, (Tese de Livre Docência, Universidade de São Paulo). 369 PEREIRA, Magnus Roberto de Mello. “Um jovem naturalista num ninho de cobras: a trajetória de João da Silva Feijó em Cabo Verde, em finais do século XVIII”. História: Questões & Debates. Curitiba: Editora UFPR, n. 36, 2002, p. 36. 370 GUEDES, Maria Estela. “João da Silva Feijó: Viagem filosófica a Cabo Verde”. Asclepio, vol. XLIX, 1, 1997, p. 135. Disponível em http://asclepio.revistas.csic.es/index.php/asclepio/article/ download/ 381/379 Acesso em 13 de maio de 2013. 122 de ciência”, e de não ter contribuído com as atividades administrativas.371 Outra possibilidade seria que o naturalista teria causado mal estar e “escândalos”, ao classificar parte da população branca da ilha de “vadios” e “degredados”, tornando-se “alvo de repressão por parte dos habitantes, do governador e do próprio ministro que o nomeou para a missão”.372 Por fim, outra razão dos problemas de Feijó pode ser o envolvimento que teve com Domingos Vidal Barbosa Lage (c.1761-c.1793), João Dias da Mota (c.1743-c.1793), José de Resende Costa (c.1728-c.1798) e José Resende Costa (c.1766-1841), filho, deportados da conspiração mineira e acolhidos por Feijó quando desembarcaram no arquipélago. 373 Feijó demonstrou, em suas memórias, grande predileção pelo estudo da mineralogia, o que pode ter influenciado Vandelli a enviá-lo para um arquipélago possuidor de intensas atividades vulcânicas, onde certamente encontraria a presença em abundância do enxofre, elemento fundamental para a produção da pólvora, assunto que muito interessava a Coroa. O naturalista, no entanto, não deixou de se aventurar em outros assuntos, escrevendo considerável número de memórias sobre temas tão diversos quanto a produção de corantes e tinturas a partir do anil e da urzela ou o beneficiamento de peixe seco para uso na alimentação. Apenas no início da década de 1790 os ensejos das elites políticas de Cabo Verde foram atendidos, e Feijó passou a acumular a atividade de naturalista atuando, também, como secretário do governo. 374 Apesar da crescente atribulação, Feijó não deixou que as atividades burocráticas dessem lugar às pesquisas em História Natural, dando continuidade à remessa de coletas à Corte, bem como a redação de suas memórias. 375 Em 1797, após 14 anos em Cabo Verde, Feijó retornou para Lisboa, tornando-se colaborador de Ferreira no complexo da Ajuda. Assim como o próprio Ferreira, Feijó 371 KURY, Lorelai. “Homens de ciência no Brasil: impérios coloniais e circulação de informações (1780-1810)”. História, Ciência, Saúde – Manguinhos, vol. 11 (suplemento 1), 2004, p. 116. 372 SANTOS, Danilo de Jesus da Veiga dos. O Cabo-verdiano através dos olhos dos forasteiros: representações nos textos portugueses (1784 – 1844). Lisboa, 2011, p. 23 (Dissertação de Mestrado em História, Universidade de Lisboa). 373 BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento. Diccionário Bibliográphico Brazileiro, vol. IV. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1898, p. 36. 374 SANTOS, Danilo de Jesus da Veiga dos. O Cabo-verdiano através dos olhos dos forasteiros: representações nos textos portugueses (1784 – 1844). Lisboa, 2011, p. 23 (Dissertação de Mestrado em História, Universidade de Lisboa). 375 C.f. AHU, CE, Nº Catálogo 984. Ofício do naturalista João da Silva Feijó ao [secretário de estado dos Negócios da Marinha e Ultramar, Visconde de Anadia, João Rodrigues de Sá e Melo Meneses e Souto Maior], remetendo sementes de frutos do Ceará. Fortaleza, 12 de maio de 1803, ou ainda AHU, CE, Nº Catálogo 811. Ofício do naturalista João da Silva Feijó ao [secretário de estado dos Negócios da Marinha e Ultramar, João Rodrigues de Sá e Melo], informando sobre as minas de salitre encontradas no Ceará e queixando-se das condições em que trabalha na referida capitania, faltando-lhe livros, desenhador e instrumentos para as observações físicas químicas e topográficas. Ceará, 13 de dezembro de 1800. 123 encontraria as coleções que organizou com tanto esmero em grande desordem. 376 Depois de breve período em Portugal, em 1799, Feijó novamente tornou a se deslocar entre os domínios lusos, desta vez de volta para sua Pátria, desembarcando em Fortaleza com uma carta patente para o “posto de Sargento-mor das Milícias da Capitania do Ceará”, expedida pelo Príncipe Dom João.377 Novamente tinha a incumbência de servir à Coroa em múltiplas funções, devendo atuar como militar e recebendo, ainda, a “incumbência de inventariar o quadro natural e analisar a viabilidade mineralógica” da região, devendo dar “especial atenção à existência e possível exploração de salitre”.378 3.4.3 – Joaquim José da Silva Outro discípulo de Vandelli incumbido de realizar viagens filosóficas em África foi o carioca Joaquim José da Silva. Nascido pelos idos de 1755, tornou-se Bacharel em Matemática e Medicina por Coimbra, também atuando como auxiliar de Vandelli no complexo da Ajuda, onde adquiriu experiência no estudo da História Natural. 379 Ao contrário de Ferreira e de Feijó, que viajaram incumbidos apenas do estudo da História Natural, Silva partiu para Angola ciente das múltiplas atribuições que deveria desempenhar; naturalista e integrante do corpo administrativo local. Naquela conquista, administrada à época por uma junta, receberia o cargo de secretário do governo. 380 Silva deu início às pesquisas filosóficas ainda embarcado, tão logo partiu de Lisboa. Como de costume aos naturalistas que realizavam grande percursos embarcados para chegar aos seus destinos, o oceano era vislumbrado como um primeiro cenário a ser explorado, e dessa forma o naturalista, em seus 146 dias de travessia oceânica, apresentou nove espécies de peixes que ainda eram desconhecidos da literatura científica, 381 além de alguns estudos sobre a fauna e flora do Reino do Congo e de 376 ARAÚJO, Agostinho Rui Marques de. Experiência da natureza e sensibilidade pré-romântica em Portugal. Temas de pintura e seu consumo (1780 – 1825), vol. 1. Porto, 1991, p. 51 (Tese de Doutoramento em História, Universidade do Porto). 377 AHU, CE, Nº Catálogo 727. Decreto do príncipe D. João a nomear João da Silva Feijó para sargento-mor de Milícias do Ceará. Palácio de Queluz, 01 de fevereiro de 1799. 378 PAIVA, Melquíades Pinto. Os naturalistas e o Ceará: João da Silva Feijó (1760 – 1824). Revista do Instituto. Fortaleza: Instituto Histórico, Geográfico e Antropológico do Ceará, 1991, p. 23. 379 AFBN. Estudantes brasileiros na Universidade de Coimbra. Vol. XLII, 1940, p. 154. 380 Joaquim José da Silva foi nomeado como secretário de Estado de Angola em um Alvará Régio de 14 de Dezembro de 1782. In: PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 382. 381 PATACA, Ermelinda Moutinho. A confecção de desenhos de peixes oceânicos das Viagens Philosophicas (1783) ao Pará e à Angola. História, Ciências, Saúde: Manguinhos. Vol. 10 (3), Set.-Dez., 2003, p. 980. 124 Benguela, onde aportou. Ressalte-se que quando das travessias oceânicas, o naturalista assumia tripla função; a “documentação dos peixes oceânicos coletados em alto mar”, a “formação artística para os demais viajantes que deveriam se familiarizar nesta prática para eventualmente substituírem os desenhistas” e estudos para o “desenvolvimento da atividade pesqueira”.382 Ao contrário de Feijó, Silva conduzia consigo dois auxiliares; o desenhista e naturalista italiano Ângelo Donati, membro da equipe de Vandelli, e o jardineiro português José António. 383 Ao longo de 1784, em meio às atividades que recebera, como elaborar o plano para a construção de parte das muralhas da fortaleza de Cabinda, 384 Silva procedeu à preparação e o envio da coleção que realizou durante a viagem transatlântica. 385 Nesse mesmo ano, foi enviado em uma viagem aos sertões de Massangano, “com pretextos da Historia Natural”, ainda que, em sua opinião, tinham-no como um espião para “observar o que lá se passava”,386 tendo pouco ou nenhum tempo para suas indagações filosóficas, descontentamento que expressaria por mais de uma vez em suas correspondências. Apesar de descontente por sua participação nas expedições militares, Silva tinha ciência de que era nesse contexto que estavam as oportunidades para adentrar os sertões de Angola com a segurança necessária, ainda que estivesse à mercê do comandante e de suas vontades que, em sua opinião, eram vistas como um detalhe em meio à expedição: Partimos na sexta feira, atravessando neste dia, e nos seguintes, estas e outras montanhas, mais, aliás, duas vezes que as de Cintra e Serra da Estrela em Portugal; não me sendo possível nem demorar-me, nem recolher por estes incultos sertões nenhuma das ótimas plantas e esquisitos animais, que povoam em imenso numero aquelas serras; onde encontrava a cada passo tropas tão grandes de Zebras, como se 382 PATACA, Ermelinda. Mobilidades e permanências de viajantes no mundo português. São Paulo, 2013, p. 33 e 185 (Tese de Livre Docência, Universidade de São Paulo). 383 AHMB. CN/D-6. Carta Ângelo Donati para Júlio Mattiazzi. S. Filippo di Benghela [Benguela, Angola], 10 de Setembro de 1783. Disponível em http://www.triplov.com/hist_fil_ciencia/ Ângelo_donati/ms1.htm. Acesso em 03 de junho de 2013. Donati teria acusado Joaquim “de ter partido em explorações deixando-o para trás a morrer.” In: PEREIRA. Um jovem naturalista num ninho de cobras, p. 35. José Antônio, o outro naturalista que acompanhava Silva, faleceu no Sertão de Massangano em decorrência de “umas febres”, pouco mais de ano após o desembarque. In: Carta de Joaquim da Silva para David José, Luanda, 21 de maio de 1785. SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 151. 384 AHMB. Carta de Joaquim José da Silva para Julio Mattiazzi. Benguela, 24 de maio de 1787. Transcrito por Magnus Roberto de Mello Pereira e Rosângela Maria Ferreira dos Santos. Acervo do CEDOPE/UFPR. Disponível em http://www.cedope.ufpr.br/pdf/22_JoaquimJozedaSilva.pdf. Acesso em 13 de maio de 2013. 385 AHU, Angola, maço 16, inventário do envio de espécimes de história natural, 20 de março de 1784. Transcrito em SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 159. 386 AHMB. Carta de Joaquim José da Silva para Julio Mattiazzi. Benguela, 24 de maio de 1787. Transcrito por Magnus Roberto de Mello Pereira e Rosângela Maria Ferreira dos Santos. Acervo do CEDOPE/UFPR. Disponível em http://www.cedope.ufpr.br/pdf/22_JoaquimJozedaSilva.pdf. Acesso em 13 de maio de 2013. 125 encontrão nos campos do Brasil as boiadas. 387 E tendo no dia seguinte passado algumas Libatas [casas] deste mesmo Sova [Soba], chegamos a Lumbimbi, outro Sovado; e porque desde aqui até Quilenguies me não aconteceu ter lugar para exame de coisa alguma, assim pela necessária pressa da marcha, como por outras causas não menores (...). 388 Foi nesse contexto que, em 1785, sob o comando do capitão Antônio José da Costa, Silva desenvolveria sua mais significante viagem filosófica em Angola; uma empreitada que tinha como objetivo conhecer o interior da conquista e estabelecer rotas comerciais desde Benguela até o Cabo Negro, passando pelos sertões de Caconda e Quipungo. 389 Dois anos depois, no entanto, o naturalista escreveu uma carta a Júlio Mattiazzi, dando contas da baixa produção que até então tinha realizado e das dificuldades que enfrentava para enviar as remessas. Reclamava também da ausência de auxiliares, uma vez que Ângelo Donati e José António haviam falecido e não havia ninguém que os substituíssem. 390 Destarte as dificuldades relatadas pelo naturalista, todo esse cenário foi compreendido pela Coroa como uma deliberada “falta de resultados”, e as atividades do naturalista foram, inclusive, ameaçadas de suspensão.391 Magnus Pereira afirma ser o ano de 1808 o último em que Silva realizou estudos em História Natural, passando a se dedicar em definitivo à administração colonial, constituindo família em Angola até seu falecimento, em 1813. 392 387 SILVA. Joaquim José. Extracto da viagem, que fez ao sertão de Benguella no anno de 1785 por ordem do Governardor e Capitão General do Reino de Angola, o Bacharel Joaquim José da Silva, enviado á aquelle Reino como Naturalista, e depois Secretario do Governo. De Loanda para Benguella. In: O Patriota: Jornal Literário, Político, Mercantil & Comercial do Rio de Janeiro. Nº. 2, fevereiro. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1813, p. 89. 388 SILVA. Extracto da viagem, que fez ao sertão de Benguella... p. 91-92. 389 AHU, Angola, Cx. 38. Relatório de Joaquim José da Silva a Martinho de Melo e Castro. [Luanda], Angola, 17 de março de 1784. 390 Após permanecer 19 dias em Benguela, Donati desembarcou em Luanda com a saúde debilitada, vindo a falecer poucos dias depois. José António, por sua vez, viria a falecer de febre nos sertões de Massangano, em 1784. PATACA. A confecção de desenhos de peixes oceânicos das Viagens philosophicas, p. 982. 391 “Meu prezado Amigo e Senhor. Recebi uma Carta de Vossa Mercê sem data: e nela me dá Vossa Mercê a desgostosa noticia de que o Excelentíssimo Senhor Martinho de Mello pensa em fazer me Retirar, como inútil neste Continente”. AHMB. CN/S-22. Carta de Joaquim José da Silva para Julio Mattiazzi. Benguela em 24 de maio de 1787. Transcrito por Magnus Roberto de Mello Pereira e Rosângela Maria Ferreira dos Santos. Acervo do CEDOPE/UFPR. Disponível em http://www.cedope.ufpr.br/pdf/ 22_JoaquimJozedaSilva.pdf. Acesso em 13 de maio de 2013. Também em RAMINELLI, Ronald. Ilustração e império colonial. História, vol. 31, nº.2, p. 36-67, jul./dez. 2012. 392 PEREIRA. Um jovem naturalista num ninho de cobras. 126 3.4.4 – Manuel Galvão da Silva Outro letrado incumbido de realizar indagações filosóficas em África foi Manuel Galvão da Silva (1750 – 18??), natural da Bahia, graduado bacharel em Filosofia por Coimbra, em 1776, 393 a quem coube realizar as viagens filosóficas em parte das conquistas lusas no Oriente – Goa e Moçambique, para onde foi enviado em 1783. Levava consigo uma carta assinada por Martinho de Mello e Castro, para tomar posse do cargo de Secretário de Governo, 394 e debaixo da sua inspeção a Antônio Gomes, riscador, e José da Costa, jardineiro botânico, os quais vão vencendo do serviço de Sua Majestade, a saber: o primeiro, o ordenado, que compete ao referido emprego de secretário; e o segundo e terceiro, o ordenado de trezentos mil reis cada hum por ano, com a obrigação de se empregarem debaixo das Ordens de Vossa Senhoria, em examinar, e descrever tudo o que houver nessa capitania relativa a História Natural, em recolher, preparar, e remeter a esta Corte tudo o que houver de dirigir-se a ela, na conformidade dos exemplares de Instruções, que a Academia das Ciências de Lisboa publicou a esse respeito. 395 Sua viagem desde Lisboa foi marcada por uma curta estada de 30 dias na Bahia, de onde escreveu duas cartas, uma para Júlio Mattiazzi e outra para Martinho de Melo e Castro, relatando aspectos da terra, contratempos, e a utilização que estava fazendo dos instrumentos e outras demandas. A verdade é que Galvão partiu de Lisboa com a responsabilidade de fazer alguns estudos na Bahia, sobretudo sobre duas amostras específicas de cobre, uma enviada para o Museu da Ajuda, e outra que se encontrava em Salvador, e verificar se “eram de cobre nativo ou se eram resquícios de utensílios de cobre de um antigo engenho de açúcar que teria existido no local e tinha sido incendiado na época da invasão dos holandeses”.396 Para tanto, ao desembarcar em Salvador, o naturalista se reuniu com o governador, Afonso Miguel de Portugal e Castro (1748-1802), o Marquês de Valença, “para informá-lo das ordens que tinha recebido do Ministro” para realizar uma “expedição à Vila da Cachoeira”, onde deveria realizar a coleta de algumas amostras da 393 PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 151. 394 SILVA, Manuel Galvão da. Observações sobre a História Natural de Goa, feitas em 1784 por Manuel Galvão da Silva e agora publicada por J. H. da Cunha Rivara. Nova Goa: Imprensa Nacional, 1862, p. 1-2. Disponível em https://books.google.com.br/books/about/Observaç%C3%25%20B5es_ sobre_a_%20historia_natural_d.html?id=g6c5AAAAcAAJ&redir_esc=y. Acesso em 25 de julho de 2016. 395 SILVA. Observações sobre a História Natural de Goa... 396 AHMB – CN/S–26. Carta de Manoel Galvão da Silva para Julio Mattiazzi. Bahia, 16 de Junho de 1783, apud PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 363. A outra correspondência de Galvão, para Martinho de Melo e Castro, segue a seguinte notação: AMP, FJB, Arq. 29-75. Carta de Manoel Galvão da Silva para Martinho de Melo e Castro. Bahia, 1783. 127 Botânica e do cobre local. 397 Segundo Ermelinda Pataca, “os relatos de Galvão revelam a validação científica da época, pois os experimentos realizados [com o cobre] necessitavam do arbítrio de testemunhas, especialmente das autoridades administrativas e de pessoas versadas em Ciências Naturais”, tendo sido, em sua opinião, extremamente positivos. Realizados os ensaios na Casa da Moeda da Bahia, (...) ficaram contentes todos os que presentes estavam, e mais que todos o Juiz de Fora da Cachoeira, que por aqui vive há muitas semanas; votarão, deram arbítrios, e eu também disse, do que Sua Excelência perguntou, o que me pareceu conveniente; afirmando-lhes ser cobre nativo, e não procedido de alguma fusão. 398 Após sua estada na Bahia, Galvão desembarcou em Goa em dezembro de 1783 e durante os pouco mais de dois meses em que ali esteve, 399 realizou algumas coletas em História Natural, enviando para Lisboa dois caixotes; um “grande”, e outro “pequeno”; e “um latão grande” “com “algumas produções da natureza”400, as quais serviriam de subsídios para uma pequena memória que escreveria posteriormente. 401 As circunstâncias de sua partida das Índias, em janeiro próximo, levam a crer que o naturalista procurou deixar o território o quanto antes, talvez por julgá-lo improdutivo ou mesmo pelo medo de “perder a saúde”.402 Após três longos meses de viagem, desembarcou em Moçambique em abril de 1784, permanecendo naquela conquista até o ano de 1793. 403 O contexto político que ali encontrou, no entanto, não se mostrava favorável para que se dedicasse apenas aos assuntos da História Natural. O último governador, Pedro Saldanha e Albuquerque (?-1782), falecera cinco meses após tomar posse, em 21 de agosto do ano anterior, sendo a Colônia assumida por um triunvirato que 397 AHMB – CN/S–26. Carta de Manoel Galvão da Silva para Julio Mattiazzi. Bahia, 16 de Junho de 1783, apud PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 363. 398 AHMB – CN/S–26. Carta de Manoel Galvão da Silva para Julio Mattiazzi. Bahia, 16 de Junho de 1783, apud PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 363. 399 AHU, Moçambique, Cx. 21, Carta de Manuel Galvão da Silva para Martinho de Mello e Castro, Moçambique, 18 de agosto de 1784. Transcrito em SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 151. 400 SILVA. Observações sobre a História Natural de Goa..., p. 6. 401 Ibidem. 402 AHU, Moçambique, Cx. 21, Carta de Manuel Galvão da Silva para Martinho de Mello e Castro, Moçambique, 18 de agosto de 1784. Transcrito em SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 151. 403 É bem provável que seja 26 de abril de 1784 ou mesmo alguns dias antes como sendo o dia do desembarque de Galvão em Moçambique haja vista a transcrição da mensagem de Martinho de Mello e Castro para Frederico Guilherme de Souza realizada em Moçambique e datada de 26 de abril de 1784 (Simon, 1983: 149). Ou seja, de Goa à Moçambique transcorreram não mais que 26 dias de viagem. 128 permaneceria até março de 1786, e que era composto pelo Frei Amaro José de Santo Thomas, bispo prelado de Moçambique; por Antônio José de Moraes Durão, ouvidor-geral, e pelo tenente-coronel Vicente Caetano de Mayo Vasconcelos. Assim como Silva, Galvão encontraria grande dificuldade em realizar suas indagações em História Natural; de certo a junta responsável pela administração local acreditasse que as atividades administrativas que deveriam ser desempenhadas pelo naturalista deveriam se sobressair àquelas que envolviam as pesquisas em História Natural. Assim, Galvão escreveu uma carta indignado ao Bispo, alegando que Martinho de Mello e Castro mantinha despesas “a um Desenhador e a hum Jardineiro Botânico, sem deles se seguir utilidade, por não trabalharem”. Com esta carta, Galvão procurava conscientizar a junta acerca da importância de sua função como naturalista, bem como da necessidade que tinha de sair a campo sem demora, uma vez “que as plantas vivem e florescem em diferentes Estações do ano, que não podem ser examinadas, descritas, e desenhadas, se não quando florescem, e frutificam, e que por isso todo o tempo que se perde não serve mais do que diminuir as Produções”.404 Apenas um mês após seu desembarque, depois de solicitar por mais de uma vez autorização, Galvão receberia a aprovação para que pudesse preparar sua primeira viagem filosófica: Por hora examine (...), e faça delegação de que é incumbido, nas circunvizinhanças desta Capitania, e na primeira monção irá aos Rios de Senna; sai a pronto e ficara o que for preciso segundo as ordens de Sua Majestade expedidas pela Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha. 405 Apesar da autorização concedida no mês de junho pelo Bispo, em agosto Galvão ainda se encontrava na Ilha de Moçambique, queixando-se de fadigas e febres, provavelmente acometido por malária, o que postergou seus planos de percorrer “todo o vasto País dos Rios de Sena”.406 Apenas nos últimos meses de 1784 Galvão deu início às suas atividades de pesquisa, como integrante de uma expedição militar, percorrendo a região de Sancule, 404 AHU, Moçambique, Cx. 21. Petição de Manuel Galvão da Silva para começar as explorações, aprovada em 23 de junho de 1784. Moçambique, S/D, transcrito em SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 150. 405 Ibidem. 406 AHU, Moçambique, Cx. 21, Carta de Manuel Galvão da Silva para Martinho de Mello e Castro, Moçambique, 18 de agosto de 1784. Transcrito em SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 151. 129 ainda próximo à capital, 407 onde fez alguns estudos que considerou “sem alguma utilidade”, posteriormente remetidos a Martinho de Melo e Castro. Na mesma correspondência, desabafando, o naturalista dava informações ao secretário da nova negação pelas autoridades locais para que pudesse viajar ao Rio de Sena, queixando-se também de que estava “convalescendo de uma moléstia grave” que o tinha “atacado desde seis de janeiro”, e que o “deixava sem forças”.408 No ano seguinte, Galvão seria integrante de nova expedição militar, realizada nas serras de Mutipa e de Utigulo, locais onde predominam formações rochosas distantes não mais do que 10 léguas do litoral, onde ouvira dizer “que não só havia cobre, mas outras Minas”. Durante esta viagem, o naturalista teceu várias críticas às condições que se encontrava e ao clima. Devido ao intenso calor, “andando muitas léguas sob o Sol” durante vinte e seis dias, por falta de Cafres, “e por causa dos maus caminhos”, retornou à Ilha de Moçambique bastante debilitado, “com umas ‘terçãns duplas’ que” o “puseram as portas da morte”.409 Em suas palavras: Sentindo só o fazer tão pouca fortuna nesta viagem, que me saiu tão cara; e vendo que não tenho que oferecer dos meus trabalhos se não as minas de ferro, que remeto, e as amostras das pedras, de que compõem da grande Cordilheira de Montanhas de Mutipa, e do Utigulo. 410 Na mesma correspondência, Galvão comunicava a remessa de três caixotes, sendo dois com “árvores marinhas” e um com conchas, material recolhido no litoral costa. Mencionou ainda a existência de pássaros que eram “tão raros, ou mais, do que na America”, mas que não tinha conseguido capturar nenhum ainda, pelo qual não os tinha enviado, bem como sobre alguns peixes e anfíbios que observara e que também não os tinha enviado, pois aguardava instruções de Vandelli ou de Mattiazzi para assim o fazer. 411 Em correspondência posterior, no mesmo ano, enviou as amostras de minério de ferro achado nas montanhas de Mutipa. 412 Nos anos de 1787 e 1788, Galvão torna a integrar nova expedição militar, deslocando-se através da região do Rio de Tete e do Reino de Manica, onde realizou 407 A Ilha de Moçambique foi capital daquela conquista até fundação de Lourenço Marques, no final do século XIX. 408 AHU, Moçambique, cx. 22, Carta de Manuel Galvão da Silva para Martinho de Mello e Castro. Moçambique, c. Agosto, 1785. Transcrito em SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 151. 409 Idem, p. 152. 410 Ibidem. 411 Ibidem. 412 Idem, p. 153. 130 coletas de amostras de ouro, que lhe valeram alguns conflitos com os locais. 413 De todas as expedições que o naturalista participou, a do rio de Sena foi a que mais despertou o interesse da administração colonial, a ponto de Antônio Manuel de Melo e Castro (1740-1795), governador empossado após o triunvirato, escrever para Martinho de Melo e Castro justificando a demora de Galvão em executar a exploração daquele território: “até agora [Galvão] não tem podido executar [a viagem ao Rio de Sena] por causa das muitas, e repetidas moléstias que tem padecido; como pela ocupação do Seu ministério”, mas que a mesma seria de fundamental importância, pois seria o naturalista o responsável por investigar a presença de ouro e de outros metais preciosos e “tombar as terras de sesmarias daqueles rios, para se evitarem as contendas e litígios” entre os portugueses e os locais.414 Poucos dias depois, Galvão e o governador redigiriam outras cartas para Martinho de Melo e Castro. Enquanto o governador informava a partida do naturalista para os sertões de Quilimane, “para dar principio às Expedições Filosóficas”, Galvão dava notícias de que estava partindo sem seus auxiliares, pois o desenhador se encontrava “muito doente”, e o jardineiro “com praça assentada no Regimento de Infantaria”. Sobre este, o naturalista ressaltou que o mesmo mantinha-se na “mais repreensível ignorância, sem querer instruir-se para vir a ser útil”, e que com o passar do tempo tinha “caído de vício em vício”, 415 restando alistá-lo “por considerá-lo imprestável”.416 Logo, além das coletas e do preparo do material ao longo da viagem filosófica, ficaram sob a responsabilidade do naturalista a elaboração das “cartas geográficas e mineralógicas” daqueles sertões. Seria esta a mais longa viagem filosófica de Galvão, deixando o naturalista a Ilha de Moçambique em 1787, percorrendo o litoral na direção sul e, posteriormente, as regiões de Tete, Manica e rio de Sena, além de ter explorado parte do curso do rio Zambeze, retornando para a Ilha de Moçambique em 1790, sendo então nomeado Procurador da Coroa e da Fazenda. 417 Desta grande viagem, em agosto de 1791, Galvão enviou várias caixas, contendo 413 PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 381. 414 AHU, Moçambique, Cx. 22, Carta do Governador de Moçambique, Antônio Manuel de Melo e Castro, para Martinho de Mello e Castro. Moçambique, 1º de dezembro de 1786. Transcrito em SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 153. 415 O mais provável é que o Jardineiro Botânico tenha adquirido o hábito de embriagar-se, causando desgosto no naturalista a ponto de dificultar o andamento das expedições. PEREIRA. Um jovem naturalista num ninho de cobras, p. 35. 416 AHU, Moçambique, cx. 52, n. 61, apud PEREIRA. Um jovem naturalista num ninho de cobras, p. 35. 417 SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 75-76. 131 amostras minerais, da flora e da fauna locais, como dois barris de peixes, imersos em álcool e uma cabeça de hipopótamo. 418 Suas memórias e seus diários evidenciam o que vivenciou e observou no interior daquela conquista. 419 Veloso de Miranda fez parte desse seleto grupo de letrados luso-brasileiros, delegados a pesquisar e tomar ciência das potencialidades das conquistas lusas, para que pudessem ser exploradas com vistas à “felicidade da Nação”, ao mesmo tempo em que atuavam em sua administração. Assim como ele e os outros naturalistas aqui brevemente descritos, muitos outros letrados foram igualmente responsáveis pelo estudo da História Natural em Portugal e em seus domínios ao longo da segunda metade do século XVIII. Nesse ínterim, por dever de justiça, devem ser lembrados os nomes de Antônio Pires da Silva e Pontes (1750-1807), Baltasar da Silva Lisboa (1761-1840), Domingos Alves Branco Muniz Barreto (1748-1831), João Manso Pereira (1750– 1820), Joaquim de Amorim e Castro (1760-1817), José Álvares Maciel (1760-1804), José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838), José Maria de Lacerda (? – 1797), José Mariano da Conceição Veloso (1742-1811), José Vieira Couto (1752-1827), Manuel Arruda da Câmara (1752-1810) e Vicente Coelho Seabra Silva Telles (1764-1804), dentre outros, alguns dos quais já reconhecidos na historiografia por seus estudos e outros, ainda que não fizessem o uso da função de naturalista a serviço da Coroa, desempenharam atividades administrativas, políticas e técnicas a partir dos conhecimentos adquiridos em instituições acadêmicas, militares e religiosas, elaborando projetos, cartografias e memórias sobre aspectos e recursos que julgavam curiosos, interessantes ou promissoras para a economia lusa. Pessoa fundamental nesse processo foi Dom Rodrigo de Sousa Coutinho que, na Secretaria de Estado da Marinha e do Ultramar, desencadeou ações que buscavam resolver, entre outros problemas, a crise política em que se encontrava Portugal, decorrente, sobretudo, da redução de valores enviados a Lisboa, o ouro das Minas. 418 AHU, Moçambique, Cx. 23, Carta de Manuel Galvão da Silva para Martinho de Mello e Castro. Moçambique, 3 de dezembro de 1786, apud SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 75. 419 SILVA, Manuel Galvão da. Diário das viagens feitas pelas terras da Manica em 1790. Anais da Junta de Investigações do Ultramar, 9, tomo 1, 1954, p. 323-332; _____. Diário ou relação das viagens filosóficas nas terras da Jurisdição de Tere e em algumas dos Maraves. Anais da Junta de Investigações do Ultramar, 9, tomo 1, 1954, p. 311-319. 132 3.5 – A política ilustrada de Dom Rodrigo de Souza Coutinho Em 1795, após dezessete anos em Turim, onde exercia a carreira diplomática, Dom Rodrigo de Souza Coutinho (1755-1812) retornou para Portugal, para suceder a Martinho de Melo e Castro (1716-1795) no cargo de Secretário de Estado da Marinha e do Ultramar, encontrando as finanças da Corte em estado bastante díspar se comparado à época em que dali se ausentou. Afilhado de batismo de Pombal, 420 Dom Rodrigo nasceu a 3 de agosto de 1755, filho de D. Francisco Inocêncio de Sousa Coutinho, militar, administrador e diplomata. Utilizou, quando moço, da influência de seu padrinho para receber a melhor educação do Reino, frequentando o Colégio dos Nobres e a Universidade de Coimbra, acumulando saberes e influências que certamente seriam responsáveis por colocá-lo entre os mais hábeis candidatos a exercer a alta administração reinol. Ao assumir a função de Secretário de Estado da Marinha e do Ultramar, em 1796, os problemas encontrados por Dom Rodrigo não estavam restritos à hipossuficiência das minas de ouro da América portuguesa que, desde 1763, último ano em que a cota mínima de impostos havia sido atingida, apresentava a cada ano mais resultados negativos, 421 ou aos planos para sublevações que vez ou outra faziam a Coroa tomar providências jurídicas e militares. Advinham, acreditava o Marquês, dos planos de Pombal que apesar de criteriosos, não haviam sido suficientes para colocar em alinhados eixos econômicos a Nação e suas conquistas, ainda que em sua opinião o Tratado de Methuen, assinado entre Portugal e Inglaterra há quase um século, em 1703, fosse igualmente responsável pelo processo de estagnação econômica do Reino. 422 Havia, no entanto, um consenso nos dois lados do Atlântico; de que a crise não era um problema local, mas envolvia todo o Reino, e para dissuadi-la havia a necessidade de que Portugal recobrasse de forma urgente “a independência perdida (...) ao mercador inglês e alienada pelo sistema mercantil”.423 Ao longo da gestão anterior, entre 1770 e 1795, Martinho de Melo e Castro já 420 MAXWELL. A geração de 1790 e a ideia de império luso-brasileiro, p. 180. 421 FIGUEIREDO, Luciano Raposo de Almeida. Prudência e Luzes no cálculo econômico do Antigo Regime: fiscalidade e derrama em Minas Gerais (notas preliminares para discussão). Anais do X Seminário sobre a Economia Mineira. Diamantina, 2002. 422 COUTINHO, Rodrigo de Sousa (Dom). Memória sobre a verdadeira influencia das minas de metais preciosos na indústria das nações que as possuem, e especialmente na portuguesa. Memórias econômicas da Academia, Tomo 1. Lisboa: Na Officina da Academia Real das Sciencias, 1789, apud MAXWELL. A geração de 1790 e a ideia de império luso-brasileiro, p. 180. 423 FAORO. Os donos do poder, p. 227-228. 133 havia dado o pontapé inicial a vários projetos para a reestruturação econômica do Reino, atividades que passaram às mãos de Dom Rodrigo em 1795, por ocasião do seu falecimento. Valendo-se da orientação política que adquiriu ao longo de sua carreira como diplomata, não por coincidência análoga àquela exercida por Pombal nos seus vinte e sete anos de secretário do estado do Reino, Dom Rodrigo daria prosseguimento às ações planejadas por aquele secretário com grande prioridade para as conquistas do além-mar, ciente da importância em conhecer seus recursos naturais, pelo que manteve grande parte das atividades científicas desenvolvidas pelos naturalistas luso-brasileiros em viagem apostando, ainda, na criação de instituições que deveriam ser responsáveis por dar continuidade aos trabalhos desenvolvidos no além-mar. Há muito a Secretaria se mostrava atenta para com o trabalho desempenho pelos naturalistas luso-brasileiros, 424 o que pode ser verificado por meio das relações profissionais e pessoais e, principalmente, das correspondências que Martinho de Melo e Castro e Dom Rodrigo de Sousa Coutinho trocaram diretamente com os letrados em questão, muitas vezes sem a intermediação da Academia Real de Ciências de Lisboa, instituição a qual estavam subordinados, ou mesmo de outras pessoas, como Vandelli. 425 Veloso de Miranda, por exemplo, em diversos momentos escreveu diretamente a Dom Rodrigo, expondo as particularidades que observara nos sertões de Minas Gerais, cartas que constituem-se como “material valioso para o historiador da Ilustração luso-americana, na medida em que permite observar a atuação de um naturalista [ou, em seu conjunto, de vários profissionais] em postos-chaves da administração do Império Português, sobretudo aqueles relativos às minas, matas e bosques, e rios”.426 Por meio delas, era possível ainda que Dom Rodrigo tomasse ciência do andamento das reformas que conduzia, recebendo informes preliminares das ações que ordenara, emitindo ordens para reorientar as ações de determinado naturalista, quando necessário, ou mesmo reconhecer, por meio de elogios, o bom andamento das pesquisas que às suas mãos 424 Designados por Kenneth Maxwell “geração de 1790”, correspondendo ao grupo de letrados luso-brasileiros que frequentaram a Universidade de Coimbra e que passaram a atuar sob a proteção da Coroa realizando pesquisas em História Natural e em outras atividades que fossem julgadas interessantes para o desenvolvimento do Reino. MAXWELL. A geração de 1790 e a ideia de império luso-brasileiro, p. 157-207. 425 Ver, por exemplo, as várias cartas que Alexandre Rodrigues Ferreira escreveu diretamente a Martinho de Melo e Castro durante sua estada na Amazônia. In: LIMA, Américo Pires de. Alexandre Rodrigues Ferreira: documentos coligidos e prefaciados. Lisboa: Agência Geral de Ultramar, 1953. 426 VARELA, Alex Gonçalves. “‘Juro-lhe pela honra de bom vassalo e bom português": As cartas de José Bonifácio de Andrada e Silva para D. Rodrigo de Sousa Coutinho’”. RIHGB, vol. 174, nº. 460, Jul./Set. 2013, p. 281-310. 134 eram direcionadas. As relações políticas que Dom Rodrigo manteve ao longo de sua gestão são assuntos há muito abordados na historiografia luso-brasileira. Varnhagen, por exemplo, mencionou o fato de que Dom João era absolutamente ciente do quão positivo poderia ser para o Reino ter Dom Rodrigo como um dos seus principais estadistas, considerado-o um “patriota cheio de fé e entusiasmo, de muita energia, interesse, atividade e imaginação”, além de ser uma “grande projetista político” desde quando exercia a diplomacia como ministro plenipotenciário na corte da Sardenha, em Turim. 427 Também a maior atenção dispensada por Dom Rodrigo aos naturalistas encontra em Maria Odila Leite da Silva Dias fundamentos bastante coerentes para afirmar a existência de uma elite luso-brasileira atuando como agentes da integração metropolitana e colonial em prol da construção de um novo Império português. 428 A política que formulou para o Império português também pode ser compreendida por meio de sua visão sobre o estado das finanças lusas e outras áreas que considerava de suma importância, como a mineração e a agricultura. Nesse ínterim, as memórias e demais tratados que escreveu são de grande importância para a compreensão de suas ideias e de seus projetos políticos. Em sua Memória sobre os melhoramentos dos domínios de Sua Majestade na América, de 1797, Dom Rodrigo reafirmava sua estratégia em relação à utilização dos recursos naturais no âmbito de sua política econômica e administrativa. Para ele, Portugal deveria manter uma similar comunicabilidade entre seus domínios no que toca à administração e exploração dos recursos naturais e, para isso, era necessário “animar as culturas existentes e naturalizar no Brasil todos os produtos que se extraem de outros países”. Obviamente, para que existisse um cenário propício a tal comércio, era necessário que tais políticas fossem igualmente implantadas nos outros domínios ou, para aquele contexto, que tais ações fossem mantidas, haja vistas que já haviam sido iniciadas, o que de fato Dom Rodrigo não deixou de fazer. No entanto, a liberdade que o estadista auferia para as conquistas no âmbito dessa memória fazia referência apenas à prática do intercâmbio em ações que envolvessem estudos da História Natural que se mostrassem interessantes à economia, devendo as relações comerciais serem realizadas 427 VARNHAGEN, Francisco Adolfo de. História Geral do Brazil. Rio de Janeiro: Em Casa de E. e H. Laemmert, 1857, vol. 2, p. 282. 428 DIAS, Maria Odila Leite da Silva. “Aspectos da Ilustração no Brasil”. In: _____. A interiorização da metrópole de e outros estudos. São Paulo: Alameda, 2005. 135 única e exclusivamente “por meio da Metrópole”.429 Esta memória foi analisada por Fernando Novais, ao tratar a crise do Antigo Regime, como um “vasto e articulado plano de fomento da exploração econômica do Brasil”, uma “tentativa de remover obstáculos ao ‘pleno funcionamento do sistema colonial na nova conjuntura’, chamando a atenção para o uso da expressão ‘sistema’ no texto de Dom Rodrigo, onde o estadista procurou definir, de maneira vantajosa, as relações entre Portugal e seus domínios”.430 Ao dar início às atividades na Secretaria, Dom Rodrigo entrou em contato com diversas autoridades do além-mar, no intuito de tomar ciência oficialmente dos recursos naturais que cada região dispunha, procedimento que já havia sido realizado por seu antecessor. Ao Governador da Capitania do Espírito Santo, Antônio Pires da Silva Pontes Leme (1750-1805), também mineiro da Cidade de Mariana, o secretário solicitou que fosse realizado um “exame circunstanciado” contendo a “descrição geográfica e topográfica de seu governo, com a identificação dos limites e confins com as outras capitanias vizinhas, assim como as estradas de comunicação atualmente estabelecidas”. Informações sobre a população “em brancos, negros e pardos” também eram fundamentais para a avaliação da mão de obra disponível. Por fim, e não menos importante, solicitou uma “relação, a mais exata que for possível haver, da qualidade e quantidade dos produtos dessa capitania, justamente com a informação do que se exporta dos mesmos produtos, seja para o Reino, seja para os outros domínios ultramarinos”.431 Como resposta, Pontes Leme enviou a Lisboa alguns exemplares botânicos e mineralógicos da capitania, afirmando ainda que estava providenciando o loteamento para a construção de um jardim botânico na vila de Vitória, 432 assuntos que não devem 429 ALMEIDA, L. F. Aclimatação de plantas do Oriente no Brasil durante os séculos XVII e XVIII. In: Revista Portuguesa de História, tomo XV, 1976, p. 339-481, apud SANJAD, Nelson. Portugal e os intercâmbios vegetais no Mundo ultramarino: as origens da rede luso-brasileira de jardins botânicos, 1750-1800. In: ALVES, José Jerônimo de Alencar. Múltiplas faces da história das ciências na Amazônia. Belém: Ed. UFPA, 2005, p. 91. 430 SANTOS, Afonso Carlos Marques dos. Do projeto de Império à Independência: notas acerca da opção monárquica na autonomia política do Brasil. AMHN, Rio de Janeiro, vol. 30, 1998, p. 10. 431 AHU, ES, Códice 606. Ofício de Dom Rodrigo de Sousa Coutinho para o Governador da Capitania do Espírito Santo. S/L. S/D, apud FILHO, Oswaldo Munteal & MELO, Mariana Ferreira de. Minas Gerais e a história natural das colônias: política colonial e cultura científica no século XVIII. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 2004, p. 106. 432 AHU, ES, Cx. 06, Doc. 455. Ofício do [Governador da Capitania do Espírito Santo], Antônio Pires da Silva Pontes [Pais Leme de Camargo], ao [Secretário Interino de Estado da Marinha e Ultramar], D. Rodrigo de Souza Coutinho, a informar da remessa de suas caixas de caraipe contendo sementes, um 136 ter demandado maiores esforços por parte do governador uma vez que ele era, assim como Veloso de Miranda, um letrado oriundo da Universidade de Coimbra sendo, inclusive, seu contemporâneo, tendo sido designado para uma viagem ao Pará, Amazonas e Mato Grosso, em 1780, onde haveria, com o auxílio de Francisco José de Lacerda e Almeida (1753-1798), mapear e tomar as coordenadas geográficas dos locais percorridos, a fim de atualizar a cartografia amazônica, tornando-se, ao regressar a Corte, professor na Academia de Marinha. 433 Destarte a necessidade em tomar ciência do potencial econômico de toda a América portuguesa, tais processos foram realizados, grosso modo, em duas frentes; a Amazônia e a região sudeste. Estas porções do território, mais que outras, tornaram-se alvos de maior atenção por parte da Secretaria Ultramarina em função da grande abundância de recursos e produtos naturais que se julgavam nelas existir. Ademais, a região Norte, com toda sua diversidade botânica, há muito cativava os portugueses pela possibilidade de torná-la uma nova Índia das especiarias e drogas do sertão. Concomitantemente, havia grande preocupação diante dos constantes avanços de armadas de outras Nações sobre aquele território. Para Luís Almeida, Dom Rodrigo tinha uma “clara visão da unidade do mundo português e das suas implicações e vantagens no plano econômico”, e procurava, sempre que possível, “integrar naturalmente na sua política a ideia da permuta de plantas dos diversos territórios e, em especial, a aclimatação das especiarias orientais no Brasil”.434 A partir de tais projetos, nasceria no além-mar, por meio da iniciativa de Dom Rodrigo, a política de criação de jardins botânicos, da qual vamos tratar de forma mais aprofundada a posteriori, o que não nos impede de mencionar, por ora, sua importância, bem como o papel desempenhado pelo secretário em sua política pautada na História Natural com vistas ao desenvolvimento econômico. Para a Amazônia, além da viagem filosófica realizada por Alexandre Rodrigues Ferreira, várias outras frentes de trabalho foram planejadas por Dom Rodrigo, como a criação de um horto botânico em Belém; a realização de várias viagens para embrulho das flores em algodão e um caixão com 18 libras de coxonilha para Antônio Martins Seixas com importante informação sobre Botânica. Vila de Vitória, 08 de fevereiro de 1801. 433 CAMPOS, Adriana Pereira. Relatos da natureza e a província do Espírito Santo. Anais do V Encontro Internacional UFES/ Paris-Est. Vitória: UFES, 2015. 434 ALMEIDA, Luís Ferrand. Aclimatação de plantas do Oriente no Brasil durante os séculos XVII e XVIII. Revista Portuguesa de História, tomo XV, 1976, p. 339-481, apud SANJAD, Nelson. Portugal e os intercâmbios vegetais no Mundo ultramarino: as origens da rede luso-brasileira de jardins botânicos, 1750-1800. In: ALVES, José Jerônimo de Alencar. Múltiplas faces da história das ciências na Amazônia. Belém: Ed. UFPA, 2005, p. 91. 137 reconhecimento e manutenção das fronteiras do território, como aquela realizada pelo capitão engenheiro Ricardo Franco de Almeida Serra, na qual buscou-se reconhecer os caminhos fluviais que ligavam o Amazonas à Guiana Holandesa, por meio do Rio Branco, 435 ou ainda da criação de vários núcleos coloniais ao longo das fronteiras, como a transferência da praça comercial de Mazagão desde o litoral africano para o Amapá. 436 Apesar de dar continuidade a algumas das ações criadas por seu antecessor na Amazônia, Dom Rodrigo estabelece novo centro de gravidade de atuação de seus letrados para com a História Natural; a região Sudeste e, mais particularmente, Minas Gerais, concentrando ali grande número de naturalistas com missões semelhantes. A botânica continuaria sendo uma importante área de atuação, ainda que as pesquisas em mineralogia passassem a concorrer com aquela vis-à-vis, algo justificável em função da geologia da capitania. Logo, para Dom Rodrigo, o trato para com as atividades mineradoras deveria receber maior atenção pelo potencial que, em sua opinião, haveria de existir nos territórios incultos daquele sertão. Ademais, o secretário considerava que o setor voltaria a ser próspero conquanto fosse melhorada a instrução dos mineiros, e aprimorada a técnica por meio dos mais recentes estudos das Ciências Montanísticas, 437 não deixando de valorizar as descobertas fortuitas por meio de as mercês concedidas àqueles que as acusassem. Também a instalação de uma fábrica de ferro na América portuguesa passou a ser assunto de constantes discussões entre as autoridades de Lisboa, a administração colonial e os letrados luso-brasileiros, sobretudo Manuel Ferreira da Câmara, considerado o primeiro engenheiro de minas do Brasil e que também se dedicava aos estudos dos processos metalúrgicos, 438 além de ser ex-aluno de Vandelli. Outro naturalista, José Vieira Couto (1752-1827), se ocupou durante anos do estudo dos diamantes, do ouro, do ferro e dos processos metalúrgicos, sendo o descobridor de várias minas de platina, galena e salitre nos sertões mineiros, rendendo, 435 SERRA, Ricardo Franco de Almeida, Capitão Engenheiro. Viagem de reconhecimento das comunicações do Brasil com a colônia holandesa do Suriname, 19 de junho de 1781. RIHGB, tomo 6, 1844, p. 84-90. 436 VIDAL. Laurent. Mazagão, a cidade que atravessou o Atlântico: do Marrocos à Amazônia (1769-1783). São Paulo: Martins Fontes, 2008. 437 PINTO, Manuel Serrano. Aspectos da história da mineração no Brasil colonial. In: FREITAS, Fernando Antônio de Lins. Brasil 500 anos: a construção do Brasil e da América Latina pela mineração. Rio de Janeiro: Cetem/MCT, 2000. 438 _____. O Intendente Câmara. Brasil Mineral, 167, 1998, p. 46-49. 138 inclusive, homenagem a Dom Rodrigo, ao nomear Monte Rorigo as minas de salitre por ele descobertas: Mas, Excelentíssimo Senhor, pelo que toca ao nome destes aprazíveis, e até hoje inominados montes, que deram sujeito a ela (...) não preza aos céus que ofenda eu a filosofia modéstia de Vossa Excelência! Monte Rorigo é uma cordilheira de formosos montes, e uma daquelas que por ventura o tempo nunca a aplainará, e tirará do número das montanhas. 439 Mas não apenas das práticas científicas se valia Dom Rodrigo para reorganizar a economia portuguesa, propondo a expansão das medidas para coibir as ações de contrabando de pedras e metais preciosos, sobretudo ouro e diamantes. Ou seja, foi este um período “marcado pela busca de superação do problema da mineração”, bem como pela necessidade em se diversificar seus setores, por meio do aumento da exploração do salitre, fundamental para o feitio da pólvora, bem como de outros minerais e metais, como o cobre, o chumbo, o ferro e a prata, todos importantes para as atividades de comércio e indústria. 440 O incentivo ao desenvolvimento da técnica e da tecnologia à época de dom Rodrigo também pode ser compreendido por meio da criação de instituições, como a Sociedade Real Marítima, Militar e Geográfica, criada em 1798, e que receberia a incumbência de restaurar a tradição lusa nos estudos náuticos, organizando o acervo e as atividades cartográficas do Reino, promovendo o aperfeiçoamento dos apetrechos náuticos e ajustando as atividades comerciais ultramarinas ao cenário político e econômico então vigente. Nota-se, em especial, que o viés que contemplava a História Natural estava presente no Estatuto deste empreendimento, com o propósito de “incentivar e complementar o conhecimento ilustrado como um meio ‘para poder elevar os domínios ao melhor estado de cultura, e promover as comunicações interiores, assim como favorecer o estabelecimento de manufaturas, que se naturalizem facilmente, 439 COUTO, José Vieira. Memória sobre as salitreiras de Monte Rorigo. Rio de Janeiro: Na Impressão Régia, 1809 [1803]; e FURTADO, Júnia Ferreira. Estudo Crítico. In COUTO, José Vieira. Memória sobre a Capitania das Minas Gerais; seu território, clima e produções metálicas; estudo crítico, transcrição e pesquisa histórica por Júnia Ferreira Furtado. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994. 440 SILVA, Clarete Paranhos Da Silva; FIGUEIRÔA, Silvia Fernanda De Mendonça. “Garimpando ideias: A “arte de minerar” no Brasil em quatro memórias na transição para o século XIX”. Revista da Sociedade Brasileira de História da Ciência. Rio de Janeiro, Vol. 2, Nº. 1, Jan./ Jun. 2004, p. 36. 139 achando uma situação territorial que mais lhes convenha.’”441 Presente em sua inauguração, Dom Rodrigo fez caloroso discurso, recomendando que a Sociedade se ocupasse com afinco dos objetos científicos a ela encarregados, e das cartas e instrumentos náuticos, “o primeiro e mais essencial objeto que deve merecer a atenção da Sociedade, e que é de esperar, consiga com grande e indefesso zelo publicar, no mais breve período possível, ao menos, aquelas de que há uma inteira falta, é uma absoluta necessidade”. Assim, esperava-se que, por meio da cartografia, fosse possível dar prosseguimento aos planos de navegação nos rios “Amazonas, Madeira e Guaporé, até o Mato Grosso, Tocantins, Goiás e Tapajós, que só por si fariam”, em suas palavras, “a glória de um Reinado”.442 Outra importante instituição para o desenvolvimento náutico, a Real Fábrica da Cordoaria e Lonas, também foi modernizada à época de Dom Rodrigo, para que nela fosse centralizado o feitio das manufaturas utilizadas nos navios, como cordas e velas, que passariam a ser fabricadas sem a dependência estrangeira, utilizando-se do “linho e cânhamo do Rio Grande, do Paraguai, e dos Campos de Curitiba”. Como consequência do ânimo dispensado às Ciências Náuticas e suas indústrias, a literatura sobre tais aspectos também sofre considerável impulso, com a tradução de importantes obras, como a Construcção, e analyse de proposições geometrica, e experiencias precticas, que servem de fundamento à architectura naval, 443 ou o feitio de estudos próprios à realidade lusa, como a Memória em que se exhorta, com o máximo interesse, o Reino de Portugal a fomentar a agricultura, a pesca e marinha (...), 444 ou ainda a Memória sobre a liberdade para o comércio do sal e pesca das baleias no Brasil, 441 CARDOSO, José Luís. Nas malhas do império: a economia política e a política colonial de D. Rodrigo de Sousa Coutinho. In: _____. (Org.). A economia política e os dilemas do império luso-brasileiro (1790-1822). Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2001, p. 91, apud CARDOSO, José Luís & CUNHA, Alexandre Mendes. “Discurso econômico e política colonial no Império Luso-Brasileiro (1750-1808)”. Tempo, vol. 17, nº. 31, 2011, p. 86. 442 COUTINHO, (Dom) Rodrigo de Sousa. Discurso I, feito pelo Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Dom Rodrigo de Sousa Coutinho na abertura da Sociedade Real Marítima, em 22 de Dezembro de 1798. In: FUNCHAL (Agostinho de Souza Coutinho, marquês do). O conde de Linhares Dom Rodrigo Domingos António de Sousa Coutinho. Lisboa: Typographia Bayard, 1908, págs. 105-115. Disponível em https://archive.org/details/ocondedelinhares00func. Acesso em 15 de agosto de 2014. 443 ATWOOD, George. Construcção, e analyse de proposições geometrica, e experiências practicas, que servem de fundamento à architectura naval. Impressa por ordem de Sua Magestade e traduzida do inglez por Antonio Pires da Silva Pontes. Lisboa: Officina Patriarcal de João Procopio Correa da Silva, 1798. 444 ANRJ, Manuscritos, Cód. 816. Memória em que se exhorta, com o máximo interesse, o Reino de Portugal a fomentar a agricultura, a pesca e marinha, que devem constituir a base das suas atividades e merecer preferência às demais. 6 f. 140 dentre outras. 445 Outra estratégia para que fosse dinamizada a economia metropolitana e, por consequência, as coloniais, passava pela difusão dos conhecimentos construídos por meio das viagens filosóficas, dos estudos realizados pelas demais instituições, como a Academia Real de Ciências de Lisboa, da difusão dos mesmos por intermédio de sua tipografia e de outras tantas, como a Typis Seminarri (Tipografia do Seminário), a Officina de Simão Thaddeo Ferreira e, em especial, outra casa tipográfica que se fez presente com grande vulto em Lisboa ao findar do século; a Casa Literária do Arco do Cego. Também projeto de Dom Rodrigo, a Casa Literária do Arco do Cego atuou como espaço destinado à tradução e impressão de memórias estrangeiras, 446 e instituição onde os letrados luso-brasileiros encontrariam apoio do Estado para publicar seus estudos. Buscava, também, conter gastos na impressão desta qualidade de publicação, muitas das quais até então realizadas em tipografias particulares. Ademais, a nova tipografia portuguesa eliminava que obras que apresentavam maior complexidade, como livros de fino acabamento ou que continham mapas e iluminuras, fossem enviadas para França e Inglaterra, para serem impressas, o que favorecia o compartilhamento de preciosas informações. Seu projeto e administração foram entregues nas mãos do naturalista luso-brasileiro Frei José Mariano da Conceição Veloso, de quem já tratamos no Primeiro Capítulo, e que se fazia presente em Lisboa desde 1790, atuando na tradução de obras estrangeiras, a convite do então Vice-Rei do Brasil, Luis de Vasconcelos e Sousa. À frente do novo empreendimento, rapidamente Frei Veloso se cercou de assistentes, muitos dos quais concludentes dos cursos da Universidade de Coimbra, igualmente luso-brasileiros, que o auxiliavam nos processos de tradução, edição e publicação. Em agosto de 1799, o Arco do Cego imprimiu seu primeiro livro, a Memória sobre a cultura dos algodoeiros (...), de autoria do luso-brasileiro Manuel Arruda da Câmara, 447 primeira das 88 obras publicadas sob o selo da tipografia em seus 28 meses 445 ANRJ, Manuscritos, Cód. 807, v. 24/62. Memória sobre a liberdade para o comércio do sal e pesca das baleias no Brasil. 446 Seria renomeada em sua curta existência como Casa Tipográfica do Arco do Cego, a partir de 1800 e, mais à frente, como Tipografia Calcográfica, Tipoplástica e Literária do Arco do Cego. 447 CÂMARA, Manuel Arruda da. Memória sobre a cultura dos algodoeiros, e sobre o método de escolher, e ensacar, etc., em que se propõem alguns planos novos para o seu melhoramento. Lisboa: Officina da Casa Literária do Arco do Cego, 1799. 141 de funcionamento (entre agosto de 1799 e dezembro de 1801), dos quais 36 escritos por autores luso-brasileiros, 46 obras traduzidas e 6 publicações em latim. Importante ressaltar que em um período histórico em que a língua latina exercia a predominância nos meios acadêmico e científico, a publicação de grande quantidade de títulos na língua portuguesa revela um claro indício de que Portugal procurava difundir e fazer conhecer as obras e, principalmente, os conhecimentos ali impressos. Ainda que seja evidente a função da tipografia do Arco do Cego para a difusão dos conhecimentos adquiridos por meio das pesquisas em História Natural, faz-se necessário mencionar que antes mesmo de sua inauguração, as remessas dessa qualidade de publicação para o Brasil já haviam se intensificado, como as obras Memória sobre a reforma dos alambiques, de João Manso Pereira, e Método de preparar a cochonilha, de João Procópio Correia da Silva, enviadas por Dom Rodrigo enviadas por meio de um Ofício, no ano de 1798, para se “espalhar entre os Habitantes do Brasil conhecimentos de que se lhes pudessem seguir vantagens consideráveis”.448 Tão logo impressas, a partir de 1801, as obras do Arco do Cego começaram a se fazer presentes nas Minas. Ao receber uma caixa de impressos despachados desde a tipografia, Bernardo José de Lorena tratou de transmiti-los a homens de sua confiança, como o coronel Carlos José da Silva, receptário com a incumbência de dar continuidade à distribuição, repassando-os aos oficiais de sua confiança sem, contudo, deixar de remeter “o seu valor ao Secretário do Governo para ser enviado à Secretaria de Estado desta repartição”. 449 Em uma das ocasiões, constavam, dentre outras obras, dois exemplares do Manual do Mineralógico (...), de Bergman, traduzido por frei Veloso; 450 e outros dois exemplares d’O Fazendeiro do Brasil, de Frei Veloso.451 No ano seguinte, nova remessa de livros enviados por Lorena chegaria às mãos 448 Outras sete obras compunham a lista anexa ao Ofício de Dom Rodrigo. Basicamente, títulos que versavam sobre o cultivo da canela, a produção de tabaco, um ensaio teórico sobre a quina e outros tantos sobre a extração do salitre. Além dos impressos, eram comuns as recomendações presentes no corpo do Ofício para que as autoridades receptarias fizessem “o uso que melhor [pudesse] corresponder às benignas Intenções de Sua Majestade para o aumento da Riqueza Nacional”, ou seja, deveriam ser empregadas de forma prática, dando-lhes destinos coerentes de acordo com suas especificidades, e se possível, aproximando-as das atividades da agricultura e a indústria. In: APM, SC-283, 1798. Originais de Cartas Régias e Avisos (1798), fls. 1-1v. 449 APM, SC-277. Registros de Cartas do Governador a várias autoridades e destas ao mesmo (1797-1803), fl. 1798. Originais de Cartas Régias e Avisos (1798), fls. 86. 450 BERGMAN, Torben. Manual do Mineralógico, ou esboço do Reino Mineral, dispostos segundo a análise química. Lisboa: Casa Tipográfica do Arco do Cego, 1799. 451 VELOSO, (Frei) José Mariano da Conceição. O Fazendeiro do Brasil. Lisboa: Casa Tipográfica do Arco do Cego, 1799. 142 do coronel Carlos José da Silva e de outras autoridades coloniais. 452 O teor da correspondência escrita pelo governador em nada se mostrava diferente daquela enviada no ano anterior, incluindo as recomendações. Desta vez, no entanto, a remessa era mais volumosa, constando 14 títulos assim distribuídos: 01 Manual do Mineralógico (...), de Bergman; 453 02 unidades d’O Fazendeiro do Brasil, de Frei Veloso;454 02 impressos versando sobre a produção de linho e cânhamo; 455 04 sobre o cravo da Índia; 456 02 unidades do que possivelmente é a Proposta para uma nova subscrição (...), sobre a utilização de maquinários nas atividades de agricultura e indústrias, do Conde de Rumford, 457 02 unidades do A Ciência das Sombras relativas ao desenho, de Dupain de Montesson, obra técnica e didática sobre a prática do desenho traduzido por Frei Veloso, 458 e um exemplar da Memória sobre a cultura dos algodoeiros (...), de Manuel Arruda da Câmara. 459 Outros tantos ofícios destinados aos capitães-mores de várias vilas e arraiais da capitania como Campanha, Congonhas, Guarapiranga, Piranga, Sabará e Vila Nova da Rainha de Caeté, bem como para os coronéis comandantes dos 2° e 3° Regimentos das Comarcas do Rio das Mortes e do Rio das Velhas, respectivamente, foram expedidos em sequencia, de modo que uma simples soma dos impressos relacionados nos ofícios em questão nos revela, apenas para o ano de 1802, um total de 227 obras distribuídas na capitania de Minas Gerais, 460 para além de que as outras capitanias também receberam 452 APM, SC-277. Registros de Cartas do Governador a várias autoridades e destas ao mesmo (1797-1803), Originais de Cartas Régias e Avisos (1798), fls. 98. 453 BERGMAN. Manual do Mineralógico. 454 VELOSO, (Frei) José Mariano da Conceição. O Fazendeiro do Brasil. Lisboa: Casa Tipográfica do Arco do Cego, 1799. 455 _____. Collecção de memorias inglezas sobre a cultura e comercio do linho canamo tiradas de differentes authores que devem entrar no quinto tomo do Fazendeiro do Brazil. Lisboa: Officina de Antonio Rodrigues Galhardo, 1799. 456 Provavelmente, trata-se do FOURCROY, Antoine-François. Memória sobre a cultura, a preparação do Girofeito aromático, vulgo Cravo da Índia, nas Ilhas de Bourbon e Cavena. Lisboa: Officina de João Procópio Correa da Silva, 1798. 457 RUNFORD, Conde de. Proposta para uma nova subscrição na Metrópole do Império Britânico uma instituição pública para derramar e facilitar a geral introdução das úteis invenções mecânicas e melhoramentos e para ensinar por meio de cursos de lições filosóficas, e experiências, aos comuns fins da vida. Lisboa: Officina de Antônio Rodrigues Galhardo, 1799. 458 MONTESSON, Dupain. A Ciência das Sombras relativas ao desenho. Lisboa: Officina de Procópio Correa da Silva, 1799. 459 CÂMARA. Memória sobre a cultura dos algodoeiros. 460 APM, SC-277, Registro de cartas do Governador a várias autoridades e destas ao mesmo, (1797-1803), fls. 98-98v. 143 tais publicações, 461 o que consolida a perspectiva de que os esforços da Coroa em prol do aperfeiçoamento de práticas agrícolas, do aproveitamento da terra arável e do incentivo ao estabelecimento de novas manufaturas e indústrias de base rural não foram restritas aos maiores centros urbanos, como Rio de Janeiro e Vila Rica. Apesar dos investimentos, o Arco do Cego não resistiu ao tempo, e entrou em colapso financeiro por meio de uma dívida por ela mesma criada, ao enviar suas centenas ou mesmo milhares de publicações para serem comercializadas no Brasil esperando receber, rapidamente, os valores devidos, o que não aconteceu, encerrando suas atividades em dezembro de 1801, sendo seu patrimônio transferido para a Tipografia Régia, assim como muitos dos seus funcionários. Frei Veloso somente retornaria ao Brasil junto com a Corte, em 1808, onde daria continuidade às suas pesquisas botânicas. Deve-se levar em conta que o projeto do Arco do Cego não apresentou os resultados esperados tão só pelo déficit financeiro que se estabeleceu na instituição. A falta de intimidade para com as letras e as instruções técnicas daqueles que deveriam ter contado com tais obras, os agricultores, na parte mais baixa da cadeia hierárquica, também deve ser considerado quando do levantamento das hipóteses que tratam do fracasso da tipografia. Em determinado evento acadêmico, me foi transmitida a anedota de que as obras do Arco do Cego eram utilizadas, ao longo da primeira metade do século XIX, para embalar peixes e queijos no Rio de Janeiro. Outras críticas, devidamente embasadas, davam conta de que os livros daquela tipografia eram minimamente úteis para calçar algum pé de mesa mais curto. 462 Também as desavenças em relação à eficiência do que era impresso e à própria ciência produzida em Portugal e em seus domínios estavam presentes, inclusive, nos círculos de letrados. Wilhelm 461 Corrobora com esta afirmação o estudo realizado por Marcelo Galves, sobre os livros à venda em São Luis do Maranhão no final do século XVIII e primeiros anos do século posterior. O pesquisador encontrou grande quantidade de impressos pragmáticos, muitos dos quais com o selo do Arco do Cego, como a Memória sobre a cultura dos algodoeiros (...) e o Naturalista instruído (...), de Frei Veloso. Ao mencionar os valores que as obras eram oferecidas ao público em São Luís, Galves nos possibilitou verificar que tanto no Maranhão quanto nas Minas os títulos eram comercializados pela mesma monta. Em estudo similar para a Capitania de Santa Catarina, Felipe Matos também identificou publicações do Arco do Cego circulando entre os leitores da vila de Nossa Senhora do Desterro, como o já mencionado O Fazendeiro do Brasil. Ver: GALVES, Marcelo Cheche. Cultura letrada na virada para os oitocentos: livros à venda em São Luís do Maranhão. Anais do XXVII Simpósio Nacional de História. Natal, 2013, p. 10-11; KURY. Homens de ciência no Brasil, p. 109-129; MATOS, Felipe. A circulação dos livros da Tipografia do Arco do Cego em Nossa Senhora do Desterro (Florianópolis, século XVIII). Anais da VII Jornada Setecentista. Curitiba, 2007, e WEGNER, Robert. Livros do Arco do Cego no Brasil Colonial. História, Ciências, Saúde: Manguinhos, Vol. 11, 2004, p. 133. 462 CABRAL, Osvaldo. Nossa Senhora do Desterro. Memória 2. Florianópolis: Lunardelli, 1979, p. 91, apud MATOS, Felipe. A circulação dos livros da Tipografia do Arco do Cego em Nossa Senhora do Desterro (Florianópolis, século XVIII). Anais da VII Jornada Setecentista. Curitiba, 2007, p. 311. 144 Ludwig von Eschwege (1777-1855), em 1833, teceu severas críticas sobre o insucesso de João Manso Pereira em implantar uma fábrica de ferro em São Paulo, utilizando dos conhecimentos de que dispunha: Em 1801, um certo João Manso, mulato de nascimento, tendo extraído dos livros alguns conhecimentos químicos e portanto, segundo o modo de pensar dos portugueses e brasileiros, devia estar habilitado para fabricar ferro, obteve do governo a incumbência de construir um novo forno de fundição. (...) Construíram eles um alto forno de tijolos, nas terras do capitão mor de Sorocaba e assentaram um fole manual, certos de terem feito o necessário para dar início a fundição. Várias das mais importantes pessoas das vizinhanças foram convidadas como para uma grande festa. Como é fácil de prever, apesar de acionarem o fole e descarregarem o carvão e minério no forno, nenhum ferro apareceu no cadinho. João Manso e o inspetor fugiram às escondidas dali, e os convidados, indignados, tiveram de voltar para as suas casas. Foram feitos todos os esforços para se chegar a um resultado, porém inutilmente. João Manso, homem de muito tino, que mais tarde vim a conhecer, ria-se gostosamente de toda essa história, tendo chegado à conclusão de que para fabricar ferro em grande escala não bastavam conhecimentos de Química. 463 Se, em Lisboa, a tipografia do Arco do Cego não alçou projeção a ponto de ser considerada essencial para o andamento das atividades vinculadas às pesquisas filosóficas, do outro lado do Atlântico seus produtos foram igualmente alvos de desconfiança. No âmbito da agricultura, por exemplo, a elite luso-brasileira, incrédula com o potencial dos impressos, ignorava estas publicações, “desprezando os novos gêneros de literatura didática voltados para a melhoria da agricultura, das manufaturas e de zootecnia”.464 Não que fossem os livros ou seus conteúdos os responsáveis por gerar receio e desconfiança naqueles que das culturas da terra dependiam, mas sim a práxis, há muito consolidada que previa condutas muitas vezes completamente distintas daquelas presentes nos impressos. Obviamente, concorriam ainda para tal cenário o desconhecimento das letras por parte da quase totalidade daqueles que estavam diretamente relacionados aos processos de produção, de modo que a presença de tais impressos por si só não foi suficiente para estabelecer novos rumos aos setores a que eram direcionados. 463 ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Pluto Brasiliensis, Vol. 2. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1979, p. 202-3. 464 KURY. Homens de ciência no Brasil, p. 112. 145 Mais valor teriam as práticas realizadas por meio dos exemplos, da observação e da reprodução, pelo que foram fundamentais, nesse ínterim, a interação entre os letrados e o público alvo, basicamente o que Veloso de Miranda também faria a partir de 1798, quando inaugura o Horto Botânico de Vila Rica, por meio do qual buscou ajuizar novas propostas para o desenvolvimento da agricultura entre os mineiros, mote que tem início no capítulo seguinte, com o retorno do naturalista à América portuguesa. 146 PARTE 2: UM SAVANT MAZOMBO DE VOLTA ÀS MINAS 147 CAPÍTULO 4 DAMIÃO DOS SAIS, VELOSO DAS VELLÓSIAS: ENTRE PESQUISAS BOTÂNICAS E MINERALÓGICAS 4.1 – De volta às Minas, um padre sem batinas Após quase dez anos em Portugal, já graduado e doutor em Filosofia pela Universidade de Coimbra e possuidor das honras que conquistou por meio dos estudos, Veloso de Miranda retornou a América portuguesa. Antes de partir de Lisboa, no entanto, cuidou para que a continuidade de suas responsabilidades docentes junto a Universidade de Coimbra fossem plenamente asseguradas, sendo transmitidas ao português Francisco Antônio Ribeiro de Paiva (1757-1831) que, segundo Caio Boschi, passou a receber metade da remuneração de um professor, 75$000 réis por ano. Por seu turno, na América, Veloso de Miranda continuaria recebendo vencimentos equivalentes à outra metade para se dedicar às pesquisas nas Minas. 465 Veloso de Miranda alegara motivos particulares para retornar a América, e a 30 de outubro de 1799 transpôs a barra de Lisboa embarcado, provavelmente, no navio Nossa Senhora da Luz e São Pedro, que havia chegado em Lisboa um mês antes, vindo do Rio de Janeiro, carregado de açúcar, arroz, aguardente e outros gêneros de secos e molhados, retornando à mesma conquista em 27 de outubro. 466 Embarcado, Veloso de Miranda vivenciou 65 dias de viagem que começaram com um “tufão de vento” na costa portuguesa, e que terminariam com um “mar de bonança” já no Atlântico sul.467 Antes de desembarcar no Rio de Janeiro, é bem provável que o Nossa Senhora da Luz e São Pedro tenha aportado em Salvador, “a maior praça comercial da Bahia”, 465 AUC, Livro da Tesouraria Geral da Junta da Fazenda da Universidade de Coimbra para a Folha Acadêmica dos ordenados do ano de 1780, fl. 89. Cota IN-1ª. D-11-5-nº. 48 e 49, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 118. Francisco Antônio Ribeiro de Paiva assentara matrícula nos cursos de Filosofia, Matemática e Medicina respectivamente em 1773, 1774 e 1777. Permaneceria ocupando o lugar que fora de Veloso de Miranda até 1783, quando passou a ocupar as cadeiras de Física Experimental, até 1791 e de Zoologia e Mineralogia, de 1791 até 1813, sempre como substituto. Foi agraciado como Cavaleiro da Ordem de Cristo e Sócio da Academia Real das Ciências. São dele as seguintes obras: De Aquis Mineralibus dissertatio [manuscrito]. Coimbra, 1778, 8 fl.; De chemiae utilitate dissertatio [manuscrito]. Coimbra, 1778, 7 fl., e Introductiones zoologicae, in quibus termini ad historiam animalium intelligendam explicantur, & litteratorum inventa, ac illustrationes, quae hucusque in lucem prodiere, referuntur. Additis Tabulis zoologicis systematicis, omnia in tironum usum ac utilitatem accommodata, & secundum linneanam methodum concinnata. Coimbra: Typis Academicis, 1794. 466 AML, Marco dos Navios, Livro das entradas de navios portugueses, IMPS/01/0005, 1779-01-25 – 1779-12-13, fl. 50. 467 APM, FJB. Cota I. 1/I-2-1/276. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Domingos Vandelli. Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1780. 148 “ponto neurálgico dos intercâmbios no Atlântico-Sul” e “maior centro comercial da América lusitana, até ser superado pelo Rio de Janeiro”, em 1749.468 Salvador era, sobretudo, importante “porto de desembarque das naus rumo ao oriente e ao Reino” e também “importante centro de difusão” e de trânsito de amostras da História Natural das conquistas ultramarinas lusas. 469 Ao desembarcar no Rio de Janeiro, Veloso de Miranda procurou Dom Rodrigo José de Menezes e Castro (1750-1807), o novo governador das Minas que também há pouco desembarcara, vindo do Reino, tendo sido recebido “com toda a benignidade” e recebendo promessas de ser ajudado “no que fosse necessário a respeito da História Natural”.470 O futuro naturalista estendeu sua estada na cidade por um mês, para se refazer dos incômodos da viagem, e aproveitou para observar o que a região dispunha no tocante à História Natural. Velos de Miranda voltaria sua atenção para diversos outros gêneros encontrados na cidade ou seus arredores, como a cochonilha, o anil, o café, a baunilha e o cacau, este último cultivado no convento dos Barbadinhos italianos, onde se produzia, inclusive, chocolate. Aproveitou ainda para comprar, em uma velha botica que havia sido dos jesuítas, a obra Historiae Universalis plantarum, do médico e botânico suíço João Bauhino (1541-1613), contemporâneo do célebre Amato Lusitano, em três volumes que, anos mais tarde, ainda figurava em meio a sua livraria particular, então avaliada em 6$400 réis e arrolada quando da realização do seu inventário post-mortem. 471 Na carta 468 JUNQUEIRA, Lucas de Faria. A Bahia e o Prata no Primeiro Reinado: comércio, recrutamento e guerra cisplatina. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal da Bahia, Salvador. 2005, p. 19. 469 Diversos apontamentos revelam o trânsito de exemplares da História Natural brasílica e africana, inclusive, pelo porto de Salvador. Francisco Inocêncio de Sousa Coutinho (1726-1780), governador de Angola, por exemplo, não se furtou a enviar a Lisboa “um leão branco capturado quando passeava à noite pelas ruas de Luanda”, o qual foi visto na Bahia, acompanhado de algumas zebras, que também tinham Lisboa como destino. In: Boletim do Arquivo Histórico e da Biblioteca do Museu de Angola, Nº. 11, 1954, p. 7, apud PATACA, Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 347; e CRUZ, Ana Lúcia Rocha Barbalho da. “As viagens são os viajantes: dimensões identitárias dos viajantes naturalistas brasileiros do século XVIII”. História: Questões & Debates. Curitiba, Nº. 36, 2002, p. 80.Em outra remessa, que teve Recife como porto de passagem, o governador da capitania de Pernambuco, Luis Diogo Lobo da Silva (1717-?), dava contas ao Secretário de Estado da Marinha e Ultramar, Francisco Xavier de Mendonça Furtado (1700-1769), da remessa de um elefante, pássaros e de galinhas de Angola na charrua são José. AHU, PE, Cx. 99, Doc. 7758. 16 de abril de 1763. Também o porto de São Luís, no Maranhão, recebia embarcações que haviam partido dos portos africanos e tinham Lisboa como destino: AHU, MA, Cx. 42, Doc. 4134. Carta do provedor e capitão-general do Maranhão, Joaquim de Melo e Póvoas ao Rei D. José, sobre a chegada de um navio de Angola que trazia cartas para o Monarca. São Lázaro. [São Luis do] Maranhão, 16 de agosto de 1765. 470 AMP, FJB, Cota I. 1/I-2-1/276. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Domingos Vandelli. Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1780. 471 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 31. 149 em que enviou notícias à Vandelli, fez ainda alguns apontamentos sobre o que viu no mar, relatando que tudo o que se pescou foram não mais do que “alguns peixes ordinários”, como a Ecleneis remora, “sobre que tanto se tem fabulado”,472 talvez fazendo referência à crença popular de que poderiam, assim como fazem com os tubarões, se agarrar aos navios, atrapalhando-os no progresso em alto mar. 473 O período de permanência no Rio de Janeiro permitiu o estudo de algumas plantas que foram alvos de sua curiosidade. Em carta, relatou à Vandelli que não concordava em tudo com os pensamentos expressos na bibliografia produzida por Lineu, sobretudo ao confrontar os nectários da Phyllantus Viruria e a corolla da Mirya Orellana. 474 Observa-se aqui que ele não se portava como um receptor passivo das teorias que adquiria nos livros dos grandes mestres europeus. Ao contrário, seu espírito crítico baseava-se na prática para criticar a tradição e desenvolver teorias próprias. Nesse sentido, observa-se que a América tornava-se centro de produção de conhecimento, rompendo com as análises clássicas de centro-periferia, ainda que os tradicionais fluxos de produção de conhecimento eurocêntricos, em grande parte, não tenham sido capazes de absorver, ou serem impactados, por esse estimulante ambiente intelectual vivido por esses jovens naturalistas luso-brasileiros. Veloso de Miranda deve ter deixado a praça comercial do Rio de Janeiro por volta do dia 5 de fevereiro, provavelmente não acompanhando as festividades da posse de Dom Rodrigo, ocorridas a 20 de fevereiro, em Vila Rica. 475 É plausível que tenha partido embarcado a partir do Porto dos Mineiros, como se fazia à época, navegando pela última vez as águas da baía da Guanabara em direção à foz do rio Inhomirim, do outro lado da baía, onde um quarto de légua acima estava localizado o Porto da Estrela, de onde seguiu para as Minas em comitiva, através do Caminho Novo. Cruzar o rio Paraibuna e ser fiscalizado pelos Dragões no Registro de Matias Barbosa marcava a entrada em sua capitania de origem. Estes postos eram símbolos da presença do Estado português em suas conquistas e locais onde se cobrava a licença necessária para se entrar no território, se exercia o controle sobre quem saía, buscando 472 AMP, FJB. Cota I. 1/I-2-1/276. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Domingos Vandelli. Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1780. 473 BINGLEY, William. Animal biography, or, Popular zoology, Vol. III. London: F. C. and J. Rivington, 1829, p. 254. As rêmoras também foram pescadas nas viagens filosóficas do Pará, de Alexandre Rodrigues Ferreira, e de Angola, de José Joaquim da Silva. In: PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 211. 474 AMP, FJB, Cota I. 1/I-2-1/276. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Domingos Vandelli. Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1780. 475 RAPM. Posse de Dom Rodrigo José de Menezes. Ano 9, Jan.-Jun. Bello Horizonte: Imprensa Official do Estado de Minas Gerais, 1904, p. 320. Também Gazeta de Lisboa, 14 de abril de 1780. 150 detectar, em meio as bagagens e fardos, o contrabando e o descaminho de pedras e metais preciosos, e se cobrava os impostos devidos a mascates e demais mercadores, procedimentos que seriam realizados novamente mais a frente, em outro Registro, chamado de Velho, situado em Barbacena, já nas proximidades da serra da Mantiqueira. De volta ao centro da região mineradora, Veloso de Miranda deve ter se dividido entre as atenções dispensadas à família, no Inficionado, e as primeiras pesquisas em História Natural, que realizou na Cidade de Mariana, estabelecendo-se à casa de um padre, a partir de onde “coletou e descreveu uma grande parte das plantas que se apresentam para suas pesquisas nos arredores férteis e montanhosos daquela cidade”.476 Mais tarde, já em Vila Rica, fixou residência a Rua de São José, em casa de número 539, 477 situada de frente para o chafariz e para a Casa de Fundição, próximo à ponte dos Contos, e que, em 1816, foi avaliada em 1:000$000 de réis. 478 Era, à época, e ainda é, um casarão assobradado, com uma escada de pedra que dá acesso ao andar superior, com cimalhas por baixo do telhado na testada e com os elementos visíveis das portas esculpidos em pedra, em volta redonda, e não em madeira, como era mais comum. Havia ainda “outros quartos por baixo”, onde poderiam ser guardados os apetrechos que não se enquadrassem no ambiente residencial, como as ferramentas ou os instrumentos de um naturalista, caso de Veloso de Miranda, além dos espécimes por ele coletados. Era uma propriedade toda coberta de telhas, com pátio de lajes e quintal murado de pedras, que recebia água da sobra do chafariz e ostentava vidro em várias janelas, também símbolo de distinção entre os mais ricos, e que possibilitava clarear o interior das residências mais abastardas, enquanto as casas mais pobres, geralmente úmidas e escuras, possuíam apenas gelosias, isto é, o fechamento de janelas com madeira. Eram seus vizinhos, pelo lado direito, em um sobrado situado às margens do córrego dos Contos, Teodósio Bernardes da Fonseca, que ali morava com seus três filhos: Teodósio, o filho, escultor e ourives, e as irmãs Maria e Ana. 479 Na casa 476 ALMANACK DE LISBOA, 1786, p. 54. Stellfeld, no entanto, afirmou que Veloso de Miranda teria permanecido durante “um ano no convento de Mariana”, ou seja, no seminário que havia frequentado. In: Stellfeld. Os dois Vellozo, p. 239. 477 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 51v. 478 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 6v. 479 MATHIAS. Um recenseamento na Capitania de Minas Gerais, p. 96. Teodósio, o filho, é apontado como ourives em A Igreja de São José, em Ouro Preto (documentos do seu arquivo). RELAÇÃO dos oficiais que trabalharam em São José. Revista do patrimônio histórico e artístico nacional, nº. 13, 1956, p. 196. 151 seguinte, de apenas um andar, moravam João Rodrigues Barbosa, 45 anos, e sua esposa, Joaquina, 27. 480 Pelo lado esquerdo, junto ao Largo do Chafariz, era morador o capitão João Antônio da Rocha, futuro fiscal na Real Casa da Intendência de Vila Rica entre os anos de 1800 e 1803 481 e que tentaria, em 1813, atuar como fiscal da Intendência na vila de Queluz, não logrando êxito por ser considerado naquela praça pessoa de má reputação. 482 Pelos fundos, sua propriedade fazia divisa com aquela pertencente ao comerciante português José Bento Soares, 483 sargento-mor que, em 1816 viria a arrematar, em sociedade com o tenente Francisco de Paula Dias Bicalho e outros, autorização para a abertura de uma fábrica de pólvora em Vila Rica, a qual não teria entrado em funcionamento até, pelo menos, o ano de 1822. 484 Nas imediações, além dos vários estabelecimentos comerciais de secos e molhados, como o de dona Joaquina Rosa do Sacramento ou aquele pertencente a Bernardo Francisco Xavier, poderiam ser encontrados outros préstimos como sapateiros, alfaiates e cabeleireiros, caracterizando a zona comercial que dali se estendia até a rua Direita e desta, em direção ao alto do Morro de Santa Quitéria. Para além da descrição sumária constante no inventário de Veloso de Miranda, verifica-se que sua residência era, de fato, distinta da grande maioria das casas de Vila Rica. A água que recebia no interior de sua casa, ainda que refugo do chafariz, por si só demonstrava que era diferente das demais, comumente desprovidas desse recurso, cabendo, neste caso, às mulheres pobres, aos escravos particulares ou aos de ganho, se assim o proprietário pudesse deles se dispor, buscar água nos chafarizes para o consumo familiar, situação esta que aparentemente não causaria maiores preocupações a Veloso de Miranda. No que toca ao abastecimento público de águas, Vila Rica foi bastante privilegiada ao possuir várias nascentes que eram direcionadas, a partir do alto dos 480 MATHIAS. Um recenseamento na Capitania de Minas Gerais, p. 96. 481 APM, FCMOP, caixa 72, doc. 37. Documento aprovando o nome do fiscal João Antônio da Rocha, para servir na Real Casa da Intendência de Vila Rica, no trimestre outubro/dezembro de 1800. Vila Rica, 10 de maio de 1800; e APM, CC, Cx. 30, doc. 10614. Carta de Florêncio de Abreu Perada à Câmara de Vila Rica sobre a eleição e aprovação do capitão João Antônio da Rocha para o cargo de fiscal da Intendência. Vila Rica, 07 de setembro de 1803, respectivamente. 482 APM, SG 16, Cx. 89, Doc. 36. Representação que fazem os oficiais da Câmara à Sua Alteza Real, protestando contra a eleição do capitão João Antônio da Rocha para juiz ordinário da vila e termo de Queluz, por se tratar de pessoa de má reputação e imploram para que se proceda a novos pelouros. Queluz, 30 de novembro de 1813. 483 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 6v. 484 APM, CC, Cx. 46, Doc. 30275. Carta de Antônio Tomaz de Figueiredo Neves, Teotônio Álvares de Oliveira Maciel, Francisco Lopes de Abreu, José Ferreira Pacheco, Joaquim José Lopes Meneses [Ribeiro], José Bento Soares, João José Lopes Mendes Ribeiro, Manuel Inácio de Melo e Souza, José Bento Leite Ferreira de Melo, a José Bonifácio de Andrada e Silva sobre a impossibilidade da execução do decreto de 16 de fevereiro na capitania de Minas Gerais. Vila Rica, 22 de março de 1822. 152 morros, através de valos e bicames, a regiões específicas do núcleo urbano, para então serem distribuídas à quase totalidade da população nos chafarizes e fontes públicas. Por meio da leitura do inventário de Veloso de Miranda pode-se constatar como era estruturada uma distinta casa setecentista em Vila Rica. Os detalhes sobre seus bens possibilitam averiguar a constituição de riquezas e os padrões de vida e de consumo que eram difundidos no período em questão, sobretudo por ocasião da apresentação pública, quando se ornar com o que mais valioso havia em questão de joias, roupas e sapatos era mais significativo para a sociedade do que para a pessoa que o fazia. Também a aparência da residência era responsável por colocar em destaque o proprietário, sobretudo no recorte histórico em questão, quando se buscava encobrir a rusticidade do viver em uma vila do ouro, ornando as residências à moda europeia. Mais do que os depoimentos registrados pelos olhares de viajantes, aos quais estavam fechados os espaços íntimos e a cozinha, e facultado apenas o acesso à sala e, quando muito, ao quarto de hóspedes, os inventários nos possibilitam um passeio ao que de mais pessoal se encerrava no interior das habitações mineiras, revelando vez ou outra o gosto apurado daqueles que dispunham de fazendas para manter um elevado padrão de vida. O recheio da casa de Veloso de Miranda em Vila Rica era como ele; distinto. Os quase dez anos em que passou na Corte despertaram gostos e gestos que não teria cultivado se tivesse passado a vida inteira morando no Inficionado. Em Coimbra e Lisboa, aprendeu não apenas a ser um membro da elite, mas notabilizou-se pela convivência e pela etiqueta que aprendeu, adquirindo gostos e anseios que com ele cruzariam o Atlântico e se sedimentariam nas Minas. Na sala, a “primeira peça” da casa, conforme se referiu Saint-Hilaire a este cômodo, espaço de cerimônia onde os convidados eram recebidos, 485 as alfaias, representadas por uma poltrona forrada em pele de ariranha, revelando o gosto peculiar do naturalista, talvez sendo-lhe a preferida, 486 e outros assentos mais rústicos, como bancos de madeira branca ou em jacarandá, e tamboretes no mesmo material, deveriam estar distribuídos no ambiente. 487 Também uma portada com um reposteiro de algodão tinto era responsável por decorar o ambiente, bem como restringir a visão das vistas ao 485 SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem às nascentes do rio São Francisco. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1975, p. 56. 486 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 19. 487 Idem, fl. 5v. 153 interior do imóvel. 488 Dificilmente se mostraria ausente, neste ambiente, um porta chapéus, onde também eram penduradas bengalas, chicotes e rédeas. 489 Em outros ambientes, era de se esperar a presença de vários objetos deveriam estar dispersos sobre as mesas e aparadores que o naturalista possuía. Candeeiros de latão, em bom número, iluminavam a residência à noite. O castiçal de prata, com a mesma função, talvez fosse mais utilizado como objeto de decoração. Uma campainha de bronze deveria ser utilizada para chamar a atenção de um pajem. Quanto à viola, infelizmente não é possível saber se Veloso de Miranda a manuseava com arte, ou se assim fazia um de seus escravos. 490 Segundo Robert Smith, vistas de interiores das casas no período colonial eram extremamente raras, assim como também eram mínimas as ornamentações nos ambientes, mesmo nas melhores casas. 491 A residência de Veloso de Miranda, no entanto, se mostrava diferente. Nas paredes, algumas singularidades como “cinco mapas de sala”, “um quadro de Mafra”, “doze quadros de estampas diversas com vidros e molduras” e “um quadro das pessoas reais com moldura dourada e vidro” ornavam os ambientes, 492 o que absolutamente não era comum para as cidades coloniais, conforme ressaltou Mello e Souza. 493 O quarto de dormir da casa ou, a alcova, como à época, era possuidor de móveis e acessórios que deixavam transparecer o gosto apurado do proprietário. Uma caixa de casco de tartaruga deveria fazer as vezes de porta joias. Para dormir, lençóis de algodão fino forravam o colchão, provavelmente recheado de capim ou paina. A higiene pessoal haveria de ser realizada em um dos dois semicúpios de cobre – os banhos de assento – de que dispunha, não sendo este, contudo, um hábito diário à época. A higiene do corpo era finalizada com as toalhas da Bretanha, 494 e com a aplicação de perfumes ou bálsamos. Outros quartos certamente estariam a disposição para receber convidados, 488 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 26. 489 SAINT-HILAIRE. Viagem às nascentes do rio São Francisco, p. 56. 490 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 6,13,14 e 20, respectivamente. 491 SMITH, Robert. Arquitetura Civil do período Colonial. Arquitetura Civil 1: Textos escolhidos da Revista do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. São Paulo: FAU-USP e MEC-IPHAN, 1975, p. 177. 492 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 20. 493 MELLO E SOUZA, Laura de. Cláudio Manoel da Costa. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, 140-146. 494 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 5v, 24 e 77, respectivamente. 154 como o colega, bacharel e naturalista José de Sá Bittencourt e Câmara, coronel de milícias e seu hóspede quando da noite do complô da Inconfidência. 495 Para estes, o tratamento dispensado deveria ser a altura da relevância do convidado; lençóis de pano de linho para os menos distintos ou de algodão para os mais importantes. 496 Como era comum, é provável que a cozinha da residência de Veloso de Miranda estivesse localizada nos fundos da casa, ou mesmo em um alpendre, sendo este um espaço comumente restrito às mulheres e aos escravos, como observou Saint-Hilaire, onde estes poderiam ter maior liberdade servindo, nas palavras do naturalista francês, como “uma fraca compensação de seu cativeiro”.497 Neste espaço, um fogão de barro socado sustentava uma trempe de ferro de três bocas, e para o preparo dos alimentos eram utilizados tachos de cobre ou panelas de barro queimado. 498 No quintal, atrás da residência, à moda e respeitando determinação oficial, 499 provavelmente Veloso de Miranda cultivava alguns exemplares botânicos de interesse farmacológico, bem como frutas e legumes. Nas residências mais distintas, as refeições se davam em ambiente específico, a sala de jantar. Na residência de Veloso de Miranda, uma grande mesa de jacarandá, com cadeiras no mesmo material, servia a esse propósito. Para o consumo, pratos em pó de pedra 500 ou em estanho serviriam bem a alimentação diária. Os talheres, denominação inexistente à época, eram compostos por colher e garfo e, em menor número, por algumas facas, 501 pois era comum que cada comensal carregasse a sua em um jantar. Ademais, quase nunca esse material era utilizado, haja vista que o difundido hábito de comer o trivial (feijão e farinha de milho ou de mandioca acompanhados de toucinho ou carne cozida) com as mãos, juntando-se o alimento com não mais do que três dedos, como mandava a informal etiqueta, era o mais corriqueiro, conforme demonstrou Júnia 495 BRASIL. Autos da devassa da Inconfidência mineira, Vol. 9, p. 403-404. José de Sá Bittencourt e Câmara era, ainda, irmão mais velho do também naturalista Manuel Ferreira da Câmara Bittencourt. 496 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 24. 497 SAINT-HILAIRE. Viagens pelas Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais, p. 96. 498 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 6 e 13v, respectivamente. 499 MELLO E SOUZA, Laura de. Cláudio Manuel da Costa. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 77. 500 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 6. 501 SOMMERS, John. O artesanato de estanho em Minas Gerais. RIHGSJDR, vol. III, junho de 1985, p. 52-53. 155 Furtado. 502 Veloso de Miranda, no entanto, possuía um faqueiro completo; 12 unidades de cada peça, podendo ainda se dar ao luxo, nas ocasiões especiais, de expor toda sua rica louçaria em faiança azul, composta por duas terrinas, quinze pratos comuns, quarenta e dois pratos de sopa, três saladeiras e três mostardeiras, tudo das Índias. Copos de vinho ou de beber água completavam a mesa. Após a refeição, um lavabo de balcão, “de fábrica do Brasil”, servia a higiene, acompanhado de guardanapos de Guimarães, 503 confeccionados em linho, enxoval bastante considerado entre os mais ricos. 504 Para completar, café ou chá poderiam ser servidos em bule, pires e xícaras, todos também em louça das Índias. 505 Numa época que o simples ato de sair de casa era se fazer presente em meio à hierarquizada sociedade, Carla Almeida, ao analisar os mais distintos homens de Vila Rica neste mesmo recorte histórico, verificou que seus habitantes por mais desfavorecidos que fossem se espelhavam nas elites, compartilhando de um “ideal aristocratizante” entre atos e formas que deveriam ser imitados.506 Do alto de sua posição de letrado e membro da elite colonial, Veloso de Miranda certamente deve ter sido um desses homens que por muitos outros foi idealizado em suas formas de se portar e de se vestir, pois procurava viver dentro dos padrões europeus utilizando-se, para tanto, de “veludos e sedas, brocados e tafetás, rendas e meias de seda, chapéus e fitas bordadas a ouro e prata”, entre outras indumentárias, muitas das quais certamente trazidas da Corte. 507 Ainda que em seu guarda-roupas pudessem ser encontradas vestimentas confeccionadas em tecidos rústicos e de baixo custo, como uma íntima ceroula em algodão grosso, camisas no mesmo tecido ou ainda um capote em baetão, 508 peças de maior qualidade também se faziam presentes, como as meias de seda e as camisas da 502 FURTADO. Chica da Silva e o contratador dos diamantes, p. 134. À época, o hábito de comer com as mãos, fazendo bolinhos de alimento, era conhecido como “comer capitão”. 503 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 12v, 20v-21v, 22, e 24v, respectivamente. 504 MOTA, Antônia da Silva. Aspectos da Cultura material nos inventários post-mortem da capitania do Maranhão, séculos XVIII e XIX. Anais [do] XXIII Simpósio Nacional de História: História: Guerra e Paz [CD-ROM]. Londrina: Editora Mídia, 2005. 505 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 21v. 506 ALMEIDA, Carla Maria Carvalho de. Homens ricos, homens bons: produção de alimentos e hierarquização social em Minas Gerais, 1750-1822. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2001, Tese (Doutorado em História). 507 PINTO, Virgílio Noya. O ouro brasileiro e o comércio anglo-português. São Paulo: Nacional; Brasília: INL, 1979, p. 255. 508 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 25-25v 156 Bretanha. No fundo do mesmo móvel, guardados e já sem muita serventia, uma capa de batina e um capelo de cetim azul ferrete acompanhado de uma murça de veludo azul que recebera quando se tornou doutor em Coimbra representavam, para o naturalista, duas eras; aquela em que se formou no Seminário da Boa Morte, que dali distava não mais que légua e meia, e a honra e glória conquistada em Coimbra. 509 Em situações formais ou no dia a dia, a correta postura de um homem letrado em público era fundamental para confirmar sua posição social; calçados limpos e roupas engomadas eram quesitos básicos para uma boa apresentação, 510 sendo bem provável que Veloso de Miranda mantivesse, em algum lugar da casa, linhas e agulhas que utilizava para consertar, quando necessário, suas vestes. 511 Outros paramentos deveriam ser parte da vestimenta em ocasiões mais oficiais. Veloso de Miranda era possuidor de dois anéis em ouro, um ornados de águas marinhas e outro de esmeraldas. Para a cabeça, um chapéu de tafetá, de fina trama de seda. No bolso, um relógio com tampo de vidro e caixa de ouro, suspenso por uma corrente do mesmo metal. Para as íngremes ruas de Vila Rica, com calçamento em pé de moleque, botas deveriam ser o calçado mais apropriado, de preferência ornadas com as reluzentes fivelas de prata que possuía. Os lenços de algodão deveriam ser de uso corriqueiro, diferentemente do fraque, indicado para comemorações, casamentos ou outras ocasiões especiais, 512 tendo os pulsos fechados por um par de botões de ouro. Esporadicamente, utilizava um par de óculos, em latão, de ver ao longe, 513 e também era costume, nas Minas, levar um rosário no pescoço, conforme mencionou Auguste de Saint-Hilaire; porém não nos foi possível saber se Veloso de Miranda o fazia, pois este é um objeto inexistente em seu inventário. 514 Outros trajes e vestes, como as perucas, por exemplo, já haviam sido abandonadas pelos homens mais jovens, conforme apontou Tomás 509 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fls. 20v-21v, 6 e 26, respectivamente. 510 Ressalte-se a presença na residência de Veloso de Miranda de um ferro de engomar feito em latão. In: AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 14. 511 Caixinhas de costuras eram usuais sendo utilizadas inclusive por homens, como podemos verificar no depoimento de Manuel José da Costa Mourão sobre sua relação com Tomás Antônio Gonzaga, ao afirmar que este haveria de estar bordando um vestido, provavelmente para o seu enxoval de casamento com Maria Dorotéia Joaquina de Seixas, a Marília de Dirceu, fato que se transformou em poesia nas mãos de Cecília Meireles: “Aqui esteve o noivo, / de agulha e dedal, / bordando o vestido / do seu enxoval.” In: BRASIL. Autos da Devassa da Inconfidência Mineira, vol. 2, p. 486; MEIRELES, Cecília. Romanceiro da Inconfidência. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1977 (Romance LIV ou “Do enxoval interrompido”). 512 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fls. 5, 12, 19, 13, 5v, 6v, 25 e 13, respectivamente. 513 VALADARES, Virgínia Maria Trindade. Elites mineiras setecentistas: conjugação de dois mundos. Belo Horizonte: Ed. PUC Minas; Lisboa: Ed. da Universidade de Lisboa, 2004, p. 387. 514 SAINT-HILAIRE. Viagem às nascentes do rio São Francisco, p. 86. 157 Antônio Gonzaga 515 e Laura de Mello e Souza, motivo pelo qual não encontramos tal paramento arrolado em seu inventário. 516 Se a teve e a usou, há muito havia se desfeito dela. Aos domingos e em dias santos e festivos, é bem provável que Veloso de Miranda colocasse uma de suas melhores roupas e caminhasse pela Rua de São José, em direção à ladeira de Simão da Rocha, atual Rua Randolpho Bretas, descendo para a igreja Matriz de Nossa Senhora do Pilar, onde era irmão do Santíssimo Sacramento, para professar a fé católica, assistir às missas e se confessar, quando houvesse por bem. 517 Em contraste a sua pertença à Irmandade, a ausência em seu inventário de bens responsáveis por demonstrar sua fé e devoção se revelou uma surpresa de difícil interpretação. Não constam, neste documento, referências a crucifixos, imagens sacras, rosários, oratórios ou missais, muitos dos quais objetos imprescindíveis à sociedade da época e, principalmente, a um homem que havia sido aluno de um Seminário. Dentre as várias possibilidades para explicar tal panorama, podemos supor que Veloso de Miranda tenha, por volta de 1816, sentindo a iminência da morte, doado seus objetos devocionais a alguém de sua confiança ou a própria Irmandade. Ademais, a própria relação de Veloso de Miranda para com a Igreja Católica ainda nos suscita outras questões. Apesar da conclusão dos estudos religiosos no Seminário da Boa Morte, não nos foi possível verificar se Joaquim Veloso de Miranda foi, de fato, ordenado padre, nem mesmo que tenha recebido as ordens menores (in minoribus), assim como apontou Boschi. 518 Sobre este assunto, esse autor realizou diversas pesquisas na tentativa de encontrar aportes sobre uma possível ordenação de Veloso de Miranda tanto no antigo Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana, atual Arquivo Eclesiástico Dom Oscar de Oliveira, quanto no Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo, sem sucesso. Em outro momento, assinala ainda a possibilidade de Veloso de Miranda ter sido ordenado em Salvador, apontando para tal um fragmento do inventário de sua mãe, que declarou que havia assistido a “seu filho Joaquim, com doação de patrimônio para 515 “Na rua não andavam sem florete; / Traziam cabeleira grande e branca. / Nas mãos os seus chapéus. Agora, amigo, / Os nossos próprios becas têm cabelo.” In: GONZAGA, Tomás Antônio. Cartas Chilenas. São Paulo, DCL, 2013, Carta 5ª, verso 235, p. 8. 516 MELLO E SOUZA, Laura de. Cláudio Manoel da Costa. Companhia das Letras, 2011, 144. 517 AHMI, Irmandade do Santíssimo Sacramento. Livro de eleições e termos de ajustes (1718-1823), fl. 111. É bem provável que os imbróglios envolvendo a França também tenham sido responsáveis pelo fim do uso das perucas em Portugal e seus domínios. 518 BOSCHI, Caio. O Cabido da Sé de Mariana (1745-1820): documentos básicos. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro/Editora PUC Minas, 2011, p. 452. 158 que ele fosse ordenado sacerdote na cidade da Bahia”.519 De fato, tal assistência é verossímil, estando presente no dito Inventário e sendo calculada em um total de duzentos e trinta mil reis. 520 Contudo, as observações realizadas por Boschi nos arquivos em Salvador não apresentaram resultados positivos. Ainda que oficialmente Veloso de Miranda não tenha assumido uma capela ou se tornado cura, aparentemente não deixou de pleitear uma posição junto à Igreja. Durante a década de 1780, algumas solicitações foram feita em seu favor, como uma no ano de 1786, quando foi recomendado para as atividades de canonicato onde poderia, enfim, exercer atividades religiosas como padre secular; 521 ou em 1788, quando o Secretário de Estado, Martinho de Melo e Castro, em nome de Sua Majestade, solicitou ao bispo de Mariana, Dom Frei Domingos da Encarnação Pontevel (1722-1793), que fosse destinada a Veloso de Miranda uma conezia vaga ou a vagar no Cabido local; 522 ou ainda em 1791, quando o mesmo Cabido deixou de prover a Veloso de Miranda a um chantrado – a função de regente de coro de uma celebração – alegando certa preferência a um dito bacharel João Luís já que “os doutores, referindo-se claramente a Veloso de Miranda, abonavam a colação ordinária pelo direito da devolução, cujos sentimentos, aliás, reconheceu não serem seguros”. 523 Observa-se que, a despeito da posição eclesiástica, sua firmeza de crença não era assegurada por seus superiores. Isso aponta que sua investidura fora mais uma questão de investimento familiar do que de crença pessoal, como corroboram seus atos e a ausência de objetos de culto religioso entre seus pertences. Sendo assim, considero por ora que todas as pesquisas sobre as atividades clericais de Veloso de Miranda ou mesmo a ausência destas vêm ao encontro dos apontamentos que o classificaram como “um dos mais importantes membros do clero mineiro do final do século XVIII e início do seguinte”.524 Ainda que, em função da sua formação, tenha ao longo de sua vida sido designado como religioso, o que se confirma nos muitos “Padre” e “Reverendo” que antecedem seu nome em documentos e afins, pouco podemos aferir de suas atividades como membro ativo da Igreja Católica. 519 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 105. 520 AHCSM, 1° Ofício, caixa 116, auto 2406, Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784, fl. 11. 521 BOSCHI. O Cabido da Sé de Mariana (1745-1820), p. 452. 522 AHU, Secretaria do Conselho Ultramarino, Cód. 610, fls. 162v-163, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 122. 523 BOSCHI. O Cabido da Sé de Mariana, p. 452. 524 MAIA, Moacir Rodrigo de Castro. “Uma quinta portuguesa no interior do Brasil ou A saga do ilustrado dom frei Cipriano e o jardim do antigo palácio episcopal no final do século XVIII”. História, Ciências, Saúde – Manguinhos. Rio de Janeiro, vol.16, nº.4, out.-dez. 2009, p. 809. 159 4.2 – Um naturalista pioneiro Ainda que o trânsito transatlântico para pessoas com certa distinção social, como Veloso de Miranda, fosse facilitado, dificilmente alguém faria tal viagem deixando de exercer as atividades de lente na Universidade de Coimbra com o intuito de passar uns poucos meses a solucionar “problemas de sua casa”, conforme alegou o naturalista.525 Logo, era mais provável que alguma outra questão de ordem pessoal, mais que os motivos econômicos ou, ainda, o desejo de se mostrar útil por meio da pesquisa filosófica, fossem pretextos para levá-lo a solicitar autorização para regressar a América portuguesa, desprezando as vantagens que na Corte eram oferecidas, o que pode ser corroborado por meio da correspondência enviada por Vandelli a Martinho de Melo e Castro, datada de 22 de junho de 1778, onde o lente paduano presta contas àquele secretário dos naturalistas aptos para as viagens filosóficas. Dentre eles, cita os “bacharéis em Filosofia que assistem no Brasil: Dr. Joaquim Veloso, em Vila Rica; Francisco Vieira do Couto, no Serro do Frio; Serafim Francisco de Macedo, na vila de São Francisco da Cidade da Bahia; José da Silva Lisboa, na Bahia; e Estácio Goulart, no Rio de Janeiro”, afirmando que todos eram “bons e capazes de observar, e recolher as produções naturais”, mencionando ainda outros que poderiam “ser bons correspondentes”, a saber, Antônio da Rocha Barbosa, no Rio de Janeiro, e Joaquim Barbosa de Almeida, também na Bahia. Ao analisarmos a data da carta, no entanto, podemos imaginar que Vandelli tinha, quando muito, a pretensão de dizer que estes eram os prováveis candidatos às viagens filosóficas, uma vez que Veloso de Miranda, à época, ainda estava em Coimbra, 526 situação similar que seria imputada a José da Silva Lisboa, também discípulo do lente paduano, que retornou à Bahia em 1780, tendo sido nomeado professor de filosofia racional e moral para a cidade de Salvador, 527 enviando sua primeira contribuição para 525 Carta em que se concede licença ao Doutor Joaquim Veloso de Miranda para sair ao Brasil, e durante a qual ele se obriga a remeter para a Universidade com as clarezas necessárias varias, e escolhidas mostras de produtos naturais. Coimbra, 11 de setembro de 1779. Publicada em CRUZ, Ligia. Domingos Vandelli. Alguns aspectos da sua actividade em Coimbra. Coimbra, S/E, 1976, p. 66, apud PATACA. Terra, água e ar nas viagens cientificas portuguesas, p. 307. 526 De licenciado em Filosofia, em 21 de julho de 1778, e doutor em Filosofia, em 26 de julho de 1778. BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 106. 527 MAGALHÃES, Pablo Antonio Iglesias. “Flores Celestes: O livro secreto de José da Silva Lisboa, o visconde de Cairú?” História, vol. 31, nº. 1, p. 65-100, jan./jun. 2012. 160 Portugal apenas em 1781. 528 Ademais, a partida de Veloso de Miranda no ano de 1779 o coloca em posição de destaque perante seus pares, principalmente em relação a Alexandre Rodrigues Ferreira, há muito considerado o primeiro letrado luso-brasileiro formado na Universidade de Coimbra reformada a se dedicar apenas às pesquisas filosóficas, conforme mencionado por vários autores. 529 Nesse ínterim, apenas Boschi e Pataca, a partir de um olhar mais apurado, ousaram colocar Veloso de Miranda como o naturalista que teria antecedido a todos os outros da “geração de 1790”, o que buscamos ratificar nesta Tese.530 Ao analisarmos o considerável acervo documental resultante de suas atividades, entre correspondência, ofícios e memórias, constatamos que Veloso de Miranda nutria certa predileção pelas indagações filosóficas que envolviam a descrição botânica e a utilização de vegetais, interesse que compartilhava com outros letrados como Baltasar da Silva Lisboa (1761-1840) e Domingos Alves Branco Muniz Barreto (1748-1831), enquanto José Vieira Couto, José Bonifácio de Andrada e João Manso Pereira demonstravam maior interesse pelas minas e pela montanística, à época assim designado o estudo da fusão dos metais, o que de modo algum restringia a realização de pesquisas em outros campos de saberes da História Natural. Os resultados das primeiras pesquisas realizadas por Veloso de Miranda após seu retorno à América já podem ser constatados em seu Catalogus herbais, que enviou a 25 de Março de 1781, para Lisboa, acompanhado de algumas caixas de exemplares vegetais, 531 resultado de suas primeiras pesquisas oficiais em sua Pátria, realizadas nas 528 LISBOA, José da Silva. Carta para Domingos Vandelli, descrevendo-lhe a cidade, as ilhas e vilas da Capitania, o clima, as fortificações, a defesa militar, as tropas da guarnição, o comércio e a agricultura, e especialmente a cultura da cana do açúcar, tabaco, mandioca e algodão. Dá também informações sobre a população, os usos e costumes, o luxo, a escravatura, a exportação, as construções navais, a navegação para a Costa da Mina, etc.. Bahia, 18 de Outubro de 1781. AFBN, Rio de Janeiro, 32, 1910, p. 494-506. 529 HENRIQUES, Cláudia Helena Nunes. Turismo Sustentável e valorização patrimonial: A (re)construção da Viagem Filosófica de Alexandre Rodrigues Ferreira – o primeiro naturalista português. Revista Turismo e Desenvolvimento, vol. 17/18, Aveiro, 2002; RAMINELLI, Ronald. Alexandre Rodrigues Ferreira e a mobilidade de luso-brasileiros em Portugal. Anais do XXIII Simpósio Nacional De História da Anpuh. Londrina, 2005, p. 8; SILVA, José Pereira da. Viagem ao Brasil, de Alexandre Rodrigues Ferreira. Soletras, Ano VI, N° 11. São Gonçalo: UERJ, jan./jun.2006, p. 131. Tiago Bonato rememora, ainda, o naturalista luso-brasileiro José Machado Gaio, que “não fez parte das expedições organizadas pelo naturalista italiano Vandelli”, no entanto, “ainda na década de 1780, foi mandado pelo governador José Teles da Silva para uma expedição científica na serra do Ipiapaba, divisa da capitania do Ceará com o Maranhão”, e a quem o historiador atribui certo pioneirismo, inclusive face à Ferreira. In: BONATO, Tiago. “Esta planta é das que se supõe de muitos préstimos na medicina”: a procura por plantas medicinais nas viagens filosóficas setecentistas. 13º Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia, 2012, São Paulo. Anais do 13º Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2012, vol. 1, p. 3. 530 PATACA. Terra, água e ar nas viagens científicas portuguesas, p. 289. 531 AHMB, Rem. 636. MIRANDA, Joaquim Veloso. Catalogus herbais. 1781. 161 imediações de Vila Rica e da Cidade de Mariana, logo após seu retorno. Neste catálogo, Veloso de Miranda descreveu 69 espécies da flora mineira, de acordo com o sistema de classificação e de nomenclatura proposto por Lineu, mencionando ainda a denominação com que cada espécie era conhecida entre a população local. O conteúdo deste Catalogus haveria de ser incorporado a duas memórias de Vandelli, a Florae Lusitanicae et Brasiliensis specimen e a Florae et Faunae Lusitanicae specimen, publicadas em 1788 e 1797, respectivamente, onde, entre outros exemplares descritos, talvez provenientes de informações transmitidas por outros naturalistas, podem ser encontrados aqueles estudados por Veloso de Miranda, identificadas por “Vellozo”.532 Certo desconforto, no entanto, causou o Catalogus herbais. Dentre as espécies que catalogou, Veloso de Miranda nomeou considerável quantidade com os nomes e sobrenomes de pessoas e de casas importantes que devia estima ou favores em Portugal. Esta homenagem, corroborada por Vandelli, não agradou parte da classe política portuguesa, sobretudo os “setores ditos ‘conservadores’ de Portugal”, desejosos de “retirar de vários cargos aqueles que ainda restassem do consulado Pombalino”, sendo Vandelli um alvo propício. 533 O padre João Loureiro, por exemplo, por meio de seu Notas sobre o Fasciculus plantarum Brasiliensium do S.or Joachim Velloso, 534 realizou severas críticas questionando o fato de que aos novos gêneros das coleções enviadas pelo naturalista mineiro haviam se dado “nomes das famílias ilustres de Portugal, sem motivo, ou fundamento algum botânico”, ressaltando que tal ato, em outras Nações, “poderia ser julgado por adulação”.535 Loureiro, ciente da briga que estava comprando não apenas com Vandelli, mas com parte da nobreza portuguesa, fez algumas ressalvas alegando que as homenagens à Casa dos Bragança (Bragantia), à Casa dos Viscondes de 532 Na introdução da Florae et Faunae Lusitanicae specimen, Vandelli fala que Veloso de Miranda as havia feito secar, ou preparar, e procedeu os iconibus, ou os riscos, o que tornou a descrição mais exata possível. In: VANDELLI, Domenico. Florae Lusitanicae et Brasiliensis specimen. Et Epistole ab Eruditis Viris Carolo a Linné, Antonio de Haen ad Domenicum Vandelli Scriptae. Coimbra: Typographia Academico-Regia, 1788, 96 p. Disponível em http://bibdigital.bot.uc.pt/obras/UCFCTBt-B- 78-1-24b/globalItems.html. Acesso em 12 de novembro de 2016; VANDELLI, Domenicus. Florae et Faunae Lusitanicae specimen. Memórias da Academia Real das Sciências de Lisboa, Vol. 1. Lisboa: Na Tipografia da Academia, 1797, p. 37-79. Disponível em http://www.archive.org/stream/ memoriasdaacade00 lisbgoog#page/ n48/mode/2up. Acesso em 12 de novembro de 2016. 533 Os problemas advindos desta homenagem foram contextualizados recentemente por Gustavo Ferreira em sua Dissertação de Mestrado. In: FERREIRA. As Polêmicas Flores. 534 Atribuição realizada há muito por Simon, Pataca e Gustavo Ferreira. In: SIMON. Scientific Expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 113; PATACA. Terra, água e ar nas viagens cientificas portuguesas, p. 309; e FERREIRA. As Polêmicas Flores. 535 FBN, Manuscritos, I, 28, 32, 011. Notas sobre os Fasciculus das plantas do Brasil de Joaquim Velloso de Miranda, de autoria do Padre João de Loureiro. 05 de dezembro de 1780. 162 Barbacena (Barbacenia) e ao Abade Correia da Serra (Correana) poderiam ser mantidas, “pelo motivo que em seu lugar se declara”, ou seja, por serem os dois primeiros considerados incentivadores das Luzes no Reino, 536 mas também, claro, por pertencerem a mais alta classe política, não estendendo, contudo, esta possibilidade aos outros homenageados, dentre eles a Casa dos Marqueses de Marialva (Marialva), o Duque de Lafões (Lafoensia) e o próprio Joaquim Veloso de Miranda (Vellosia) considerando o autor, neste último caso, ser “contra os princípios da ética, que ele [Veloso de Miranda] ponha o seu nome a alguma delas”.537 Ainda na mesma década, Veloso de Miranda realizaria outras viagens filosóficas em Minas. Uma Portaria Régia, datada de 17 de fevereiro de 1787 e endereçada ao Tesoureiro da Real Fazenda da capitania de Minas Gerais, corroborava as ordens para que Veloso de Miranda fosse assistido com valores provenientes da Real Fazenda da capitania para suas “comedorias” e as de seus auxiliares, com a quantia de “trinta oitavas de ouro por mês”, devendo apresentar “recibo para sua descarga”, além de meia pataca por dia para satisfazer “ao pintor que o deve acompanhar na sobredita diligência”. Como havia a previsão de que o naturalista se afastasse muito de Vila Rica, e por não ter “comodidade para mandar buscar a sobredita quantia todos os respectivos meses”, o Tesoureiro poderia “adiantar-lhe a quantia que pertence a quatro meses” de tais vencimentos. 538 Aparentemente, entretanto, os pagamentos da Real Fazenda da capitania a Veloso de Miranda se mostravam inconstantes, fazendo com o naturalista desse início às atividades a partir de recursos próprios, vindo a solicitar o reembolso das despesas a posteriori. Parte das remessas enviadas por Veloso de Miranda para Vandelli vieram a prelo em 1788. Trata-se da Florae et Faunae Lusitanicae Specimen, 539 impresso de autoria de Vandelli, mas que é composto basicamente pelos estudos realizados pelo naturalista mineiro. Constam ainda, nessa edição, algumas gravuras ou cópias cujos riscos são igualmente atribuídos ao naturalista mineiro, ou mesmo a seus auxiliares, 540 e que foram reunidas em três pranchas com suas respectivas nomenclaturas científicas, 536 A manutenção da homenagem ao Abade Correa da Serra se daria por ser Loureiro profundo admirador deste. Ver, dentre outros documentos, Elogio do senhor João de Loureiro. 12 de Maio de 1792. In: ANTT, Arquivos Particulares, Abade Correia da Serra, Caixa 2B, A 42. 537 FERREIRA. As Polêmicas Flores, p. 64. 538 FBN, CC, I – 25, 19, 002. Cópia da Portaria Régia ao Tesoureiro da Real Fazenda da Capitania de Minas Gerais para que se pague as despesas do Naturalista Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 17/02/1787. 1 p. Cópia. Manuscrito. 539 VANDELLI. Florae Lusitanicae et Brasiliensis specimen... 540 FERREIRA. As polêmicas flores, p. 143-145. 163 atribuídas por Veloso de Miranda e corroboradas por Vandelli, homenageando as Casas mais ilustres de Portugal. 541 Cópias dessas gravuras foram enviadas por Vandelli ao botânico inglês Joseph Banks, em Londres, com quem o lente paduano nutria admiração profissional, e hoje fazem parte do acervo do The Natural History Museum, de Londres. 542 Imagem 3 – Prancha publicada no Florae et Faunae Lusitanicae Specimen, de Vandelli (1788). Imagens atribuídas a Veloso de Miranda ou seus auxiliares. 541 VANDELLI. Florae Lusitanicae et Brasiliensis specimen..., Tab. 1 a 5. Não empreendemos maior esforço na análise da referida homenagem por já tê-la feito Gustavo Oliveira Ferreira em sua Dissertação de Mestrado, “As Polêmicas Flores”, p. 47. 542 Estas gravuras também foram utilizadas por Ferreira em As polêmicas flores, p. 146-148. 164 Imagem 4 – Prancha publicada no Florae et Faunae Lusitanicae Specimen, de Vandelli (1788). Imagens atribuídas a Veloso de Miranda ou seus auxiliares. Imagem 5 – Prancha publicada no Florae et Faunae Lusitanicae Specimen, de Vandelli (1788). Imagens atribuídas a Veloso de Miranda ou seus auxiliares. 165 Imagens 6 e 7 – NHM. Autograph letter to Sir J. Banks, consisting of descriptions, with water color drawings of genera of Plants collected in Minas Gerais, Brazil. Disponível em https://nhmimages.com/en/search/do_quick_search.html?q=Vandelli. Acesso em 25 de abril de 2017. 166 Imagens 8 e 9 – NHM. Autograph letter to Sir J. Banks, consisting of descriptions, with water color drawings of genera of Plants collected in Minas Gerais, Brazil Disponível em https://nhmimages.com/en/search/do_quick_search.html?q=Vandelli. Acesso em 25 de abril de 2017. 167 Imagens 10 e 11 – NHM. Autograph letter to Sir J. Banks, consisting of descriptions, with water color drawings of genera of Plants collected in Minas Gerais, Brazil. Disponível em https://nhmimages.com/en/search/do_quick_search.html?q=Vandelli. Acesso em 25 de abril de 2017. 168 Alguns anos depois, em 1797, a Florae et Faunae Lusitanicae Specimen seria novamente publicada por Vandelli, em um volume das Memórias da Academia Real de Ciências de Lisboa. Curiosamente, nesta publicação, as gravuras não se fazem presentes, conquanto Vandelli atribua a Veloso de Miranda os créditos das descrições das plantas; quem ficcis plantis, et iconibus. 543 No ano de 1790, é possível identificar nova empreitada de Veloso de Miranda, por meio de uma correspondência expedida pelo Visconde de Barbacena, governador da Capitania de Minas Gerais, dando contas das atividades de pesquisa que estavam sendo realizadas pelo naturalista nas Minas. Além da carta, o governador enviou quatro caixas de produtos minerais e vegetais, acompanhadas de duas relações que, infelizmente, se perderam, e que eram responsáveis por descrever os referidos produtos. Barbacena explicitou ainda que aquelas eram as coleções referentes às “primeiras amostras que havia alcançado” ao longo de seu governo, iniciado no mês de julho de 1788, e que não havia promovido “mais [amostras de minerais] por ora”, pois havia “transferido mais diligência para a outra dos vegetais”, que realizou “antecipadamente pela utilidade que dela pode resultar a Medicina e o Comércio”. Nesta remessa, o governador destacou a presença de “várias plantas vivas da Ipecacuanha, ou Poaia [(Psychotria ipecacuanha)], como se lhe chamam no país”, para que pudesse ser melhor “conhecida, e se lhe possa fixar o verdadeiro lugar que deve ter nos Sistemas botânicos”.544 Nesta correspondência, o governador fez questão de ressaltar que a coleção vegetal que encaminhava se devia, “na maior parte, ao doutor Joaquim Veloso de Miranda, em consequência das recomendações que lhe fiz nesta matéria, e a ele mesmo encarreguei também da Relação que acompanha”. Dizia, ainda, que as despesas que havia realizado eram, em grande parte, em função das diárias de comedorias e alugueis de escravos para que o naturalista pudesse realizar suas pesquisas em História Natural, aconselhando que seria melhor determinar ao Naturalista um ordenado certo, uma vez que ele tem servido de graça, “dando-lhe somente algum acréscimo por ajuda de custo nos dias de jornada ou de marcha”, o que limitava sua atuação em meio a uma capitania onde as distâncias eram consideráveis e o potencial a ser estudado vultuoso. Por fim, sugeria que o ajudante desenhador que acompanhava Veloso de Miranda fosse igualmente ordenado, “para se tirar maior fruto das expedições”, e que se empregasse 543 VANDELLI, Domenico. Florae Lusitanicae et Brasiliensis specimen... p. 37. 544 AHU, MG, Cx. 134, Doc. 56. Carta do Visconde de Barbacena, governador das Minas Gerais, enviando quatro caixas de produtos minerais ou vegetais, e junto duas relações. Vila Rica, 12 de junho de 1790. 169 “maior eficiência no descobrimento das minas”, podendo concorrer para elas também “as diligências dos homens cultos e dos Oficiais dos Distritos”.545 Durante o segundo semestre do ano de 1790, mais precisamente desde o dia 8 de setembro, Veloso de Miranda empreenderia nova viagem filosófica, a qual se estenderia até o dia 30 de maio do ano posterior. Nesta, o naturalista se fez acompanhar por um desenhador, Apolinário de Souza Caldas, por três escravos e sete bestas, contratados “a razão de 150 reis por dia cada” [escravo] e “450 [reis] nos dias de serviço, e nos de falta, a 225 reis por dia” a totalidade das bestas, vencendo um total de “duzentos e trinta e oito dias de serviço”.546 Como nas empreitadas anteriores, Veloso de Miranda novamente dispôs de seus investimentos para que pudesse realizar os estudos propostos, vindo a solicitar, após seu retorno, reembolso ao governo da capitania das despesas que havia realizado. Com parecer favorável, passado um mês de seu retorno, o então tesoureiro Manoel Antonio de Carvalho expediu recibo referente aos vencimentos devidos ao naturalista, constando o valor de “quinhentos e setenta oitavas de ouro, que fazem a quantia de seiscentos e oitenta e quatro mil reis”, e a Apolinário coube meia oitava de ouro por dia, o equivalente a 600 réis. 547 Haveria ainda de ser arrolado no mesmo documento a despesa com os materiais utilizados pelo naturalista e seu assistente ao longo da viagem filosófica, como flores de anil e outras ditas vermelhas e carmins, utilizadas como corantes, bem como penas de lápis, pincéis, goma arábica e papel. 548 No ano de 1794, devido a um imbróglio com Barbacena, Veloso de Miranda viu seus vencimentos de naturalista serem suspensos por alguns meses, o que não o impediu de dar prosseguimento a alguns projetos pessoais, como as indagações que fez sobre a utilização do óleo da Copaiba (Copaifera SP) na cura da morfeia, ou hanseníase, assunto que será abordado com maior atenção no Capítulo 6. Já o ano de 1797 marca a entrada de Veloso de Miranda na política mineira, com sua nomeação para o cargo de secretário do governo da capitania, tornando-se, a partir de então, o auxiliar direto do novo governador, Bernardo José de Lorena. Em 545 AHU, MG, Cx. 134, doc. 56. Carta do Visconde de Barbacena, governador das Minas Gerais, enviando quatro caixas de produtos minerais ou vegetais , e junto duas relações. Vila Rica, 12 de junho de 1790. 546 FBN, CC, I - 26, 22, 050, rolo 70, documento microfilmado. Requerimento solicitando o reembolso pelo serviço prestado enquanto acompanhava com três escravos e sete bestas o naturalista Joaquim Veloso de Miranda. Villa Rica, 1791. 2 doc. (3 p.). Orig. Ms. Documento digitalizado. 547 FBN, CC, I – 25, 09, 028. RECIBO de pagamento do Tesoureiro da Real Fazenda, Manoel Antonio de Carvalho, a Joaquim Veloso de Miranda referente à sua alimentação. Vila Rica, 06/08/1791. 548 FBN, CC, I - 26, 22, 053 nº 001, rolo 70, documento microfilmado. MIRANDA, Joaquim Veloso de. Requerimento solicitando o pagamento da despesa feia no rol incluso durante a tarefa de exame e coleta dos produtos naturais da Capitania de Minas Gerais. Vila Rica, 1791. 3 doc. (3 p.) Orig. Ms. 170 correspondência enviada a Dom Rodrigo de Souza Coutinho, além de confirmar a posse de Veloso de Miranda, Lorena teceu consideráveis elogios ao naturalista, afirmando que eram “indubitáveis os talentos públicos do Doutor Joaquim Veloso de Miranda”. Dizia ainda que o naturalista se achava empregado por Vossa Majestade, pela Universidade de Coimbra, e pela Academia Real das Ciências no exame e remessas dos produtos de Historia natural na Capitania de Minas Gerais, [e] tendo feito importantíssimas descobertas particularmente no Reino Vegetal, de que tem remetido para o Real Gabinete de Vossa Majestade as plantas e arraliza (sic) delas recebendo pelo seu trabalho a quantia de 50:000 [réis]. 549 Ou seja, para além das atividades como secretário do governo da capitania, Veloso de Miranda poderia dar continuidade às pesquisas filosóficas a serviço da Coroa, já que era considerado possuidor de esmero em suas atividades e suficientemente capaz de servir trabalhando ao mesmo tempo nos objetos relativos da sua Comissão que nos é contraditória com o dito lugar, antes lhe facilita muito mais os meios para o poder desempenhar como deseja, podendo ao mesmo tempo evitar-se a Despesa da ajuda de custo que o Suplicante recebe por verificar somente com ordenado, previsões e percalços da Secretaria de Governo, que pede com Remunerações de seus serviços pelo tempo que Vossa Majestade for servir de terminar. 550 Para além dessa afirmação, o governador se mostrou ciente de que tal acúmulo de funções poderia ser propício para ampliar as atividades científicas do naturalista, uma vez que na função de secretário, Veloso de Miranda transmitiria parte das demandas do Reino para com a História Natural, sobretudo as atividades de coleta, a outros delegados considerados capazes. Por fim, justificou ser interessante para a Coroa tal situação em função da economia que seria realizada nos cofres públicos, uma vez que o naturalista deveria passar a receber apenas os vencimentos referentes ao cargo de secretário do governo, e não mais os aportes por suas funções como naturalista a serviço da Coroa.551 549 AHU, MG, Cx. 143, Doc 68, Cód. 10979. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando cumprimento a ordem régia de fevereiro, 20 de 1797, de prover Joaquim Veloso de Miranda no posto de secretário do governo das Minas Gerais. Contém anexos e cópias. Vila Rica, 1797. 550 Ibidem. 551 Ibidem. 171 Neste mesmo ano, Veloso de Miranda escreveu uma carta ao mestre paduano, onde procurou “dar parte de alguma coisa de que deve ser ciente”, como a remessa de “trezentos e tantos desenhos de plantas, e de alguns animais, com as suas descrições”, que Barbacena havia remetido, 552 mas que, segundo o naturalista, estavam aptas para o envio desde 1794. 553 O naturalista confessou ainda, nessa carta, que se achava “encarregado, por ordens Reiteradas de Sua Majestade, do exame do salitre natural, e artificial”, e que havia realizado o desenho e a descrição de uma nitreira e remetido tais estudo às mãos de Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, mostrando-se também bastante empolgado por ter encontrado várias eflorescências nitrosas em uma fazenda de criação de gados, obtendo uma pequena porção de salitre, que já estava a caminho das mãos de Sua Majestade. 554 No segundo semestre de 1798, Veloso de Miranda realizou outra viagem filosófica pelos sertões da capitania de Minas Gerais e, mais uma vez, tomou para si o custeio das despesas realizadas ao longo da empreitada, solicitando, a posteriori, o reembolso das mesmas quando de seu retorno, no mês de janeiro do ano seguinte, e que foram resumidas em comedorias e alugueis de cinco escravos e três bestas, bem como pela confecção de 68 caixões, onde foram remetidas as amostras colhidas pelo naturalista. 555 A duração desta viagem, segundo os cálculos apresentados pelo naturalista, foi de três meses. Durante este período, além da recolha de plantas vivas que deveriam ser remetidas para Lisboa, da observações sobre as culturas do linho cânhamo (Cannabis ruderalis), espécie vegetal então utilizada para o feitio de produtos têxteis, como tecidos e cordas, o naturalista tratou da “execução de outras Ordens de Sua Majestade”, sobretudo observações em uma nitreira, a fim de extrair salitre. 556 Os 68 caixões que Veloso de Miranda faz menção, bem como os cinco escravos 552 AHMB, CN/M, Arquivo Vandelli. Carta do Doutor Joaquim Velloso de Miranda para Domingos Vandelli. Vila Rica, 17 de dezembro de 1797, apud SIMON. Scientific Expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 174. 553 AHMB, CN/M 71. MIRANDA, Joaquim Veloso de. Carta para Domingos Vandelli sobre suas diligências em Minas Gerais e do envio de 300 estampas de plantas e animais. Villa Rica, 2 de Dezembro de 1794, apud SIMON. Scientific Expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 176. 554 AHMB, CN/M, Arquivo Vandelli. Carta do Doutor Joaquim Velloso de Miranda para Domingos Vandelli, Vila Rica, 17 de dezembro de 1797, apud SIMON. Scientific Expeditions in the Portuguese Overseas Territories, p. 174. 555 FBN, CC, I - 26, 22, 053 nº 002, rolo 70, documento microfilmado. MIRANDA, Joaquim Veloso de. Requerimento solicitando o embolso da despesa feita enquanto naturalista empregado no serviço de dona Maria I. Vila Rica, 1799. 2 doc. (3 p.) Orig. Ms. 556 AHMB, Arquivo Vandelli, Carta do Doutor Joaquim Velloso de Miranda a Domenico Vandelli. Vila Rica, 17 de dezembro de 1797. 172 utilizados na viagem filosófica confirmam que foi vultuosa a recolha de espécies botânicas. E diferentemente dos outros carregamentos que até então havia enviado, não redigiu uma amostra ou catálogo para estes produtos, deixando tal atividade a cargo de Vandelli, conforme explícito em carta enviada a 1º de abril de 1799. 557 De Vila Rica a Casa dos Pássaros, no Rio de Janeiro, e desta a Lisboa, outros responsáveis seriam delegados para acompanhar as remessas enviadas pelo naturalista. 558 Essa condução, em especial, foi realizada pelo capitão Francisco Xavier Machado, do Regimento de Cavalaria de Vila Rica, fato que ficou registrado tanto na correspondência enviada pelo naturalista a Vandelli, naquele mesmo ano, quanto em documento datado de 12 de janeiro do ano seguinte, quando, após retornar desta missão, o militar em questão informou que havia sido escolhido “pelo Ilustríssimo e Excelentíssimo Bernardo José de Lorena, Governador e Capitão General da Capitania das Minas” para “conduzir à Real Presença de Sua Alteza uma avultada remessa de Botânica”.559 Outro fato curioso é revelado na carta redigida por Veloso de Miranda, na qual o naturalista informou a Vandelli que o capitão viajava “encarregado e leva, para isso dinheiro, para me mandar alguns livros de que necessito, e instrumentos de Física”, mas como o militar não era “versado nestas ciências”, não teria “eleição na escolha”, rogando ao mestre que o fizesse, e que “encaminhasse e o notificasse sobre o envio dos livros e demais materiais”, cuja demanda se fazia presente em uma lista.560 É bem provável que nos dois últimos meses deste ano, Veloso de Miranda tenha se deslocado para a Cidade de Mariana, para presenciar a entrada do novo bispo, Dom Frei Cipriano de São José (1743-1817), já que a “chegada do antístite era momento especial para os povos e marcava-se por celebrações meticulosamente planejadas e executadas”, o que pode ser verificado nos editais publicados pelo então Senado da 557 AHMB, Arquivo Vandelli, Carta do Doutor Joaquim Velloso de Miranda a Domenico Vandelli. 1º de abril de 1799. 558 A chamada Casa dos Pássaros seria a antecessora do Museu Real, tendo sido criada pelo Vice-Rei Dom Luiz de Vasconcellos e Sousa. Ali eram reunidas, armazenados e preparados os exemplares da História Natural brasílica que deveriam ser enviados à Corte lisboeta. Seu principal administrador foi Francisco Xavier Cardoso Caldeira, conhecido como Francisco Xavier dos Pássaros. CASA DE OSWALDO CRUZ. Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832-1930). Verbete “Museu Real”. Disponível em http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/iah/pt/ verbetes/musnac.htm. Acesso em 17 de novembro de 2016. 559 APM, SC 290. Originais de Cartas régias e avisos. Rolo 61, Gav. G-4, p. [46] ou 53. Atestado de capacidade de Manoel Jose Pinto, militar que acompanhou a entrega de exemplares botânicos. Vila Rica, de 12 de janeiro do ano de 1800. 560 AHMB, Arquivo Vandelli, Carta do Doutor Joaquim Velloso de Miranda a Domenico Vandelli. 1º de abril de 1799. 173 Câmara de Mariana, que revelam os preparativos realizados na cidade para que o acontecimento fosse realizado de acordo com a importância do prelado, proibindo que se lançassem “imundícies nas mesmas ruas” e recomendado aos moradores das ruas onde se daria a passagem do bispo que preparassem a rua “areia” e “ervas cheirosas”, “ornando as janelas das suas casas com colchas” e colocando “luminárias em suas frentes das casas nas noites dos ditos dias trinta, [e] trinta e um [de outubro], e princípio de novembro do referido ano” de 1799.561 De temperamento bravio e “excessivamente gordo”, o bispo cultivava gostos e gestos que faziam jus asua posição social, conforme palavras do Cônego Trindade. 562 De Portugal, trouxe considerável bagagem e na Cidade de Mariana não saía à rua que não de sege, evitando transitar entre a população. 563 Face ao desprovimento em que se encontravam as instalações da residência episcopal, com grande parte do prédio em ruínas, o bispo solicitou apoio à Corte, vindo a receber numeroso enxoval que foi incorporado ao acervo do palácio. 564 Para além da reforma nas instalações, seu gosto requintado “motivou a construção de belíssimo e amplo jardim clássico em seu Palácio”.565 Para tanto, encontrou há pouco mais de uma légua e meia de distância um dos mais renomados botânicos do Reino, Veloso de Miranda, que, à época, já havia sido nomeado Secretário do Governo da Capitania. Das espécies vegetais alocadas neste jardim, quando de sua elaboração, pouco sabemos, que não a existência de algumas árvores frutíferas europeias “que ali dão muito bem”, conforme mencionaram Spix e Martius;566 das cercas-vivas e algumas palmeiras retratadas nas iluminuras do jardim, realizadas pelo padre José Joaquim Viegas de Menezes (1778-1841), por volta do ano de 1809, 567 ou mesmo as supostas tamareiras, violetas e morangos, referenciados por Diogo de Vasconcelos, 568 sendo bem provável a existência de algumas espécies ornamentais, como as rosas. Quanto às obras propriamente ditas, consta em um dos livros de contas do 561 APM, FCMM. Códice 29, fl. 38v, 39, 39v e 40, apud MAIA. A entrada solene de um bispo..., p. 2. 562 TRINDADE (Cônego), Raimundo. Arquidiocese de Mariana: subsídios para a sua história. 1ª edição. São Paulo: S/E, 1928-1929, vol. 1, p. 228. 563 VASCONCELOS, Diogo de. História do Bispado de Mariana: história da civilização mineira. Belo Horizonte: Biblioteca Mineira de Cultura/Edições Apollo, 1935. p. 84. 564 TRINDADE. Arquidiocese de Mariana, p. 245-247. 565 MAIA. A entrada solene de um bispo ilustrado... p. 1. 566 MARTIUS, Carl Friedrich Philipp von Martius & SPIX, Johann Baptist von. Viagem pelo Brasil: 1817-1820. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1981, vol. 1, p. 217. 567 CAMPOS, Paulo Mendes (Coord.). Mariana: arte para o céu. Belo Horizonte: Comissão Pró-Restauração da Catedral e Órgão da Sé de Mariana. 1985, p. 48. 568 VASCONCELOS. História do Bispado de Mariana, p. 86. 174 próprio Palácio valores que foram repassados a título de pagamento ao mestre-pedreiro português Francisco Álvares Quinta, 569 um dos encarregados da ereção do jardim, sendo esta uma das 14 obras que arrematou na Cidade de Mariana entre os anos de 1790 e 1806. 570 Aquele espaço era, na verdade, delimitado por dois jardins em estilo “romano, [com] canteiros geométricos cercados de meios fios, tendo no centro largos tanques em octógono”.571 Possuía complexo sistema de canalização para a distribuição de água e os pisos cobertos com placas de quartzito, conforme recente estudos arqueológicos. 572 Os muros “eram vertidos de hera e as ruas [passeios] ornadas com figuras simbólicas”, 573 como a imagem esculpida em pedra sabão que retrata a passagem bíblica da Samaritana, 574 disposta em uma das fontes, trabalho atribuído a Antônio Francisco Lisboa (1730-1814) e que atualmente se encontra no Museu de Arte Sacra de Mariana. 575 569 MAIA. Uma quinta portuguesa no interior do Brasil..., p. 892. 570 EUGÊNIO, Danielle de Fátima. Labor mecânico: oficiais mecânicos arrematantes de obras junto ao Senado da Câmara de Mariana, século XVIII. Anais do I Encontro de Pesquisa em História da UFMG. Belo Horizonte, Vol. 1, 23 a 25 de maio de 2012, p. 94. 571 VASCONCELOS. História do Bispado de Mariana, p. 86. 572 BAETA, Alenice Motta, et al. Evidenciação das estruturas remanescentes do antigo jardim do Palácio Episcopal, Mariana, MG. Anais do 4º Simpósio de Arqueologia e Patrimônio de Minas Gerais. Ouro Preto, 04 a 07 de novembro de 2010. 573 VASCONCELOS. História do Bispado de Mariana, p. 86. 574 Passagem bíblica em que Jesus pede água a uma mulher samaritana e esta se surpreende pelo fato de um judeu buscar favores seus em um contexto em que estes grupos sociais, judeus e samaritanos, se tratavam com hostilidade, desenvolvendo-se, então, um enredo que passa a ter a água como uma metáfora para alcançar Deus. 575 JORGE, Fernando. O Aleijadinho: sua vida, sua obra, seu gênio. 6ª Ed.. São Paulo: Difel, 1984, p. 163. 175 Imagem 12 – Prospecto da Chácara e Casa Episcopal. Aquarela de Joaquim José Viegas. In: CAMPOS, Paulo Mendes (Coord.). Mariana: arte para o céu. Belo Horizonte: Comissão Pró-Restauração da Catedral e Órgão da Sé de Mariana, 1985, p. 48. Imagem 13 – Prospecto da Chácara e Casa Episcopal. Aquarela de Joaquim José Viegas. In: CAMPOS. Mariana: arte para o céu, p. 48. 176 O interesse do bispo pela História Natural também pode ser verificado quando analisamos sua biblioteca, onde se faziam presentes vários compêndios sobre a botânica, como o Dictionnaire élémentaire de botanique, de Bulliard; o Description des plantes de l’Amerique, de Charles Plumier; a A alographia dos alkalis fixos, de frei José Mariano da Conceição Veloso e o Species plantarum, de Lineu. 576 Sabe-se, também, que após o falecimento de Veloso de Miranda, em 1816, seu irmão, Antônio Veloso de Miranda, ofereceu ao Bispo alguns volumes da livraria do naturalista, 577 como a Flora Lusitanica, publicado, em 1804, por Félix de Avelar Brotero, 578 e o Dictionnaire de jardinier français, de 1782, por Philip Miller. 579 Além destes livros, Spix e Martius tiveram notícias de que a biblioteca do bispo era “munida também de muitas obras sobre história natural, e o seu museu de curiosidades naturais” era ricamente ilustrado, “com alguns minérios ricos de ouro”.580 Em 1817, quando de sua primeira passagem por Minas Gerais, o naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire solicitou uma visita ao referido jardim que, no entanto, foi-lhe negada. Não podendo contemplar o espaço em seu lócus, o fez à distância, do alto do morro da igreja de São Pedro, referindo-se a ele da seguinte forma: “Tinham-me gabado muito seu jardim e, efetivamente, das elevações próximas, pareceu-me desenhado com regularidade, e ser maior e mais bem tratado que todos os outros que vira no resto da província”.581 O envolvimento de Veloso de Miranda para com a política da capitania, como bem observou Boschi, não o eximiu das atividades em História Natural; pelo contrário. Além de seus afazeres no Palácio do Governador, constantemente voltava sua atenção para outros deveres, como a já citada construção do jardim do Palácio dos Bispos, ou os vários ofícios que invariavelmente passavam por sua mão, alguns deles solicitando a 576 AEDOO. Inventário de Dom Frei Cipriano de São José. Arquivo 2, gaveta 1, 1817, apud MAIA. Uma quinta portuguesa no interior do Brasil... p. 892. 577 Ibidem, fls.84v-85v. 578 BROTERO, Félix de Avelar. Flora Lusitanica, seu plantarum, quae in Lusitania vel sponte crescunt, vel frequentius coluntur, ex florum praesertim sexubus systematice distributarum,synopsis. Lisboa: Ex Typographia Regia, 1804. 579 MILLER, Philip. Dictionnaire des jardiniers, contenant les méthodes les plus sûres et les plus modernes pour cultiver et améliorer les jardins potagers, à fruits, à fleurs et les pépinières, et dans lequel on donne des préceptes pour multiplier et faire prospérer tous les objets soumis à l'agriculture. Ouvrage traduit de l'anglois, sur la 8e édition de Philippe Miller par une société de gens de lettres.Paris: Guillot, 1785. A notícia desta doação se deve ao estudo de Moacir Maia; “Uma quinta portuguesa no interior do Brasil”..., p. 898, citando o Inventário de dom frei Cipriano de São José. Arquivo 2, gaveta 1, 1817, fls. 84v-85v, existente no Arquivo Eclesiástico Dom Oscar de Oliveira. 580 MARTIUS, Carl Friedrich Philipp von Martius & SPIX, Johann Baptist von. Viagem pelo Brasil: 1817-1820. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1981, vol. 1, p. 217. 581 SAINT-HILAIRE. Viagem pelas províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais, p. 79. 177 coleta e o envio à Corte de amostras da História Natural mineira, a exemplo de um pedido datado de 3 de Dezembro de 1800, para que se remetesse ao Reino “todas as espécies e variedades de Aves Indígenas dessa Capitania que se poderem descobrir, a fim de povoarem os Viveiros da Real Quinta de Belém”,582 o que provavelmente Veloso de Miranda não se furtou a providenciar pessoalmente ou em assessoria. Apesar de sua atuação como secretário de governo da capitania, Veloso de Miranda não expandiu seu envolvimento político para outras esferas de Vila Rica ou da capitania, como as casas de vereanças e as santas casas de Misericórdia. 583 Engana-se, no entanto, quem pensa que sua ausência nestas instituições fazia do naturalista homem possuidor de menor prestígio em meio àquela sociedade colonial. Pelo contrário, as carreiras que teceu, religiosa e acadêmica, eram de grande relevância para que fosse reconhecido como cidadão diferenciado entre os moradores de Vila Rica, inclusive entre a classe política local. Quanto às atividades filosóficas, em especial àqueles desenvolvidas no âmbito da mineralogia, estas se configuram como outra vertente ainda pouco explorada das atividades científicas desenvolvidas por Veloso de Miranda após seu retorno às Minas. 4.3 – “Ao lento fogo, com que sábio tira, Os úteis sais da terra”: a mineralogia de Damião À época do retorno de Veloso de Miranda à América, era grande o interesse da Coroa portuguesa em compreender os motivos que levaram à queda na produção do ouro das Minas, bem como no desenvolvimento de novas técnicas de prospecção que pudessem retomar a extração deste metal, como no passado. A essa conjuntura, somava-se uma crescente necessidade em se descobrir depósitos de outros metais e minerais considerados importantes para a defesa militar e estratégica do Reino, como o ferro e o salitre. Nesse ínterim, mesmo que o governador Lorena tenha ressaltado em dado 582 APM, SC 290, p. [184] ou 254. Pedido para envio de aves para os Viveiros da Quinta de Belém. Palácio de Queluz, 3 de dezembro de 1800. 583 Enquanto as primeiras, instituições políticas possuidoras de certa autonomia quanto à elaboração das leis da vila e das posturas a serem adotadas nos territórios que estavam circunscritos a suas jurisdições, eram frequentadas pelos homens mais influentes e ricos da vila, o controle das santas casas de Misericórdia, por sua vez, através dos postos de sua administração, estava igualmente reservados àqueles que dispunham de fazendas para dispor em favor da sociedade. Nesta, o rico exercia e tornava pública sua compaixão, característica indispensável para que a salvação fosse alcançada quando a morte batesse à porta. In: PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo: Brasiliense; Publifolha, 2000, p. 312; RUSSEL-WOOD, Anthony John. Fidalgos e filantropos: a Santa Casa da Misericórdia da Bahia, 1550-1755. Brasília: Ed. UnB, 1984. 178 momento que os estudos mineralógicos não despertavam maiores interesses em Veloso de Miranda, tal espectro, construído a partir das predominantes indagações botânicas realizadas pelo naturalista luso-brasileiro, encontra outras perspectivas quando analisamos as pesquisas que realizou, ainda em Portugal, como aluno e lente substituto, nas minas de Buarcos e Porto de Mós, bem como aquelas que viria a desenvolver nas Minas, pelo qual alcançaria certo epíteto nas Cartas Chilenas; “o nosso Damião”, aquele que “abana, ao lento fogo com que, sábio, tira os úteis sais da terra”.584 Sobre este personagem, de modesta presença nas Cartas Chilenas, o filósofo Manuel Rodrigues Lapa retificou Afonso Arinos de Melo Franco que, em nota em seu livro, 585 apontou José Álvares Maciel como sendo Damião, o que segundo Lapa não se justifica, uma vez que “Maciel não estava em Vila Rica ao tempo da composição da sátira”, retornando às Minas apenas em agosto de 1788, depois de “ter concluídos os seus estudos na Universidade de Coimbra”.586 De fato, quando nas Minas, Maciel realizou algumas pesquisas em mineralogia, sobretudo com o cobre, o ferro e o salitre, não poupando, para tanto, despesas próprias, 587 dando continuidade às suas indagações em História Natural em Angola, após ser degredado, tendo visitando, naquela conquista, a região de Ambaca, nas Highlands [planalto], na companhia do também naturalista Joaquim José da Silva, que lá se encontrava desde 1783. 588 Lapa conjectura ainda outro naturalista contemporâneo passível de ser apontado como Damião; José Vieira Couto, rapidamente descartando-o, segundo consta, pois “não há no seu nome ou em circunstância da sua vida, à semelhança do que sucede com Maciel, elementos donde se possa tirar o referido criptônimo”.589 Soma-se, ainda, o modo como aquele que retira os sais da terra é tratado; “o nosso Damião”, o que em sua opinião “pressupõe uma amizade cimentada em longo convívio, entre homens de idade 584 GONZAGA, Tomás Antônio. Cartas Chilenas. São Paulo: Companhia das Letras, 2006 (Advertência e Carta 3ª). 585 FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Cartas chilenas / Critilo (Tomaz Antonio Gonzaga). Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1940. 586 LAPA, Manuel Rodrigues. As Cartas Chilenas: um problema histórico e filológico. Rio de Janeiro: Ministério da Cultura, Instituto Nacional do Livro, 1958, p. 159, apud Autos de Devassa da Inconfidência Mineira, IV, 396. 587 BRASIL. Autos da devassa da Inconfidência Mineira, vol. 8, p. 146. 588 SILVA. Joaquim José. Extracto da viagem, que fez ao sertão de Benguella no anno de 1785 por ordem do Governardor e Capitão General do Reino de Angola, o Bacharel Joaquim José da Silva, enviado á aquelle Reino como Naturalista, e depois Secretario do Governo. De Loanda para Benguella. O Patriota – Jornal Literário, Político, Mercantil & Comercial do Rio de Janeiro. Numero 2, fevereiro. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1813. 589 LAPA. As Cartas Chilenas, p. 160. 179 aproximada”.590 Por fim, veremos que na época em que as cartas passaram a correr de mão em mão em Vila Rica, a partir de 1788, Veloso de Miranda havia sido, há pouco, encarregado de realizar pesquisas sobre os sais, no caso, o salitre, útil que seria tanto para o Reino quanto para uma sublevação planejada para poucos meses que, contudo, não seria efetivada, condições estas que quando reunidas, apontam em definitivo para o nome de Veloso de Miranda. De forma concomitante aos estudos realizados nos anos de 1780 e 1781, os quais foram responsáveis por dar origem ao Catalogus herbais, Veloso de Miranda realizou outras pesquisas que igualmente despertaram o maior interesse da Coroa portuguesa; o modo como o ouro era extraído nas Minas. Para tanto, escolheu a já conhecida lavra da Cata Preta como estudo de caso, mina que estava sob o controle de sua família há mais de 50 anos. A partir dos estudos que realizou na Cata Preta, Veloso de Miranda escreveu uma memória, denominada Descripção da Lavra da Cata Preta Chamada Caldeiram, 591 enviada a Vandelli no ano de 1780, e igualmente apropriada pelo Lente e inserida em outra memória de sua “autoria”; a Memória sobre as minas do ouro do Brazil que, junto à Memória sobre os diamantes do Brazil, seria publicada em 1898, nos Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. 592 A partir da Descripção da Lavra da Cata Preta nos foi possível compreender um pouco mais a dinâmica de uma das principais minas de ouro de Minas Gerais. Segundo Veloso de Miranda, a lavra em questão estava situada na freguesia do Inficionado, onde habitavam uns 200 fogos, e era considerada uma das mais bem sucedidas da região. Possuía um “quarto de légua”, “seguindo sempre [na] direção de uma grande serra, chamada Caraça, que passa desviada da mesma lavra uma légua”. À época, cerca de “200 Escravos e 5 Feitores brancos” eram responsáveis pelas atividades da mineração. 593 Veloso de Miranda relata que quando do início das atividades na Cata Preta, “os jornais [de trabalho] eram avultadíssimos; porém pelo decurso dos tempos foi necessário aprofundar a terra, perder muito tempo no desmonte da terra inútil, de que se compõem os altos montes”, assim como cavar galerias e poços em busca dos veios 590 LAPA. As Cartas Chilenas, p. 161. 591 AHMB, Rem. 636. MIRANDA, Joaquim Veloso. Catalogus herbais, 1781, fl. 16-19. 592 VANDELLI, Domenico. Memória sobre as minas do ouro do Brazil. ABNRJ, vol. 20, 1898, p. 266-278. 593 Ibidem, p. 271. 180 auríferos. 594 O naturalista assinalou ainda que alguns problemas, como a água da chuva que acumulava nas galerias, fizeram com que os mineiros passassem a utilizar máquinas de tirar água, grande parte das quais não eram conhecidas pelos “habitantes do País”, como a máquina “de fogo”, ou a “hidráulica”,595 análoga a uma roda e devidamente riscada na taboa junta à Memória pelo naturalista, mas que, infelizmente, não conseguimos localizar. Veloso de Miranda descreveu a máquina hidráulica como uma roda tocada por uma bica d’água que, com seus dentes, fazia girar um rosário, engrenagem composta por um eixo e tabletas, ou caixas de um palmo de quadro. Ao ser movimentado o conjunto por uma força hidráulica, a engrenagem fazia subir as tabletas e, nestas, a água do fundo das minas, conduzindo-a a um canal fora do poço. “A maior altura que há da superfície ao lugar mais baixo é de 100 palmos, estancadas de paus, para embaraçar a que não desça a terra juntamente com a água”,596 sistema análogo a tantas outras estruturas que possuíam a mesma função e que foram retratados na iconografia. Imagem 14 – Equipamento hidráulico utilizado para retirar água do fundo das minas de ouro e diamantes. Autor desconhecido. In: GUIMARÃES, Carlos M.; MORAIS, Camila Fernandes de. O ouro, a água e a Arqueologia (Minas Gerais, Brasil, século XVIII). Agua y Territorio, Nº. 3, Enero-junio 2014, p. 37. 594 VANDELLI. Memória sobre as minas do ouro do Brazil, p. 272. 595 Idem, p. 271. 596 Idem, p. 272-273. 181 Veloso de Miranda afirma ainda que na Cata Preta, a formação de quartzo e piçarra onde poderia ser encontrado o ouro corria “com a direção Norte ao sul, com uma inclinação quase [que] horizontal”, o que implicava ainda mais a necessidade da construção de poços, para que os veios fossem alcançados. Das galerias das minas, o minério aurífero passava por processos distintos, como ser vertido em água e escorrido em tecidos de flanela ou em couros de gado, com os pelos direcionados no sentido contrário, retendo assim o material que seria novamente processado com maior rigor, nas bateias, instrumento descrito por Veloso de Miranda como um “pau que, virado com a boca para baixo, tem a figura de uma pirâmide cônica, e na sua cavidade conduz a terra e serve para se apurar o ouro”.597 Junto à memória sobre a Cata Preta, Veloso de Miranda enviou a Vandelli 25 amostras de minerais acompanhadas de um Catalogus mineralogiae, onde procurou nomear e descrever os exemplares por meio de suas composições e de seus nomes populares. 598 Dentre eles, uma pirita com ouro mineralizado, de onde Vandelli teria conseguido extrair alguma quantidade do precioso metal. 599 Veloso de Miranda, no entanto, não era o único letrado ocupado com pesquisas em mineralogia. Em 1785, Martinho de Melo e Castro recomendou ao Fiscal dos diamantes do Serro do Frio, Luiz Beltrão de Gouvêa de Almeida de Lucena, que mandasse praticar naquela região diligências semelhantes àquelas “realizadas pelo hábil naturalista Joaquim Veloso de Miranda”, como 597 VANDELLI. Memória sobre as minas do ouro do Brazil, p. 273. 598 AHMB, Rem. 636. MIRANDA, Joaquim Veloso. Catalogus herbais, 1781. 599 VANDELLI. Memória sobre as minas do ouro do Brazil, p. 268. 182 recolher tudo que é relativo a Mineralogia, como são matrizes de toda a carta de pedras preciosas, e igualmente de Cristais; e toda sorte de Cristalização em que se compreendam não só as matrizes, mas igualmente pedras de Cristais soltos que pela sua singularidade ou grandeza, sejam dignos do Real Museu; como também toda a sorte de Minerais de ouro, prata, cobre, ferro e outros minerais remetendo Vossa Mercê tudo o que se for descobrindo em caixotes bem acondicionados no mesmo tempo em que se fizerem as remessas e conduções dos Diamantes, e dirigindo as ditas remessas a esta Secretaria de Estado para ser entregue no Real Museu com uma Relação circunstanciada de tudo o que se remete e continuando Vossa Mercê as sobreditas remessas em todo o tempo em que ocupar o lugar que vai servir, sem serem precisas novas ou repetidas ordens (...). 600 Na verdade, as pesquisas mineralógicas nesta região já eram realizadas por José Vieira Couto desde o ano de 1783, sendo intensificadas posteriormente, a partir de 1797, quando Dom Rodrigo de Souza Coutinho ordenou que o então governador, Conde de Sarzedas, encarregasse ao “hábil Doutor Couto” de dar informações mais “circunstanciadas sobre as minas daquele país, como também do partido que se delas se pode tirar”,601 contexto que já foi analisado por Júnia Ferreira Furtado e Clarete Paranhos da Silva e que se destaca pela situação de oposição política existente entre a família Vieira Couto e o então intendente dos diamantes, João Inácio do Amaral Silveira, que vetou por mais de uma vez a saída do naturalista para que pudesse realizar as atividades de estudo filosófico que lhe haviam sido imputadas. 602 Em 1787, novamente Veloso de Miranda viria a desenvolver novas indagações mineralógicas. Em carta datada de 7 de julho, o então governador da Capitania, Luiz da Cunha de Menezes, respondeu ao ofício expedido por Martinho de Mello e Castro, de 31 de julho de 1785, que incumbia ao “hábil naturalista, o Doutor Joaquim Veloso de Miranda, de procurar por toda a sua Capitania todos os Gêneros e todas as qualidades de Espécies pertencentes à História Natural”. Junto à carta, o governador enviou “três 600 FBN, CC, I - 26, 22, 012, rolo 70, documento microfilmado. Documentos de autoridades coloniais e metropolitanas sobre Historia Natural, Mineralogia e construção do Jardim Botânico de Vila Rica. Vila Rica, 31/07/1785 – 17/11/1801. 10 doc. (13 p.). Cópia. Ms. Inclui: Carta Régia do Príncipe Regente a Bernardo José de Lorena, de 19/08/1799, Ordem de Dom Rodrigo de Souza Coutinho a Bernardo José de Lorena de 22/11/1799, Termo da Junta da Real Fazenda, de 19/02/1800, Cartas da Junta da Real Fazenda à Rainha D. Maria I e ao Príncipe Dom João, de 07/08/1799 e 05/03/1800, respectivamente. Coleção Casa dos Contos. 601 ANRJ, códice 807, vol. 5, fls. 246-7, apud SILVA, Clarete Paranhos da. O desvendar do grande livro da natureza: um estudo da obra do mineralogista José Vieira Couto, 1798-1805. São Paulo: Annablume; Campinas: Unicamp, 1999, p. 65. 602 COUTO, Jose Vieira. Memória sobre a Capitania das Minas Gerais: seu território, clima e produções metálicas. Edição organizada e comentada por Júnia Ferreira Furtado. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994; FURTADO, Júnia Ferreira. “O outro lado da Inconfidência Mineira: pacto colonial e elites locais”. LPH: Revista de História, UFOP, nº. 4, p. 70-91, 1993/1994; SILVA. O desvendar do grande livro da natureza. 183 caixões” fechados com chaves, onde se faziam presentes “uma grande parte dos pássaros e mais alguns minerais que tem sido possível ao dito Naturalista adquirir, constantes todos da sua narração e descrição também inclusa”,603 sendo bem provável que tais aves sejam o resultado da coleta que o naturalista realizou nos dois anos anteriores, quando a ele foram creditados valores referentes a quatro meses de vencimentos para que pudesse permanecer distante de Vila Rica, realizando suas indagações e coletas filosóficas. 604 No ano seguinte, 1788, o governador escreveu novamente a Martinho de Melo e Castro, dando conta de nova remessa de produtos mineralógicos que seguiam em “quatro caixões cobertos de couro, com seu rótulo”, “para serem remetidos ao Real Museu. Junto a mesma remessa, foram enviados outros “vinte e um caixões pequenos de um Sal que se fez extrair de uma mina que se encontrou na Serra de Santo Antônio do Itacambiruçu, quatro léguas distante do Quartel Geral da sua guarnição”, com perspectiva que fosse “salitre próprio de fazer pólvora”. Como nas experiências que o governador mandou realizar neste produto não foram encontrados resultados concretos, tratou de enviar “a mesma pedra da Mina, em [estado] bruto, e de onde ela se extrai, para o fim de se poder fazer alguma mais exata averiguação”.605 Aparentemente, estas pesquisas empreendidas nos sertões do rio Jequitinhonha foram as primeiras realizadas por Veloso de Miranda no que toca ao nitro e ao produto de seu beneficiamento, o salitre. Enquanto a Coroa portuguesa se esforçava para animar em diferentes capitanias da América uma indústria do salitre, Lorena procurava demonstrar ciência da importância de tais projetos, e não por poucas vezes apoiou os empreendimentos recomendados pela Coroa. Somam-se, nesta busca, quatro interessantes memórias coligidas e transcritas pelo então governador e endereçadas a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, em carta datada de 13 de agosto de 1798. Nestas, Lorena procurou fazer uma detalhada retrospectiva das notícias que tinha acerca dos descobrimentos das minas de 603 AHU, MG, Cx. 126, doc 48, código 10077. Carta de Luís da Cunha Menezes, governador de Minas Gerais, para Martinho de Melo e Castro, secretário de Estado da Marinha e Ultramar, informando ter remetido para o Reino três caixotes contendo amostras recolhidas pelo naturalista Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 07 de julho de 1787. 604 FBN, CC, I – 25, 19, 002. Cópia da Portaria Régia ao Tesoureiro da Real Fazenda da Capitania de Minas Gerais para que se pague as despesas do Naturalista Joaquim Veloso de Miranda. Villa Rica, 17/02/1787, 1 p., Cópia, Manuscrito. 605 AHU, MG, Cx. 128, Doc. 23, Cód. 10204. Carta de Luís da Cunha Menezes, governador de Minas Gerais, para Martinho de Melo e Castro, secretário de Estado da Marinha e Ultramar, dando conta de ter remetido quatro caixas contendo amostras de produtos naturais recolhidas pelo naturalista Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 17 de fevereiro de 1788. 184 salitre na América portuguesa. Na primeira memória, com fatos retroativos ao ano de 1725, Lorena teceu maiores comentários sobre os descobrimentos de salitre em Monte Alto, termo da Vila do Urubu, capitania da Bahia, local distante “48 léguas do rio Pardo, pouco mais ou menos”, e “76 léguas do Destacamento da Serra de Santo Antonio”, bem como as visitas realizadas por autoridades coloniais como Pedro Leolino Mariz, Superintendente e Mestre de Campo Regente das Minas Novas, região então pertencente à Bahia, ou pelo Ministro da Relação da Bahia, João Pedro, no ano de 1759, cumprindo ordens do Vice-Rei. 606 Após a constatação de que a região era promissora, haveria de ser instalada uma pequena fábrica para o beneficiamento do salitre na região, entregue à direção do Sargento-Mor Engenheiro Luiz Antonio. Poucos anos depois, com o fim das atividades na referida fábrica, seus bens foram entregues a um tal Manoel Antunes Lopes e, quando do seu falecimento, a seu filho, Manoel Francisco Lopes, sendo a última notícia da fábrica o fato de seus materiais estarem “recolhidos em um rancho velho coberto de caixas de pau”, relacionados da seguinte forma: “9 tachos de cobre, sendo alguns grandes”, “16 fundos de caldeiras” (...) “que excedem a altura de hum homem”, “1 dito [tacho] de peso de 9 arrobas”, “vários caldeirões de cobre, que se não puderam contar”, “1 rolo de estanho”, “2 Sinos pequenos”, vários “almocafres e alavancas”, “muitos caixões de pregos de toda a qualidade” e “muitos cofres de dinheiro” (...) “que [igualmente] se não puderam contar”. Outros materiais, como “muitas barracas e outros apetrechos que se não sabem os nomes”, encontravam-se “deteriorados pelo pouco asseio e segurança da casa” em que estavam depositados, ressaltou, e que toda a fábrica teria importado a “quantia de quarenta mil cruzados, segundo o Inventário respectivo”.607 Quanto às especificidades do processo de mineração do salitre no Monte Alto, segundo a memória de Lorena, o composto era extraído do pé de uma pequena serra chamada Boa Vista, bem como do Morro do Conde, “local assim denominado por ter 606 Pedro Mariz acreditava ser necessária uma integração entre os coloniais, sobretudo os indígenas, na forma de mão de obra, para que caminhos fossem abertos entre as minas de Monte Alto e os portos de São Felix, no Recôncavo, ou Camamu, no sul da Bahia, facilitando e diminuindo, desta forma, os problemas e o custo do transporte do composto. In: IVO, Isnara Pereira. “Trânsito cultural, conquistas e aventuras na América portuguesa”. In: FURTADO, Júnia Ferreira (Org.). Sons, formas, cores e movimentos na modernidade atlântica: Europa, Américas e África. São Paulo: Annablume, 2008, p. 450. 607 AHU, MG, Cx. 154, doc. 21, Código 11094. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando notícia de achados de nitra [salitre] e enviando amostra da mesma. Vila Rica, 13 de agosto de 1798. 185 descansado em um nicho em uma lapa o Conde dos Arcos”, Marcos José de Noronha e Brito (1712-1768), governador da capitania de Pernambuco, primeiro governador da capitania de Goiás e depois Vice-Rei do Brasil, “quando veio de Goiás para a Bahia”. Os morros, segundo consta, eram todos de “terra vermelha com alguns pedaços de pedras pequenas” e por baixo, onde havia mais umidade, “é que brota e coalha o salitre”. O solo com esta característica, não pedregoso, aliás, era tido como propício para a existência do composto, o que haveria de ser corroborado por Auguste de Saint-Hilaire, quando de sua passagem pela Vila de Paracatu, em 1819, onde fez anotações similares para o solo local. 608 A segunda memória tece outras considerações sobre as minas de Monte Alto, acrescidas de informações sobre outros depósitos do mineral, como as minas da Serra de Bom Jardim, também localizadas nas proximidades da Vila do Urubu, mas que ainda não haviam sido ensaiadas para se verificar sua qualidade. Dava notícias de que na fazenda do Fundão, que havia pertencido ao Capitão Mor Romão Gramacho Falcão, localizada na Serra do Assuruá, atual município de Gentio do Ouro, na Bahia, havia sido descoberto “melhor e mais vigoroso salitre com abundancia e facilidade”, e que na Serra da Lapa da Comarca do Serro Frio havia feito a mesma descoberta o Capitão Miguel Luiz Filgueiras, “que vivia de minerar dentro da Demarcação Diamantina”. Por fim, Lorena mencionou que no arraial de Gouveia do Serro Frio, também nas Gerais, ouviam-se notícias de que salitre poderia ser retirado em uma serra próxima a um rio chamado Pardo Pequeno. A terceira memória, transcrita e com a assinatura de um certo Eduardo José de Moura, de quem não se tem maiores informações, dava conta das minas de uma fazenda denominada Salitre, situada na freguesia do Santíssimo Sacramento, nas proximidades do rio de Contas, comarca de Jacobina, informando que ali o composto era produzido “com tanta abundância que os moradores vizinhos se servem dele para os fogos de artifício nas suas chamadas festividades”. Eu mesmo, escreveu Eduardo, “o vi cristalizado sem mais outro artifício, e empregado em diferentes circunstancias”. As informações presentes nas distintas memórias se cruzam quando o signatário aponta a existência do mesmo mineral “na Freguesia no Urubu, alem do Rio Paramirim”, em 608 Em vários locais da Comarca de Paracatu o naturalista francês fez menção à existência de terras salitrosas, como na região do arraial de Araxá, onde a terra e as águas eram consideradas salgadas; na Serra do Salitre, ao norte de Araxá, e no arraial de Patrocínio, “conhecido como Salitre”, pela existência do mineral, e na Serra do Salitre. In: SAINT-HILAIRE. Viagem às nascentes do rio São Francisco, p. 135, 136, 151. 186 uma fazenda “com bom Edifício (coisa ali muito rara)”, pertencente ao supracitado Romão Gramacho, que “pretendia ali fabricar pólvora por haver o salitre (...) produzido em muita quantidade” e que só não o fez porque “a morte lhe atalhara este desígnio”.609 A quarta memória, a mais abreviada de todas, elenca certo episódio no qual um certo Inácio Vaz Rego, morador do supracitado arraial de Gouvêa, 40 anos antes (não há outras referências temporais) teria se deslocado à Serra da Lapa, “por mandado do falecido meu tio, o Capitão Miguel Luiz Filgueiras, por lhe terem notificado haver salitre na dita Serra, o qual achei em Linha de veio descambado para o rio Cipó”, informações que novamente convergem para com aquelas despendidas na segunda memória. Por possuir, à época, idade já avançada e pobreza, “se atinava com o lugar para remeter as amostras que se pedem”, informava o depoente Inácio.610 Dos empreendimentos aprovados pela Coroa para que o salitre fosse produzido em grande quantidade na América portuguesa, durante os últimos anos do século XVIII, dois tomaram maior vulto em decorrência da dedicação com que seus delegados conduziram tais projetos; o Real Laboratório da Refinação do Salitre, de João da Silva Feijó, no Ceará, 611 e a Nitreiras e Fábrica de Pólvora da Capitania das Minas, 612 de Veloso de Miranda, nos sertões do Ouro Branco, o que não significa que tais ações tenham gozado de longa vida e operação. Passados alguns anos aparentemente sem se voltar aos estudos de mineralogia, em 1795 novamente Veloso de Miranda foi incumbido de realizar pesquisas sobre as nitreiras naturais, dessa vez nos sertões do rio de São Francisco, devendo remeter as amostras que encontrassem “com uma informação circunstanciada”, “calculando a despesa da extração, e da condução até o Porto”. Nesta correspondência, recomendações também foram tecidas para que o então governador da capitania da Bahia, Fernando José de Portugal e Castro (1752-1817), auxiliasse as diligências do Doutor Veloso no que fosse necessário, 613 as quais só chegaram à Jacobina pelo idos de 1797, pois apenas em abril de 1798, o governador da Bahia, Dom Fernando José de Portugal, respondeu a 609 AHU, MG, Cx. 154, Doc. 21, Cód. 11094. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando notícia de achados de nitra (salitre) e enviando amostra da mesma. Vila Rica, 13 de agosto de 1798. 610 Idem. 611 FERRAZ. A produção do salitre no Brasil colonial , p. 846. 612 AHU, MG, Cx. 147, Doc. 10, Cód. 11332. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando os caixotes números 2 e 3 com amostras de salitre e suas respectivas notas, e informando ter feito diligências para fazer análise ao ferro pantanoso. Vila Rica, 12 de janeiro de 1779. 613 APM, SC 269, p.18. Carta ordenando ao Dor. Veloso para que empreenda viagem filosófica ao Rio São Francisco para pesquisar as nitreiras naturais. Palácio de Queluz, 10 de novembro de 1795. 187 Dom Rodrigo de Sousa Coutinho afirmando que já havia transmitido as ordens para que Veloso de Miranda fosse auxiliado, caso aparecesse naqueles sertões, mas que até então não tinha notícias de que o naturalista havia entrado em sua capitania, ressaltando ainda que o Visconde de Barbacena, que à época se encontrava em Salvador, igualmente confirmara que não tinha notícias de que Veloso de Miranda estava se preparando para uma viagem de tal envergadura. 614 Sabe-se, no entanto, que a viagem de Veloso de Miranda ao rio de São Francisco se deu entre o segundo semestre do ano de 1796 e o primeiro semestre do ano posterior, já que no mês de julho de 1797 o governador da capitania de Minas Gerais escreveu a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, informando que Veloso de Miranda havia empreendido uma viagem aos sertões do rio de São Francisco não mencionando, contudo, se o naturalista chegou a visitar Jacobina, ou mesmo a adentrar a Bahia. Para além de algumas amostras de chumbos acompanhadas de suas respectivas relações, enviou algumas sementes “com a declaração dos nomes próprios do país”, “uma onça pintada (...) e dois urubus rei”. Fechada a carta, o governador tornou a abri-la antes que fosse enviada para incluir na mesma outra carta, da letra de Veloso de Miranda, bem como uma amostra de nitro, produto resultante da “primeira cozida” realizada na nitreira artificial construída pelo naturalista, que havia sido extraída na Fazenda do Mau Cabelo, “um sítio do mesmo doutor”, ressaltou, local onde “presentemente [o naturalista] se acha continuando as experiências que muito recomendei”.615 Na cópia da carta escrita pelo naturalista, afirma que em um braço de Rio chamado Abaeté, está uma Serrania muito extensa, na qual se acham Lages de Chumbo, e dentro do córrego, braço [do] sobredito Abaeté, tudo é lajeado do mesmo metal, onde para se tirar, é necessário ser cortado com alavancas, por terem algumas partes sete palmos de grossura (...), e que na primeira Fundição daquele metal sai chumbo, [e] na terceira sai como Estanho. 616 Reverencialmente, Veloso de Miranda mostrava-se desejoso de poder, quando da 614 AHU, BA. Ofício do Governador Dom Fernando José de Portugal para Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, no qual participa ter transmitido ao Ouvidor, à Câmara e Capitães Mores da Comarca da Jacobina, para que prestassem todo o auxílio que lhes fosse pedido pelo Dr. Joaquim Veloso de Miranda, encarregado por ordem régia, de ir ao Rio de São Francisco examinar as nitreiras naturais, que constava existirem naquele distrito. Cidade da Bahia, 27 de abril de 1798. 615 AHU, MG, Cx. 143, Doc. 58, Cód. 10978. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando cumprimento a ordem régia de 13 de dezembro de 1796, e de 18 e 31 de marco de 1797, para tomar providências necessárias para extrair o salitre na salina do rio São Francisco, e enviando uma amostra de chumbo acompanhado da sua nota. Vila Rica, 10 de julho de 1797. 616 Idem. 188 redação da carta, se deslocar para Vila Rica, “para ter a honra de beijar a mão de Vossa Excelência [o governador], alegrar-me na sua respeitável e sempre amável presença e juntamente dar conta do estado em que se acha a fatura da Nitreira artificial”, bem como apresentar “o resultado de uma pequena experiência sobre o salitre que aqui [no Mau Cabelo] fiz”, o que não poderia realizar naquele momento por não ser possível “desamparar o trabalho, que ainda está em meio”. Dizia ainda que tinha feito uma casa “própria para as experiências, com os tanques necessários” e demais estruturas, e que “no pequeno embrulho” que junto enviava poderiam averiguar o governador e o ministro que o terreno em questão era possuidor “de toda a propriedade para dele se tirar o salitre artificial”, e que “nos dias de maior sol” se tornavam visíveis, no piçarrão, algumas florescências”, de onde tinha retirado amostras que, beneficiadas, resultaram em uma pequena porção do produto. 617 Além da carta em que esclarecia sobre sua viagem aos rios Abaeté e São Francisco, aparentemente nada mais foi entregue pelo naturalista sobre o que descobriu nesta região, como as memórias que sempre eram redigidas. Entretanto, um mapa intitulado “Mapa das Salitreiras Naturais de Linhares, na Mata do Distrito da Formiga, vertentes do Rio São Francisco” (...), de 1810, nos revela que neste ano já estavam em operação nas fazendas da região dez fábricas para a extração de salitre, sendo este, talvez, um empreendimento fruto dos conhecimentos produzidos por Veloso de Miranda quando de sua viagem ao Rio São Francisco. 618 617 Idem. 618 APM, SC 008. Mapa das Salitreiras Naturais de Linhares, na Mata do Distrito da Formiga, vertentes do Rio São Francisco, desde o Porto R[eal] até o de Mariquita, das Fazendas, do dito Território, e das Fabricas estabelecidas para a extração de Salitre em 1810. Autor desconhecido, 1810. Ressalte-se que o mapa contém informações truncadas, como um pedaço de papel colado sobre o mesmo, na lateral, que diferentemente de seu título, atribui o mapa como sendo pertencente ao “município” de Sabará. A título de localização, o Porto da Mariquita, cuja denominação ainda é a mesma, encontra-se atualmente no município de Doresópolis, sob as Coordenadas Geográficas -20.338635, -45.974589. 189 Mapa 1 – Mapa das Salitreiras Naturais de Linhares, na Mata do Distrito da Formiga, vertentes do Rio São Francisco, desde o Porto R[eal] até o de Mariquita, das Fazendas, do dito Território, e das Fabricas estabelecidas para a extração de Salitre em 1810. Autor desconhecido, 1810. Fonte: APM, SC 008 (Acervo Cartográfico). Foi realizado, provavelmente, realizado a partir dos conhecimentos e das informações obtidos por Veloso de Miranda em sua viagem ao Rio de São Francisco, entre 1796 e 1797. 190 Quanto ao trabalho que em sua fazenda estava realizando, Veloso de Miranda procurou explicar algumas particularidades sobre o beneficiamento do salitre, chamado pelos salitreiros quando de seu primeiro cozimento de produto “bruto, no qual se acha sempre combinada quase a quarta parte de sal marinho, [e] até de outros sais”, e que “por meio de algumas fáceis manipulações mais” poderia “se obtém o salitre puro”, ressaltando, no entanto, que “a pequena porção que pude recolher não me permitiu passar avante com a experiência”, ainda que encontrasse perspectivas em função de alguns resultados, como “a cristalização deste sal em agulhas, o sentimento de frescura na boca e a detonação que faz quando unido ao carvão”, ou seja, a explosão propriamente dita, “além de [que] outros caracteres tiram toda a dúvida sobre a sua existência” naquele local.619 No mês de fevereiro do ano seguinte, o governador deu novas notícias sobre a continuidade das pesquisas em mineralogia de Veloso de Miranda, afirmando que o naturalista havia chegado “felizmente, ao ponto que desejava, e não havia duvida nenhuma que aqui se pode fabricar o salitre, compreendendo já grande distancia a terra própria para a sua extração”, o que poderia ser verificado através da nova remessa de amostras, constantes em uma caixa, e que seguiam acompanhadas das “explicações necessárias”, escritas por Veloso de Miranda.620 Poucos meses depois, em junho, Veloso de Miranda escreveu nova carta destinada diretamente a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, em resposta à carta deste datada de 18 de março de 1797, que solicitava informações sobre todos os descobrimentos de minas e o estado das mesmas. Nesta, afirmava que “no descobrimento das minas de ouro nesta Capitania teve a maior parte o acaso, e depois deste a diligência metódica dos descobridores e dos que lhe foram até o presente obedecendo a nenhuma arte” e nenhuma indústria, por serem “destituídos os mineiros dos conhecimentos necessários para semelhantes explorações”, não sendo dúvida para o naturalista que a casualidade era a responsável por mostrar ao homem “o ouro na 619 AHU, MG, Cx. 143, Doc. 58, Cód. 10978. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando cumprimento a ordem régia de 13 de dezembro de 1796, e de 18 e 31 de marco de 1797, para tomar providências necessárias para extrair o salitre na salina do rio São Francisco, e enviando uma amostra de chumbo acompanhado da sua nota. Vila Rica, 10 de julho de 1797. 620 AHU, MG, Cx. 144, doc. 3, Código 11085. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, enviando a amostra de salitre extraído nas minas junto com outras informações sobre o assunto. Vila Rica, 06 de fevereiro de 1798. 191 superfície da terra”. Pouco mais de um século após os primeiros descobrimentos, ressaltou Veloso de Miranda, “pouco melhoramento neste gênero de serviços” havia surgido, e “os descobrimentos ricos que houveram” bem como “a fácil extração do ouro, por serem mais superficiais”, e a que pouca produção que agora era vigente “incitarão a estes povos a fazerem maiores indagações, e diligencias; porem diminuindo-se a facilidade dos descobrimos”.621 Veloso de Miranda não se furtou em tecer comentários sobre outra questão bastante delicada e que envolvia a atividade mineradora; o trato dos escravos. Afirmava que pela “grande mortandade dos escravos por falta de professores de Medicina, e também pela pouca caridade dos senhores, se principiou um grande atraso na extração”, que era maximizado “pela grande carestia de escravos, ferro, aço, pólvora e sal que se tem aqui experimentado há alguns anos”. O “aumento do preço nos gêneros de primeira necessidade” igualmente estava “desanimando a muitos mineiros”, alegou, obrigando-os a “lançar mão de meios mais fáceis para proverem os seus interesses”, como a agricultura, gênero de trabalho em que os proprietários poderiam encontrar “mais segurança, ainda que pouco interesse”, pois “poupam mais do ferro e aço, não dispensam pólvora alguma; os escravos, ainda que velhos, dão serviço considerável, o que não acontece nas Minas, onde são precisos homens de grande força para poderem se postar um serviço”, além de estarem “expostos aos vapores e explorações minerais, e a uma continuada umidade, o que tudo é tão contrario à saúde, como se sabe”.622 Para além da escassez de alguns gêneros importantes à mineração, Veloso de Miranda criticou a “imperfeição do método em se tirar e apurar o ouro, porquanto se não conhecerem outras máquinas mais do que a roda de tirar água”. A ineficiência do processo também poderia ser verificada “porque não se fazer uso do azougue”, ou mercúrio, “exceto em uma ou outra parte, como ensina a Química e praticam os mineiros das outras Nações”, e pela falta de conhecimentos sobre cálculos a serem aplicados às minas recentemente descobertas, por meio dos quais os mineiros poderiam prever a produção antes de despender qualquer serviço. 623 Quanto às notícias que eram esperadas por Martinho de Melo e Castro, Veloso de Miranda mencionou sobre “algumas minas de metais menos nobres” que, segundo 621 AHU, MG, Cx. 145, Doc. 2, Código 11128. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, informando sobre os descobrimentos de minas e do seu estado. Vila Rica, 12 de junho de 1798. 622 Idem. 623 Idem. 192 sua opinião, mereciam “muita contemplação; porem nenhuma tem havido por falta de conhecimentos necessários para serem empregadas”. Sobre estas, remeteu o naturalista várias amostras, como um exemplar “de mina de ferro e cobre do Arraial do Paracatu; outra de manganês, chamada também sabão de vidro, pelo uso que tem nas respectivas fabricas, a qual serve também para os esmaltes”, e que poderia ser facilmente encontrada em uma mina “junto à Vila de Queluz” [de Minas], atual Conselheiro Lafaiete. Também ressaltou que “nas remessas dos anos passados” havia remetido para o Real Museu uma “amostra da mina de cobre do Arraial de Catas Altas da Noruega; outra de bismuto, de um lugar chamado Santana do Deserto, e outra de chumbo, muito rica, do Indaiá”. Das amostras de minério de ferro, Veloso de Miranda disse que estas existiam em grande variedade, ainda que não tivesse ciência da sua qualidade, uma vez que ensaios sobre o mesmo ainda não haviam sido realizados. 624 No segundo semestre daquele ano, o governador escreveu uma carta a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, referindo-se à ordem que esse último dera a Veloso de Miranda, quando o naturalista se encontrava em Vila Rica, em 1796, ordenando-o que realizasse pesquisas sobre o salitre no rio de São Francisco. Nela, Lorena mencionou certa incredulidade de que Veloso de Miranda fosse capaz de encontrar nitreiras que fornecessem grande quantidade de salitre, e que essas fossem economicamente viáveis de serem exploradas. Informou, ainda, que o naturalista estando à época com a saúde abalada, não teria condições de realizar uma viagem filosófica “aos distritos da Bahia, na distancia de perto de trezentas, ou quatrocentas léguas”, estando já ocupado, “trabalhando nas suas Nitreiras já estabelecidas, encarregado de aprontar as remessas de sementes, e plantas vivas, que daqui se devem remeter a essa Corte”. Lamentou que não havia outra pessoa que pudesse ocupar seu lugar. João Manso Pereira, segundo Lorena, “ainda não tinha chegado a Vila Rica” – de fato não há notícias da passagem desse naturalista por aquela vila – e Vieira Couto já havia sido indicado por este governador a Dom Rodrigo, em ofício anterior. Por fim, Lorena considerou ser interessante que, diante da “excessiva distância daqueles lugares da Capitania da Bahia a esta Vila e daqui ainda mais de oitenta léguas ao Rio de Janeiro, porto de mar mais vizinho, haveria de ser mais natural que aqueles lugares fossem examinados pela Capitania da Bahia, pois só assim se poderá calcular a despesa da extração e condução até o Porto do embarque” – a “Cidade da Bahia”. Anexa a esta carta, se encontram as memórias, em número de quatro, escritas por Lorena sobre 624 Idem. 193 os descobrimentos do salitre na América portuguesa. 625 A 22 de setembro de 1798, Veloso de Miranda assinou outra missiva destinada a Dom Rodrigo. Nela, relatou que, no ano anterior, havia informado os motivos que “o tinham obrigado a fazer construir uma nitreira artificial na fazenda do Mau Cabelo”, pois havia encontrado “nas vizinhanças daquela Fazenda, com a mesma facilidade, o acido nitroso depositado nos muros das povoações circunvizinhos, até a distância de mais de uma légua, por serem os ditos muros formados do mesmo piçarrão, ou concreção térrea de que são feitos os do Mau Cabelo”.626 Poucos meses depois, no início de janeiro de 1799, nova carta foi remetida por Lorena, prestando contas das pesquisas em mineralogia realizadas por Veloso de Miranda em Minas Gerais e, em especial, as que diziam respeito à fábrica de salitre. Dizia o governador que o naturalista estava trabalhando nos cálculos da produção e do transporte do salitre desde as Minas até o porto mais próximo, e que ele também tinha se oferecido “para Diretor da Fábrica quando deva estabelecer-se”. Por fim, afirmou Lorena que havia mandado Veloso de Miranda fazer diligências sobre o ferro pantanoso, conforme recomendações recebidas desde Lisboa, exaradas a 20 de setembro do ano anterior, e garantiu que os resultados seriam enviados tão logo fossem concluídos. 627 Junto a esta carta, foram enviados três caixotes – sendo que as descrições especificavam os conteúdos de apenas dois – com amostras representativas do produto final que havia conseguido e que poderiam servir de parâmetro de cálculo para uma futura produção na fábrica de Mau Cabelo. No interior do caixote nº 2, em um compartimento, estavam amostras de Alumen plumosa, ou pedra hume, e Caparrozza 625 AHU, MG, Cx. 154, doc. 21, Código 11094. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando notícia de achados de nitra (salitre) e enviando amostra da mesma. Vila Rica, 13 de agosto de 1798. 626 AHU, MG, Cx. 144, Doc. 2, Cód. 11125. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, sobre as providências que deu para extrair o salitre na fazenda do Mau Cabelo. S/L, 22 de setembro de 1798. 627 AHU, MG, Cx. 147, doc. 10, Código 11332. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando os caixotes números 2 e 3 com amostras de salitre e suas respectivas notas e informando ter feito diligências para fazer análise ao ferro pantanoso. Vila Rica, 12 de janeiro de 1799. Também AHU, MG, Cx. 144, Doc. 03, Cód. 11085. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, enviando a amostra de salitre extraído nas minas, junto com outras informações sobre o assunto. Vila Rica, 6 de fevereiro de 1798. 194 vitrolum, 628 recolhidos em eflorescências às margens do rio Jequitinhonha, acima do Registro da Passagem, na Bahia (...), onde eram encontrados em abundância. Em outro compartimento, foram dispostas algumas estalactites, “concreções calcárias” em que “se sente algum sabor amargo”, e que se supunha possuir nitro, oriundas de “um lugar chamado a Lapa dos Morcegos, onde se lhes dá o nome de Salitre virgem”, e que pelo processo de “calcinação se obtém destas concreções uma branquíssima cal”.629 No caixote nº. 3, por sua vez, constavam duas amostras de salitre. A primeira, também oriunda Lapa dos Morcegos, “onde se acha unido às paredes de uma grande concavidade, e se diz havê-lo em abundancia, mas superficialmente”, apresentando-se como “um misto de salitre, sal marinho e outros sais”. A segunda amostra, “que vai em uma xícara, foi trazida por José Nogueira Duarte, morador na Freguesia do Curral d’El Rey”, e pode ser encontrada em um “lugar chamado Capela do Piçarrão, servindo desta Capital doze dias de jornada”.630 Ainda no primeiro semestre de 1799, Lorena enviou um informe sobre a questão do ferro pantanoso, no qual contou que havia designado Veloso de Miranda e José Vieira Couto para realizarem pesquisas sobre esse mineral. Os naturalistas, por sua vez, não demoraram a apresentar resultados positivos. Em julho do mesmo ano, Lorena transmitiu a Dom Rodrigo as informações que recebera de Veloso de Miranda, de que havia encontrado uma mina de ferro, distante 35 léguas de Vila Rica, e que desta havia extraído uma amostra e realizado um ensaio com o auxílio de um ajudante, um armeiro militar. O naturalista, no entanto, se eximiu de precisar os custos para extração e fabrico do metal, mencionando a outra diligência que com o mesmo intuito havia sido realizada. Ou seja, revelou que tinha ciência das experiências sobre fundição que seu colega Vieira Couto realizava nas proximidades do arraial do Tejuco, afirmando ainda que esse naturalista havia encontrado uma mina bastante rica, e que este poderia estimar números 628 “Designação vulgar de vários sulfatos (...), também chamada vitríolo, utilizado na medicina contra úlceras, hemorragias, oftalmias crônicas e erisipelas”. MALAQUIAS, Isabel; PEREIRA, Virgínia Soares. O mundo mineral nos Comentários a Dioscórides de Amato Lusitano. In: ANDRADE, António; MORA, Carlos; TORRÃO, João (Org.). Humanismo e ciência: Antiguidade e Renascimento. Aveiro: Universidade de Aveiro; Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra; São Paulo: Annablume, 2015, p. 393, apud BUFFON, Georges Louis Le Clerc de. Histoire Naturelle des Mineraux, vol. 3. 629 AHU, MG, Cx. 147, doc. 10, Código 11332. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando os caixotes números 2 e 3 com amostras de salitre e suas respectivas notas e informando ter feito diligências para fazer análise ao ferro pantanoso. Vila Rica, 12 de janeiro de 1799. 630 Idem. 195 mais concretos. 631 Alguns meses depois, novo ofício de Dom Rodrigo recomendava a manutenção das atividades de Veloso de Miranda nas nitreiras, exaltando ainda os trabalhos de José Vieira Couto e os do Intendente Câmara, no Distrito Diamantino. O ministro, no entanto, questionou o governador sobre outras atividades que haviam de ser animadas na capitania: “Nada disse Vossa Senhoria sobre o ferro pantanoso (...)”, comentou Dom Rodrigo, sem saber que a carta com tais informações já havia sido enviada. Afirmou, também, que o professor João Manso estava em São Paulo, onde vinha realizando maravilhas. E continuou: “Vossa Senhoria o verá chegar ai, logo que ele possa desembaraçar-se dos primeiros trabalhos que deve deixar principalmente naquela capitania sobre as Minas de Ferro”.632 Em 1800, em resposta às remessas realizadas no mês de janeiro do ano anterior, referentes aos caixões nº. 2 e nº. 3, Dom Rodrigo escreve a Lorena acusando tal recebimento e salientando, mais uma vez, a necessidade de manutenção dos trabalhos com as nitreiras, para que tão logo o salitre fosse produzido em abundância. Sugeria ainda, e com maior ênfase, que se fizessem os cálculos de produção, venda e lucro deste gênero, bem como da pólvora, advertindo que estes apenas poderiam ser vendidos por conta da Real Fazenda, o que mais uma vez espelha a importância dispensada a tais produções. 633 Neste mesmo ano, Veloso de Miranda enviou uma carta a Dom Rodrigo, informando sobre a fábrica de salitre que havia erigido no Mau Cabelo. Anexa a esta, constavam alguns desenhos da oficina da lixiviação e das fornalhas para as caldeiras de evaporação, provavelmente de punho do próprio naturalista, mas que foram extraviadas. 634 Nova carta seria enviada pelo naturalista ao ministro no ano de 1801, transmitindo informações atualizadas sobre o empreendimento. Disse Veloso de Miranda que em um primeiro experimento conseguiu auferir entre 16 e 30 libras de salitre após quatro dias da lixiviação, “conforme a maior, ou menor nitrificação das 631 AHU, MG, Cx. 148, Doc. 45, Cód. 11380. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para dom Rodrigo de Sousa Coutinho, respondendo as cartas de 20 de setembro e de 31 de outubro de 1798, a respeito da mina de Ferri encontrada num sítio pantanoso, para o que envia uma carta e um ensaio. Em anexo: 1 carta; 2ª via; cópia do respectivo anexo. Vila Rica, 10 de junho de 1799. 632 APM, SC 269, fl. 39v. Carta de Dom Rodrigo de Souza Coutinho para Bernardo José de Lorena. Mafra, 3 de outubro de 1799. 633 APM, SC 290, fl. [105] ou 133. Ofício sobre as pesquisas do Salitre e os valores para a fabricação de pólvora. 634 APM, SC 295. Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-63, Gav. G-4. 1801, fl. 118 e 118v. Vila Rica, 1° de Dezembro de 1801. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, sobre as atividades da fábrica de salitre do Mau Cabelo. 196 terras”, considerando “maior acréscimo para o futuro”. Apesar dos resultados, o naturalista se mostrava preocupado, afirmando que “um só edifício, ou dois (por quanto se está acabando de armar outra Nitreira artificial em diferente lugar da Capitania)”, talvez fazendo referência às atividades em Monte Rorigo, “não podem suprir com o salitre necessário para fazer trabalhar uma fábrica de Pólvora, ainda que pequena, para o que são necessárias muitas Nitreiras, como Vossa Excelência bem sabe e se pratica em toda a Europa”.635 Para além da incapacidade de uma ou duas fábricas de salitre serem suficientes para abastecer uma f[abrica de pólvora, Veloso de Miranda fez outros apontamentos interessantes sobre a demanda deste recurso nas Minas, e como esta era contornada, principalmente por meio de meios ilícitos, mencionando que “nos subúrbios desta Vila” [Rica] procederam contra um, em “cuja casa se achou já pólvora por ele fabricada”, e que “em outras muitas partes da capitania o povo miúdo de baixo se tem alvoroçado para fabricar e contratar neste gênero de contrabando”.636 No ano de 1802, nova missiva versando sobre a produção de salitre chegou às mãos de Lorena. Desta vez, escrita pelo Príncipe, informando que havia recebido as “representações dos dois naturalistas, Joaquim Veloso de Miranda e Francisco José da Silveira”, e novamente recomendando que se procurasse ampliar as Nitreiras, fazendo todo o esforço por se conseguir não só o salitre necessário ao fabrico da pólvora que consome essa Capitania, mas também afim de se exportar para o Reino” (...), “proibindo por outra parte com o maior rigor que ai existam Fábricas de Salitre, e de pólvora” (...), e “castigando severamente os contraventores destas tão justas e sabias determinações”. Outra importante medida seria, nesta mesma carta, tomada pelo príncipe; ordenou “deixar a vosso arbítrio [de Lorena] (se assim o julgares mais conveniente) permitir se aos particulares que tenham nitreiras próprias debaixo da impreterível condição de venderem o Salitre por hum preço justo, e determinado às juntas da Real Fazenda”.637 Ainda que Veloso de Miranda estivesse pronto a atender as recomendações para as pesquisas com o salitre, com o início das atividades do Horto Botânico em Vila Rica, e em decorrência de seu cargo na Secretaria do governo da capitania, aparentemente o naturalista contrariou as recomendações régias de que o estudo e fabricação do 635 APM, SC 295. Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-63, Gav. G-4. 1801, fl. 118 e 118v. Vila Rica, 1° de Dezembro de 1801. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, sobre as atividades da fábrica de salitre do Mau Cabelo. 636 Idem. 637 Idem, fl. 115. 197 compostos permanecessem como prioridade. A partir do ano de 1800, inexistem documentos que não os já apresentados, relacionando as atividades do naturalista para com as pesquisas mineralógicas, silêncio este que só é quebrado no ano de 1806. Neste ano, Veloso de Miranda é escolhido para aferir um carregamento de topázios que havia sido recolhido entre a população das Minas, para o feitio de “dois adereços de senhora”.638 No mesmo ano, novamente o naturalista assessorou o governo da capitania quanto a “um pequeno embrulho com amostras de minerais” que haviam sido “entregues pelo Caixa do Abaeté, ou nova Lorena”, Diogo Pereira Ribeiro de Vasconcelos (1758-1815). Veloso de Miranda, no entanto, julgou a própria apreciação “muito imperfeita”, tendo o governador sugerido que o ministro mandasse fazer em Lisboa “uma análise mais perfeita pelas pessoas que lhe parecerem mais capazes”.639 Nesse interstício, e principalmente entre os anos de 1803 e 1806, a ausência de maiores informações sobre Veloso de Miranda em Vila Rica nos sugere que ele tenha permanecido a maior parte do tempo no Mau Cabelo, tentando fazer produtiva a fábrica de salitre que havia planejado, ou mesmo desenvolvendo alguns projetos econômicos pessoais. É certo, no entanto, que vez ou outra o naturalista se deslocou à capital para tratar de assuntos de seu interesse, concernentes as suas atividades junto à secretaria de governo da capitania e ao horto botânico, também sob sua responsabilidade. Por suas relevâncias, temas do próximo capítulo. 638 O então governador, Pedro Maria Xavier de Ataíde e Melo, recebera recomendações de que tais coleções de topázio deveriam ser “igualmente ricas; compostas, cada uma delas, de pedras de diferentes tamanhos, mas iguais em tudo o mais; e só diversas entre si, as duas coleções na cor (...)”. APM, Secretaria do Governo da Capitania, Seção Colonial - SC 309. Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-67, Gav. G-4. 1805-1807, fl. 60, 68 e 139. 639 APM, SC 303. Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-65, Gav. G-4. 1803-1808, fl. 139v. 198 CAPÍTULO 5 UM HORTO E JARDIM BOTÂNICO EM VILA RICA 5.1 – Sobre hortos e jardins botânicos na América portuguesa O ato de reunir espécies botânicas em um determinado espaço físico com o intuito de aclimatá-las e multiplicá-las para diversos usos, como o medicinal, bem como a criação de coleções de espécimes raros ou uteis é prática que remete, na Europa, ao século XVI, quando da criação dos jardins e hortos botânicos em Pisa (1543), Pádua e Florença (1545). Tais espaços estiveram associados a alguma instituição de ensino, sobretudo as universitárias, onde os lentes procuravam retificar ou corroborar os saberes advindos de séculos de observações realizadas nos jardins de conventos, desde o medievo, onde padres, monges e freiras cultivavam espécies botânicas para a alimentação, para a cura do corpo ou simplesmente para a observação de suas características. 640 Tal contexto fez com que as amostras botânicas que chegavam à Europa vindas da África, da Ásia e das Américas, em meio às transações comerciais ultramarinas, despertassem ainda mais o interesse dos investigadores. Apesar da importância dos hortos, jardins, quintais e outros espaços destinados à aclimatação e multiplicação de espécies botânicas não autóctones, a historiografia ocidental se mostrou tímida em relação aos espaços que, ao longo do tempo, se constituíram fora do território europeu. Os estudos sobre o jardim suspenso da Babilônia, conhecido por meio da literatura clássica, constituem rara exceção. 641 No contexto da descoberta e colonização da América espanhola, é possível encontrar, em apontamentos memorialísticos e em cartas enviadas desde a América Central para a Espanha, informações sobre os aspectos geográficos e urbanísticos do Império Asteca e sobre a existência de espaços que, a exemplo dos europeus, eram 640 A exemplo das observações botânicas realizadas por Hildegarda de Bingen (1098-1179), e transmitidas ao opúsculo de sua autoria, Liber subtilitatum diversarum naturarum creaturarum, onde, sob influência dos conhecimentos médicos de Galeno, de outros autores médicos da Grécia clássica e da medicina árabe, fez observações sobre as propriedades médicas dos recursos pertencentes à História Natural que estavam sob seu alcance. In: COSTA, Marcos Roberto Nunes. Mulheres intelectuais na idade média: Hildegarda de Bingen - entre a medicina, a filosofia e a mística. Trans/Form/Ação. Marília, vol. 35, p. 187-208, 2012. 641 Os jardins da Babilônia eram destinados, segundo Rocha, ao cultivo de plantas medicinais, para além de ser “um espaço de convívio para a sociedade”, ou seja, comungava das mesmas funções que ainda hoje são atribuídas a estes locais. In: ROCHA, Yuri Tavares. Dos antigos ao atual Jardim Botânico de São Paulo. São Paulo, 1999 (Dissertação de Mestrado em Geografia, Universidade de São Paulo). 199 destinados à reunião de vegetais e animais. 642 Os jardins astecas, em particular, reuniam grande número de exemplares botânicos, quase sempre utilitários e ornamentais, muitos dos quais oferecidos à Corte local na forma de presentes, remetidos desde as possessões mais remotas. As descrições que chegaram aos dias de hoje sugerem que estes espaços eram muito semelhantes aos jardins botânicos atuais, a exemplo do jardim Huaxtepec, situado nas proximidades de Tenochtitlan, erigido a mando de Caitlahua, irmão do derrotado Moctezuma II. Cortês o considerou liberal e ilustrado e, em carta ao rei Carlos V, descreveu o jardim: Estamos todos aquartelados numa sede de campo, entre os mais lindos e refrescantes jardins jamais vistos (...). Há estufas espaçadas à distância de dois tiros de besta, e resplandecentes canteiros de flores, muitas árvores com vários frutos e muitas ervas e flores docemente perfumadas. Certamente a elegância e magnificência deste jardim produzem um espetáculo notável. 643 Ainda que exemplares existam desde o século XVI, foi apenas no início do século XVII que hortos e jardins começaram a se multiplicar pela Europa, resultado tanto da curiosidade sistemática em relação ao mundo natural, quanto diversidade de possibilidades econômicas resultantes da exploração e da domesticação da natureza do além-mar, com destaque, nos primeiros tempos, para as especiarias das Índias. Datam, deste período, vários deles que, assim como os congêneres da Península Itálica, se tornariam referências para o estabelecimento de coleções botânicas e para as pesquisas em História Natural, como os das universidades de Montpellier e de Heidelberg, criados em 1593, de Oxford (1621), de Paris (1635), de Berlim (1646) e de Upsala (1655). Os jardins botânicos europeus se multiplicavam na mesma proporção com que recebiam novos exemplares vindos das terras recém-conquistadas no ultramar, possibilitando um intercâmbio de espécies vegetais nas duas direções, pois ora estas eram conduzidas à Europa, ora enviadas para o além-mar. Esse fluxo, Alfred Crosby chamou de “imperialismo ecológico”, prevendo que seria a Nação mais sucedida aquela que se mostrasse capaz de concentrar, em seus domínios, o maior e mais diversificado 642 O historiador Jacques Soustelle ressaltou a presença de um "jardim zoológico" particular do imperador, o qual era possuidor de uma grande diversidade de pássaros. In: SOUSTELLE, Jacques. A Civilização Asteca. Rio e Janeiro: Zahar, 2002, p. 26. 643 EVANS, Susan Toby. Aztec royal pleasure parks: conspicuous consumption and elite status rivalry. In: _____. Studies in the History of Gardens and Designed Landscapes, vol. 20, no 3, jul./set. 2000, London & Philadelphia, Taylor & Francis, p. 217-218. Disponível em http://anth.la.psu.edu/documents/ evans_aztec_royal_pleasure_parks.pdf, Acesso em 24 de agosto de 2014. 200 número de plantas passíveis de serem utilizadas nos tratos comerciais. 644 O século XVIII assistiu a criação de hortos botânicos sob o novo signo Iluminista, que buscava o levantamento sistemático e sob bases estritamente empíricas e racionais da diversidade natural do mundo, segundo os novos métodos experimentais. Os novos hortos e jardins botânicos erigidos ao longo do século XVIII possuíam caracterização distinta daqueles próprios do Renascimento, com espaços sendo adaptados às novas funcionalidades que não apenas aquelas de caráter científico, mas também comercial. No caso do império português, essa reordenação acompanhou o crescimento em ritmo exponencial do número de espécies botânicas a serem aclimatadas, frutos das viagens filosóficas realizadas pelos naturalistas luso-brasileiros treinados na Universidade de Coimbra reformada, e das trocas de espécies vegetais que as conquistas ultramarinas continuaram a realizar entre si. A disposição dos canteiros e das alamedas, dos passeios e das ruas mudou: grandes passagens longilíneas, dispostas geometricamente que se cruzavam com outros caminhos menores, arranjos “paisagísticos que visavam, principalmente, a praticidade do ordenamento das plantas em gêneros ou famílias botânicas e suas exigências de cultivo, o que significou, em certa medida, não adotar a estética dos jardins Renascentistas e Barrocos”.645 Os hortos e jardins tornaram-se, pois, uma resposta às necessidades práticas, pois neles eram reunidas as espécies exóticas que chegavam de lugares distantes e poderiam crescer em outras partes. Era, ao mesmo tempo, objeto da ciência botânica e instrumento para incrementar a produção agrícola e, portanto, instrumento político. 646 Em Portugal, data do ano de 1731 a primeira pretensão de se criar um jardim botânico desse novo tipo, projetado inicialmente para ser estabelecido junto a Universidade de Coimbra, que Dom João V propunha reformar e adequar aos novos métodos científicos que então se formulava. Não tendo sido bem sucedida tal iniciativa, passados pouco mais de 20 anos, a seguir ao Terremoto de 1755, houve nova tentativa 644 CROSBY, Alfred. Imperialismo ecológico: a expansão biológica da Europa (900-1900). São Paulo: Companhia das Letras, 2011. 645 TOMASI, L. T. Botanical gardens of the sixteenth and seventeenth centuries. In: The history of garden design: the western tradition from the Renaissance to the present day. London: Thams and Hudson, 1991, p. 81-82, apud ROCHA, Yuri Tavares; CAVALHEIRO, Felisberto. Aspectos históricos do Jardim Botânico de São Paulo. Revista Brasileira de Botânica. São Paulo, vol. 24, nº. 4, Dez. 2001. 646 DOMINGUES, Heloisa Maria Bertol. O jardim botânico do Rio de Janeiro, In: DANTES, Maria Amélia. Espaços da ciência no Brasil (1800-1930). Rio de Janeiro: Fiocruz, 2008, p. 28. 201 de criação de um horto na região da Ajuda, para onde se mudara a família real. Novamente, no entanto, tal pretensão fracassou e o projeto de um jardim botânico foi mantido em estado de latência até o ano de 1768, quando Vandelli foi encarregado de concretiza-lo, vinculando-o ao Museu de História Natural e Gabinete de Física da Ajuda, servindo à educação dos príncipes. Quanto ao futuro jardim da Universidade de Coimbra, de fato os novos estatutos da instituição, de 1772, determinaram a criação de um horto botânico, no contexto da restruturação por que passava a instituição. Para além dos hortos e jardins botânicos estabelecidos ao longo do século XVIII em Portugal continental, há notícias da instalação de um congênere na Ilha da Madeira. Maria Graham (1785-1842), quando de sua passagem por esse arquipélago, durante sua primeira viagem ao Brasil, anotou que “perto da igreja (catedral da Sé de Funchal) fez-se um jardim público, onde se colocaram, com grande sucesso, algumas curiosas árvores exóticas”.647 Já no Brasil, em fins do século XVIII, há várias iniciativas similares, destacando-se a criação do Passeio Público, no Rio de Janeiro, em 1783, que como vários congêneres tinha basicamente a função contemplativa. Considerado o parque urbano mais antigo do Brasil, foi inspirado em seu similar lisboeta e construído em área pantanosa que até então era responsável por receber grande parte do esgoto da Corte; habitat considerado fonte de moléstias para a cidade e, principalmente, para a população que residia em seu entorno. Diferentemente dos hortos ou jardins botânicos, o Passeio Público era desprovido de pretensões acadêmicas e científicas, enquadando-se em uma nova proposta de urbanização da principal praça comercial do Vice-Reino. Era configurado como um parque aberto, cortado por alamedas retas e diagonais, com estátuas e chafarizes, tudo com forte inspiração nos traçados dos jardins franceses, como o de Versailles, mas onde se faziam presentes muitas espécies exóticas, como os baobás (Andasonia digitata). A criação do primeiro horto botânico propriamente dito, de caráter iluminista, na América portuguesa, sob a égide da administração lusa, se deu em Belém, no então Estado do Grão Pará, com a criação do Horto Público de São José, em 1796. Seu surgimento parece ter sido resposta ao La Gabrielle, o horto botânico de Caiena, cujas plantas vinham sendo, sempre que possível, pirateadas por luso-brasileiros. Especula-se que, inclusive, a introdução do café na América portuguesa tenha se dado a partir desse 647 É bem provável que tenham partido deste jardim os exemplares da árvore dragoeiro (Dracaena draco), recebidos por Vandelli na década de 1790, na Ajuda. In: GRAHAM, Maria. Diário de uma viagem ao Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1990, p. 107. 202 territoire d'outre-mer francês. 648 Se a comunidade científica luso-brasileira cobiçava os exemplares oriundos da Guiana Francesa, como apontou Nelson Sanjad, 649 havia nesta relação certa reciprocidade, pois há muito os franceses desejavam conhecer a botânica brasileira, a exemplo do projeto proposto por Jacques-François Artur, médecin du Roi, de viajar ao Grão-Pará para aproveitar os conhecimentos dos nativos em botânica, uma vez que espanhóis e portugueses eram, segundo suas palavras, “bem mais sábios nesse domínio que os franceses”.650 A construção do Horto de São José, em Belém, é noticiada por Francisco de Sousa Coutinho, governador da capitania do Pará e irmão de Rodrigo de Sousa Coutinho, ministro do ultramar, que informou que havia executado as ordens régias para a construção de um horto botânico no Grão-Pará, onde fosse realizada a “educação das plantas estranhas” e também o “cultivo de ‘plantas indígenas”.651 Segundo o ofício, junto ao edifício que algum dia foi Convento com a invocação de São José, mandei limpar e preparar urna extensão de terreno de cinquenta braças em quadro [aproximadamente 12.100 m²] para o estabelecimento dos viveiros, e da educação das plantas que Sua Majestade foi servida determinar pela Carta Regia de 4 de novembro de 1796. Por esta Relação, verá Vossa Excelência eu me alarguei do que prescreviam as Ordens de Sua Majestade cingindo-me mais ao espírito que a letra dela pois se Sua Majestade quer fazer despesa com a educação de plantas estranhas em viveiros para promover a cultura delas nos seus Reais Domínios por força de maior razão, parece conforme as suas Reais intenções que a um mesmo tempo se promova a das indígenas que se não cultivam ainda e cujos produtos se vão avulsamente procurar pelos matos. Pelo Comandante da Fragata Golfinho remeto agora dois pés de árvores de pão, e passados alguns meses poderei mandar a Real Presença, e para os governos do Brasil alguns do Girofle [cravo da Índia (Syzygium aromaticum)], e da canela (Cinnamomum verum). 652 648 O café teria introduzido na América portuguesa enquanto fruto de um contrabando. Os frutos, ou mudas, teriam sido aclimatadas em Belém em 1722, distribuídas no Maranhão, em 1774 até desembarcarem na Corte do Rio de Janeiro dois anos depois, de onde seriam distribuídas a todas as outras partes da Colônia. In: PEREIRA. Márcio Mota. A descoberta do meio ambiente: Itatiaia e a política brasileira de parques nacionais. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2013, p. 27 (Dissertação de Mestrado em Bens Culturais e Projetos Sociais, Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil / Fundação Getúlio Vargas). 649 SANJAD, Nelson Rodrigues. Nos jardins de São José: uma história do Jardim Botânico do Grão Pará, 1796-1873. Campinas: Unicamp, 2001 (Dissertação de mestrado em Geociências, Universidade Estadual de Campinas). 650 _____. Portugal e os intercâmbios vegetais no mundo ultramarino: as origens da rede luso-brasileira de jardins botânicos, 1750-1800. In: ALVES, José Jerônimo de Alencar. Múltiplas faces da história das ciências na Amazônia. Belém: EDUFPA, 2005, p. 83. 651 _____. Nos jardins de São José, p. 78. 652 APEP, Cód. 676, Oficio de dom Francisco de Souza Coutinho a dom Rodrigo de Souza Coutinho. Pará, 30 de março de 1798. apud SANJAD. Nos jardins de São José, p. 78. 203 Mapa 2 – Fragmento cartográfico de uma cópia do Plano do Pará, do engenheiro Hugo Fournier La Clair (1792-1822), mostrando a cidade de Belém na década de 1810 ou 1820. Nesta representação, é possível visualizar o Horto de São José disposto em formato quadricular, na direção Leste da cidade (ou na direção Norte do plano). In: IHGB, Mapoteca; LA CLAIR, Hugo Fournier. Copia da carta topográfica da cidade do Pará e parte dos seus contornos, extraída pelo Engenheiro Hugo de Fournier encarregado do Arquivo Provincial desde 12 de novembro de 1823. Rio de Janeiro: Estado Maior do Exército, 1905. Disponível em http://www.sudoestesp.com.br/ file/ colecao-imagens-periodo-colonial-para/679/. Acesso em 05 de outubro de 2016. Segundo Begonha Bediaga, o Horto Público de São José “parece ter sido um projeto tão bem sucedido aos olhos da metrópole que as instituições congêneres seguintes foram criadas à semelhança dele”, na maioria das vezes sendo ressaltado esse fato. 653 Assim, à sua semelhança, hortos e jardins botânicos seriam criados em Vila 653 BEDIAGA, Begonha. “Conciliar o útil ao agradável e fazer ciência: Jardim Botânico do Rio de Janeiro – 1808 a 1860”. História, Ciências, Saúde: Manguinhos, Rio de Janeiro, vol. 14, nº. 4, out.-dez. 2007, p. 1137. 204 Rica, no ano de 1799; no Rio de Janeiro, em 1808; e em Olinda, em 1811. 654 Segundo Sanjad, entre os anos de 1798 e 1802, cartas e autorizações para a “abertura de outros jardins botânicos foram expedidas para São Paulo, Salvador, Goiás e São Luís”, contanto que estes espaços fossem, em tudo e principalmente nas questões financeiras, “similares ao do Pará, considerado um horto ‘econômico’ e ‘muito produtivo’”.655 Na Bahia, em novembro de 1798, dois anos após a criação do Horto de São José, o governador da capitania, dom Fernando José de Portugal e Castro (1752-1817), recebeu um ofício com ordens para que ali se estabelecesse um jardim semelhante àquele de Belém. Junto ao Ofício, constava uma cópia do “catalogo das plantas” do horto paraense, onde estavam descritas as espécies botânicas que já estavam sendo cultivadas naquela instituição: Tendo o governador e capitão-general da capitania do Pará formado naquela cidade um Horto Botânico, em que já se achavam as plantas do catalogo incluso e que é de esperar que eleva aumentando gradualmente; manda Sua Majestade recomendar a Vossa Excelência que procure estabelecer nessa capitania com a menor despesa que for possível um Jardim Botânico semelhante ao do Pará, em que se cultivem todas as plantas assim indígenas, como exóticas, e em que particularmente se cuide em propagar de sementes as arvores que dão madeiras de construção; para depois se semearem nas Matas Reais. 656 654 Ao contrário do que diz Sanjad, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro não foi o segundo espaço do gênero criado por iniciativa da Coroa lusa na América portuguesa, mas sim aquele localizado em Vila Rica. SANJAD. Portugal e os intercâmbios vegetais no mundo ultramarino, p. 77. 655 SANJAD. Os jardins botânicos luso-brasileiros, p. 20. 656 FBN, Seção de Manuscritos, 1-47, 16, 1 nº 8. Oficio de Rodrigo de Souza Coutinho a D. Fernando Jose de Portugal, enviando o catálogo das plantas do Horto Botânico do Para. Palácio de Queluz, 19 de novembro de 1798, apud SANJAD. Nos jardins de São José, p. 84. Apesar de ter ciência das ordens para que fossem instalados hortos e jardins botânicos nas vilas de São Paulo, Goiás e em Vila Rica, Sanjad não elabora maiores comentários sobre estes espaços. Para o cenário de Vila Rica, entretanto, comete certa gafe, afirmando que este horto e jardim botânico somente seria “implantado depois da Independência, ainda refletindo a política de D. Rodrigo”. Por fim, aparentemente Sanjad não conhecia o trabalho de Veloso de Miranda, não mencionando o mesmo ou suas atividades filosóficas em sua dissertação. In: SANJAD. Nos jardins de São José, p. 86. 205 Imagem 15 – Gravura do Jardim Botânico da Bahia, de autoria de Maria Graham, realizada quando de sua visita a Salvador, em 1822. In: GRAHAM, Maria. Diário de uma viagem ao Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1990, p. 146. Outro jardim botânico que se manteve ativo por muitos anos foi o estabelecido em Olinda, tendo funcionado entre os anos de 1811 e 1844. Instalado em uma grande e ainda preservada colina, era já espaço de grande diversidade vegetal onde, inclusive, “já se davam aulas de botânica, por iniciativa do Seminário de Olinda”, pelo que este espaço foi adequado a nova natureza que caracterizava essas instituições. 657 Durante uma viagem à Pernambuco, em 1837, o botânico escocês George Gardner (1812-1849), escreveu suas observações sobre o espaço, com olhar bastante crítico em relação à iniciativa luso-brasileira: 657 MEUNIER, Isabelle Maria Jacqueline; SILVA, Horivani Conceição Gomes da. “Horto d’el Rey de Olinda, Pernambuco: história, estado atual e potencialidades da cobertura vegetal de uma área verde urbana (quase) esquecida”. Revista Brasileira de Arborização Urbana. Piracicaba – SP, vol. 4, nº. 2, 2009, p. 67. 206 O Jardim Botânico está situado em um terreno côncavo atrás da cidade de Olinda e, conquanto grande, só é em parte cultivado. A residência do professor fica quase ao centro. Encontramos o Dr. [Bernardo José] Serpa [Brandão, diretor da instituição entre os anos de 1822 e 1826], em seu gabinete, bastante amplo, e que ele usa para sala de preleções. Parecia homem de sessenta anos e impressionou-me por sua inteligência e atenciosas maneiras. Além de suas outras ocupações tinha a principal clientela de Olinda. Sua biblioteca se compunha principalmente de obras em francês sobre botânica, história natural, agricultura e medicina. Vi ali pela primeira vez a Flora Fluminensis, obra publicada a expensas do governo brasileiro. Os desenhos de que se fizeram as chapas foram preparados em fins do século passado sob a direção de um jesuíta de nome Veloso. Custou 70.000 libras esterlinas e, para empregar as palavras do Dr. Von Martius, ‘é uma estranha publicação, que pode ser dada como exemplo de uma obra literária mal orientada, e em ponto tão grande, que nunca devera ter sido começada. Onze volumes com cerca de mil e quinhentas ilustrações, constituem esta obra vultosa, cuja utilidade, infelizmente, não está em proporção com os gastos que envolveu’. O médico nos acompanhou em um passeio pelo Jardim Botânico, onde pouco encontrei que mereça menção: umas poucas plantas medicinais europeias lutando para sobreviver e algumas grandes árvores indianas são as principais produções; entre estas, porém, figuram belos exemplares de mangueiras, tamarindos, caneleiras e tamareiras. Tinha recebido recentemente do interior plantas de uma espécie de ipecacuanha, cuja raiz constitui artigo de exportação de Pernambuco, e os espécimes vivos que dele obtive estão agora em pleno viço nas estufas do Jardim Botânico de Glasgow. São de aparência diferente do que é representado e descrito por St. Hilaire, oriundo do sul do Brasil, e que eu suponho ser uma espécie distinta, embora intimamente relacionada. Deixando o jardim, penetramos um pouco no interior, onde eu contava encontrar alguma coisa mais interessante, e não me enganei na minha expectativa, porque enriqueci com muitas plantas minhas coleções. Nas colinas áridas e cobertas de moitas destes arredores encontra-se em grande abundância uma árvore frutífera e agreste, que os brasileiros chamam mangaba, a Hancornia speciosa dos botânicos. É uma pequena árvore pertencente à ordem natural dos apocyneae, de folhas delgadas e ramos pendentes que a assemelham um tanto com o chorão. O fruto é do tamanho de uma ameixa grande, de cor amarela, com riscos vermelhos de um lado, muitíssimo saboroso. 658 Já em São Paulo, o horto botânico foi estabelecido a partir do ano de 1799, no Campo da Luz, local então conhecido popularmente como Guaré, entre o centro da vila e o povoado de Santana. 659 Possuía formato e área similar ao Horto de São José, e como este também foi alocado em região à margem do núcleo urbano então 658 GARDNER, George. Viagens no Brasil: principalmente nas províncias do norte e nos distritos do ouro e do diamante durante os anos de 1836-1841. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1942, p. 69-70. 659 PREFEITURA DE SÃO PAULO. A casa do administrador: parque jardim da luz. São Paulo: S/E, 2008. 207 estabelecido. Segundo Yuri Rocha, o horto de São Paulo era um projeto “oficial para abrigar espécies de plantas medicinais, alem de outras de valor econômico, como aquelas próprias para a construção naval”, mas, segundo este autor, o espaço em questão não “recebeu os incentivos de que foi alvo o do Rio de Janeiro”, motivo pelo qual suas atividades foram efêmeras. 660 A pequena diferença de poucos meses ou anos entre a criação destas instituições refletiu a importância que Portugal conferiu a esses espaços para o desenvolvimento de estudos em História Natural, buscando na diversidade da botânica do império a utilidade de um sem número de espécimes. A importância dos jardins botânicos para a realização dessa missão havia sido sistematizada pelo próprio Vandelli: Quão grande seja a utilidade de um Jardim Botânico (além do gosto de ver juntas as plantas de todas as partes do mundo, e do proveito que delas recebem, a Medicina, as Artes, o Comércio, etc.) para a Agricultura, só o ignora aquele que não sabe quantas plantas de regiões remotas por meio dos Jardins são hoje comuns, e ordinárias na Europa, e cujo numero se vai cada dia aumentando; de que é prova evidente França, Suécia, e Alemanha. 661 Há que se destacar que as utilidades – ou vantagens – observadas por Vandelli e pelo Estado português eram os resultados que se esperava obter de tais espaços, para além de compreenderem, também, a necessidade do estudo sistemático das espécimes neles alocadas. O reconhecimento da importância da ciência para o progresso econômico local também era compreendido pela elite política do Pará que, como revela Nelson Sanjad, poucos anos após a criação do Horto de São José, ajudou a estruturar outros dois espaços similares, para neles difundir algumas culturas agrícolas e para servirem de espaços de sociabilidade cortesã; o Horto do Piry, também conhecido como Jardim das Caneleiras, e o Passeio Publico, análogo àquele do Rio de Janeiro. 662 Todos estes espaços, no reino ou nas conquistas, compunham o que Sanjad denominou de “rede luso-brasileira de jardins botânicos”663 – estrutura por meio da qual Portugal reunia e compartilhava as espécies botânicas que eram julgadas aptas ao 660 ROCHA, Yuri Tavares; CAVALHEIRO, Felisberto. Aspectos históricos do Jardim Botânico de São Paulo. Revista Brasileira de Botânica. São Paulo, vol. 24, nº. 4, suplemento, dez. 2001, p. 579-580. 661 VANDELLI, Domingos. Dicionário dos termos técnicos de história natural de Domenico Vandelli. Edição fac-símile. Rio de Janeiro: Dantes, 2008, p. 295-296. 662 O Horto do Piry e o Passeio Público seriam incorporados pela reestruturação urbanística da cidade após da Revolução da Cabanagem, em 1840. In: SANJAD. Nos jardins de São José, p. 68, 155-156. 663 SANJAD, Nelson. Portugal e os intercâmbios vegetais no mundo ultramarino: as origens da rede luso-brasileira de jardins botânicos. In: ALVES, José Jerônimo de Alencar (Org.). Múltiplas faces da história na Amazônia. Belém: UDUFPA, 2005, p. 77-102. 208 desenvolvimento econômico de cada região. De todos os jardins da América portuguesa, no entanto, apenas os de Belém e o do Rio de Janeiro mantiveram suas atividades de forma constante até os dias de hoje. Este último recebeu, ao longo do tempo, várias denominações: primeiramente Jardim de Aclimação, depois Real Horto, Real Jardim Botânico e, mais recentemente, Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Os demais hortos e jardins, no entanto, foram sendo paulatinamente abandonados, em face de reorientação das atividades econômicas da região ou mesmo pelo descaso das autoridades responsáveis por sua gestão, já que o poder público português, aquele que mais incentivara sua criação e seu funcionamento, por diversas razões, inclusive pela demora na concretização dos resultados esperados, passou a investir em ações consideradas mais rápidas e eficazes na transformação da economia, especialmente no que concerne à agricultura e à pecuária. Mas não foram apenas as benfeitorias econômicas, advindas das pesquisas e da exploração das espécies botânicas, que justificaram a implantação de tantos hortos e jardins botânicos. Também a concepção de tais espaços como locais de sociabilidade capazes de permitir o contato das elites com a natureza exótica foram, por isso, responsáveis. Nestes espaços, era como se o frequentador, por um momento, se transladasse para as selvas e as matas localizadas nas terras incultas e distantes, pelo que os jardins botânicos tinham, pois, um quê de gabinetes de curiosidades, para além de que o bucolismo do espaço e a possibilidade de tecer relações sociais muitas vezes colocavam suas verdadeiras funções em segundo plano. Ainda que, conforme a definição de Mário Beni, esses jardins fossem “instituições destinadas à conservação e multiplicação de espécimes vegetais, visando sua preservação e a visitação pública”, 664 a grande maioria funcionou de modo intermitente. É o caso do Horto e Jardim Botânico de Vila Rica, que funcionou desde sua inauguração até por volta de 1805, sendo reaberto na década de 1830, funcionando por pouco mais de 20 anos, e sendo novamente reaberto no ano de 2008, tendo suas atividades encerradas em 2017. Nesses interstícios, distintos foram os locais e as perspectivas funcionais em que funcionaram. 664 BENI, Mário Carlos. Análise estrutural do turismo. São Paulo: Senac São Paulo, 1998, p. 341. 209 5.2 – Horto e Jardim Botânico de Vila Rica: um espaço de pesquisas em História Natural das Minas Ao longo do século XVIII, Vila Rica acabou por se tornar o principal núcleo urbano da América portuguesa, chegando a ter, conforme algumas estimativas, cerca de 100 mil habitantes no auge do período minerador, 665 população inferior apenas à da Cidade do México, que possuía “aproximadamente 113 mil habitantes em 1793, e que superava em muito a população de outros importantes núcleos urbanos do Novo Mundo como Lima, Havana e Nova Iorque, todas com menos de 60 em fins do século XVIII”.666 Ou seja, estima-se que 20% da população total da América Portuguesa ali residia. 667 Na urbe, a elite culta se divertia à sua maneira, sendo comuns as reuniões realizadas em ambientes privados, onde se recitava poesia, se discutia política e se lia textos filosóficos. Festas, fossem elas sagradas ou profanas, também eram importantes eventos sociais. Já a Casa da Ópera, em funcionamento desde a década de 1770, passou a oferecer algum entretimento aos seus frequentadores. 668 Faltava, no entanto, um espaço público, um jardim ou horto, aos moldes do Passeio Público de Lisboa ou do Rio de Janeiro, onde os homens mais distintos da vila pudessem contemplar a natureza acompanhados de seus pares e familiares. O Horto Botânico de Vila Rica, posteriormente designado Jardim Botânico, no entanto, não nasceu da necessidade de um espaço público destinado ao deleite das elites locais, ainda que essa fosse uma de suas atribuições secundárias. Para além de oferecer algum sinal de modernidade à urbe, foi erigido com o intuito de propiciar a necessária diversificação econômica regional, fundada no melhor conhecimento da diversidade botânica, sobretudo das chamadas drogas do sertão, bem como da necessidade em se conhecer mais a fundo a História Natural da capitania, além de propiciar a aclimatação de espécies exóticas que ali pudessem ser reproduzidas por sua qualidade e interesse para a economia. 665 AVILA, Affonso. Resíduos seiscentistas em Minas: textos do século do ouro e as projeções do mundo barroco. Belo Horizonte: Centro de Estudos Mineiros, 1967, vol. 1, p. 122. 666 FONSECA, Cláudia Damasceno; VENÂNCIO, Renato Pinto. Vila Rica e a noção de “grande cidade” na transição do Antigo Regime para a época contemporânea. Locus, Universidade Federal de Juiz de Fora, Vol. 20, 2014, p. 164. 667 IHGB, lata 22, Doc. 13. “Notícia da capitania de Minas Gerais", apud MAXWELL, Kenneth. “Conjuração Mineira: novos aspectos”. Estudos Avançados, vol. 3, nº. 6, ano 2. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1989, p. 9. Também ALDEN, Dauri. The population of Brazil in the late Eighteenth Century: a preliminary survey. HAHR, XLIII, (2): 173-205, maio de 1967. 668 ARAÚJO, Elisângela Rodrigues da Silva; et al, A restauração do Teatro Municipal de Ouro Preto - MG. Revista Escola de Minas, vol. 62, 2009, p. 379-384. 210 Como já dito, o Horto Botânico de Ouro Preto não foi uma instituição permanente, tendo funcionado de modo intermitente, conforme as atribuições políticas e econômicas que lhe foram conferidas ao longo do tempo. Ressalte-se, ainda, que nem sempreo horto e o jardim botânico se situaram no mesmo local onde foi instalado por Veloso de Miranda. Sua criação foi determinada por ofício régio exarado em Lisboa, em novembro de 1798. Nele, estavam contidas determinações similares às dos demais empreendimentos congêneres. As ordens diziam para que fosse construído com a menor despesa que for possível, um Jardim Botânico semelhante ao do Pará, em que se cultivem todas as Plantas, assim indígenas, como exóticas, com que particularmente se cuide em propagar de sementes as árvores que são madeiras de construção para depois se semearem nas matas reais. 669 A resposta do governador da capitania não tardou e no mês de maio do ano seguinte, Bernardo José de Lorena informou a dom Rodrigo de Sousa Coutinho que já tinha encontrado um “lugar excelente” para o estabelecimento de um jardim botânico. Dispunha, para tal empreendimento, de casas e terrenos do contratador das Entradas, o comerciante e Tenente-Coronel da Cavalaria Auxiliar José Pereira Marques, o Marquésio das Cartas Chilenas, “devedor de grande quantia à Real Fazenda pelo conserto das estradas que teve arrematado”. Eram terras muito bem localizadas, situadas no centro de Vila Rica, ao lado da Casa dos Contos e as margens do córrego de mesmo nome. Tão logo iniciadas as obras, informou o governador, foram gastos pouco mais de 597 mil réis somente para adequar o terreno ao novo empreendimento. 670 No mesmo ofício, contou que havia encarregado Veloso de Miranda de conduzir o novo empreendimento. Este, por sua vez, solicitou que fosse designado um auxiliar, propondo para o cargo Luiz Jose de Godói Torres, que deveria receber um “ordenado de 200 mil reis por ano”.671 Tal escolha se justificava por terem sido ambos colegas na Universidade de Coimbra, e igualmente alunos de Vandelli. Além disso, Godói Torres 669 APM, SC 269. Livro de Registro de Cartas, Ordens Régias e Avisos. 1795-1802, p. 27. 670 APM, CC, Cx. 18, Doc. 10367, Rolo 506. Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda com a exploração e estabelecimento do Jardim botânico de Ouro Preto. Vila Rica, 21 de agosto de 1806. 671 APM, SC 276. Livro de Registro de Ofícios do Governador às Secretarias de Estado, (1799), p. 44-44v. Concomitantemente à nomeação de Veloso de Miranda para o Horto Botânico de Vila Rica, verifica-se a nomeação de tantos outros mazombos ilustrados para cargos de confiança: “Manuel Ferreira da Câmara foi nomeado Intendente das Minas e do Serro do Frio. Antônio Pires da Silva Pontes foi nomeado governador da Capitania do Espírito Santo. José Bonifácio de Andrada e Silva foi nomeado Intendente das Minas e Metais em Portugal”. In: SILVA, Maria Betriz Nizza da. O império luso brasileiro: 1750-1822. Lisboa: Estampa, 1986, p. 380. 211 era profundo conhecedor das propriedades farmacêuticas das drogas do sertão, e exercia a medicina na Câmara da Cidade de Mariana. Um ano depois, a resposta desse ofício chegou a Vila Rica, com a aprovação de Sua Alteza Real e recomendações para que se fizesse “a maior economia no mesmo Estabelecimento”, que se empenhasse em realizar nas suas dependências a aclimatação das tão valorizadas drogas, como o “Cravo da Índia (Syzygium aromaticum), a Canela (Cinnamomum verum), a Pimenta (provavelmente a pimenta da Índia, Piper nigrum, a pimenta da América, chamada, à época, caiena, Capsicum annuum) e a Árvore Pão (Artocarpus altilis), e que se cultivasse debaixo de verdadeiros princípios (...), a mandioca (Manihot esculenta), que na maior parte do Brasil” ainda se planta “destruindo matas preciosas por meio de cruéis, e devastadores fogos”.672 As atividades de pesquisa botânica que Veloso de Miranda já desenvolvia na região foram responsáveis para a escolha de Vila Rica como sede do horto. Essa afirmação encontra subsídios na Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda com a exploração e estabelecimento do Jardim botânico de Ouro Preto, 673 documento redigido no ano de 1806 e que relaciona as despesas realizadas por Veloso de Miranda desde o ano de 1786, quando de suas viagens filosóficas, ou seja, 12 anos antes da decisão régia da criação desse espaço. Todas as atividades elencadas foram consideradas parte das ações dedicadas ao planejamento e à criação do espaço, sendo que, para o ano de 1786, foram relacionadas as despesas com a condução de plantas e de gêneros coletados pelo naturalista durante sua viagem filosófica. Para os anos seguintes, mantêm-se despesas similares, acrescidas de outras diversas, como o aluguel de bestas, os gastos com a alimentação e os valores despendidos com os trabalhos de um pintor, José Gervásio de Souza, que reproduzia em imagens os espécimes coletados. Interessante verificar que os valores relacionados a partir do ano de 1799 na Lista de Cálculo passam a não mais reunir apenas as despesas realizadas por Veloso de Miranda, mas gastos relativos ao envolvimento de outros naturalistas, como Francisco José da Silveira, no ano de 1800, e José Vieira Couto, entre os anos 1800 e 1805. Os gastos para a aquisição de vários itens para o laboratório do horto também constam da lista, como aqueles realizados no ano de 1799, quando foram relacionadas a aquisição de tachos de cobre, livros e outros itens, muitos dos quais infelizmente não 672 APM, SC 290. Originais de Cartas Régias e Avisos, (1800), p. 62-62v. 673 APM, CC, Cx. 18, Doc. 10367, Rolo 506. Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda com a exploração e estabelecimento do Jardim botânico de Ouro Preto. Vila Rica, 21 de agosto de 1806. 212 discriminados. 674 A melhoria das instalações físicas também pode ser constatada por meio da realização de trabalhos de alvenaria, representados pelos “jornais de obras”, realizados entre os anos de 1803 e 1804. Em 1804, em particular, houve ainda o “conserto de um andaime para a água do jardim botânico”, referência ao chafariz de um de seus jardins, “trabalho executado pelo arrematante de obras públicas Miguel Moreira Maia”.675 As despesas da instituição apontam ainda para o constante aluguel de bestas, destinadas ao transporte das remessas, assinalando o fluxo contínuo de novos carregamentos de espécies botânicas. Tais tropas faziam a conexão entre as atividades de recolhimento nos sertões da capitania, de aclimatação em Vila Rica e de envio para o Rio de Janeiro, de onde seriam embarcadas para a Metrópole; bem como, no sentido inverso, das espécimes exógenas que deveriam ser aclimatadas no horto local, com vistas a sua difusão e aproveitamento econômico. 676 Poucos meses após a inauguração do horto botânico, Lorena remeteu novo ofício a Lisboa, informando ao secretário de Estado do seu estabelecimento. Anexou uma planta do local, riscada por Manuel Ribeiro Guimarães. Ainda segundo o governador, o espaço contava, quando de sua inauguração, com “quinhentas plantas, pouco mais ou menos”, as quais eram conservadas “com todo o asseio”, e que “os trabalhos do doutor Veloso com as Nitreiras não tem [teriam] dado lugar à descrição botânica das plantas”.677 Quanto ao seu planejamento físico, a partir do risco de Manoel Ribeiro Guimarães, pode-se visualizar sete patamares, estrategicamente localizados ao lado da Casa dos Contos e a vista dos passantes da Rua de São José, dispostos simetricamente em estilo italiano. Sua configuração revelava, por um lado, seu caráter utilitário, e, por outro, demonstrava ser obra de bom gosto, apta a receber, nas horas de lazer, as pessoas 674 APM, CC, Cx. 18, Rolo 506, Doc. 10367,. Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda com a exploração e estabelecimento do Jardim botânico de Ouro Preto. Vila Rica, 21 de agosto de 1806. 675 ANRJ, CC, lata n.121 (1º pacote), Conserto do andaime para a água do Jardim Botânico, de 1804, apud PESSOA, Ana (Org.). Jardins históricos: as culturas, as práticas e os instrumentos de salvaguarda de espaços paisagísticos. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 2015, p. 109. 676 APM, CC. Caixa 18, Rolo 506, Doc. 10367. Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda com a exploração e estabelecimento do Jardim botânico de Ouro Preto. Vila Rica, 21 de agosto de 1806. Interessante verificar que apesar de ter se tornado notório mineralogista, o naturalistas José Vieira Couto manteve vínculos com o Horto Botânico de Vila Rica ainda que, à época, entre os anos de 1800 e 1805, se dedicasse a atividades filosóficas na Comarca do Serro do Frio e no Tejuco, onde provavelmente recolhia espécimes a serem enviadas ao horto. 677 AHU, MG, Cx. 153, Doc. 36, Cód. 14236. Ofício do Governador de Minas, Bernardo José de Lorena para o Secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos, Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, no qual remete a planta do Horto Botânico do Ouro Preto. Vila Rica, 04 de julho de 1800. 213 mais distintas e influentes da capitania. Nos patamares inferiores, dispostos ao lado do edifício que servia de administração, a antiga Casa do Real Contrato, e em frente à entrada estavam localizados os jardins principais, dispostos geometricamente por entre caminhos calçados de pedras, sendo o primeiro deles ornado com uma fonte, suspensa sobre um pedestal oitavado, e um tanque, o que pode ser visualizado a partir da gravura de autoria de José Wasth Rodrigues (1891-1957), realizada entre os anos de 1928 e 1931. 678 É provável que neste canteiro e nos imediatamente dispostos nos níveis superiores fossem cultivadas, sobretudo, plantas ornamentais. Nos fundos do terreno, avançando sobre a encosta em direção ao Palácio do Bispo, 679 uma área de maior dimensão era destinada ao cultivo de espécies de grande porte, provavelmente árvores frutíferas, mas também outras destinadas à construção civil, utilitárias. Segundo Carrato, toda a estrutura do horto teria sido “planejada pelo doutor Veloso de Miranda” que, inclusive, residia a poucos metros de seu novo empreendimento, em um sobrado localizado em frente à Casa dos Contos, mais para os lados do chafariz. 680 678 Segundo José Walsh Rodrigues, a fonte e o tanque seriam transpostos ainda na década de 1930 para o pátio localizado em frente ao antigo Palácio dos Governadores, atual prédio da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto, permanecendo neste local até hoje. O autor, no entanto, se refere ao jardim como “jardim antigo”, afirmando que o mesmo pertencia a uma “velha residência existente ao lado da Casa dos Contos”. “Este pequeno e gracioso jardim é provavelmente, exemplar único no Brasil, conservando características do século XVIII, num gênero de construção tão frágil e tão sujeito a modificações”, assinalou o autor. In: RODRIGUES, José Walsh. Documentário arquitetônico relativo a antiga construção civil no Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1979, p. 124-128. De fato, a fonte e tanque não estão presentes à frente do antigo palácio dos governadores, em uma fotografia datada da década de 1920. In: VALE. Nossa história. Rio de Janeiro: Verso, 2012, p. 25. 679 Edifício erigido a mando de Dom Domingos da Encarnação Pontével em Vila Rica para servir como sua residência, em função dos desentendimentos que este mantinha com o Cabido da Catedral da Sé de Mariana. 680 CARRATO, José Ferreira. Uma casa portuguesa com horta e jardim, nas Minas Gerais do século XVIII. Revista de Guimarães. Guimarães, 81, 1971, p. 120. 214 Mapa 3 – Mapa Topográfico do Orto Botanico do Ouro Preto. 1799. Fonte: Arquivo Histórico Ultramarino, Lisboa. Disponível em http://www2.iict.pt/?idc=84&idi=13786. Acesso em 28 de agosto de 2014. Imagem 16 – Gravura de autoria de José Walsh Rodrigues realizada entre os anos de 1928 e 1931, retratando o primeiro patamar do Horto Botânico de Vila Rica, situada abaixo do nível da ponte da rua São José. É possível verificar a presença da fonte e do tanque, no centro da imagem, bem como os pequenos muros que delimitavam os jardins, o calçamento de pedras, o muro de arrimo, ao fundo, em pedras de canga, e a escada que conduzia ao próximo patamar do jardim. In: RODRIGUES, José Wasth. Documentário arquitetônico relativo a antiga construção civil no Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1979, p. 125. 215 Imagem 17 – Na gravura superior, de autoria de José Walsh Rodrigues, realizada entre os anos de 1928 e 1931, é possível verificar o primeiro patamar do Horto Botânico de Vila Rica, visto de cima, com os seus canteiros divididos em formatos geométricos, a escada com degraus em semicírculo, para o acesso à casa de vivenda do Horto Botânico, e a escada de acesso aos patamares superiores. Na gravura inferior, a fonte em perspectiva, suspensa por um patamar em formato oitavado e o tanque que a circulava. In: RODRIGUES. Documentário arquitetônico relativo a antiga construção civil no Brasil, p. 127. Imagem 18 – Edificação que serviu de casa de vivenda para o Horto e Jardim Botânico de Villa Rica durante a primeira fase de existência da instituição. Foto do Autor. Outubro de 2017. 216 Imagem 19 – Vista da área em que esteve situado o primeiro canteiro do Horto e Jardim Botânico de Villa Rica. Ao centro, o local onde foram dispostas, à época, a fonte e do tanque. Foto do Autor. Outubro de 2017. Imagem 20 – Parte dos muros de contenção dos jardins do Horto e Jardim Botânico de Villa Rica. Foto do Autor. Outubro de 2017. 217 Imagem 21 – Fonte e tanque que pertenceram ao Horto e Jardim Botânico de Vila Rica, transladados após 1931 para os jardins do antigo Palácio dos Governadores, atual Museu de Ciência e Técnica da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto. Fonte: OURO PRETO: Vista da Praça Tiradentes. Belo Horizonte: Postais de Minas, [201-]. Cartão postal; color, 21 x 15 cm. Tão logo o horto foi inaugurado, o espaço foi responsável, também, por outras atividades que não apenas a aclimatação de espécies botânicas, como a pesquisa sobre a existência de espécies vegetais passíveis de serem utilizadas na produção de papel, 218 conforme foi determinado em Carta Régia, datada de 5 de abril de 1799. 681 Nesta, Sua Majestade mandou que fosse remetida ao reino uma relação com as “plantas e árvores que podem servir para fabricar papel”, e que o governador da capitania encarregasse “aos Naturalistas existentes nessa Capitania o cuidado de fazer as precisas indagações, a fim de se conhecer e se encontrar algumas das ditas plantas e árvores cujos ramos possam, depois de uma perfeita maceração na água, dar fio próprio para se fabricar Papel”. 682 Assim, a 20 de novembro do mesmo ano, o governador respondeu informando que havia encarregado “ao doutor Joaquim Veloso de Miranda o cuidado de fazer as precisas indagações de plantas, e árvores que sirvam para fabricar papel [e], em tempo próprio informarei a Vossa Excelência do resultado”.683 Observa-se, então, que o horto configurou-se como um laboratório de pesquisa experimental, ou Centro de Cálculo, segundo a perspectiva de Bruno Latour. É o que se depreende, também, da carta que, em julho do ano seguinte, informava os resultados das prospecções de Veloso de Miranda sobre o tema. Segundo Lorena, “apesar de se encontrarem aqui plantas e árvores próprias para se fabricar papel, estas existem muito espalhadas, em lugares remotos, [o] que faria grande a despesa, para se ajuntar grande e 681 APM, SC 269, Rolo 59, Gav. G-4, Registros de Cartas, Ordens Régias e Avisos (1795-1802), ano 1800, p. 30v. É bem provável que esta ordem, solicitando as ditas averiguações para se saber se havia, em Minas, plantas próprias para se fabricar papel, seja decorrente da proposta enviada por Francisco Joaquim Moreira de Sá, senhor da Casa e Morgado de Sá, em Guimarães, em carta para o secretário de Estado dos Negócios Ultramarinos, no qual vislumbrava um empréstimo por parte da coroa de 30 a 40 cruzados para que pudesse estabelecer, nas Minas, uma fábrica de papel, para poder suprir a demanda que havia deste produto em toda a América. Interessante assinalar que Francisco Joaquim termina a carta recomendando que os naturalistas residentes em Minas fossem incumbidos de realizar uma indagação filosófica a respeito. Aparentemente, projetou ainda um “catálogo das plantas que há na América” consideradas aptas para tais projetos que, no entanto, o mesmo se perdeu uma vez que o documento se encontra incompleto. In: AHU, MG, Cx. 143, Doc. 74, Cód. 9251. Carta de Francisco Joaquim Moreira de Sá para o secretário de Estado dos Negócios Ultramarinos, como senhor da Casa e Morgado de Sá, em Guimarães, pedindo para que lhe sejam pagas as dívidas que lhe tinham feito várias pessoas em Minas Gerais para poder montar nas terras de seu morgado uma fábrica de papel. S/L, 1797. Moacir Rodrigo de Castro Maia, em artigo intitulado “Histórias (re)conectadas: O Horto Botânico de Vila Rica e os jardins do antigo Palácio dos Bispos de Mariana”, afirmou que Veloso de Miranda “mandou construir ‘coches para as experiências das embiras para o papel’, experimento, provavelmente, realizado na fazenda do diretor em Ouro Branco, local em que constituiu laboratório para produção de nitreiras artificiais”. De fato, seria este um interessante local para a realização destes experimentos face a disponibilidade de espaço e de salitre na propriedade rural, ainda que as amostras dos vegetais utilizados pelo naturalista fossem mais facilmente encontradas no horto botânico. O documento assinalado por Moacir, no entanto, não possui as informações assinaladas por ele (AHU, cx. 154, doc. 45, fl. 4). In: MAIA. Histórias (re)conectadas: O Horto Botânico de Vila Rica e os jardins do antigo Palácio dos Bispos de Mariana. Anais do IV Encontro de Gestores de Jardins Históricos. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 2004, p. 107. 682 APM, SC 287, Rolo 61, Gav. G-4, Registros de Cartas, Ordens Régias e Avisos (1795-1802), ano 1799, fl. [72] ou 99. 683 AHU, Minas Gerais, Cx. 151, Doc. 16, Cód. 11428. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, informando que, em consequência da carta de 1799, abril, 5, encarregou Joaquim Veloso de Miranda do exame de plantas e de árvores próprias para o fabrico de papel. Vila Rica, 20 de novembro de 1799. 219 suficiente porção, e ainda maior para se fazer uma plantação própria”.684 Poucos meses depois, em outubro, nova carta de Lorena tratando do envio, em caixa separada, das amostras resultantes das experiências de Veloso de Miranda na fabricação de papel, divididas em dois grupos; as que “se apresentam no estado em que se acham”, compostas de “embiras e lascas de paus maceradas”, relacionadas como guanxuma branca (Sida rhombifolia) e ordinária (Sida spinosa), embira branca e vermelha, paina de embiruçu vermelho (Pseudobombax grandiflorum) e gameleira (Ficus adhatodifolia); e as que maceradas, “ainda se encontravam muito rixas”, compostas de vassoura grande de folha ruiva (Dodonaea viscosa), carrapicho, araticum (Annona montana), jequitibá (Cariniana legalis), pindaíba preta (Guatteria nigrescens) e vermelha (Duguetia lanceolata), embiruçu branca (Eriotheca pentaphylla) e vermelha (Pseudobombax grandiflorum) e embaúba (Cecropia pachystachya). 685 Anexa a carta, algumas notas do naturalista, onde afirma que procurou branquear as amostras em repetidas lavagens, utilizando para isso água fervida com salitre, que era o que tinha em mãos. Os resultados que alcançou, porém, não foram satisfatórios, uma vez que se extraía muito “princípio” e “matéria colorante”, “não obstante fazer ferver por vezes a dita lasca [de madeira] (...) ou ajuntando-lhe cinza”, e que não havia conseguido reduzir a “cor que antes tinha”.686 Além da aclimatação de espécies recolhidas nos sertões, as primeiras atividades de Veloso de Miranda vinculadas ao horto podem ser relacionadas às várias remessas de exemplares botânicos que fez em respostas a pedidos que demandavam desde “belas e cheirosas flores” ou, mesmo, “uma coleção de sementes de todas as plantas” da capitania, que deveriam ser “dirigidas ao diretor do Jardim Botânico da Ajuda com o seu catálogo”, além de outra cópia do mesmo, endereçada ao “Real Erário, para ser presente a sua Alteza Real”.687 Ainda que Veloso de Miranda se mostrasse um estudioso da botânica por predileção, a Coroa não o isentou da recolha de espécimes que atendessem a interesses específicos, como “aves indígenas dessa capitania (...), a fim de povoarem os viveiros 684 APM, SC 269, Rolo 59, Gav. G-4, Registros de Cartas, Ordens Régias e Avisos (1795-1802), ano 1800, fl. 70v. 685 AHU, MG, Cx. 154, Doc. 44, Cód. 11735. Lista (1ª via) de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando amostras de plantas e de árvores próprias para o fabrico de papel, acompanhadas da nota de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 15 de outubro de 1800. 686 Idem. 687 APM, SC 290. Originais de Cartas Régias e Avisos, (1800), fl. 183. 220 da Real Quinta de Belém”,688 colocando à margem, pelos menos momentaneamente, as características que balizavam o pragmatismo filosófico em detrimento do exotismo da avifauna brasílica: Sua Majestade manda recomendar a Vossa Excelência, muito particularmente esta diligência, não se podendo fazer crível, que havendo em todo o Brasil, tanta diversidade de pássaros grandes e pequenos, e tendo-se recomendado tantas e repetidas vezes aos diferentes governadores da América, que se façam as possíveis diligências, não só para a efetiva remessa dos referidos pássaros senão tenha até agora conseguido das Capitanias do Brasil, mais do que araras, papagaios e alguns periquitos ou coisa que o valha, os quais por muito comuns já são aqui de muito pouca estimação, tendo a certeza de que na Quinta de Belém se acha quase acabado um magnífico viveiro e que tendo Sua Majestade tantos e tão extensos domínios no ultramar, não tem pássaros para ele. 689 Não por coincidência o período em que o horto se mostrou mais produtivo, a partir do ano de 1801, corresponde à época em que Veloso de Miranda atuou como secretário do governo da capitania de Minas Gerais, entre os anos de 1799 e 1804. Apesar da crescente responsabilidade, o naturalista não se absteve de suas atividades filosóficas, comportamento que foi apreciado e elogiado na Corte. Constantes foram as ordens para que ele empreendesse viagens e outras indagações filosóficas para além das realizadas em função do horto botânico, como as explorações que fez nos sertões dos rios Abaeté e São Francisco. Procurando evitar a acumulação de encargos que, em sua opinião, poderia se tornar nociva à administração do novo horto botânico, informou ao governo da capitania que o aumento de suas atribuições e as “necessárias ausências [seriam] seguramente prejudiciais ao progresso do mesmo jardim, não havendo quem faça as minhas vezes” naquele local. Na tentativa de abrandar possíveis prejuízos, Veloso de Miranda fez nova representação ao governador da capitania, solicitando que seu auxiliar, o doutor Godoy Torres, fosse seu substituto na administração do horto quando necessário, uma vez que concorria com “as qualidades necessárias para a ocupação de meu Ajudante no sobredito exercício”.690 De 688 APM, SC 290. Originais de Cartas Régias e Avisos, (1800), fl. 184, e APM, SC 290. Originais de Cartas Régias e Avisos, (1800), fl.. 179. Enquanto horto botânico, não era responsabilidade daquela instituição realizar remessas de exemplares animais para a Europa, atividade esta que estaria destinada à ação isolada de naturalistas. No entanto, é bem provável que tal ordem fora imputada ao doutor Veloso quando observamos que dentre as várias remessas que este naturalista fez à Europa uma era dedicada apenas à ornitologia. AHU, MG, Cx. 126, Doc. 48, Cód. 10077, 1787, fl. 1. 689 ANRJ, Cód. 67, Vol. 9, 11, 48, apud HEYNEMANN, Cláudia Beatriz. História Natural na América Portuguesa - 2ª metade do século XVIII. In: Varia História, 20, março de 1999, p. 109. 690 APM, SC 283, Rolo 59, Gav. G-4, Originais de Cartas Régias e Avisos (1798), fl. 92 – 93v. 221 forma análoga, quando havia a necessidade de se ausentar de Vila Rica, delegava a alguns auxiliares suas responsabilidades na secretaria do governo da capitania, tomando as devidas precauções para que o cargo não ficasse a descoberto durante sua ausência. 691 Pode-se concluir que ele soube utilizar sua nova posição política e sua influência junto ao governador da capitania, para dinamizar as atividades de que estava encarregado, especialmente as do horto botânico. Ora enviava ofícios dando ordens a oficiais de todas as comarcas da capitania em benefício das atividades botânicas, ora enviava amostras de sementes, ora solicitava que fossem remetidas para Vila Rica exemplares de plantas, “cebolas” – ou tubérculos, ou ainda bulbos – e cascas de árvores. Por intermédio de João Varela da Fonseca e Cunha, professor régio da Vila de São José del-Rei, enviou a Gonçalo Teixeira de Carvalho, capitão-mor daquela vila, um ofício e “uma porção de sementes de “linho canário” – provavelmente linho cânhamo (Cannabis ruderalis), fibra vegetal bastante utilizada na tecelagem e em cordoarias, que deveriam ser distribuídas por quem melhor as tiver para a agricultura”.692 Apesar do fluxo constante de espécies vegetais enviadas para fora da capitania, apenas em 1801 é possível verificar o estabelecimento efetivo de um quadro de permutas que caracterizava tais espaços físicos. Nesse ano, chegam a Vila Rica as primeiras remessas vindas da Metrópole, compostas por sementes de sândalo (Santalum album) e endereçadas ao “naturalista Joaquim Veloso de Miranda”, que deveria plantá-las no horto da capital e distribuí-las a quem soubesse aproveitá-las da melhor forma. 693 Nesse caso e no anterior, observa-se o papel do horto não apenas na coleta, na aclimatização e na pesquisa de espécimes nativas e exóticas, mas de difusor do conhecimento botânico ali construído, contribuindo para a produção em larga escala de espécimes que apresentassem viabilidade econômica. É interessante também perceber a formação de uma rede de agricultores capazes, isto é, bem instruídos, indispensáveis ao sucesso da empreitada. Não por acaso, a Casa do Arco do Cego foi encarregada da impressão de manuais que preparassem e atualizassem os leigos nas técnicas mais modernas. Neste mesmo ano, vários foram os ofícios enviados pela secretaria do governo 691 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa histórica, p. 93-95. 692 Nesta ocasião, Veloso de Miranda enviou através de João Varella da Fonseca e Cunha, professor Régio da Vila de São José del-Rei, ao senhor Gonçalo Teixeira de Carvalho, Capitão Mor da Vila de São João del-Rei, uma porção das referidas sementes. In: APM, SC 279. Registros de Cartas, Ordens e Portarias do Governador a Diversas autoridades da Capitania. 1797-1809, fl. 27v. 693 APM, SC 295. Originais de Cartas Régias e Avisos, (1801), fl. 228. 222 da capitania a diversas vilas e arraiais, solicitando a recolha e o envio de exemplares botânicos para o horto de Vila Rica. Além das justificativas, os ofícios possuíam, em anexo, listas onde eram assinaladas as espécies que deveriam ser recolhidas, por meio de seus nomes populares. Veloso de Miranda recomendava ainda que as remessas fossem enviadas com sobriedade, para que chegassem à capital “vivas e bem acondicionadas”, aconselhando também moderação quanto à quantidade de amostras transportadas, para que não fossem embaraçados os negócios daqueles que as transportavam. Desse modo, ao capitão mor Antônio Álvares Pereira, da Cidade de Mariana, solicitou o envio de bromélias de Passagem [de Mariana], de amendoins e de tamarindos. De Piranga, “plantas ornamentais e bromélias de todas as qualidades”, bem como “palmitos (provavelmente o palmito chamado de jussara, comum na Mata Atlântica, Euterpe edulis), ameixas (Eriobothrya japonica), pitangas (Eugenia uniflora), articuns (Annona montana) e araribás” (Centrolobium tomentosum).694 Como nos outros ofícios, nestes também constavam as instruções que deveriam ser rigorosamente seguidas: Recolhidas os [ilegível] e mais raízes em barro feito de terra vermelha e água, isso [ilegível] pedaços e folha de bananeira secas e se atem com uma embira. Arranjado assim os [ilegível] forrados com as ditas folhas de bananeira secas borrifadas com água. Haverá o cuidado de se recomendar aos condutores que ponham em exceção essa regra todos os dias a lhes serem as plantas recolhidas ao Real Jardim Botânico. Devem ainda cada umas das espécies pedidas [ter de] 10 até 12 pés [de altura]. 695 Ao intendente do ouro da vila de Sabará, Francisco de Paula Beltrão, solicitou jenipapos (Genipa americana), mangabas (Hancornia speciosa), romãs (Punica granatum), frutos do “coqueiro chamado de macaúbas” (Acrocomia aculeata), cajás manteiga (Spondias mombin), cajus (Anacardium occidentale) e goiabas (Psidium guajava) de todas as qualidades. Ao capitão Florindo Guedes Pinto de Souza Carvalho, comandante da vila de Paracatu, “atas e frutas do conde (Annona squamosa), umbus (Spondias tuberosa) e frutos do coqueiro chamado gurimba”. Ao sargento mor Thomaz Joaquim de Almeida, da vila de Campanha; mangas (Mangifera indica), frutos de castanheiras e de nogueiras, amêndoas de pequi (Caryocar brasiliense), romãs (Punica 694 APM, SC 279, Registros de Cartas, Ordens e Portarias do Governador a Diversas autoridades da Capitania (1797-1809), fl. 30-30v. 695 Idem, fl. 31. 223 granatum), cajus (Anacardium occidentale), grumixamas (Eugenia brasiliensis) e laranjeiras (Citrus sinensis). 696 Assim como nos primeiros ofícios, nestes também estavam presentes as recomendações que deveriam ser observadas quando da coleta e do transporte. No ano seguinte, 1802, novos ofícios foram expedidos para as vilas de Sabará, São João del-Rei, e para o arraial do Indaiá, devendo ser “tirados dos matos daqueles distritos e paragens frutos, cascas, mudas ou sementes de quina, “sassafrão (provavelmente a canela sassafrás, Ocotea odorífera), óleos e frutos de copaíba (Copaifera sp), jatobás (Fabaceae caesalpinioideae), jambos (Syzygium jambos), pitangas (Eugenia uniflora), salsaparrilha (Smilax ornata), pau-terra (Qualea grandiflora), articuns (Annona coriacea), pequis (Caryocar brasiliense), jabuticabas (Plinia cauliflora), mangabas (Hancornia speciosa) e mudas de angelim” (Hymenolobium petraeum ou Dinizia excelsa). O Ofício destinado à vila de Sabará, em especial, encarregava o ouvidor Francisco de Souza Guerra de Araújo Godinho de ser o responsável pelas atividades de recolha dos exemplares botânicos, devendo realizar com a “brevidade que lhe for possível”.697 Para tanto, poderia “servir-se de todos os Oficiais de Milícias e Ordenanças que para o referido fim lhe forem necessário”, devendo ainda “enviar uma conta assinada de toda a despesa que se fizer para ser paga pela Real Fazenda”. 698 Novamente, instruções técnicas foram elaboradas para o correto andamento das diligências e, segundo estas, as frutas e plantas deveriam ser recolhidas bem maduras, e em dia de sol, que venham nas suas cascas naturais, ou bainhas (?), e que sejam recolhidas em sacos de algodão, com seus nomes e préstimos se o souberem, e que venham em quantidade suficiente de meia quarta [4,5 litros] pouco mais ou menos. 699 Apesar dos vários ofícios enviados, aparentemente nem todos foram respondidos e em julho de 1801, Veloso de Miranda, demonstrando alguma impaciência, escreveu 696 APM, SC 279, Registros de Cartas, Ordens e Portarias do Governador a Diversas autoridades da Capitania (1797-1809), fl. 31-32v. 697 Provavelmente, Ouvidor da vila de Mariana. Em 1789 Araújo Godinho exercia a advocacia naquela vila. In: ANTUNES, Álvaro de Araújo. Espelho de cem faces: o "universo relacional" de um advogado setecentista. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: PPGH/UFMG, p. 163. Além do curso de Direito, formou-se em Matemática, em Coimbra, em 1778 e 1779, respectivamente. In: MORAIS, Francisco. Estudantes brasileiros na Universidade de Coimbra (1772-1872). In: AFBN, vol. 62, 1940, p. 163. 698 APM, SC 277, Registros de cartas do Governador a várias autoridades e destas ao mesmo, 1797-1803, fl. 17, 17v e 18. 699 APM, SC 277, Registros de cartas do Governador a várias autoridades e destas ao mesmo.1797-1803, fl. 17-18. A medida portuguesa “quarta” correspondia a 3,45 litros, sendo meia-quarta o equivalente a 1,725 litro. 224 novamente ao capitão mor de Mariana, solicitando as plantas que “até o presente nada tem aqui [no Jardim Botânico] aparecido”, 700 diferentemente do posicionamento adotado pelo ouvidor da comarca de Sabará, Francisco de Souza Guerra Godinho, que escreveu diretamente ao governador alegando não ter “feito remessa alguma dos produtos naturais porque só o capitão do distrito do Curral d’El Rey, Tomé da Rocha Machado, teria feito uma pequena remessa, prometendo aumentá-la nos primeiros meses do ano futuro”. Nessa mesma ocasião, informou ainda que tinha retransmitido o pedido para os capitães-mores das freguesias e arraiais de Taquaruçu, Sete Lagoas e Pitangui, revelando a descentralização e a dinamização das atribuições. Os responsáveis por estes núcleos urbanos, segundo Godinho, no entanto, “nem resposta deram”.701 Interessante notar, por meio dessas informações, que parte das coletas e das remessas botânicas realizadas na capitania foi realizada não diretamente por Veloso de Miranda ou por outros naturalistas, mas por representantes camarários e outros delegados. Em uma simples analogia, a elite portuguesa, ávida pelos saberes e pelos recursos naturais coloniais, valia-se dessa estrutura como uma árvore. Do seu tronco, ou seja, das classes mais altas, partiam as demandas de coleta e de remessas, transmitidas aos galhos maiores e, destes, aos galhos menores, até que a mensagem fosse propagada aos ramos menores, o último elo da corrente ilustrada. Uma vez transmitidas aos pequenos sítios, freguesias e arraiais, estas mensagens buscavam não apenas um auxílio para que o que havia sido determinado fosse cumprido, mas acabavam dando conta a seus moradores da nova orientação política e econômica do Reino, fazendo transparecer, nos mais recônditos sertões, que todos aqueles “matos” e “pedras” eram, de fato, possuidores de algum valor. Ademais, o relacionamento das elites políticas portuguesas para com a História Natural também pode ser observado quando estes utilizavam, em suas correspondências, terminologias técnicas, a exemplo da correspondência enviada, em 1797, por Rodrigo de Sousa Coutinho ao vice-rei, José Luís de Castro (1744-1819), o Conde de Rezende, onde foi remetido “um desenho da árvore da quina do Peru (Cinchona officinalis), segundo Lineu”.702 Por outro lado, no entanto, a correspondência enviada pelas elites para as autoridades locais utilizava uma 700 APM, SC 279, Registros de Cartas, Ordens e Portarias do Governador a Diversas autoridades da Capitania. 1797-1809, fl. 32v. 701 APM, SC 307, Informação de serviço de Francisco de Souza Guerra Araújo Godinho, ouvidor da Comarca, ao Governador sobre a impossibilidade de enviar as remessas de produtos naturais, plantas e frutos do Curral del-Rei. SG-Cx. 41, Doc. 17. Sabará, 17 de dezembro de 1798. 702 ANRJ, Correspondência entre a corte e os vice-reis. Códice 67, v.22, 11.92, apud HEYNEMANN. História Natural na América Portuguesa, p. 106. 225 linguagem informal e popular, sem que fossem mencionadas as nomenclaturas científicas de cada espécie, mas terminologias de fácil compreensão, como “cebolas”, por exemplo, quando a intenção era designar algum tubérculo, bulbo ou raiz, não sendo difícil imaginar que essa troca de correspondência e de conhecimentos tenha sido responsável, inclusive, por ampliar o vocabulário e os saberes para com Botânica mineira nas autoridades locais. Apesar de nos cinco primeiros anos de existência o Horto Botânico de Vila Rica ter recebido maior atenção por parte de Veloso de Miranda e do governo da capitania, após a saída do naturalista do cenário político, em 1804, tornam-se inexistentes ou, quando muito, bastante escassas as referências nos documentos oficiais sobre sua pessoa e ao estabelecimento que criou. Apenas em 1806, ou seja, dois anos após ter sido retirado oficialmente do cargo de secretário, seu nome torna a emergir nas fontes, quando ao naturalista foi atribuída a avaliação de algumas amostras mineralógicas, em Vila Rica, 703 indicando que, naquele momento, ele se encontrava na capital, conquanto fosse mais provável que já tivesse se estabelecido na Fazenda do Mau Cabelo. 704 Apenas a partir da década de 1810, por meio de notícias registradas por naturalistas, viajantes, negociantes e religiosos que passaram por Vila Rica, algumas poucas referências seriam observadas sobre este espaço, como aquelas assinaladas pelo negociante inglês John Mawe (1764-1829) que, em seu diário, teceu alguns comentários acerca dos jardins de Vila Rica, surpreendendo-se com um em especial, ou, em suas palavras, com o que havia restado de suas instalações, que José Ferreira Carrato acredita ser o horto planejado por Veloso de Miranda. 705 Apenas no ano de 1825 surgem outras notícias sobre o horto de Vila Rica, agora Imperial Cidade de Ouro Preto. 706 Reinaugurado como Jardim Botânico, teve suas instalações transferidas da Rua de São José, no Centro, para região conhecida como Passa Dez, distante “uma milha do centro”,707 sendo as ruínas do chafariz de duas bicas 703 APM, SC 309, Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-67, Gav. G-4. 1805-1807, fl. 60, 68 e 139. 704 Curiosa informação nos revela Varnhagen, afirmando que em 1805 Veloso de Miranda teria se estabelecido “na Bahia, no engenho da Ponta do Iguape, onde contribuiu a serem melhorados os processos da lavoura”. In: VARNHAGEN, Francisco Adolfo de. História geral do Brazil [...], vol. 2. Rio de Janeiro: Em casa de E. e H. Laemmert, 1877, p. 1044. 705 CARRATO. Uma casa portuguesa com horta e jardim, p. 220. 706 SCARLATO, Francisco Capuano. Quro Preto: Cidade Histórica da Mineração no Sertão Brasileiro. In: Anales de Geografia de la Universidad Complutense, nº. 16, Madrid: Servicio de Publicaciones de la Universidad Complutense, 1996, p. 126. Disponível em http://revistas.ucm.es/index.php/ AGUC/article/viewFile/AGUC9696110123A/31488. Acesso em 21 de setembro de 2016. 707 HEYNEMANN. História natural nas Minas Gerais Setecentistas, p. 115. 226 que ainda hoje se encontra neste terreno provável fruto de sua reinauguração. 708 A “avenida que conduz ao [novo] jardim [botânico], bem como outras que o rodeiam, está plantada com o pinho brasileiro (Araucaria brasiliensis)”, “árvores de cerca de 30 anos de idade [que] produzem em abundância suas grandes pinhas anuais”, o que dava dá grande realce à beleza das terras”, afirmou George Gardner em sua passagem por Ouro Preto. 709 No valoroso espaço de Ciências que criou no centro de Vila Rica, Veloso de Miranda deu continuidade a inúmeras pesquisas, muitas das quais a ele designadas por parte da Coroa, e outras tantas frutos de sua curiosidade filosófica. Para tanto, e ocupando-se ainda de outros afazeres em sua vida profissional e pessoal, utilizou-se não em poucas ocasiões da contribuição de inúmeros auxiliares, tanto seus pares, naturalistas, quanto seus subordinados, entre pupilos, jovens aprendizes e escravos, inclusive, que o auxiliaram nas atividades de coleta, preparação, condução e experimentos, relações pessoais que serão melhor analisadas ao longo do próximo capítulo. 708 Na década de 1930, a Inspetoria de Monumentos Nacionais do Museu Histórico Nacional, encarregada dos trabalhos de reparação e conservação dos monumentos históricos de Ouro Preto e dirigida por Gustavo Adolfo Luiz Guilherme Dodt da Cunha Barroso (1888-1959), apresentou ao Ministério da Educação um minucioso plano dos serviços a serem executados em Ouro Preto. O chafariz do antigo Jardim Botânico do Passa Dez fora contemplado com obras de reforma por sua importância histórica e, segundo relatório publicado nos Anais do Museu Histórico Nacional, por ser “ainda hoje utilizado pela população pobre de suas vizinhanças, estando constantemente a água a cair”. Quando da restauração, foram realizados serviços de “limpeza a picão” nos muros de canga e nos encontros das pedras, recomposição das cantarias danificadas e conserto dos muros laterais, em obra orçada a 2:092$500 réis. Nesta reforma, foram inseridos nos chafariz os ornamentos em pedra, na forma de peixes estilizados, e um tanque em pedra, o que nos revela que a construção em seu estágio primitivo era desprovida de tais adereços. AMHH, vol. VI, 1945. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1950, p. 51-55. Neste recorte histórico, o terreno do Jardim Botânico instalado no Passa Dez estava sob a disposição do Instituto Barão de Camargos. 709 GARDNER, George. Viagem ao interior do Brasil: principalmente nas províncias do Norte e nos distritos do ouro e do diamante durante os anos de 1836-1841. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo; Belo Horizonte: Itatiaia, 1975, p. 220. 227 CAPÍTULO 6 ALVÉOLOS DE UMA GRANDE COLMEIA: VELOSO DE MIRANDA E SEUS AUXILIARES NAS MINAS 6.1 – Entre assessores e observadores privilegiados O zoólogo brasileiro Cândido de Mello Leitão (1886-1948), em sua Historia das expedições cientificas no Brasil, ao se referir ao naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira, afirmou que à época desse e de seus contemporâneos brilhava, em Coimbra, a “colmeia brasileira, quer de professores, quer de estudantes”, referindo-se ao grande número de savants de origem mazomba que por meio das letras se afirmavam na Corte. 710 A colmeia, como conjunto de alvéolos, adquiriu em Mello Leitão analogia a um coletivo de homens que brilharam não apenas do lado de lá do Atlântico, mas que passados alguns anos, de volta à Pátria, haveriam de se tornar notórios, expandindo aquela colmeia do lado de cá. Os que outrora foram operários na velha Coimbra, no entanto, tornaram-se aqui abelhas-rainhas, no sentido de que em suas mãos estavam a condução de novas responsabilidades, as quais sendo impossíveis de ser conduzidas por uma única pessoa, haveriam de ser compartilhadas. Longe de ser uma atribuição solitária, a rotina do naturalista viajante em campo previa várias atividades, como a coleta de exemplares, sua identificação, por vezes sua representação em risco e sua preparação para o transporte. Particularmente aos estudos botânicos, havia a necessidade de expor o acervo para acelerar sua desidratação, o que também era feito embrulhando os exemplares em papel encerado, importado da Europa, ou na falta deste em papel preparado com a cera de velas. Também preparar os muares, equipando-os para acomodar as bruacas, onde eram guardados os acervos, estabelecer o local de pouso, o preparo das comedorias e guardar os animais em pasto seguro eram todas atividades impossíveis de serem realizadas por apenas uma ou duas pessoas, motivo pelo qual havia a necessidade de que auxiliares acompanhassem os naturalistas durante as viagens filosóficas. Esta relação, no entanto, não estava restrita apenas a participação de homens incultos, responsáveis pelas lides diárias, sendo comum a participação de homens 710 LEITÃO, Cândido Firmino de Mello. Historia das expedições cientificas no Brasil. São Paulo: Cia. Ed. Nacional, 1941, p. 213, apud STELLFELD. Os dois Vellozo, p. 214. 228 instruídos nas letras e nas artes nestas jornadas, incumbidos das atividades que demandavam conhecimentos mais técnicos. Quando de sua expedição à Amazônia, por exemplo, Alexandre Rodrigues Ferreira se fez acompanhar por vários auxiliares, como o jardineiro botânico Agostinho Joaquim do Cabo (?-1789), o astrônomo e arquiteto bolonhês Antônio José Landi (1713-1791), e os riscadores portugueses José Joaquim Freire (1760-1847) e José Codina (?-1793), além de religiosos e numeroso contingente militar, composto por duas centenas de homens, entre oficiais e graduados, portugueses e indígenas. Enquanto isso, nas Minas, as viagens filosóficas envolviam menor quantidade de homens e de recursos, como aquela que fez Vieira Couto como integrante da comitiva de Francisco de Paula Beltrão, Intendente do Ouro da Comarca do Rio das Velhas, encarregado das diligências militares e científicas no sertão do Abaeté e que tinha, nesta empreitada, a missão de descobrir novos depósitos minerais, sobretudo de ouro, nitro e chumbo. Em sua Memória sobre as minas da capitania de Minas Gerais, de 1801, Vieira Couto legou algumas interessantes anotações sobre essa invernada, bem como sobre os recursos humanos que a compunham: (...) saímos de Vila Rica à ordem do mesmo Excelentíssimo General em uma quinta-feira, 24 de Abril de 1800, pelas 5 da manhã, e seguimos o caminho do arraial da Cachoeira, que nos ficava para o Poente 3 léguas e meia. A comitiva empregada nestes mesmos exames compunha-se do Intendente do ouro do Sabará, Francisco de Paula Beltrão, encarregado da arrecadação das preciosidades que apparecessem; do sargento-mór Antônio José Dias Coelho, que auxiliava a diligencia com uma trintena de soldados; de mim, que tinha obrigação de observar estas coisas, que agora as vou lançando por estas paginas. 711 De forma análoga, Veloso de Miranda também se fez acompanhar de auxiliares em suas indagações filosófica pelo sertão mineiro, valendo-se de militares, engenheiros, médicos, cirurgiões, riscadores, pintores e escravos, companhias constantes do naturalista em suas viagens e nos experimentos que conduziu no Horto Botânico de Vila Rica e na fazenda do Mau Cabelo. De todos, José Gervásio de Souza Lobo e Apolinário de Souza Caldas apresentam-se como os mais afamados ou, pelo menos, aqueles de quem mais temos notícias, ainda que outros como cirurgião Antônio José Vieira de 711 COUTO, José Vieira. Memória sobre as minas da capitania de Minas Gerais; suas descriçoes, ensaios e domicílio próprio, à maneira de itinerário, com apêndice sobre a Nova Lorena Diamantina, sua descrição, suas produções mineralógicas e suas utilidades que deste país possam resultar ao Estado, escrita pelo Doutor José Vieira Couto, e publicada sob os auspícios do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil. Rio de Janeiro: Em Casa dos Editores Laemmert, 1842, p. 38. 229 Carvalho também tenham participado ativamente das pesquisas conduzidas por Veloso de Miranda. 6.1.1 – Antônio José Vieira de Carvalho, o cirurgião Natural da freguesia de Atalaia, conselho de Vila Nova da Barquinha, este português radicado em Vila Rica, morador em uma casa na rua Direita, 712 exerceu as funções de médico e cirurgião no Regimento de Cavalaria de Vila Rica, bem como de juiz ordinário e examinador para o licenciamento de cirurgiões-mores na Câmara local. 713 Com formação adquirida no Hospital Real de Todos os Santos, em Lisboa, onde foi “discípulo do ilustre médico português Manuel Constâncio”,714 iniciou sua carreira no ano de 1781, quando assentou praça na função de auxiliar do cirurgião no regimento de Vila Rica. 715 Passados alguns anos, já havia sido alçado ao posto de médico-cirurgião e, por influência do governador, Bernardo José de Lorena, foi indicado para ocupar o cargo de lente de anatomia e cirurgia no Hospital Real Militar de Vila Rica. 716 Não se sabe, contudo, se de fato Vieira de Carvalho chegou a exercer tal 712 MATHIAS. Um recenseamento na Capitania de Minas Gerais... p. 109. 713 ROSA, Maria Cristina. Da pluralidade dos corpos: educação, diversão e doença na Comarca de Vila Rica. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2005, p. 190-191 (Tese de Doutorado em Educação, Universidade Estadual de Campinas). 714 BRASIL. Autos da Devassa da Inconfidência Mineira... Vol. 1, p. 313. 715 AHU, MG, Caixa 156, Doc. 27, Código 11775. Requerimento de Antônio José Vieira de Carvalho, cirurgião-mor do Regimento de Cavalaria Regular da Capitania das Minas, pedindo a mercê do Hábito da Ordem de Cristo ou de Ávis, atendendo aos seus serviços e a ter feito entrar, na Real Casa de Fundição de Vila Rica, mais de 8 arrobas de ouro. Vila Rica, 4 de fevereiro de 1799. 716 A ideia de se criar uma cadeira de Anatomia, Cirurgia e Partos surgiu através de ofício escrito por Joaquim Félix Pinheiro que, me 1797, “propôs ao governador da capitania, Visconde de Barbacena”, a criação da mesma, “afirmando que dela a capitania de Minas Gerais muito necessitava” e que havia grande “caridade de cirurgiões inteligentes”. In: NISKIER, Arnaldo. História da educação brasileira: de José de Anchieta aos dias de hoje, 1500-2010. São Paulo: Editora Europa, 2011, p. 69. A solicitação em questão encontra-se em: APM, CC, Cx. 080, Doc. 20135. Carta de Joaquim Felix Pinheiro sobre a criação de uma cadeira de Cirurgia, Anatomia e Parto, com a finalidade principal de atender a população. Vila Rica, 03 de outubro de 1797 e em uma cópia deste documento, em AHU, MG, Cx. 143, Doc. 10904. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando seu parecer sobre os meios próprios com que se poderá estabelecer a cadeira de Cirurgião na Vila Rica. Vila Rica, 7 de outubro de 1797. Joaquim Felix Pinheiro, no entanto, não assumiu a cadeira que propôs, e Bernardo José de Lorena achou conveniente que Vieira de Carvalho o fizesse, pois este havia sido “discípulo de Manoel Constâncio no Hospital Real de Lisboa”, era possuidor “de grandes creditos nesta Capital, e de bons estudos”, “que talvez exercitasse a dita cadeira com menos despesa da Real Fazenda” e que havia, no Hospital Militar, “lugar para se estabelecer uma aula suficiente”. In: AHU, MG, Cx. 143, Doc. 10904. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando seu parecer sobre os meios próprios com que se poderá estabelecer a cadeira de Cirurgião na Vila Rica. Vila Rica, 7 de outubro de 1797. Interessante lembrar que em 1768, os oficias de Sabará solicitaram autorização à Corte para a criação de uma cadeira de cirurgia e medicina naquela vila, o que foi indeferido. JESUS, Nauk Maria de. “Aulas de cirurgia no centro da América do Sul (1808-16)”. História, Ciências, Saúde: Manguinhos, Vol.1, Nº 1. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz, 2004, p. 96. 230 função, uma vez que as aulas deveriam ter sido abertas ao público a partir do ano de 1801, 717 momento em que Carvalho se encontrava na Corte, tratando de problemas de saúde. 718 Por meio de suas atribuições como médico e cirurgião, Vieira de Carvalho construiu e consolidou seu interesse pelas Ciências, mantendo um relacionamento filosófico bastante próximo com Veloso de Miranda, em função de atividades profissionais que a ambos interessavam, conforme apontou Boschi. 719 Nesse ínterim, um fragmento dos Autos da Inconfidência Mineira revela que Veloso de Miranda “assistia” com Viera de Carvalho,720 o que também podemos verificar em vários outras fontes históricas, como na correspondência enviada por Veloso de Miranda a Vandelli, em 1794, onde revelou que estava realizando algumas observações médicas “juntamente com o cirurgião-mor do Regimento de Cavalaria”, “a respeito do Balsamo de Copaíba [(Copaifera SP)] na cura da Morfeia”, ou mal de São Lázaro.721 Segundo Veloso de Miranda, era corrente a história na capitania de que na freguesia de Aiuruoca, “distante desta capital três dias de jornada, se curava a dita moléstia” com um bálsamo preparado a partir do óleo desta árvore, mas que o tratamento dispensado aos enfermos era dúbio, já que “alguns ficavam perfeitamente sãos e outros não”.722 Procurando saber mais sobre o assunto, ambos os letrados vieram a descobrir que o método de cura utilizado naquela freguesia era baseado não apenas no óleo da copaíba, mas também em “supertições populares e muitas superfluidades, com grande falta das disposições necessárias para melhor acertar o remédio”. Ainda segundo o naturalista, ele e Vieira de Carvalho, com algum esforço, reuniram algumas esmolas para “fazer observações e para a subsistência dos enfermos”, em Vila Rica, e ali “compuseram uma casa”, à espécie de um hospital, onde receberam “treze doentes”. 717 As aulas de medicina ali ministradas foram criadas por Carta Régia de 17 de junho de 1801 e se encerrariam em meados do século XIX. LIMA, Cláudio de. Notas sobre alguns estabelecimentos de Ouro Preto. In: DRUMMOND, Maria Francelina Silami Ibrahim (Org.). Bi-Centenário de Ouro Preto (1711-1911): Memória Histórica. Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Estado de Minas Gerais, 1911. Reedição. Ouro Preto: Editora Liberdade, 2011, p. 117. 718 ARNALDO, Niskier. História da Educação Brasileira: de José de Anchieta aos dias de hoje, 1500-2010. São Paulo: Europa, 2011, p. 69. 719 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 205-206. 720 BRASIL. Autos da Devassa da Inconfidência Mineira... vol. 5, p. 565-566. 721 AHMB, Cota: CN/M-71. MIRANDA, Joaquim Veloso de. Carta para Domingos Vandelli sobre suas diligências em Minas Gerais e do envio de 300 estampas de plantas e animais. Vila Rica, 2 de dezembro de 1794, apud BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 129. 722 AHMB, Cota: CN/M-71. MIRANDA, Joaquim Veloso de. Carta para Domingos Vandelli sobre suas diligências em Minas Gerais e do envio de 300 estampas de plantas e animais. Vila Rica, 2 de dezembro de 1794, apud BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 129. 231 Naquele ambiente, procuraram dispor aos “enfermos tudo o que fosse capaz de abrandar-lhe a pele” e “adoçar os humores”. Com efeito, Veloso de Miranda ressaltou que (...) tem desaparecido em quase todos uma boa parte dos tumores, tem-se cicatrizado chagas terríveis, e nem um só deixa de sentir melhora. Só o que todos os dias observo melhoras, sem ainda chegar ao fim, me faz não duvidar de que este seja o especifico desta moléstia: excessiva evacuação que o balsamo move por suores continuados, e por veias faz considerá-lo com um poderoso inconsciente, além de vulnerável meio e por consequência próprio para fazer a cura. Vamos continuando com todo o cuidado no tratamento dos ditos enfermos, e no fim mandarei o resultado das nossas observações. 723 Aparentemente o naturalista não redigiu outros relatos sobre estas pesquisas ou se o fez, infelizmente estes se perderam. No entanto, observa-se que estudos médicos e botânicos inovadores eram realizados na capitania de Minas Gerais, buscando colocar fim ou dirimir uma das temidas patologias do século XVIII. Como em outros setores, e conforme destaca Bruno Latour, a produção do conhecimento não era formulada numa única direção, isto é, da Europa para a América. Nesse sentido, não apenas Portugal continental, mas também a America portuguesa bem como os outros domínios lusos contrubuíam transformar o panorama da Ciência ocidental, sob a égide Iluminista. Entre os legados de Vieira de Carvalho, no entanto, o mais importante foi a tradução que fez para o português da obra Observation sur les maladies des nègres, 724 escrita pelo cirurgião-mor francês Jean-Barthélemy Dazille (1732/1733-1812), e que havia sido publicada na França, em 1776, escrita a partir de suas experiências como médico em Caiena, onde observou que eram grandes os prejuízos financeiros dos senhores de escravos que não zelavam pela saúde dos seus cativos. As doenças que constantemente os acometiam, segundo Dazille, refletiam as péssimas condições sanitárias, as habitações inadequadas, o trabalho exaustivo e a alimentação precária, restrita e insuficiente. Vieira de Carvalho percebeu a utilidade da obra, pois as condições em que viviam os cativos eram bastante similares na América portuguesa. A tradução foi 723 AHMB, CN/M 71. MIRANDA, Joaquim Veloso de. Carta para Domingos Vandelli sobre suas diligências em Minas Gerais e do envio de 300 estampas de plantas e animais. Vila Rica, 2 de dezembro de 1794. 724 DAZILLE, Jean Barthélemy. Observações sobre as enfermidades dos negros, suas causas, seus tratamentos, e os meios de as prevenir. Tradução de Antônio José Vieira de Carvalho. Lisboa: Typographia Chalcographica, Typoplastica, e Litteraria do Arco do Cego, 1801, 189 p. Disponível em http://www.brasiliana.usp.br/handle/1918/00622200#page/1/mode/1up. Acesso em 28 de outubro de 2016. 232 impressa, em Lisboa, no ano de 1801, pela Tipografia do Arco do Cego, com o título de Observações sobre Enfermidades de Negros: suas causas, seus tratamentos e os meios de prevenir. 725 Como Veloso de Miranda, Vieira de Carvalho possuía respeitável biblioteca, o que revela ser profissional atualizado, cosmopolita e ávido por informações sobre seu campo de atuação profissional. Quando da realização de seu inventário, foram listados 133 títulos, grande parte versando sobre cirurgia e anatomia, ainda que livros sobre botânica, geografia, dicionários e obras literárias, como as poesias de Camões, também se fizessem presentes. 726 Não foram listadas obras proibidas, mas isso não significa que ele não possuísse tal tipo de livro, pois não fariam parte do espolio inventariado; ou que não tivesse tido acesso a eles. A leitura compartilhada e o empréstimo de livros eram práticas comuns à época, entre as elites letradas. Interessante verificar a coincidência de 11 títulos entre as livrarias de Vieira de Carvalho e Veloso de Miranda, conforme assinalou Boschi. 727 Ambos possuíam as Observations sur les maladies vénériennes, do médico português Antônio Nunes Ribeiro Sanches (1699-1782), 728 o livro de anatomia Traité complet d’anatomie ou description de toutes les parties du corps humain, de Raphael-Bienvenu Sabatier (1732-1811), 729 os de química, de Antoine Baumé (1728-1804) e de Jean-Antoine Chaptal (1756-1832), 730 e as obras botânicas Compendio de botânica ou noçõens 725 DAZILLE, Jean Barthélemy. Observações sobre as enfermidades dos negros... 726 APM, SG, Cx. 108, Doc. 43. Inventário do capitão mor cirurgião do Regimento da Cavalaria de linha, da capitania de Minas Gerais, Antônio José Vieira de Carvalho. Vila Rica, 26 de novembro de 1818. Os bens arrolados no inventário podem ser consultados também em APM. Inventário dos bens móveis de Antônio José Vieira de Carvalho, capitão cirurgião mor deste regimento de Cavalaria de Linha de Minas Gerais In: Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, Ano X, fascículos III e IV, jul.-dez. 1905. p. 706-709. O documento original encontra-se no Arquivo Histórico do Museu da Inconfidência – Casa do Pilar, em Ouro Preto. AHMI, 1º Ofício, Códice 306, Auto 6576. Testamento de Antônio José Vieira de Carvalho. Vila Rica, 1820, fl. 3v. 727 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 205, nota 143. Os livros de Carvalho podem ser encontrados em seu inventário post-mortem, transcrito parcialmente e publicado na Revista do Arquivo Público Mineiro. Inventário dos bens móveis de Antônio José Vieira de Carvalho, capitão cirurgião mor deste regimento de Cavalaria de Linha de Minas Gerais. RAPM, Belo Horizonte, v.10, fasc. III-IV, jul.-dez. 1905, p.706-709. 728 SANCHES, Antoine Nunés Ribeiro (1699-1783). Observations sur les maladies vénériennes. Paris: Chez Théophile Barrois, 1785. 729 SABATIER, Raphael-Bienvenu. Traité complet d’anatomie ou description de toutes les parties du corps humain. 2 ed. Paris: Chez Thèophile Barrois, 1792. 4 v. A primeira edição, em dois volumes, foi publicada em Paris, em 1716. 730 BAUMÉ, Antoine. Chymie expérimentale et raisonnée. Paris: Chez P. François Didot le Jeune, 1773. 3 v.; CHAPTAL, Jean-Antoine. Èléments de chimie. Montpellier: J.-F. Picot, 1790. 3 v. 233 elementares desta sciencia, de Brotero (1744-1828), 731 Systema naturae, de Lineu 732 e Diccionario dos termos techinicos de História Natural, de Vandelli. 733 Como era comum entre as elites ilustradas da época, a maioria dos livros diziam respeito diretamente à prática profissional, como a Medicina, no caso de Vieira de Carvalho. Mas como Veloso de Miranda, de quem se tornara colaborador, o cirurgião também demonstrou interesse por temas diversos, como os relativos à mineração, assunto recorrente entre os ilustrados da capitania, e pela manufatura, atividades fundamentais e interconectadas para a promoção do desenvolvimento da região, e alvo dos interesses dos ilustrados que investigaram as potencialidades locais. Sabe-se que, em Saramenha, distante menos de uma légua de Vila Rica, o cirurgião explorava uma mina de topázios e estabelecendo, entre 1802 e 1808, em sua propriedade rural, a chácara denominada Saramenha, 734 nas proximidades, 735 uma manufatura de cerâmicas, em sociedade com o padre José Joaquim Viegas de Menezes, que havia aprendido a técnica de produção em Portugal. 736 Quando de sua passagem por Lisboa, em 1801, objetivando honra e reconhecimento, Vieira de Carvalho requereu a mercê do hábito da Ordem de Cristo ou de São Bento de Avis. Afirmava, como suplicante, que havia feito entrar na Casa de Fundição de Vila Rica pouco mais de oito arrobas de ouro no ano anterior, 737 o que lhe habilitava, conforme a legislação pombalina, a requerer tal mercê, conquanto segundo Roberta Stumpf, um proprietário de lavras afortunado não poderia “ser equiparado a um 731 BROTERO, Félix de Avelar. Compendio de botânica ou noçoens elementares desta sciencia, segundo os melhores escritores modernos, expostos na língua portugueza por Felix Avelar Brotero. Paris/Lisboa: Paulo Martin, 1788. 2 v. 732 LINNÉ, Caroli a/Carolus Linnaues. Systema naturae per regna tria naturae, secundum classes, ordines, genera, species; cum characteribus, differentiis, synonymis, locis. Tomus primus – [tertius]. Editio décima tertia, aucta, reformata/cura Jo. Frid. Gmelin. Lugduni (Lyon): Apud J. B. Delamolliere, 1789-1796. 3 v. 733 VANDELLI, Domingos. Diccionario dos termos techinicos de História Natural: extrahidos das Obras de Linnéo, com a sua explicação, e estampas abertas em cobre, para facilitar a intelligencia dos mesmos: e a Memoria sobre a utilidade dos jardins botânicos: que offerece a Raynha D. Maria I. Nossa Senhora/Domingos Vandelli Director do Real Jardim Botanico, e Lente das Cadeiras de Chymica, e de Historia Natural na Universidade de Coimbra. Coimbra: na Real Officina da Universidade, 1788. 734 Relacionada em meio ao recenseamento realizado em 1804. MATHIAS. Um recenseamento na Capitania de Minas Gerais... p. 61. Na propriedade constavam, à época, um feitor e um oleiro assim como doze escravos. 735 AHMI, 1º Ofício, Códice 306, Auto 6576. Testamento de Antônio José Vieira de Carvalho. Vila Rica, 1820, fl. 3v. 736 RAPM. O Fundador da imprensa mineira (Padre José Joaquim Viegas de Menezes), Vol. 3, 1898, p. 240; LAGE, Paulo Rogério Ayres. Cerâmica Saramenha: a primeira manufatura de Minas Gerais. Belo Horizonte: Palco, 2010 737 AHU, MG, Cx. 156, Doc. 27, Código 11775. Requerimento de Antônio José Vieira de Carvalho, cirurgião-mor do Regimento de Cavalaria Regular da Capitania das Minas, pedindo a mercê do Hábito da Ordem de Cristo ou de Avis, atendendo aos seus serviços e a ter feito entrar, na Real Casa de Fundição de Vila Rica, mais de 8 arrobas de ouro. Vila Rica, 4 de fevereiro de 1799. 234 camarista, que recebera um hábito da Ordem de Cristo por ter se destacado no serviço real”. Eram todos nobres, de fato, “mas só o último fora nobilitado aos olhos do rei, e poderia ser reconhecido como um autêntico nobre colonial justamente porque percorrera as vias tradicionais de enobrecimento e beneficiara-se da economia moral do dom”.738 Aparentemente Vieira de Carvalho foi bem sucedido nesta demanda, pois pouco antes de falecer costumava se apresentar em Vila Rica como Cavaleiro da Ordem de Cristo. 739 Além do ouro, informou que havia colaborado com o Estado português (...) em decorrência de suas observações, [e] fez por em prática o uso de muitos gêneros daquele país, para o curativo dos enfermos, entrando nesta classe a nova salsaparrilha, a quina também nova, e águas ardentes ensinando ao enfermeiro muitas composições, e evitando por este meio grande despesa à Real Fazenda, principalmente quando ocorrerão mais enfermos das três companhias, que foram ao Rio de Janeiro destacadas para aquela Capital sem cirurgião, e ultimamente no Regimento de Estremoz, continuando-se até o presente o mesmo uso, e prática dos ditos remédios com louvável acerto, e utilidade da Real Fazenda”.740 Interessante observar que ainda que a legislação coeva não fizesse menção a atuação na área científica como condição para a concessão do título, observa-se na argumentação de Vieira de Carvalho que essa sociedade cada vez mais valorizava o talento, sobretudo se ele fosse procedente das conquistas, pelo que poderia ser ajustado ao interesse metropolitano que tinha por objetivo trazer para junto de Lisboa as elites lusas do além-mar. Conforme demonstrou Júnia Furtado, essa República de Letras era constituída “tanto de nobres, quanto de indivíduos oriundos de estratos sociais mais baixos”,741 como o próprio Vieira de Carvalho. No entanto, enquanto os primeiros, possuidores de largos cabedais, possuíam condições financeiras para manter seus gostos pelos estudos filosóficos, os outros, ao frequentarem os círculos sociais ilustrados, como a universidade e as academias, “dependiam diretamente do patronato de algum 738 STUMPF, Roberta Giannubilo. Cavaleiros do ouro e outras trajetórias nobilitantes: as solicitações de hábitos das ordens militares nas Minas setecentistas. Brasília: Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Brasília, 2009, p. 62 (Tese de Doutorado em História, Universidade de Brasília). 739 APM, CC, Cx. 25, Doc. 10510. Atestado do cavaleiro professo na Ordem de Cristo, Antônio José Vieira de Carvalho, sobre o óbito do soldado Felipe Neri Alves Ferreira. Vila Rica, 7 de setembro de 1815. 740 AHU, MG, Cx. 156, Doc. 27, Código 11775. Requerimento de Antônio José Vieira de Carvalho, cirurgião-mor do Regimento de Cavalaria Regular da Capitania das Minas, pedindo a mercê do Hábito da Ordem de Cristo ou de Avis, atendendo aos seus serviços e a ter feito entrar, na Real Casa de Fundição de Vila Rica, mais de 8 arrobas de ouro. Vila Rica, 4 de fevereiro de 1799. 741 FURTADO. Oráculos da geografia iluminista... p. 115. 235 poderoso”,742 conquanto uma vez neles inseridos os utilizassem para consolidar e corroborar sua ascensão social. Ao analisar o inventário de Vieira de Carvalho, falecido a 1818, verifica-se que ele não se casou e nem deixou filhos. Em testamento, designou o capitão Manoel José Pinto; uma senhora, de nome Francisca de Assis, e o próprio padre Viegas – seu sócio e de quem aparentemente era muito amigo – como seus herdeiros.743 Esse último possuiu uma pintura-retrato de Vieira de Carvalho, provavelmente oriunda de seu espólio. 744 6.1.2 – Luiz José de Godói Torres, o médico Luiz José de Godói Torres (1761-1824), filho de Domingos Gonçalves Torres e de Violante de Godói e Castro, grandes sesmeiros na freguesia de São Sebastião da Ponte Nova, 745 atual município de Ponte Nova, onde possuíam a Fazenda do Engenho, foi outro importante colaborador de Veloso de Miranda nas atividades que o naturalista desenvolveu em Vila Rica, sobretudo na administração do Horto e no trato com a botânica mineira. Assim como Veloso de Miranda, Godói Torres frequentou a Universidade de Coimbra, assentando matrícula como aluno ordinário nos cursos de Matemática e Filosofia, a 26 de outubro de 1784 e, posteriormente, a 24 de outubro de 1790, no curso de Medicina, concluindo-o em 1794. 746 Naquela universidade, foi contemporâneo de outros letrados que também atuaram como naturalistas, como Vicente Coelho da Silva Seabra e Teles (1764-1804) e José de Sá Bittencourt Acioli, com quem deve ter 742 FURTADO. Oráculos da geografia iluminista... p. 122. 743 AHMI, 1º Ofício, Códice 306, Auto 6576. Testamento de Antônio José Vieira de Carvalho. Vila Rica, 1820, fl. 3v. Parte dos bens do cirurgião estão transcritos em: Inventário dos bens móveis de Antônio José Vieira de Carvalho, capitão cirurgião mor deste regimento de Cavalaria de Linha de Minas Gerais. RAPM, Belo Horizonte, ano 10, fasc.3-4, p.706-709.1905. 744 O Fundador da imprensa mineira (Padre José Joaquim Viegas de Menezes). RAPM, Vol. 3, 1898, p. 247. 745 Domingos Gonçalves Torres é relacionado a um triste documento datado de 1755 que pedia para que fosse regularizada a picada cirúrgica, considerada “um dos castigos mais bárbaros impostos pelos senhores de escravos”. Procedimento realizado por um cirurgião, consistia em cortar parcialmente um nervo do pé do cativo para evitar que ele fugisse sem, contudo, inutilizá-lo para o trabalho. Além de Domingos, assinaram este requerimento Antônio Duarte, João da Silva Tavares e Tomé Soares de Brito. In: MOURA, Clóvis. Dicionário da escravidão negra no Brasil. São Paulo: EdUsp, 2004, p. 314. 746 AUC, Índice de alunos da Universidade de Coimbra, Registro de Descrição de Luiz José de Godói Torres. Disponível em http://pesquisa.auc.uc.pt/details?id=204651. Acesso em 29 de outubro de 2016. 236 reencontrado em Minas. 747 Ao retornar à capitania, depois de concluir seus estudos em Coimbra, o médico Godói Torres fixou residência em Mariana, sua cidade natal. Sua morada, um sobrado, se situava na Rua da Intendência, atual rua Frei Durão, em frente do Largo da Matriz da Sé. 748 Além de médico, foi juiz ordinário na Câmara de Mariana, 749 e fiscal da Intendência na Real Fazenda de Fundição, de Vila Rica. 750 Em 28 de agosto 1797, por meio de uma representação, os vereadores da Câmara de Mariana solicitaram que Godói Torres fosse nomeado médico remunerado do partido. Segundo eles, devido ao aumento da população e “por faltarem à cirurgia conhecimentos mais amplos e próprios da Medicina”, os habitantes daquela urbe estavam desprovidos de um profissional especializado. Argumentaram ainda que ele era “Bacharel formado em Coimbra (...), com reconhecida aptidão e merecimento para assistir as referidas pessoas, e [realizar os devidos] exames”.751 A petição foi atendida e Godói Torres tornou-se responsável por atender aos pobres, “miseráveis” e reclusos, por vezes assistindo também no hospital militar da vila, realizando, por interesse próprio e para a economia do Reino, como afirmou por mais de uma vez, pesquisas farmacológicas, investigando novas drogas a partir da flora mineira. Em 1799, Bernardo José de Lorena solicitou a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho a confirmação da remuneração de médico para o partido da Câmara de Vila Rica, em favor de Godói Torres, em substituição a Thomás de Aquino Bello, que havia servido “muito bem, quando o podia”. Em carta, Lorena chamou a atenção “para o grande conceito que dele, [Godói Torres], o povo o faz”, e “de seus talentos conhecidos”, mencionado ainda 747 MORAIS, Francisco. Estudantes brasileiros na Universidade de Coimbra. Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, vol. 62, 1940, p. 179. Acerca da socialização de Godói Torres com outros ex-alunos coimbrões nas Minas, Lucas Quadros, desconhecendo a convivência do médico com Veloso de Miranda, afirmou que apenas o advogado João Saião viria a fazer parte de seu universo relacional quando de volta à América portuguesa. In: QUADROS, Lucas Samuel. A medicina luso-brasileira: formação, leituras e atuações do médico Luis José Godói Torres. Anais do XVIII Encontro Regional da Anpuh - MG. Mariana, julho de 2012. 748 AHCSM, Inventários, 1º ofício, Códice 109, Auto 2244. Inventário de Luis José de Godói Torres, 1824, fl. 12. 749 AHU, MG, Cx. 178, Doc. 50, Cód. 13144. Ofício de Pedro Maria Xavier de Ataíde e Melo, governador da capitania de Minas Gerais, ao Príncipe Regente, notificando o envio da justificação de serviço do Bacharel Luiz José de Godói Torres. Vila Rica, 30 de dezembro de 1805, fl. 22. Neste documento, à espécie de um dossiê sobre sua atuação profissional, encontra-se transcrito, às folhas 17-18v, cópia do conteúdo presente no diploma do curso de medicina de Luiz José de Godói Torres expedido pela Universidade de Coimbra em latim e com sua tradução para a língua portuguesa. 750 Ibidem. 751 AHU, MG, Cx. 143, Doc. 46. Representação dos oficiais da Câmara de Mariana, pedindo provisão para nomearem o bacharel Luiz José de Godói Torres, médico do partido da dita Câmara, com ordenado. Leal Cidade de Mariana, 28 de agosto de 1797. 237 a certeza a que me dá o secretário deste governo, o Doutor Joaquim Veloso de Miranda, de que, juntamente com este Médico, poderia diminuir a despesa do Hospital Militar, substituindo com drogas do país remédios que vêm de fora, cujas experiências podem depois redundar em utilidade até deste Reino. 752 Esse documento revela que a exemplo do que ocorrera com o cirurgião Vieira de Carvalho, a aproximação entre os dois naturalistas se deu sob o signo da Ciência utilitária, a partir da investigação das potencialidades médico-curativas da flora da capitania. Segundo o governador, eles pretendiam intensificar a prescrição de simples e drogas mineiras em uso nos hospitais locais, o que viria a desonerar os cofres reais e a minimizar as dificuldades existentes no comércio de remédios e compostos fármacos que eram impostados do Rio de Janeiro e de Lisboa. De fato, seis anos depois, Godói Torres alegou que, com suas pesquisas, buscou animar “na sua prática o uso das plantas medicinais descobertas nesse país, cuja aplicação devida aos seus trabalhos, e conhecidos talentos, tem apresentado visivelmente os seus efeitos, diminuindo assim as despesas dos miseráveis enfermos (...)”.753 A partir de 1799, já bastante envolvido nas atividades do Horto de Vila Rica, Godói Torres passou a auxiliar Veloso de Miranda nas suas pesquisas e nos exames práticos para verificar a existência, nas Minas, de espécies botânicas próprias ao fabrico de papel, 754 indagações que, como já mencionado, não obtiveram resultados satisfatórios. 755 Dois anos depois, Godói Torres alegou sua experiência profissional para solicitar a função de físico-mor da capitania de Minas Gerais. Na ocasião, afirmou que desde que regressara a 752 AHU, MG, Cx. 148, Doc. 8, Cód. 11358. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, pedindo para que a Rainha confirme os 200 mil réis atribuídos pelo partido a Luís José de Godói Torres, medido da Vila. Vila Rica, 13 de março de 1799. 753 AHU, MG, Cx. 178, Doc. 50, Cód. 13144. Ofício de Pedro Maria Xavier de Ataíde e Melo, governador da capitania de Minas Gerais, ao Príncipe Regente, notificando o envio da justificação de serviço do Bacharel Luiz José de Godói Torres. Vila Rica, 30 de dezembro de 1805, fl. 27. 754 AHU, MG, Cx. 151, Doc. 16, Cód. 11428. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, informando que, em consequência da carta de 1799, abril, 5, encarregou Joaquim Veloso de Miranda do exame de plantas e de árvores próprias para o fabrico de papel. Vila Rica, 20 de novembro de 1799 755 APM, SC 269, Rolo 59, Gav. G-4, Registros de Cartas, Ordens Régias e Avisos (1795-1802), ano 1800, p. 70v. 238 sua Pátria, se há distinguido não só por seus conhecimentos médicos no exercício dos Partidos das Câmaras de Vila Rica, e Cidade de Mariana, como também no curativo dos enfermos de toda aquela capitania que o convocam, e ainda pela feliz aplicação dos simples do país, de que tem resultado utilidades até à Fazenda Real de Vossa Alteza no Hospital Militar. 756 Passados alguns anos, em 1814, uma matéria de sua autoria foi publicada no jornal O Patriota. Trata-se do “Plantas medicinais indígenas de Minas Gerais, pelo Doutor Luiz José de Godoy Torres, Physico das tropas daquella Cappitania”,757 no qual faz a análise de vinte e cinco plantas indígenas das Minas, elencando, dentre outras, a congonha (Ilex cerasifolia), que indicou como diurética; a poaia, ou ipecacuanha (Carapichea ipecacuanha), como emética; a salsa parrilha (Smilax aspera) e o sassafrás (Sassafras albidum), para doenças venéreas; o butiá (Butia capitata), para doenças do trato urinário, e outros três exemplares botânicos específicos prescritos como antídoto contra o veneno de serpentes; a árvore do quiabo (Abelmoschus esculentus), o cipó mil homens (Aristolochia Triangularis), e o óleo da copaíba (Copaifera langsdorffii). Seu artigo revela não só as pesquisas botânicas a que se dedicou, e os detalhes da colaboração que estabeleceu com Veloso de Miranda e Vieira de Carvalho, como, também, a importância da pesquisa científica que os três naturalistas desenvolviam em Minas, contribuindo para a investigação da natureza local e seus empregos médicos. 758 Godói Torres também possuía considerável livraria, disposta em 38 títulos, divididos em 92 tomos. Entre eles, constavam as obras de Willian Cullen (1710-1790), 759 Samuel-Auguste Tissot (1728-1797) 760 e Herman Boerhaave (1668-1738). 761 Os três eram importantes referências que inovaram os estudos médicos, insistindo em seu caráter profilático, e possuir suas obras revela que os estudos de Godói Torres estavam consonantes com as discussões do período que enfatizavam a profilaxia do ambiente urbano como forma de prevenir doenças. 756 AHU, MG, Cx. 160, Doc. 115, Cód. 115. Requerimento de Luís José de Godói Torres, bacharel em Medicina e Filosofia, tendo exercido a profissão nas câmaras de Vila Rica e Cidade de Mariana, solicitando o lugar de físico mor da Capitania de Minas Gerais. Vila Rica, 1801. 757 TORRES, Luiz José de Godói. Plantas medicinais indígenas de Minas Gerais, pelo Doutor Luiz José de Godoy Torres, Physico das tropas daquella Cappitania. O Patriota, nº 3, maio-jun. 1814, p. 62-73. 758 TORRES. Plantas medicinais indígenas de Minas Gerais, p. 62, 63, 65, 66, 73, 66, 70 e 67, respectivamente. 759 CULLEN, Willian. First lines of the practice of physic. Worcester, Masssachusetts: Printed by Isaiah Thomas. Sold at his bookstore in Worcester, and by him and company in Boston, 1784, 4 vol. 760 TISSOT, Samuel-Auguste André David. Les œuvres de M. Tissot. A Lausanne: chez Franç. Grasset & Comp., 1790, 10 vol. 761 BOERHAAVE, Herman. Aphorismi de cognoscendis et curandis morbis, uberrimis commentariis, atque illustrati.editio secunda ab autore correcta et curandis febribus locupletata (in 2 volumi). Patavii (Pádua): Typis Seminarii, Apud Joannem Manfrè, 1754-1758. 239 Godói Torres possuía, ainda, impressos sobre taxonomia e farmacologia, uma obra de Lineu em dois volumes, talvez a Species plantaum, 762 e as Observações e reflexões sobre o uso proveitoso e saudável da quina na gota, 763 de Francisco Tavares (1750-1812). Todos esses compêndios eram úteis nas pesquisas que desenvolvia na capitania. Esse último autor, inclusive, foi contemporâneo de Veloso de Miranda em Coimbra, sendo sua obra era de grande valia, uma vez que a quina era medicamento importante no tratamento da malária, 764 e as Minas constituíam grande mercado consumidor. 765 Em 1824, “gravemente enfermo e temendo a morte”, Godói Torres redigiu seu testamento servindo-lhe de testemunha o tenente Luiz Veloso de Miranda, filho de João Veloso de Miranda e sobrinho de Joaquim Veloso de Miranda, reafirmando os laços de solidariedade entre os dois naturalistas encetados quando das pesquisas científicas na capitania. 766 Como Godói Torres não era casado e não deixou filhos, seu bens foram herdados por sua irmã, Francisca de Sales Fidelis de Godói. 767 6.1.3 – João Gomes da Silveira de Mendonça, o militar Em seu Exercícios de Pesquisa História, 768 Boschi nos oferece pistas de outro relevante “auxiliar e discípulo” de Veloso de Miranda; João Gomes da Silveira Mendonça (1781-1827), futuro Visconde do Fanado e Marquês de Sabará. Natural de São Miguel, atual São Miguel do Cajuru, distrito de São João 762 LINNÆUS, Carl Nilsson. Species plantaum. Holmiae. (Estocolmo): Impensis Laurentii Salvii, 1753, 2 vol. Disponível em https://babel.hathitrust.org/cgi/pt?id=aeu.ark:/13960/t6vx1fj89; view=1up;seq=57. Acesso em Acesso em 02 de novembro de 2016. 763 TAVARES, Francisco. Observações e reflexões sobre o uso proveitoso e saudável da quina na gota. Lisboa: Regia Officina Typographica, 1802. 764 Janaina Zito Losada destaca que os empreendimentos que buscavam a quina na América portuguesa objetivavam, na verdade, encontrar espécies similares à quina (Chinchona officinalis) endêmica do Peru, como a Strycnhos pseudoquina, “descrita mais tarde por Auguste de Saint-Hilaire, cuja ocorrência se dá em regiões de cerrado, mas também pode estar se referindo à Coutarea hexandra e outras pseudoquinas (Solarum pseudoquina) com dispersão irregular em território brasileiro, em regiões de várzeas e florestais úmidas”. C.f. LOSADA, Janaina Zito. “Historiografia brasileira e meio ambiente: as contribuições de Sérgio Buarque de Holanda e o debate contemporâneo da história ambiental”. História, Ciências, Saúde – Manguinhos. Rio de Janeiro, vol. 23, nº 3, jul.-set. 2016, p. 653-668. 765 EDLER, Flávio Coelho. Boticas e pharmácias: uma história ilustrada da farmácia no Brasil. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2006; FURTADO, Júnia Ferreira. “Barbeiros, cirurgiões e médicos na Minas colonial”. RAPM, Belo Horizonte, vol. XLI, p. 88-105, 2005. MARQUES, Vera Regina Beltrão. Natureza em boiões: medicina e boticários no Brasil setecentista. Campinas: Editora da Unicamp, 1999. 766 AHCSM, Inventários, 1º ofício, Códice 109, Auto 2244. Inventário de Luis José de Godói Torres, 1824, fl. 14 767 Idem, fl. 13v 768 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 151. 240 del-Rei, 769 iniciou sua trajetória profissional assentando praça no Regimento de Cavalaria de Vila Rica, a 28 de março de 1801, passando a cadete a 17 de junho próximo. 770 É provável que tenha convivido com Antônio Veloso de Miranda, irmão de Joaquim Veloso de Miranda e coronel deste aquartelamento. 771 Em 1803, João Rodrigues de Sá e Mello de Menezes e Sottomayor (1755-1809), o Visconde de Anadia, escreveu ao governador Bernardo José de Lorena, transmitindo algumas incumbências recebidas do Príncipe Regente: Tendo requisitado o nosso encarregado de negócios na Corte de Berlim, da parte deste ministério, sementes de plantas bravas para o Jardim Botânico daquela Corte, é o Príncipe Regente Nosso Senhor Servido que Vossa Senhoria remeta a esta Secretaria de Estado porções de sementes das ditas plantas que se descobrirem nessa capitania, fazendo praticar na ocasião de recolherem, e de se enviarem para este Reino, o método, que se ensina na Instrução, de que remeto a Vossa Senhoria uma cópia. 772 Refere-se à pequena instrução, datada do ano anterior, Sobre a escolha, preparação e remessa das sementes e cebolas das plantas que se mandarem vir de África e do Brasil, na qual, entre outras ordens, se recomenda que se “encarregassem algumas pessoas, investidas de conhecimentos botânicos de indagar quais são as plantas mais raras que vegetam neste país”. 773 Segundo Ataíde e Melo, Mendonça fora escolhido em auxílio a Veloso de Miranda, pois havia sido “abonado” em diversas ocasiões pelo mesmo: 769 GENOVEZ, Patrícia Falco. “As famílias mineiras e os universos da nobreza e da cidadania: a configuração de territorialidades no Primeiro Reinado”. Anais do XIV Seminário sobre a Economia Mineira, 2010. Diamantina; Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2010. 770 AHU, MG, Cx. 180, Doc. 81, Cód. 12959. Requerimento de João Gomes da Silveira Mendonça, cadete do Regimento de Cavalaria de Minas, solicitando a concessão do posto de tenente do referido Regimento. Vila Rica, 27 de junho de 1806. 771 Aparentemente, Mendonça não conviveu com Vieira de Carvalho ou se o fez, foi por tempo restrito uma vez que em 1801, o cirurgião do regimento se encontrava em Lisboa. 772 APM, SC 300. Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-64, Gav. G-4. 1802-1803, p. 138. 773 Idem, p. 104-107v. 241 Tendo [Mendonça] sido nomeado pelo Excelentíssimo governador que então era, Bernardo José de Lorena, para me ajudar nas diligências da indagação da natureza, de que como naturalista me achava encarregado por Ordens de Sua Alteza Real; se tem conduzido até o presente com muita prontidão e exatidão no que lhe era por mim relativamente mandado; e que tendo-se aplicado debaixo de minhas instruções ao estudo da Mineralogia, Química e Botânica, se acha com conhecimentos muito avançados em todas estas matérias, e atualmente ocupado no estudo da Aritmética e Geometria, no que pelos seus conhecidos talentos, espero o mesmo progresso (...). 774 Sob as instruções dadas por Veloso de Miranda, Mendonça recolheu exemplares botânicos, acompanhado unicamente por um escravo e uma besta. 775 Posteriormente, armazenou com zelo as sementes e plantas coletadas em um caixote, e redigiu uma relação, em latim, onde procurou “reduzir ao Sistema de Linneu todas [as plantas] quantas conheci, e pude encontrar floridas, insistindo para este fim sobre os passos dos naturalistas mais célebres que escreveram da América, como [Nikolaus Joseph Freiherr von] Jacquin (1727-1817), [Patrick] Browne (1720–1790), [Johann Reinhold] Forster (1729-1798), [Jean Baptiste Christian Fusée] Aublet (1720-1778) e outros, que me propus como modelos em uma empresa que parecerá talvez estranha à profissão de um militar”. Às descrições, Mendonça adicionou algumas “tábuas iluminadas das Espécies mais célebres, e gesuros (sic) que me parecem novos”, atividade que “eu continuava sempre que podia, apontando a lápis, clamando alguns traços ligeiros que conservassem a forma e cor natural para com vagar passar a limpo”.776 Ao comentar que utilizou as obras dos “mais célebres naturalistas que escreveram da América”, como Jacquin, Browne, Forster e Aublet, Mendonça se preocupou não apenas em demonstrar que estava atualizado no que toca à literatura científica. Revelou, também, ter adquirido por intermédio de Veloso de Miranda uma complexa carga de conhecimentos, como o domínio do risco e do latim para as Ciências Naturais, de se mostrar competente para instruir-se acerca dos procedimentos internacionais que regulamentavam a nomenclatura botânica, além de ter se dedicado, também, ao estudo da Aritmética e da Geometria, ciências que eram essenciais para um 774 AHU, MG, Cx. 180, Doc. 81, Cód. 12959. Atestado escrito por Joaquim Veloso de Miranda. In: Requerimento de João Gomes da Silveira Mendonça, cadete do Regimento de Cavalaria de Minas, solicitando a concessão do posto de tenente do referido Regimento. Vila Rica, 27 de junho de 1806. No mesmo documento, um atestado passado por Francisco Xavier Machado afirmava que Mendonça era instruído também em Francês, Latim, Retórica e Filosofia. 775 Idem.. 776 AHU, MG, Cx. 183, Doc. 7, Cód. 13707. Carta de João Gomes da Silveira Mendonça para o Visconde de Anadia, informando sobre uma relação de sementes de plantas indígenas que colhera na capitania de Minas Gerais. Lisboa, 9 de janeiro de 1807, apud BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 152. 242 militar em formação e principalmente para quem estava sendo apresentado à mineralogia. Além dessas remessas, o governador Ataíde e Melo comunicou ao Visconde de Anadia sobre o envio das plantas e sementes mais raras da capitania. 777 Aparentemente, como afirmou Boschi, o militar desempenhou as atividades com maestria sendo incumbido, também, de conduzir à Corte lisboeta a referida coleção, 778 “para ser entregue ao cônsul da Prússia, o Sr. Petters, que tem ordem para as enviar ao Jardim Botânico de Berlim”,779 junto com outro caixote “com sementes de plantas silvestres enviado do Maranhão e do Ceará (a cargo do naturalista João da Silva Feijó)”.780 De volta ao Brasil, em 1808, foi nomeado diretor da Real Fábrica de Pólvora, criada na Fazenda da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, e inspetor da Fábrica de Pólvora da Estrela, ainda hoje em funcionamento, localizada na cidade de Magé. 781 Ainda no mesmo ano, foi encarregado por meio de um decreto, datado de 13 de junho de 1808, de “preparar, perto da casa do inspetor da fábrica de pólvora, terreno necessário ao estabelecimento de um jardim de aclimação destinado a introduzir no Brasil a cultura de especiarias das Índias Orientais”.782 Poucos meses depois, novo decreto, de 12 de outubro de 1808, ordenou o cultivo de “uma ‘espécie de cultura que for de maior interesse e benefício da Real Fazenda, ou em qualquer outra plantação que lhe for determinada por ordem superior’” na área ainda não utilizada pelas atividades da fábrica. 783 As espécies cultivadas poderiam ser o cravo (Syzygium aromaticum) e a canela (Cinnamomum verum), com grande potencial econômico, à semelhança do Horto de São José, em Belém. Dessa forma, Mendonça tornou-se, por acúmulo de funções, o primeiro diretor do novo Jardim da Aclimatação, cargo que exerceu até 1819. 777 AHU, MG, Cx. 180, Doc. 79, Cód. 13476. Carta de Pedro Maria Xavier de Ataíde e Melo, governador de Minas Gerais, para o Visconde de Anadia, dando conta da remessa de uma coleção de sementes das plantas mais raras do país, e cebolas que se encontram nas mesmas plantas. Vila Rica, 26 de junho de 1806. 778 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 151-152. 779 MCUL, Livro de Registro dos Decretos (1804), apud BRIGOLA, João Carlos. O colecionismo científico em Portugal nos finais do Antigo Regime (1768-1808). In: KURY, Lorelai; GESTEIRA, Heloísa. Ensaios de história das ciências no Brasil: das Luzes à nação independente. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2012, p. 139. 780 Ibidem. C.f. também AHMB, Rem. 609. João da Silva Feijó, Relação das sementes das plantas agrestes da Capitania do Ceará destinadas ao Real Jardim Botânico de Berlim, recebidas em 5 de setembro de 1803. 781 BEDIAGA. Conciliar o útil ao agradável e fazer ciência, p. 1139. 782 RODRIGUES, João Barbosa. O Jardim Botânico do Rio de Janeiro: Uma lembrança do 1º centenário – 1808-1908. Officinas da Renascença, E.Bevilacqua & Cia. Rio de Janeiro. Reprodução da edição original, 1998. Rio de Janeiro: Banco Safra/ Jardim Botânico do Rio de Janeiro. 1908, apud PEIXOTO, Ariane Luna & GUEDES-BRUNI, Rejan. No Rio de Janeiro, um Jardim Botânico bicentenário. Ciência e Cultura, vol. 62, n. 1, 2010, p. 32-35. 783 BEDIAGA. Conciliar o útil ao agradável e fazer ciência, p. 1139. 243 Não se sabe quando Mendonça e Veloso de Miranda começaram a atuar conjuntamente, mas há vários registros de como se deu a relação entre os dois. Segundo o engenheiro militar português Francisco Xavier Machado, o hábil naturalista Joaquim Veloso de Miranda, conhecendo perfeitamente no dito cadete, além das supraditas qualidades um decidido gênio para os estudos da natureza, intentou formar nele também seu substituto, útil ao Estado, e com este muito louvável pensamento, o pede para sua companhia, ao General que então era, o Ilustríssimo e Excelentíssimo Bernardo de Lorena, no que prontamente assistiu pelas boas noticias que já então tinha do dito cadete. 784 Observa-se que o atestado passado por Machado reafirma o que havia dito Veloso de Miranda sobre estar ensinando Mineralogia, Química, Botânica, Aritmética, Geometria, Latim e Francês a Silveira Mendonça, corroborando a constatação de Boschi de que “se se pode falar na existência de discípulo de Veloso de Miranda, essa condição deve ser atribuída a Silveira Mendonça”.785 William Hooker (1785-1865), em artigo no The Journal of Botany, afirmou que Veloso de Miranda enviou por meio do senador João Gomes, diretor do Jardim do Rio de Janeiro, muitas espécies de plantas provenientes das províncias do Rio de Janeiro e Minas, que Vandelli publicou de maneira muito indiferente em seu Fasciculus Plantarum cum novis Generibus et Speciebus e em seu Flora Lusitaniae et Brasiliensis Specimen. 786 Ou seja, mesmo residente no Rio de Janeiro, Mendonça continuava se relacionando profissionalmente com Veloso de Miranda. Já Carlos Stelffeld escreveu que, em 1818, Mendonça encontrou Carl Friedrich Philipp von Martius (1794-1868), quando este afirmou que o militar era “depositário dos conhecimentos de Veloso de Miranda”.787 Na década de 1820, como deputado, Mendonça foi um dos redatores da constituição do Império, sendo também eleito Senador pela província de Minas Gerais e 784 AHU, MG, Cx. 180, Doc. 81, Cód. 12959. Atestado escrito por Francisco Xavier Machado. In: Requerimento de João Gomes da Silveira Mendonça, cadete do Regimento de Cavalaria de Minas, solicitando a concessão do posto de tenente do referido Regimento, 27 de junho de 1806. 785 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 151. 786 No original, “were received according to the authority of Senator João Gomes, (Director of the Garden at Rio de Janeiro), most of the species of plants from the provinces of Rio de Janeiro and Minas, which Vandelli published in a very indifferent manner in his Fasciculus Plantarum cum novis Generibus et Speciebus, and in his Flora Lusitaniae et Brasiliensis Specimen”. In: HOOKER, William. The Journal of Botany, Vol. IV. London: Longman, Orme, & Co., and William Pamplin, 1842, p. 4-5 787 STELFFELD. Os dois Vellozo, p. 239, apud BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 154 244 Ministro do Estado dos Negócios da Guerra. 788 6.1.4 – Manoel Ribeiro Guimarães, o engenheiro Manuel Ribeiro Guimarães (?-1795) atuou pontualmente junto a Veloso de Miranda, sendo um dos responsáveis em auxiliar o naturalista em seu maior projeto, o horto botânico. É bem provável que Guimarães tenha sido aluno da Academia Real da Marinha e de Fortificação, Artilharia e Desenho, em Lisboa, onde deve ter assistido aulas de Aritmética, Geometria e Trigonometria, conhecimentos necessários para projetos de Engenharia, como a construção de fortalezas e as atividades cartográficas. Posteriormente, na América portuguesa, percorreu diversas regiões das capitanias de Minas e de Goiás, 789 sendo o Mapa da Conquista, de 1769, seu trabalho mais conhecido. Para sua confecção, Ribeiro Guimarães acompanhou o mestre-de-campo Inácio Correia Pamplona (1731-1810) na expedição que este liderou nos sertões do Campo Grande, entre São João del-Rei e as nascentes do rio de São Francisco. Delegado pelo governador José Luiz de Menezes Castelo Branco e Abranches, Pamplona deveria afugentar os gentios que povoavam as matas reais e que causavam empecilhos às novas frentes de mineração, assim como dar fim aos negros aquilombados que, fugindo de seus senhores, buscavam no isolamento do sertão sua liberdade. 790 Importante evidenciar que a carta em questão, pelo menos em sua versão original, se perdeu no tempo, e que apenas uma cópia datada de 1784 resistiu. 791 A autoria de Ribeiro Guimarães sobre tal documento fica evidente pelo fato do mesmo ser o único engenheiro na expedição. Ademais, pela função que desempenhava, é de se esperar que atuasse como auxiliar direto de Pamplona, de modo que a ele também é atribuída a confecção do Notícia diária e individual das marchas, diário de campo onde foram descritas as atividades da expedição. Posteriormente, Ribeiro Guimarães foi o responsável por outras atividades que demandavam maiores conhecimentos em engenharia e cartografia, como na confecção da 788 SILVA, Laura de Melo e. “Negociação e soberania: os deputados eleitos pela província de Minas Gerais às cortes de Lisboa e sua permanência no Brasil”. Revista Latino-Americana de História, vol. 4, nº. 13, julho de 2015. 789 AZEM, Marina. Viagem filosófica às doenças e curas em Mato Grosso no século XVIII: os relatos do naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira. Cuiabá: Instituto de Saúde Coletiva, 2006, p. 105 (Dissertação de Mestrado em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Mato Grosso). 790 Sobre os sertões, os gentios e a cartografia que os unia, ou separava. C.f. LANGFUR, Hal. “Mapeando a conquista”. RAPM. Belo Horizonte. Ano XLVII, nº. 1, p. 31-47, 2011. 791 Reproduzidos em COSTA, Antônio Gilberto (Org.). Cartografia da conquista do território das Minas. Belo Horizonte/Lisboa: Editora UFMG/ Kapa Editorial, 2004, p. 184. 245 Planta da Vila Boa Capital da Capitania Geral de Goiás, de 1782, 792 e da Planta de uma Cadeia de Vila Rica, principiada no ano de 1784, projeto para a construção de uma nova Casa de Câmara e Cadeia, e que corresponde ao edifício que foi construído a partir de 1785. 793 Mapa 4 – Mapa da Conquista do Mestre de Campos Regente Chefe da Legião Inácio Correia Pamplona. Por Manuel Ribeiro Guimarães. Cópia de 1784. Manuscrito em aquarela. 32 x 40 cm. Fonte: Original sob guarda do AHU. Citado a partir de COSTA, Antônio Gilberto (Org.). Cartografia da Conquista do Território das Minas. Belo Horizonte: editora UFMG; Lisboa: Kapa Editorial, 2004, p. 62. A legenda do mapa, ao alto, diz: “Fiel cópia do mapa que entreguei ao Ilmo. Luiz da Cunha Menezes que por ele foi criada a legião com dois regimentos de Cavalaria e Infantaria e 14 Esquadras de Mato, feito na Conquista do Campo Grande e seus anexos da Comarca do Rio das Mortes nos anos de 1784”. Intitulado Mapa Topográfico do Orto Botânico do Ouro Preto, e datado de 1799, foi enviado à Corte no ano posterior, onde foi aprovado por Dom Rodrigo de Sousa Coutinho. 794 792 GARDNER, Jane & WIEDEMANN, Thomas. Representing the Body of the Slave. London and New York: Routledge, 2013, p. 145, nota 15. 793 Reprodução da planta da Câmara e Cadeia de Vila Rica presente em RODRIGUES, José Wasth. Documentário arquitetônico relativo à antiga construção civil no Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1979, p. 88. Consta no verso da planta o seguinte: “Planta da nova cadeia de Vila Rica, principiada no ano [17]84 pelo Ilmo. Exmo Senhor Luís da Cunha Meneses Governador e Capitão General da mesma e desenhada por Manuel Ribeiro Guimarães”. 794 AHU, MG, Cx. 153, Doc. 36, Cód. 14236. Ofício do Governador de Minas, Bernardo José de Lorena para o Secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos, Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, no qual remete a planta do Horto Botânico do Ouro Preto. Vila Rica, 04 de julho de 1800. 246 Ainda que o projeto cartográfico do Horto Botânico de Vila Rica seja assinado por Ribeiro Guimarães, é bem provável que tenha sido realizado a partir de recomendações de Veloso de Miranda, como assinalou Carrato, já que o naturalista possuía, por meio de sua experiência em Coimbra e em Lisboa, conhecimentos sobre como deveria ser a disposição dos canteiros, o tamanho dos vergéis destinados às espécies destinadas aos estudos farmacológicos e os locais que deveriam ser reservados para a reprodução das espécies próprias para a alimentação e para o uso na engenharia civil. 795 Se por um lado profissionais letrados como Ribeiro Guimarães, Silveira de Mendonça e Vieira de Carvalho se diferenciavam pelos conhecimentos acadêmicos e teóricos que possuíam, outros tantos auxiliares, menos instruídos, foram igualmente importantes para que Veloso de Miranda pudesse desenvolver suas pesquisas em História Natural, como Apolinário de Souza Caldas, José Gervásio de Souza Lobo e Manoel João Pereira. 6.1.5 – Apolinário de Souza Caldas, riscador e pintor Apolinário de Souza Caldas (1762/3-1806) foi, nas palavras de Boschi, “o mais conhecido e duradouro colaborador de Veloso de Miranda na arte da pintura e do risco”. 796 Natural de Vila Rica, assentou praça como soldado no Regimento de Cavalaria a 8 de março de 1779, aos 17 anos de idade, 797 tendo sido descrito como um rapaz que possuía “cinco pés de altura, cabelos ruivos e olhos galhardos”.798 Como militar, ocupou a função de furriel em uma das companhias daquele aquartelamento, mas foram seus conhecimentos no risco e na pintura que o aproximaram de Veloso de Miranda. Foi responsável por mais de trezentos desenhos de plantas quando acompanhou Veloso em sua primeira viagem filosófica, realizada entre 1781 e 1782, 799 servindo-o “pela sua arte de pintura e desenho para delinear as plantas, 795 Segundo Carrato, a estrutura do horto teria sido planejada pelo doutor Veloso de Miranda. Sabe-se, contudo, que vários outros profissionais foram responsáveis em auxiliá-lo nesta atividade como o próprio Ribeiro Guimarães, de modo que não é difícil pensar em um projeto que ainda que por este fosse assinado, não contasse com as ideias do naturalista. In: CARRATO. Uma casa portuguesa com horta e jardim, nas Minas Gerais do século XVIII, p. 120. 796 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica... p. 128-129. 797 AHU, MG, Cx. 188, Doc. 35, Cód. 13880. Requerimento do furriel Apolinário de Sousa Caldas, que acompanhou um cientista na descoberta da Nova Lorena Diamantina, designado também para acompanhar o naturalista Joaquim Veloso de Miranda na exploração dos produtos botânicos pintando e desenhando as plantas, solicitando a sua passagem para o 1º Regimento de Cavalaria de Minas Gerais, no posto de tenente. Minas Gerais, 7 de janeiro de 1825. 798 Na região do Minho, a expressão “olhos galhardos” fazia menção a olhos muito largos, muito abertos. 799 PATACA, Ermelinda Moutinho; PINHEIRO, Rachel. Instruções de viagem para a investigação científica do território brasileiro. Revista da SBHC, Rio de Janeiro, vol. 3, nº. 1, p. 58-79, jan.-jun. 2005. 247 sem outro interesse mais que seu soldo”.800 Apesar da importância de seus trabalhos, não encontramos informações que revelem com quem o riscador teria aprendido o ofício do risco e da pintura. Em 1800, Apolinário acompanhou o também naturalista Vieira Couto, oferecendo a ele seus préstimos “nas diferentes diligencias de que foi encarregado sobre as descobertas e exames da Nova Lorena Diamantina”. Poucos anos depois, em 1803, após prestar “tão relevantes serviços” e esperançoso por receber as devidas recompensas, requereu promoção ao posto de tenente no regimento de Vila Rica, confeccionando elaborada petição com várias declarações assinadas por autoridades e por pessoas com quem havia servido. Um deles foi Francisco de Paula Beltrão, que afirmou que Apolinário foi digno da campanha que participou, tendo sido responsável por delinear “o mapa das terras por onde andássemos que se supunham ocultar e desconhecida”, executando-o “em muita exação e fidelidade”. Vieira Couto, que também fez parte desta comitiva, igualmente lançou elogios a Apolinário, afirmando que o mesmo participou de “várias diligências tendentes ao Real Serviço nas descobertas e excursões da Nova Lorena Diamantina, em cujos serviços mostrou com muito zelo e atividade no mesmo Real Serviço”.801 Diogo Pereira Ribeiro de Vasconcelos (1758-1815), então presidente da Câmara de Vila Rica, e Vieira de Carvalho, o cirurgião, também afirmaram que Apolinário acompanhou Veloso de Miranda “na exploração dos produtos botânicos, servindo-lhe pelo seu ofício de pintor para delinear e pintar as plantas que se remeteram para o Real Museu”. Já Veloso de Miranda atestou que o riscador o acompanhou na qualidade de pintor, “na diligencia em que andei pela maior parte desta capitania a recolher e observar os produtos naturais (...), [e] cumpriu muito bem com as obrigações do que por mim era encarregado àquele respeito por ser bastantemente hábil no desenho”.802 Mesmo com todo o exposto, Apolinário não teve seu pedido prontamente deferido, solicitando “licença para vir a esta Capital, [Lisboa], representar e pedir a Vossa Majestade a devida recompensa”. No entanto, sua chegada a Lisboa coincidiu com a “retirada de Vossa Majestade para o Rio de Janeiro, por consequência da invasão 800 AHU, MG, Cx. 188, Doc. 35, Cód. 13880. Requerimento do furriel Apolinário de Sousa Caldas, que acompanhou um cientista na descoberta da Nova Lorena Diamantina, designado também para acompanhar o naturalista Joaquim Veloso de Miranda na exploração dos produtos botânicos pintando e desenhando as plantas, solicitando a sua passagem para o 1º Regimento de Cavalaria de Minas Gerais, no posto de tenente. Minas Gerais, 7 de janeiro de 1825. 801 Idem. 802 Ibidem. 248 do Exército Francês neste Reino”.803 “Conhecendo a necessidade de defensores, se ofereceu e serviu [durante] 3 anos no Regimento de Cavalaria [do Caes, atual Regimento] nº 7”, em Lisboa. “Vendo, porém, que pela sua idade nunca seria promovido pelo Marechal, requereu passagem para o seu primeiro regimento, e estando em arranjos para a viagem, sobrevieram moléstias e incômodos que o impediram” de transpor o Atlântico de volta à América. 804 Em 9 de setembro de 1822, Apolinário ainda aguardava em Lisboa a promoção que solicitara havia quase vinte anos, 805 o que ocorreu somente no ano seguinte, com a indicação de “fazer-lhe mercê de dar passagem para o seu primeiro Regimento de Cavalaria de Minas Gerais, no posto de 1º tenente, ou a conseguir uma pensão com que o suplicante possa passar o resto da sua vida nesta Capital, visto achar-se privado dos meios de subsistência”.806 Nada mais se sabe a seu respeito. 6.1.6 – José Gervásio de Souza Lobo, o riscador José Gervásio de Souza Lobo (1758?-1806), 807 brevemente biografado por 803 Idem. 804 AHU, MG, Cx. 188, Doc. 33, Cód. 13874. Requerimento (minuta) de Apolinário de Sousa Caldas, furriel da Cavalaria de Linha das Minas Gerais, pedindo promoção ao posto de alferes ou de tenente de seu Regimento. Vila Rica, 9 de setembro de 1822. 805 Idem. 806 AHU, MG, Cx. 188, Doc. 35, Cód. 13880. Requerimento do furriel Apolinário de Sousa Caldas, que acompanhou um cientista na descoberta da Nova Lorena Diamantina, designado também para acompanhar o naturalista Joaquim Veloso de Miranda na exploração dos produtos botânicos pintando e desenhando as plantas, solicitando a sua passagem para o 1º Regimento de Cavalaria de Minas Gerais, no posto de tenente. Minas Gerais, 7 de janeiro de 1825. 807 Em relação à data de nascimento de Souza Lobo, apesar do mesmo ter afirmado que possuía 46 anos quando do recenseamento em 1804, Adalgisa Arantes chama a atenção para o fato de que, nestas circunstâncias, teria assentado praça com apenas nove anos de idade, o que parece pouco provável, vindo a afirmar que provavelmente o militar “escondia idade por alguma estratégia ou as fontes oficiais não foram rigorosas nesse sentido”. In: CAMPOS, Adalgisa Arantes. Notas sobre um pintor luso-brasileiro e a iconografia dos novíssimos (a morte, o juízo, inferno e o paraíso) em fins da época colonial. Revista de História e Estudos Culturais. Vol. 9, ano IX, nº 2, Maio-Ago. 2012. Interessante verificar quem em atestado passado no ano de 1799 por Antônio José Vieira de Carvalho, cirurgião-mor do Regimento de Cavalaria de Vila Rica, foram creditados a Souza Lobo sessenta e dois anos de idade, ou seja, nascido por volta do ano de 1737. AHU, MG, Cx. 148, Doc. 19, Cód. 11376. Atestado de Antônio José Vieira de Carvalho, cirurgião-mor do Regimento de Cavalaria Regular das Minas, certificando de Gervásio de Souza Lobo, picador do dito Regimento, padece de moléstia, pelo que está impedido de continuar no seu ofício. Vila Rica, 5 de abril de 1799. 249 Adalgisa Arantes Campos, 808 assentou praça como soldado no Regimento de Cavalaria de Vila Rica a 22 de junho de 1767, fazendo o “juramento de fidelidade ao Estandarte” em “1º de julho de 1775”.809 Era possuidor, naquela praça, de uma casa de morada à Rua de São José, “em direção à igreja do Pilar”.810 Apesar de algumas fontes afirmarem que era natural de Cabeceira de Bastos, pequena freguesia próxima a Braga, 811 o militar foi descrito como sendo “mestiço”,812 possuidor de olhos galeados e cabelos castanhos, 813 o que talvez justifique o fato de pouco ter ascendido na carreira militar, exercendo apenas funções graduadas como cabo de esquadra, furriel e picador. 814 Apenas em 1797, depois de 30 anos de serviço, solicitou Carta Patente para o posto de “capitão da Companhia de Infantaria Auxiliar dos Homens Pardos dos distritos de Montevidéu, Onça e Piedade”, do termo de São João del-Rei, para um cargo que se encontrava vago, 815 tendo sido deferido. 816 808 CAMPOS, Adalgisa Arantes. Dois pintores mestiços em um mesmo canteiro de obras. In: PAIVA, Eduardo França & ANASTASIA, Carla Maria Junho (Org.). O trabalho mestiço: maneiras de pensar e formas de viver – séculos XVI a XIX. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: PPGHIS/UFMG, 2002, p. 249-254; CAMPOS, Adalgisa Arantes. A contribuição de José Gervásio de Souza Lobo para a pintura colonial. In: Anais do XXVII Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte. Belo Horizonte: C/ Arte, 2008, p. 16, Apud APM, caixa 148, doc. 18 – Minas Gerais, 1799-1804; e CAMPOS, Adalgisa Arantes. Notas sobre um pintor luso-brasileiro e a iconografia dos novíssimos (a morte, o juízo, inferno e o paraíso) em fins da época colonial. Revista de História e Estudos Culturais, Vol. 9, ano IX, nº 2, maio-ago. 2012. 809 AHU, MG, Cx. 148, Doc. 18, Cód. 11377. Certidão de Pedro Afonso Galvão de São Martinho, tenente-coronel Comandante do Regimento de Cavalaria das Minas, atestando que Gervásio de Souza Lobo, soldado da 1ª Companhia, assentou praça de soldado em 1767, julho, 22. Vila Rica, 4 de abril de 1799. 810 MATHIAS. Um recenseamento na Capitania de Minas Gerais... p. 93. 811 AHU, MG, Cx. 148, Doc. 18, Cód. 11377. Certidão de Pedro Afonso Galvão de São Martinho, tenente-coronel do Regimento de Cavalaria das Minas, atestando que Gervásio de Souza Lobo, soldado da 1ª companhia, assentou praça de soldado em 1767, junho, 22. A informação de que era procedente do Reino também pode ser encontrada em uma Relação da Oficialidade do Regimento de Cavalaria Regular de Minas Gerais, de 1790, transcrita nos Autos da Devassa da Inconfidência Mineira. In: BRASIL. Autos da Devassa da Inconfidência Mineira... p. 255, vol. 8. 812 Também Maria de Fátima Hanaque Campos afirma que “José Gervásio de Souza é considerado um dos principais artistas mulato do seu tempo”. In: TRINDADE, Joelson Biltran. Artistas pardos de Minas Gerais: ARAÚJO, Emanuel. A mão afrobrasileira: significado da contribuição artística e histórica. São Paulo: Tenenge, 1988, p. 123, apud CAMPOS, Maria de Fátima Hanaque. A pintura religiosa na Bahia, 1790-1850. Porto: Faculdade de Letras, 2003, p. 255 (Tese de Doutorado em Ciências e Técnica do Patrimônio, Universidade do Porto). 813 Souza Lobo tinha, pelo que consta, “5 pés e 3 polegadas” de altura, ou aproximadamente 1,67 metros de altura. In: AHU, MG, Cx. 148, Doc. 18, Cód. 11377. Certidão de Pedro Afonso Galvão de São Martinho, tenente-coronel Comandante do Regimento de Cavalaria das Minas, atestando que Gervásio de Souza Lobo, soldado da 1ª Companhia, assentou praça de soldado em 1767, julho, 22. Vila Rica, 4 de abril de 1799. 814 Picador era a denominação dada ao militar responsável pelo adestramento das montarias. C.f. Idem. Também SANTOS, Miriam de Oliveira. Berços de heróis: o papel das escolas militares na formação dos “salvadores da pátria”. São Paulo: Annablume, 2004, p. 73. 815 AHU, MG, Cx. 150, Doc. 46, Cód. 11261. Requerimento de José Gervásio de Souza, pedindo Carta Patente de confirmação do posto de capitão da companhia de Infantaria Auxiliar dos Homens Pardos dos distritos de Montevidel, Onça e Piedade. Vila Rica, 17 de outubro de 1799. 250 Durante a década de 1770, Gervásio conduzia os rendimentos, na forma de ouro em barra e dinheiro, mas também em prata e cobre, entre os registros do Caminho Novo e Vila Rica. 817 Em 1777, participou de uma campanha “para lutar contra os espanhóis no sul do país, pelo que recebeu um atestado de idoneidade passado por Sebastião José de Souza Furge, tenente-coronel do Regimento de Cavalaria das Minas”,818 no qual afirma que marchou em uma Companhia despedida de Vila Rica no ano de 1777, por ordem do Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Dom Antônio de Noronha, a percorrer as fronteiras do Sul, chegando à Vila de Lages, e neste exercício suportou toda conta e prontidão em tudo que o serviço lhe era encarregado pelos seus superiores. 819 Assim como Apolinário, Gervásio colaborou com Veloso de Miranda em 816 APM, CC, Cx. 148, Doc. 18, 1799-1804, apud CAMPOS, Adalgisa Arantes. A contribuição de José Gervásio de Souza Lobo para a pintura colonial. In: Anais do XXVII Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte. Belo Horizonte: C/ Arte, 2008, p. 16. A Carta Patente do Capitão Souza Lobo encontra-se em AHU, Minas Gerais, Cx. 150, Doc. 46, Cód. 11261. Requerimento de José Gervásio de Souza, pedindo Carta Patente de confirmação do posto de capitão da companhia de Infantaria Auxiliar dos Homens Pardos dos distritos de Montevidéu, Onça e Piedade. Vila Rica, 17 de outubro de 1799. 817 No ano de 1771, através de um carregamento, o então soldado dragão Gervásio conduziu 2:275$677 réis. No ano de 1773, em outro carregamento, Gervásio conduziu 34$275 réis. No ano de 1775 foram dois carregamentos de 682$651 e 4:780$730 réis e no ano seguinte, outro carregamento, no valor de 228$675 réis. In: APM, CC; Cx. 18, Rolo 506, Doc. 10377. Recibo passado por Gervásio de Souza Lobo ao capitão Braz Alves Antunes referente ao pagamento dos direitos das entradas. Vila Rica, 14 de março de 1775; Cx. 73, Rolo 523, Doc. 30814. Carta de José de Souza Gonçalves ao escrivão deputado da Junta da Real Fazenda, Carlos José da Silva, sobre o envio dos rendimentos das entradas, pelo soldado dragão Gervásio de Souza Lobo. São João del-Rei, 11 de março de 1775; Cx. 77, Rolo 524, Doc. 20071. Recibo passado por Gervásio de Souza Lobo ao administrador do registro do caminho novo, Manuel do Vale Amado, referente à entrega de ouro em pó e em barra. Registro do Caminho Novo, 03 de novembro de 1771; Cx. 77, Rolo 524, Doc. 20072. Recibo passado por Gervásio de Souza Lobo ao administrador do registro do caminho novo, Manuel do Vale Amado, referente à entrega de ouro em pó e em lavra. Registro do Caminho Novo, 04 de julho de 1776; e Cx. 79, Rolo 525, Doc. 20120. Recibo passado por Gervásio de Souza Lobo ao capitão Manuel do Vale Amado, referente à entrega de quantia no Tribunal da Junta de Vila Rica. Vila Rica, 03 de outubro de 1775. 818 Ao contrário do que diz Adalgisa Campos, a saída do grupamento em direção ao Sul da América portuguesa se deu no ano de 1777, e não em 1774. CAMPOS, Adalgisa Arantes. Notas sobre um pintor luso-brasileiro e a iconografia dos novíssimos (a morte, o juízo, inferno e o paraíso) em fins da época colonial. Revista de História e Estudos Culturais. Vol. 9, ano IX, nº 2, maio-ago. 2012. 819 APM, CC, Cx. 31, Rolo 510, Doc. 10634. Atestado de idoneidade passado por Sebastião José de Souza Ferraz para Gervásio José de Souza sobre os bons serviços prestados na expedição das fronteiras do Sul. Onça, 19 de abril de 1785. Apesar desta ocorrência, esse período de campanha não consta nos assentos da certidão passada por Pedro Afonso Galvão de São Martinho, Comandante do Regimento de Cavalaria das Minas. In: AHU, Minas Gerais, Cx. 148, Doc. 18, Cód. 11377. Certidão de Pedro Afonso Galvão de São Martinho, tenente-coronel Comandante do Regimento de Cavalaria das Minas, atestando que Gervásio de Souza Lobo, soldado da 1ª Companhia, assentou praça de soldado em 22 de julho de 1767. Vila Rica, 4 de abril de 1799. 251 algumas viagens filosóficas, 820 como naquela empreendida pelos sertões da capitania durante quase um ano, entre os dias 11 de agosto de 1791 e 27 de julho de 1792. 821 Provavelmente, o militar foi preparado para tais préstimos, haja vista que em correspondência datada de 1790, destinada a Martinho de Melo e Castro, o Visconde de Barbacena afirmou que havia mandado aperfeiçoar um soldado do Regimento “nesta arte, e [que ele] se acha[va] demais adiantado com o uso, depois das poucas lições com que se habilitou”.822 Apesar dessa informação, não se sabe de quem teria sido discípulo nas artes das tintas e dos pincéis, conquanto tenha sido contemporâneo, em Vila Rica, de Manoel da Costa Ataíde (1762?-1830) e Manoel Ribeiro Rosa (1758-1808), esse último também mestiço e militar. 823 Segundo Gustavo Ferreira, é de crer que o referido militar e artista tenha tido contato com livros sobre desenho, na busca por referências de sua instrução, tendo em vista as obras seguramente de sua autoria, como os Novíssimos dos Homens (...). [Por meio delas], percebe-se que este conhecia, por exemplo, as gravuras dos irmãos Joseph Sebastian Klauber (1710-1768) e Johann Baptist Klauber (1712-1787), gravadores oficiais do Bispo de Augsburgo, autores de estampas com temas religiosos durante o século XVIII e de muita aceitação pública, portanto possuía alguma instrução e referência na arte do desenho. 824 Além dos trabalhos junto a Veloso de Miranda, Gervásio também se destacou como pintor de regular atividade, tendo sido responsável pelo feitio de vários trabalhos em igrejas e em outras edificações, alguns dos quais ainda podem ser contemplados, como aqueles que fez entre os anos de 1792 e 1793 para a Irmandade do Rosário dos Pretos de Vila Rica, de quem era irmão professo, um conjunto de “obras que lhe renderam 27 oitavas divididas em duas parcelas”; “quatro painéis sobre os novíssimos do homem (a Morte, o Juízo, o inferno e o Paraíso)”, atualmente dispostos na Matriz do 820 Souza Lobo é um dentre vários militares que para além de suas atuações nos aquartelamentos mineiros, mantinha o risco e a pintura como segunda atividade, com a qual auferia renda. Sobre esse assunto, C.f. SILVA, Kellen Cristina. “Um Jesus esquecido: a trajetória do pintor Manoel Victor de Jesus na vila de São José del-Rei e entorno, Século XIX”. Kaypunku: Revista de Estudios Interdisciplinarios de Arte y Cultura, Vol. 3, Nº 2, 2016, p. 285-319. 821 MATHIAS. Um recenseamento na Capitania de Minas Gerais, p. XXVII. 822 AHU, MG, Cx. 134, Doc. 56, Cód. 10513. Carta do Visconde de Barbacena, governador das Minas Gerais, enviando quatro caixas de produtos minerais e vegetais, e junto suas relações. Vila Rica, 12 de junho de 1790. 823 CAMPOS. Dois pintores mestiços em um mesmo canteiro de obras, p. 250. Maiores informações sobre Manoel Ribeiro Rosa podem ser verificadas em REZENDE, Leandro Gonçalves de; LEOPOLDINO, Armando Magno de Abreu. Pintores coloniais nas minas setecentistas: a vez de Manoel Ribeiro Rosa. Anais do VIII Encontro de História da Arte. Campinas: Unicamp, 2012, p. 329-340. 824 FERREIRA. As Polêmicas Flores, p. 47. As gravuras em que Gervásio teria tomado como modelo e suas respectivas obras encontrassem nesta Dissertação de Mestrado, às páginas 147 e 148. 252 Pilar, em Ouro Preto, estudados por Adalgisa Campos. 825 Gervásio executou ainda, entre os anos de 1798 e 1803, “a pintura e o douramento dos altares laterais de Santo Antônio, São Benedito e Santa Efigênia”, também na igreja do Rosário, que lhe renderam “um total de 86 oitavas de ouro”.826 Segundo Adalgisa Campos, o militar também realizou algumas pinturas, já desaparecidas, no Palácio de Cachoeira do Campo, em 1780, 827 bem como outro trabalho na residência do intendente de São João del-Rei, Joaquim José Soares de Araújo, em 1788. 828 Campos afirma que, em 1795, Souza Lobo teria solicitado autorização para se deslocar ao Reino, na intenção de tratar de alguns assuntos relacionados às atividades que desempenhara junto a Veloso de Miranda. 829 Se, de fato, o militar realizou esta viagem, aparentemente não deve ter permanecido por muito tempo na Corte, uma vez que no ano de 1798 já se encontrava novamente em Vila Rica, trabalhando em atividades relacionadas à pintura, 830 como no serviço que realizou nas urnas da loteria então vigente na capitania, pelo qual foi recompensado com uma oitava e meia de 825 CAMPOS. Dois pintores mestiços em um mesmo canteiro de obras, p. 249; e CAMPOS, Adalgisa Arantes. Notas sobre um pintor luso-brasileiro e a iconografia dos novíssimos (a morte, o juízo, inferno e o paraíso) em fins da época colonial. Revista de História e Estudos Culturais. Vol. 9, ano IX, nº 2, Maio-Ago. 2012. 826 AHCP, Livro de Receita e Despesa da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, 1780-1818, fls. 120, 140, 152, apud CAMPOS, Adalgisa Arantes. A contribuição de José Gervásio de Souza Lobo para a pintura colonial. In: Anais do XXVII Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte. Belo Horizonte: C/ Arte, 2008, p. 16. 827 CAMPOS. Notas sobre um pintor luso-brasileiro e a iconografia dos novíssimos, apud MATHIAS, Herculano Gomes. A coleção da Casa dos Contos de Ouro Preto. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1966. p.254. 828 CAMPOS. Notas sobre um pintor luso-brasileiro e a iconografia dos novíssimos... 829 CAMPOS. A contribuição de José Gervásio de Souza Lobo para a pintura colonial, p. 17. Em fevereiro de 1796 Souza Lobo ainda não havia empreendido a viagem porque a licença não havia sido entregue, apesar da provisão datada de 28 de janeiro do ano anterior, vindo a solicitar uma segunda via. Especulou-se que o motivo para a não entrega de tal documentação fosse um possível naufrágio da embarcação ou mesmo que esta tivesse sido tomada pelos franceses. AHU, MG, Cx.140, Doc. 3, Cód. 10824. Requerimento de Gervásio de Souza Lobo, picador do Regimento de Cavalaria paga de Minas Gerais, solicitando licença para vir ao Reino. Vila rica, 17 de janeiro de 1795. 830 Quando da solicitação da licença para o deslocamento, afirmou que “poderá ter demora de um ano”. AHU, MG, Cx.140, Doc. 3, Cód. 10824. Requerimento de Gervásio de Souza Lobo, picador do Regimento de Cavalaria paga de Minas Gerais, solicitando licença para vir ao Reino. Vila rica, 17 de janeiro de 1795. 253 ouro. 831 Interessante também o fato de que Gervásio deixou de exercer a profissão militar após 32 anos de ofício, em função de problemas de saúde, provavelmente decorrentes do contato constante com as tintas e, mais precisamente, com o chumbo de sua composição, tendo recebido atestado assinado pelo médico do Regimento, Vieira de Carvalho. 832 Por todo o exposto, recentes estudos vêm inserindo Gervásio na historiografia como sendo um autor de “‘excentricidade da invenção e audácia do colorido’, não tendo antecedentes nem similitudes entre outros pintores da capitania mineira”.833 Importante mencionar que outros tantos auxiliares colaboraram com as indagações filosóficas, por meio das coletas e das experiências realizadas por Veloso de Miranda em Vila Rica, na fazenda do Mau Cabelo e quando de suas viagens. No ano de 1799, por exemplo, o naturalista foi incumbido de realizar os ensaios sobre o ferro pantanoso, 834 servindo-lhe de auxiliar o troneiro (armeiro) Manoel João Pereira, do Regimento de Vila Rica. 835 Esse Manoel, de quem pouco temos notícias, serviu naquele Regimento desde 831 APM, CC, Cx. 137, Rolo 541, Doc. 21191. Recibo passado por José Gervásio de Souza ao capitão Domingos de Amorim Lima, referente à entrega de quantia de ouro pelo pagamento das pinturas das urnas da loteria. Vila Rica, 28 de abril de 1799. Outros tantos profissionais atuaram concomitantemente com Gervásio nesse fim, a saber, Antônio Moreira Duarte, que recebeu 32 oitavas de ouro por “preparar” (organizar?) a dita loteria; Manoel Ferreira da Silva Cintra, Matheus Borges, José Ferreira da Silva e Antônio Morais Duarte, responsáveis pela redação de mil bilhetes cada um, pelo qual receberam dez oitavas de ouro cada. Foram realizadas, ainda, cinco aquisições de papel de Holanda para os bilhetes, com pagamentos de três oitavas e quatro onças, cinco oitavas, oito oitavas, uma oitava e 46 vinténs e cinco oitavas e três quartos de vintém. In: APM, CC, Cx 77, Rolo 524, Doc. 20071. Recibo passado por Antônio Moreira Duarte ao capitão Domingos de Amorim Lima por preparar a loteria. Vila Rica, 25 de novembro de 1797; Cx. 137, Rolo 541, Doc. 21189. Recibos pela redação dos bilhetes da loteria. Vila Rica, S/D; Cx. 137, Rolo 541, Doc. 21190. Recibos da compra de papel para a loteria. 832 AHU, MG, Cx. 148, Doc. 19, Cód. 11376. Atestado de Antônio José Vieira de Carvalho, cirurgião-mor do Regimento de Cavalaria Regular das Minas, certificando de Gervásio de Souza Lobo, picador do dito Regimento, padece de moléstia, pelo que está impedido de continuar no seu ofício. Vila Rica, 5 de abril de 1799. 833 TRINDADE, Joelson Biltran. Artistas pardos de Minas Gerais: ARAÚJO, Emanuel. A mão afrobrasileira: significado da contribuição artística e histórica. São Paulo: Tenenge, 1988, p. 123, apud CAMPOS, Maria de Fátima Hanaque. A pintura religiosa na Bahia, 1790-1850. Porto: Faculdade de Letras, 2003, p. 255 (Tese de Doutorado em Ciências e Técnica do Patrimônio, Universidade do Porto). 834 AHU, MG, Cx. 147, Doc. 10, Cód. 11332. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando os caixotes números 2 e 3 com amostras de salitre e suas respectivas notas e informando ter feito diligências para fazer análise ao ferro pantanoso. Vila Rica, 12 de janeiro de 1799. 835 AHU, MG, Cx. 143, Doc. 67, Cód. 10968. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, agradecendo pela sua promoção no cargo de secretário do governo das Minas Gerais, e pedindo os termos do seu cargo. Vila Rica, 10 de dezembro de 1797. Manoel João Pereira também foi designado como “serralheiro”, “armeiro” “abridor de ferros” e “mestre ferreiro”. In: APM, CC, Lata 146, 3º Pacote; Lata 158, 3º Pacote, e Lata 161, 3º Pacote. 254 pelo menos o ano de 1773, substituindo o antigo armeiro, João Gomes Batista, 836 formando com Euzébio da Costa Ataíde, mestre ferreiro, o quadro de especialistas do aquartelamento. 837 Ao que consta, exercia múltiplas funções e foi responsável não apenas pelo conserto dos armamentos, 838 mas também arrematando obras públicas, como aquelas que realizou no Palácio do Governador em duas ocasiões, em 1778 e em 1785, junto ao mestre carpinteiro Manuel Rodrigues Graça e os mestres pedreiros Marçal José de Araujo e Henrique Gomes de Brito, 839 ou ainda nas obras na Real Casa de Fundição, em 1779, 840 e na Intendência, em fevereiro de 1787. 841 Pela falta de informações sobre os resultados obtidos com o ferro pantanoso, não se pode afirmar que Veloso de Miranda e Manoel tenham, de fato, produzido amostras de ferro fundido por meio de algum pequeno alto forno, possibilidade que não pode ser desprezada uma vez que estes estudos estavam sendo incentivados na capitania, e eram considerados, inclusive, um dos “setores de intervenção primordial”.842 6.1.7 – Escravos afeitos à História Natural Além dos profissionais letrados e práticos de ofício, alguns escravos, auxiliares de Veloso de Miranda, fizeram parte das comitivas que acompanhavam o naturalista quando de suas viagens filosóficas, tendo por responsabilidade a preparação das cargas para o transporte nos muares, a condução e demais cuidados dispensados aos animais, o preparo da alimentação da jornada, a montagem do acampamento e, inclusive, o auxílio quando da coleta e do preparo das amostras. Na viagem que o naturalista realizou entre outubro de 1798 e janeiro de 1799, por exemplo, levou consigo três bestas alugadas e cinco escravos que o auxiliaram na coleta, na preparação e na embalagem de “48 caixotes de plantas vivas, que o governador Lorena logo despachou para Lisboa”.843 Posteriormente, entre o segundo semestre de 1796 e os primeiros meses do ano posterior, quando de sua “viagem científica no interior do rio de São Francisco”, Veloso de Miranda integrou uma comitiva, viajando “protegido por uma escolta de sertanistas”, 836 APM, CC, Lata 158, 3º pacote; 837 APM, CC, Lata 105, 1º pacote; Lata 161, 2º pacote; Lata 166, 1º pacote. 838 APM, CC, Lata 171, 3º Pacote; Lata 174, 2º Pacote; e outros. 839 APM, CC, Lata 160, 3º Pacote; Lata 161, 3º Pacote. 840 APM, CC, Lata 97, 2º Pacote. 841 APM, CC, Lata 148, 1º Pacote. 842 HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional do antigo regime. In: _____. Poder e instituições na Europa do antigo regime. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984. p. 68. 843 APM, SC- 276, fl. 42v, apud BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 134. 255 onde constavam alguns escravos, 844 ocasião em que seria responsável pela descoberta de minas de galena “nas cabeceiras setentrionais do rio Abaeté”.845 Pode-se ter ideia de como os cativos eram utilizados por Veloso de Miranda em suas atividades filosóficas por meio da Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda (...), de 1806, que revela que entre os anos de 1786 e 1805, o naturalista se fez acompanhar por escravos em quatro ocasiões. 846 Nos assentos relativos ao ano 1787, por exemplo, consta o “pagamento do escravo”, subentendendo-se como apenas um cativo. Dois anos depois, novamente foi lançada a despesa para um cativo. Em 1791, diz o documento que o naturalista foi acompanhado por “escravos”, no plural, em número não especificado, e, por fim, no ano de 1792 consta, novamente, o registro da despesa de um escravo acompanhando o naturalista. Nos lançamentos referentes aos outros anos, mesmo sendo inexistentes os assentos fazendo menção ao pagamento das despesas de aluguel de cativos, foram lançados valores referentes à “despesa pessoal paga do naturalista Doutor Veloso”, compreendendo estas as comedorias e “gêneros ao transporte”, pelo que não se pode recusar a possibilidade de que nestas despesas estivessem inseridos os pagamentos dos aluguéis de cativos como mão de obra. 847 Ademais, é bem provável que o naturalista realizasse suas viagens filosóficas acompanhado de escravos de sua propriedade, e que esses fossem habeis na arte do preparo e do acondicionamento das amostras, hipótese que pode ser corroborada em certo comentário registrado por Saint-Hilaire, alguns anos após o falecimento de Veloso de Miranda, ao afirmar em uma de suas memórias que o naturalista mineiro não herborizava sozinho, mas “por intermédio de seus escravos”.848 Também na Fazenda do Mau Cabelo Veloso de Miranda contava com numerosa escravaria, e além das atividades inerentes a terra e às indústrias que o ali mantinha, como veremos no Capítulo seguinte, deve ter utilizado seus cativos na condução das indagações filosóficas e de seus os projetos, como a fábrica de salitre, o que evidentemente demandava instruí-los no manejo da terra nitrosa, assim como nos demais processos para seu beneficiamento. 844 PONTES, Manoel José Pires da Silva. Extrato da Memória do Dr. José João Teixeira, pelo dito Sr. Pontes. RIHGB, tomo 6, 1844, p. 284e-284g. 845 _____. Memória da Comarca da Pitangui. RIHGB, tomo VI. Rio de Janeiro: Kraus Reprint, 1844, p. 284-284f. 846 Convém ressaltar que as informações elencadas na Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda (...) estão resumidas, portanto, imprecisas. 847 APM, CC, Cx. 18, Doc. 10367, Rolo 506. Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda com a exploração e estabelecimento do Jardim botânico de Ouro Preto. Vila Rica, 21 de agosto de 1806. 848 SAINT-HILAIRE, Auguste de. História das plantas mais notáveis do Brasil e do Paraguai. Belo Horizonte: Fino Traço, 2011, p. 84. 256 Sua rotina na Fazenda do Mau Cabelo será analisada no capítulo seguinte, do qual também faz parte uma fundamental análise de seu envolvimento na política mineira, quando da virada do século. Não por coincidência, é este o período em que mais adiantou os estudos da História Natural nas Minas. 257 CAPÍTULO 7 “FILÓSOFO NATURALISTA A SERVIÇO DO REI” E DE SI MESMO Esse capítulo aborda duas ocupações concomitantes a de naturalista, desempenhadas por Veloso de Miranda, durante os anos em que viveu na capitania de Minas de Gerais, após seu retorno de Coimbra: a de secretário de governo e a de proprietário da fazenda do Mau Cabelo. Ambas as funções são de cunho administrativo, mas a primeira diz respeito à esfera pública e a segunda, privada. O objetivo principal é analisar como essas atividades interferiram, de forma positiva ou negativa, no desempenho da sua função de naturalista, fomentando ou prejudicando suas pesquisas. Vejamos. 7.1 – A Secretaria do Governo da Capitania (1799-1804) Veloso de Miranda participou da administração da capitania, ocupando o cargo de secretário do governo. Era comum a consubstanciação da atividade de naturalista com a de administração a exemplo do que ocorrera, no Reino, com Alexandre Rodrigues Ferreira e José Bonifácio de Andrada e, no Brasil, com Manoel Ferreira da Câmara Bittencourt. Afinal, a missão científica só se completava quando posta, de forma concreta e sob o signo da utilidade, ao serviço do Estado. Esses homens, com suas luzes, deveriam transformar a administração de forma a viabilizar a modernização do império e o aproveitamento de seus recursos econômicos, contribuindo para seu progresso. A consubstanciação da atividade em História Natural e o serviço do Estado não resultava apenas na ocupação de cargos administrativos. Era necessário, também, estabelecer uma boa relação com as autoridades em exercício, especialmente os governadores, essenciais para o desempenho das custosas e caras pesquisas científicas. Esse foi o caso de Veloso de Miranda que, em geral, teve boas relações com todos os governadores, enquanto residiu em Vila Rica, desde Rodrigo José de Meneses e Castro até Pedro Maria Xavier de Ataíde e Melo, passando por Luís da Cunha Meneses, Luís António Furtado de Castro do Rio de Mendonça e Faro e Bernardo José Maria Lorena e Silveira. A única exceção parece ter sido a que estabeleceu com o Visconde de Barbacena, que registra um desentendimento pontual. No ano de 1793, Veloso recebeu a notícia de 258 que seus vencimentos haviam sido suspensos pelo governador. 849 É importante registrar, no entanto, que ambos, como salienta Boschi, haviam sido contemporâneos em Coimbra, frequentando inclusive o mesmo curso, além de que Barbacena era, quando da criação da Academia Real das Ciências de Lisboa, secretário, um dos seus fundadores, e um dos responsáveis por aprovar a candidatura de Veloso de Miranda. Há várias tentativas de explicar essa suspensão. Tarquínio José Barbosa afirma que esse episódio tinha como origem as “desavenças ocorridas no interior da aludida academia”,850 concernentes às nomenclaturas dadas por Vandelli às espécies botânicas recolhidas pelo naturalista em Minas Gerais, que homenageavam várias autoridades. Para Boschi, não era decorrente pura e simplesmente dessas homenagens, uma vez que “no inventário das espécies do Fascilusus Plantarum Brasiliensium esse governador também foi distinguido, com a atribuição da nomenclatura científica Barbacenia”.851 Ademais, Barbacena era considerado um benemérito da instituição e como amigos de longa data, é bem provável que Veloso de Miranda tivesse comentado com ele sobre as espécies que coletara ou, ainda, sobre a homenagem que a ele haveria de ser feita. Não se conhecem as causas exatas dessa suspensão. Para Gustavo Ferreira, “não passava de uma manobra arquitetada pelo governador” para redirecionar o foco das pesquisas realizadas em Minas Gerais. 852 Este historiador justifica sua afirmação pelo fato de que, em 1790, Barbacena havia escrito a Melo e Castro “sobre a questão da remuneração pelos serviços prestados por Veloso de Miranda”,853 e a necessidade de se dar maior importância ao descobrimento de novas minas, afirmando ainda que o naturalista apresentava “inclinação para as ações respeitantes aos Reinos Vegetal e Animal, em detrimento do requerido empenho de mineralogista”.854 Já para Caio Boschi, o governador “ponderava sobre a conveniência de se ‘determinar ao naturalista um ordenado certo’”,855 optando por suspendê-lo para forçar Veloso de Miranda a abrir novos horizontes para suas indagações filosóficas, sobretudo para a mineralogia. Certo é 849 FBN, CC, I - 26, 31, 047, rolo 79, documento microfilmado. Ordem Régia suspendendo o pagamento de Joaquim Veloso de Miranda e o recolhimento da Portaria que determina esse pagamento. Vila Rica, 08 de outubro de 1793. 850 OLIVEIRA, Tarquínio José Barbosa de. Cartas chilenas. São Paulo: Referência, 1972, p. 96, apud BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 125. 851 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 125. 852 FERREIRA. As Polêmicas Flores, p. 79. 853 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 127. 854 AHU, MG, Cx. 134, Doc. 56. Carta do Visconde de Barbacena, governador das Minas Gerais, enviando quatro caixas de produtos minerais ou vegetais, e junto duas relações. Vila Rica, 12 de junho de 1790. 855 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 127. 259 que, em 1794, Veloso de Miranda enviou uma carta a Vandelli, mencionando que há um ano tinha sido “suspenso da diligência em que andava, pela junta da Real Fazenda destas Minas”, que haviam ficado em seu poder “quase trezentas estampas de plantas com muitos gêneros novos, e alguns de animais, os quais por ordem do meu general se acham em minha mão”856 e somente três anos depois, em 1797, enviou ao lente paduano as iluminuras e suas descrições. 857 Em 1796, Veloso de Miranda foi, nas palavras de Boschi, reabilitado para retornar suas pesquisas em História Natural. Isso ocorreu sob a proteção de Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, que ordenou sua viagem aos sertões do Rio de São Francisco – a primeira de outras tantas com o viés em mineralogia. Sua reabilitação se completa quando, no ano seguinte, o novo governador, Bernardo José Maria Lorena e Silveira, cumprindo uma Ordem Régia, empossou Veloso de Miranda no cargo de secretário do governo da capitania pelo período de três anos, “e o mais que lhe for Servido, enquanto não lhe nomear sucessor”, com rendimentos anuais fixados em 980:000 réis. 858 Este cargo era dos mais considerados na administração local. Segundo Fernando Silva, “a escolha dos secretários de governo das Minas Gerais passava por processos criteriosos de seleção régia”, que poderia incluir a apresentação de candidatos ao cargo devidamente apresentados ao Conselho Ultramarino, que não raro considerava não apenas o histórico dos candidatos envolvidos, mas costumava valorizar a experiência e a diligência dos concorrentes no trato das atividades burocráticas e administrativas no Império português. 859 Quando das reuniões e em eventos festivos no Palácio dos Governadores, o secretário tinha assento imediatamente à direita da cabeceira da mesa, ocupada pelo governador. Na América portuguesa, “desde o século XVII, cada governador de capitania tinha um secretário letrado, nomeado por ele ou pelo rei, com a incumbência de manter em boa ordem o arquivo, fornecer certidões e assessorar burocraticamente o governante”. Tinham, mais especificamente, o encargo de “organizar os papéis que vinham do Reino, bem como os que para lá seguiam, fazendo a expedição, tramitação e 856 AHMB. Cn/M71, apud BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica. 857 SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese overseas territories, p. 174. 858 AHU, MG, Cx. 143, doc 67, código 10968. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, agradecendo pela sua promoção no cargo de secretário do governo das Minas Gerais, e pedindo os termos do seu cargo, fl. 6. Vila Rica, 10 de dezembro de 1797. 859 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 59-100, apud SILVA, Fernando Junio Santos. “Nos bastidores da administração colonial: o papel dos secretários de governo na capitania de minas gerais (1735-1763)”. Temporalidades, vol. 6, nº. 1, Jan./Abr. 2014, p. 32. 260 registro de toda a documentação produzida ou recebida pelo capitão general, além de dar publicidade aos atos do governo”.860 Mais que um cargo auxiliar, o pretendente ou indicado para ocupá-lo deveria ser munido de algumas prerrogativas. Manuel de Afonseca de Azevedo, por exemplo, secretário que foi do governo da capitania de São Paulo e Distritos das Minas do Ouro a partir de 1712, era “cavaleiro fidalgo e professo na Ordem de Cristo”, e já tinha experiência adquirida por ter sido “oficial da Secretaria de Estado desde 1703”, vindo a ocupar um cargo de secretário em uma terceira oportunidade, na década de 1720, já com a capitania de Minas possuidora de poder próprio e liberta da administração de São Paulo. 861 Também José Cardoso Peleja, nomeado secretário em 13 de setembro de 1748, respondeu como titular no cargo por nove anos, e provinha de uma família com histórico de serviços prestados à Coroa, pois seu avô, José Luís Peleja, havia sido capitão de mar e guerra com atuação em Angola, na década de 1660, e “seu pai, Antônio Luís Peleja, exerceu a Ouvidoria Geral da Capitania de São Paulo na virada do século XVII para o XVIII”. Veloso de Miranda, no entanto, não era fidalgo nem havia solicitado mercês para se tornar cavaleiro, mas tinha formação pela Universidade de Coimbra e havia servido à Coroa por quase 20 anos como naturalista, vindo a alcançar considerável reconhecimento. As diferenças sociais entre os ocupantes da primeira e segunda metade do XVIII revelam a importância que, em fins do século, os intelectuais, mesmo nascidos no além-mar e não fidalgos adquiriam junto à Corte. Portugal estava afinado com os ideais iluministas que propugnavam a ascensão dos homens de talento aos grandes do Estado. 862 Além da nova atribuição, tudo leva a crer que Lisboa tinha grande interesse que Veloso de Miranda mantivesse com a mesma regularidade seus estudos, recomendando-o “a continuar os mesmos trabalhos de História Natural”, apesar da nova investidura. 863 A economia das despesas decorrentes da manutenção de um profissional 860 MELO, Josemar Henrique de. A ideia de arquivo: a Secretaria de Governo da Capitania de Pernambuco (1687-1809). Porto: FLUP, 2006 (Tese de Doutorado em Ciências Documentais, Universidade do Porto), apud MARTINS, Marcelo Quintanilha. “Maços, latas e softwares: o Arquivo Público do Estado de São Paulo e suas reconfigurações”. Revista Acervo. Rio de Janeiro, vol. 26, nº. 2, 2013, p. 232. 861 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 62-64. 862 FURTADO. Oráculos da geografia iluminista... p. 115-116. 863 AHU, MG, Cód. 610, fl. 201v, apud BOSCHI. Exercícios de Pesquisa histórica, p. 92. 261 em dois cargos distintos parecia ser atrativa. 864 Mesmo ciente de que a acumulação de funções poderia ser prejudicial a suas pesquisas, em 1799 o naturalista assumiu o cargo de secretário, mostrando-se cortês e não deixando de agradecer sua investidura perante a “Generosa Proteção Real”.865 Tal cargo conferia-lhe remuneração estável e conferia honra e prestígio local. Como Veloso de Miranda, outros naturalistas foram agraciados com cargos administrativos de destaque, como Joaquim José da Silva e Manuel Galvão da Silva nas conquistas em Angola e Moçambique, respectivamente. 866 Para Ronald Raminelli, o abandono das pesquisas – ainda que não seja esse o caso de Veloso de Miranda – e o ingresso no universo burocrático foi recorrente entre os naturalistas que, com tal artifício, acumulavam mercês, necessárias segundo a lógica de uma sociedade pautada em valores de Antigo Regime. 867 Se por um lado o cargo de secretário tolhia grande parte do tempo que o naturalista dispunha para se dedicar ao horto botânico, aos experimentos com o salitre e a outras observações filosóficas, por outro Veloso de Miranda não deixou de cumprir as recomendações de Lisboa, nem que para isso fosse necessário transmitir algumas das suas atribuições, como a gestão do horto, delegada, em várias ocasiões e sem prejuízos evidentes, a Godói Torres. 868 Como discutido nos Capítulos 4 e 5, Veloso de Miranda usou a nova função em prol de seus estudos em História Natural e, principalmente, para incrementar o acervo botânico. Sob o manto da autoridade de que estava investido na capitania, seguidamente enviou ordens a todas as comarcas solicitando que exemplares da flora local fossem-lhe remetidos a Vila Rica, para povoarem o novo jardim. 869 Além da secretaria e do horto, Veloso de Miranda manteve as pesquisas sobre o salitre, e continuou explorando a nitreira artificial na fazenda do Mau Cabelo, parte de suas pesquisas em mineralogia. Quando o cargo exigia que se ausentasse de Vila Rica, além de delegar a 864 AHU, MG, Cx. 143, Doc. 68, Cód. 10979. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando cumprimento a Ordem Régia de 20 de fevereiro de 1797, de prover Joaquim Veloso de Miranda no posto de secretário do governo das Minas Gerais. Vila Rica, 11 de outubro de 1797. 865 AHU, MG, Cx. 143, Doc. 67, Cód. 10968. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estados dos Domínios Ultramarinos, agradecendo pela sua promoção no cargo de secretário do governo das Minas Gerais, e pedindo os termos de seu cargo. Vila Rica, 12 de outubro de 1797. . 866 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 133, nota 73. 867 RAMINELLI. Viagens Ultramarinas... p. 11-13. 868 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa histórica, p. 93-95. 869 Ver, dentre outros, APM, SC 279, Registros de Cartas, Ordens e Portarias do Governador a Diversas autoridades da Capitania. 1797-1809, p. 27v. 262 administração do horto a Godói Torres, transferia os encargos de secretário a José Joaquim de Oliveira Cardoso, igualmente mazombo e bacharel em Filosofia pela Universidade de Coimbra. 870 Cardoso era tesoureiro efetivo da tropa da capitania, 871 e “capitão da Primeira Companhia do Regimento de Cavalaria de Milícias” de Vila Rica, 872 onde era morador na Rua do Ouro Preto, em residência conhecida como “do vigário”, por ter pertencido ao padre Francisco Ferreira da Cunha.873 O naturalista desempenhou o cargo de secretário de forma parcial, uma vez que entre os anos de 1799 e 1802, Oliveira Cardoso tornou-se signatário dos papéis referentes ao cargo em 11 oportunidades. 874 Quando ambos ficavam impedidos, era exercido por terceiros, como Francisco José de Paula, Luís Maria da Silva Pinto e Manuel Jacinto Nogueira da Gama, todos oficiais maiores da Secretaria. 875 Oliveira Cardoso, no entanto, não atuou junto a Veloso de Miranda apenas como seu substituto na secretaria, sendo designado por Lorena, em determinada ocasião, a acompanhar até Lisboa várias “vias de cartas, remessas mineralógicas e dois cavalos para Sua Alteza Real”. Embarcou para a Corte a partir do Rio de Janeiro na nau Rainha de Portugal, a 8 de março de 1802”.876 Nesse período, Veloso de Miranda esteve bastante atribulado com a fábrica para o beneficiamento do nitro na fazenda do Mau Cabelo. Tudo indica que Veloso de Miranda estava ciente que não poderia servir ao Rei como secretário de governo da capitania durante muitos anos. Houve duas tentativas de 870 AUC, Índice de alunos da Universidade de Coimbra. Assento de José Joaquim de Oliveira Cardoso. 871 FBN, CC, 354.8151. Carta de José de Souza Lobo ao tesoureiro da tropa da capitania de Minas Gerais, José Joaquim de Oliveira Cardoso, tratando de uma procuração. Lisboa, 1º de março de 1805. 872 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 94. 873 APM, CMOP, Cx. 77, Doc. 40. Solicitação de José Joaquim de Oliveira Cardoso para o aforamento de algumas braças de terra, localizadas nos fundo do seu quintal. Vila Rica, 23 de março de 1804. O livro Um recenseamento na capitania de Minas Gerais, Vila Rica – 1804, indica que Oliveira Cardoso era proprietário que era de uma casa na rua Direita. C.f. MATHIAS. Um recenseamento na capitania de Minas Gerais, p. 110. Em uma destas casas procedidas as buscas aos bens de Tiradentes, quando do sequestro. In: BRASIL. Autos da devassa da Inconfidência mineira, vol. 6, p. 57. Segundo Adelto Gonçalves, o padre Francisco Ferreira da Cunha havia sido sócio de José Joaquim da Silva Xavier, o Tiradentes, em uma botica instalada nas proximidades da Ponte do Rosário. GONÇALVES, Adelto. O inconfidente que virou santo: estudo biográfico sobre Salvador Carvalho do Amaral Gurgel. Estudos Avançados. São Paulo, vol. 24, nº. 69, p. 119-141, 2010. 874 APM, SC-276. Registro de ofícios do governador às Secretarias de Estado, 1797-1802. Especificamente, ver os registros documentais de número 47, 64 e 93, do ano de 1799; 4, 6, 28 e 44, de 1800; 17 e 31, de 1801, e 17 e 23, de 1802. O período entre um assento e outro também é indício de que Veloso de Miranda costumava se ausentar frequentemente do cargo político que ocupava. 875 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 93-95. 876 APM, SG, Cx. 55, Doc. 63. Ofício do Vice-Rei D. Fernando José de Portugal e Castro ao governador, Bernardo José de Lorena, informando que já fez embarcar para Lisboa, na nau Rainha de Portugal, o bacharel José Joaquim de Oliveira Cardoso, oficial maior da secretaria de governo de Minas, conduzindo algumas vias de cartas, remessas mineralógicas e dois cavalos para Sua Alteza Real. Rio de Janeiro, 11 de maio de 1802. 263 ser substituído que, no entanto, não se concretizaram. A primeira ocorreu no ano de 1801, quando Oliveira Cardoso foi nomeado em seu lugar, e a segunda, a 26 de julho de 1804, com a nomeação de João José Lopes Mendes Ribeiro (1774-1852), futuro presidente da província de Minas Gerais entre os anos de 1827 e 1830. 877 Ambas as nomeações não chegaram a se efetivar, contrariando o que afirmou Gustavo Ferreira, 878 pois, a 10 de março de 1805, Veloso de Miranda ainda respondia pela secretaria, despachando e assinando documentos. Nessa ocasião, redigiu um relatório no qual listou as ordens recebidas desde o ano de 1799, quando assumira o cargo. 879 A documentação se cala sobre o momento que deixou definitivamente o cargo e se instalou na fazenda do Mau Cabelo, visto que inexistem cartas dirigidas ou assinadas por ele a partir de março de 1805, ao mesmo tempo que se multiplicaram aquelas destinadas a Manuel Ferreira da Câmara, designado Intendente Geral das Minas, a 7 de novembro de 1800, tornando-se, então, o interlocutor de Dom Rodrigo no que se refere, na capitania, ao salitre. 880 Apesar de não ter recebido honrarias ou mercês importantes, como os hábitos das Ordens Militares, ou a de Cristo, resultantes de sua contribuição na investigação da natureza, como se tornava frequente em fins do século XVIII, quando a Ciência era fator de honra, Veloso de Miranda era apresentado à sociedade como homem de grande inteligência, o que se refletia na documentação que seguidamente se refere a ele como “doutor”, e não como “padre”. O designativo doutor revela como sua função sacerdotal foi obliterada, mesmo abandonada, em prol da ciência. 7.2 – A Fazenda do Mau Cabelo e o legado que não foi É bem provável que Veloso de Miranda tenha se desincompatibilizado da secretaria de governo da capitania ainda em 1805, quando, então, decidiu transferir sua residência de Vila Rica para a Fazenda do Mau Cabelo, levando consigo grande parte de 877 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa histórica, p. 95. 878 Este autor mencionou que o naturalista deixou a secretaria de Governo em 1804, se recolhendo em definitivo na fazenda do Mau Cabelo. In: FERREIRA. As Polêmicas Flores, p. 114. 879 AHU, MG, Cx. 175, Doc. 11, Cód. 13210. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, secretário do governo de Minas, ao Rei, dando conta da remessa de uma relação das ordens recebidas desde 1799 na Secretaria do referido governo. Vila Rica, 10 de março de 1805. 880 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa histórica, p. 145, nota de rodapé nº 101; e MENDONÇA, Marcos Carneiro de. O intendente Câmara: Manuel Ferreira da Câmara Bithencourt e Sá, intendente geral das minas dos diamantes, 1764-1835. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1958, p. 371-375. 264 seus bens. 881 Esta propriedade se encontrava a apenas “seis léguas, pouco mais ou menos” de Vila Rica, 882 distância percorrida em uma ou duas jornadas. Saindo da capital, tomava-se a direção do Tripuí, passando pelas freguesias mineradoras de Boa Vista e Capão do Lana. Mais à frente, a freguesia de Itatiaia marcava o começo da descida da Serra do Deus te Livre, hoje Serra de Ouro Branco. Seguindo viagem em direção ao Rio de Janeiro, a topografia acentuada com solo predominantemente férreo dava lugar a terras mais planas, emolduradas por pequenos serrotes, de onde corriam vários riachos. Em um cenário análogo a este estava localizada a Fazenda do Mau Cabelo. Para lá, Veloso de Miranda transferiu seus livros, sua botica, suas ferramentas, sua escravaria e seus negócios, deixando no velho sobrado da Rua de São José o que era de pouca serventia, como os pomposos quadros de Mafra e da Família Real. O Mau Cabelo seria, a partir de então, o principal locus de suas pesquisas, o que se reflete no caráter prático e utilitário de suas instalações e mobiliário, como era afeito a seu proprietário. Ali, Veloso de Miranda residiu nos últimos 11 anos de sua vida, vindo a falecer em 1816, sem deixar testamento. 883 A mais antiga referência documental sobre a região que compreendia a Fazenda do Mau Cabelo data de 1717, quando José Duarte recebeu sua Carta de Sesmaria, 884 confirmada em 1722 pelo então Secretário do governo, Manoel de Afonseca de Azevedo. Por essa época, seu entorno, que fazia parte da freguesia de Itatiaia, já era conhecido pelo que “chamam de Mao Cabello”.885 O Itinerário Geographico,886 atribuído a 881 Utilizamos o termo “Fazenda” por ser aquele que se encontra no Inventário post mortem de Veloso de Miranda. A propriedade, no entanto, também foi denominada em vários momentos como “paragem”, “sítio” e “lugar”. 882 AHU, MG, Cx. 143, Doc. 58, Cód. 10978. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando cumprimento a ordem régia de 13 de dezembro de 1796, e de 18 e 31 de marco de 1797, para tomar providências necessárias para extrair o salitre na salina do rio São Francisco, e enviando uma amostra de chumbo acompanhado da sua nota. Vila Rica, 10 de julho de 1797. 883 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, Vila Rica, 1816, fl. 2. 884 APM-SC 12. Registro de provisões, patentes e sesmarias (1717 - 1721), fl. 21. 885 APM-SC 21. Registro de cartas, ordens, bandos, instruções, patentes, provisões e sesmarias (1721- 1725), fl. 159. 886 BRITO, Francisco Tavares de. Itinerário Geográfico com a verdadeira descripção dos Caminhos, Estradas, Rossas, Citios, Povoaçõens, Lugares, Villas, Rios, Montes, e Serras, que há da Cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro atè as Minas do Ouro. Sevilha: Na Officina de Antonio da Sylva, 1732. Disponível em versão digitalizada no endereço eletrônico da Biblioteca Nacional de Portugal. http://purl.pt/150. Acesso em 28 de janeiro de 2015. 265 Francisco Tavares de Brito, 887 também faz referência ao Mau Cabelo, já na primeira metade do século, quando o autor se refere ao Macabelo, localidade que, a partir de São Paulo, se situava no caminho do Callanday, um dos ramos do Caminho Velho, depois de São João del-Rei e de Camapoan (Serra de Camapuã, atual distrito de Entre Rios de Minas). Em relação a sua denominação, Macabelo, Lima Júnior afirma que, esse nome quer dizer cristão novo judaizante e disposto a enfrentar o Santo Ofício. Da relação publicada por Varnhagen, de judeus remetidos à inquisição de Lisboa nesse tempo, constam vários de Vila Rica. Um deles deverá ter sido esse corajoso que deu nome ao lugar. Macabelo deriva de Macabeu. 888 Maria Antonieta Cohen discorre sobre a origem judaica (ou cristã-nova?) do topônimo, associando-o às passagens bíblicas que versam acerca da perseguição dos povos hebreus pelos selêucidas, 889 encontrando diversas variações, a saber; Macabelo e Macabello, as mais antigas; seguidas de Mao Cabello, Mao Cabelo, Mau Cabello e sua forma atual, de Mau Cabelo. Esta é ainda utilizada para designar o local da antiga fazenda, hoje circunscrita ao município de Santana dos Montes, sendo Macabelo empregado pelos mais idosos. Como se trata de uma corruptela, Macabelo e suas variantes não constam dos dicionários de português setecentistas. 890 A paragem Mau Cabelo, disposta à margem do Caminho Novo, em uma rota de passagem obrigatória para aqueles que transitavam entre as Minas e o litoral, aparece em dois mapas anônimos, produzidos no século XVIII, em data não especificada, como propriedade rural, sítio de pouso e entreposto comercial. 891 No Mapa da Região das Minas Gerais (...), a fazenda de Mau Cabelo, 887 Sobre esse personagem, Sacramento Blake traçou algumas poucas linhas ainda que não demonstrasse confiança nas informações que possuía. “Natural, segundo me consta, do Rio de Janeiro, e nascido pelo ano de 1700”, foi escritos de “opúsculo raríssimo”. BLAKE, Sacramento. Dicionário Bibliográfico Brasileiro, Vol. 3. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1895, p. 131. 888 LIMA JÚNIOR, Augusto. A Capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1978, p. 135. 889 COHEN, Maria Antonieta Amarante de Mendonça. A Toponímia mineira: o caso de Macabelo. In: SEABRA, Maria Cândida Trindade Costa de. (Org.). O léxico em estudo. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, 2006, p. 81. 890 BLUTEAU, Rafael (Padre). Dicionário da Língua Portugueza. Lisboa: Na Officina de Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 891 FBN, Seção de Cartografia. ARC. 030, 03, 018. Mapa da Região das Minas Gerais com uma parte do caminho de São Paulo e do Rio de Janeiro para as Minas e dos afluentes terminais do São Francisco, s.a, s.l, 17--, 56 x 65,5cm. Manuscrito; e _____. Seção de Cartografia. ARC. 030, 03, 018. Mapa da Região das Minas Gerais com uma parte do caminho de São Paulo e do Rio de Janeiro para as Minas e dos afluentes terminais do São Francisco. [S.l.: s.n.]. [17--]. Medida: 56 x 65,5cm. Manuscrito. 266 referenciada como Macavelo, aparece localizada ao sul de Ouro Branco e a leste de Congonhas. Mais tarde, uma rasura sobre o topônimo corrigiu o que seria um “erro” do autor sem, no entanto, apontar sua “correta” localização na carta. Já no Mapa da região de encontro (...), a fazenda de Mao Cabelo está situada imediatamente ao sul da Serra de Titiaya, ou Deus te Livre, e a oeste da freguesia de Ouro Branco. Em 1757, seu proprietário era José Antonio Freire de Andrade, tenente coronel da Cavalaria e cavaleiro professo na Ordem de Cristo, que arrematou em praça pública “aquela roça com seus matos e pastos”, num total de meia légua de terras.892 No ano de 1855, o Registro de Terras Públicas e Escrituras situa esta propriedade como sendo pertencente ao distrito de Santa Anna do Morro do Chapéu, termo da Villa de Queluz, ou seja, já desvinculada do território de Ouro Branco. Nessa ocasião, era propriedade, por herança e compra, de José Francisco Teixeira Penna, e fazia divisas com as propriedades pertencentes à Dona Ignez e aos herdeiros do finado Vigário Francisco Pereira de Assis, bem como com as propriedades do Capitão Dionísio Antunes, do Comendador Joaquim Baeta Neves e de José Barbosa. 893 Ao cotejar as informações fornecidas nesses documentos, foi possível situar o local exato em que se encontrava a fazenda de Veloso de Miranda, hoje pertencente ao município de Santana dos Montes. No local existem fragmentos de suas ruínas, sob as Coordenadas Geográficas -20.76050º, -43.71288º. Imagem 22 – Fotografia das ruínas que restaram da Fazenda do Mau Cabelo. Foto do autor. Julho de 2017. 892 APM, SC-119. Registro de sesmarias (1756 - 1758), fls. 17v-18v. 893 APM, Registro Paroquial de Terras do Termo da Vila de Queluz, Livro Nº 177, 1854-1857. Relação dos possuidores de terras registradas na Paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Queluz, assento n° 247, fl. 26. 267 Imagem 23 – Fotografia das ruínas que restaram da Fazenda do Mau Cabelo. Foto do autor. Julho de 2017. Imagem 24 – Resquícios das edificações, sobretudo pedaços de telhas estilo capa e canal, podem ser encontrados em toda a extensão das ruínas que restaram da propriedade. O objeto utilizado como referência possui 15,5 centímetros. Foto do autor. Julho de 2017. 268 Imagem 25– Foto do moinho que outrora estava localizado contíguo à casa grande da Fazenda do Mau Cabelo. Sua fundação ainda mantém as características de uma edificação centenária. A edificação propriamente dita, no entanto, é de feitio recente. Foto do autor. Julho de 2017. Imagem 26 – Foto do moinho que, à época de Veloso de Miranda, estava localizado a maior distância da sede da Fazenda do Mau Cabelo, nas proximidades do “mais acantilado dos rochedos”, na direção da Fazenda Cachoeira do Santinho. Foto do autor. Julho de 2017. Segundo o naturalista alemão Wilhelm Ludwig Von Eschwege (1777-1855), a 269 fazenda em que vivia Veloso de Miranda estava situada “mais a leste de Ouro Branco”, nas proximidades do “mais acantilado dos rochedos”, 894 referência a um local comumente conhecido como “Pedreira”, localizado entre a outrora sede da Fazenda do Mau Cabelo e a Fazenda do Santinho, ainda existente e em ótimo estado de conservação. Trata-se de um acidente topográfico singular na região; uma eflorescência rochosa escarpada onde podem ser encontrados inúmeros abrigos em sua base, conjunto ígneo que se destaca ao longo da estrada entre ambas as propriedades. A partir de suas ruínas, no entanto, é possível descartar que a fazenda de Mau Cabelo estivesse localizada “mais a leste de Ouro Branco”, como afirmara Eschwege. Imagem 27 – Foto do “mais alcantilado dos rochedos”, segundo a expressão utilizada por Eschwege. Trata-se de uma eflorescência rochosa localizada entre a Fazenda da Cachoeira do Santinho e a antiga Fazenda do Mau Cabelo (Coordenadas Geográficas: -20.77141º, -43.71344º). Foto do autor. Julho de 2017. No ano de 1816, a fazenda do Mau Cabelo aparece descrita no inventário de Veloso de Miranda como uma propriedade rural possuidora de 894 ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Contribuições para a geognostica do Brasil, com quatro cartas geognosticas e petrographicas e secções de perfil. Rio de Janeiro: S/E, 1932, apud XAVIER DA VEIGA, José Pedro. Ephemérides Mineiras. Ouro Preto, Imprensa Official do Estado de Minas Gerais, 1897, Vol. 3, p. 153. 270 casas de vivenda assobradadas, com senzalas, casas de despejo e dois moinhos, tudo coberto de telha, e monjolo coberto de capim, com um quintal com suas árvores de espinhos (frutas cítricas), com um curral, e o mesmo quintal todo murado de pedra, constando esta fazenda de uma sesmaria a qual declara as suas confrontações o constante da fazenda, e ter vários capões de capoeiras e algumas restingas de matos virgens com campos e logradouros de criar, com uma roça plantada de milho que está vingado que dará, se o colherem, dez carros pouco mais ou menos, visto e avaliado tudo na quantia de oitocentos mil reis. 895 Paradoxalmente, as benfeitorias que introduzira para conduzir suas pesquisas sobre o nitro e a produção de salitre não foram arroladas no seu inventário. Quanto às culturas agrícolas, o notário referiu-se somente a roça de milho, produto comumente produzido nas fazendas mineiras. Nada é registrado sobre os vegetais que Veloso de Miranda buscou aclimatar e pesquisar durante os últimos 20 anos de sua vida. A fazenda tornara-se o laboratório do naturalista, mas, ao que tudo indica tal conhecimento não agregou valor patrimonial à propriedade, e os vestígios dessas atividades devem ser buscadas em outras fontes documentais. 7.2.1 – A produção de salitre Poucos meses após ter sido encarregado, no ano de 1797, de pesquisar a existência de lavras de nitro e sua viabilidade para a produção de salitre, Veloso de Miranda já prestava contas à Coroa, afirmando que tinha realizado viagens aos sertões do Rio de São Francisco e do Rio Jequitinhonha, mostrando-se também empolgado por ter achado um local próximo a Vila Rica, que considerou propício para esta produção; a Fazenda do Mau Cabelo. É provável, então, que de posse dessa descoberta é que tenha decidido adquirir a propriedade, sendo possível datar sua compra nos anos imediatamente posteriores a esse feito. Segundo sua descrição: Como achei pouco distante desta capital toda tendência para uma nitreira artificial, a fiz erigir e dela remeteu ao Ministro, secretário de Estado Ilmo. e Exmo. Sr. D. Rodrigo de Souza Coutinho, um desenho e sua descrição. Em uma Fazenda de criações de Gado observei que entre outras pedras que formam os muros e calçados da mesma fazenda, se observaram eflorescências nitrosas com uma concreção e consistência media entre as pedras, e as terras, martial (sic) ou tinta de ferro, é porosa, ou fossem os muros e calçados antigos ou de pouco tempo feitos; expostos ao rigor das chuvas e do sol. 896 895 AHMI, Inventário de Joaquim Veloso de Miranda, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Vila Rica, 1816, fl. 29v. 896 Carta de Joaquim Veloso de Miranda para Domingos Vandelli. Vila Rica, 17/12/1797. In: SIMON. Scientific expeditions in the Portuguese overseas territories, p. 174. 271 Segundo Veloso de Miranda, nas vizinhanças da propriedade, naturalmente e com grande facilidade, se “depositava o ácido nitroso nos muros das povoações e [dos] moradores circunvizinhos, até a distância de mais de uma légua”, e que “os ditos muros [eram] formados do mesmo piçarrão, ou concreção térrea, de que são feitos os do Mau Cabelo”.897 Junto a tal descrição, realizada no ano de 1797, foram enviadas amostras de nitro bruto e do salitre resultante do primeiro cozimento realizado por Veloso de Miranda em sua propriedade, visando testemunhar a riqueza das lavras, bem como a real possibilidade de seu aproveitamento econômico. 898 No ano seguinte, replicando Veloso de Miranda, Lorena informou a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho que “não há duvida nenhuma que aqui, [na Fazenda do Mau Cabelo], se pode fabricar o salitre, compreendendo já grande distância a terra própria para a sua extração”,899 e que o naturalista se ofereceu para o cargo de “Diretor da fábrica, quando [esta] deva estabelecer-se”.900 Foi necessário que Veloso de Miranda construísse ali um grande aparato, sem o qual seria impossível a exploração e o beneficiamento do produto desejado. Para tanto, erigiu com despesas próprias toda uma infraestrutura que, segundo Magnus Pereira, “passou a atender pelo pretensioso nome de Nitreiras e Fábrica de Pólvora da Capitania das Minas”.901 Observa-se, então, que a aquisição da fazenda não equivaleu a um afastamento em relação a suas atividades de naturalista. Ao contrário, a fazenda serviu de laboratório para seus experimentos, principalmente os que diziam respeito às pesquisas minerais sobre o salitre. Em 1800, Veloso de Miranda escreveu uma carta diretamente a Dom Rodrigo, 897 AHU, MG, Cx. 144, Doc. 2, Cód. 11125. Carta de Joaquim Veloso de Miranda para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, sobre as providências que deu para extrair o salitre na fazenda do Mau Cabelo. Vila Rica, 22 de setembro de 1798. 898 AHU, MG, Cx. 143, Doc. 58, Cód. 10978. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando cumprimento a ordem régia de 13 de dezembro de 1796, e de 18 e 31 de marco de 1797, para tomar providências necessárias para extrair o salitre na salina do rio São Francisco, e enviando uma amostra de chumbo acompanhado da sua nota. Vila Rica, 10 de julho de 1797. 899 AHU, MG, Cx. 144, Doc. 3. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, enviando a amostra de salitre extraído nas minas junto com outras informações sobre o assunto. Vila Rica, 06 de fevereiro de 1798. 900 AHU, MG, Cx. 147, Doc. 10, Cód. 11332. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando os caixotes números 2 e 3 com amostras de salitre e suas respectivas notas e informando ter feito diligências para fazer análise ao ferro pantanoso. Vila Rica, 12 de janeiro de 1799. 901 PEREIRA, Magnus Roberto de Mello. D. Rodrigo e frei Mariano: A política portuguesa de produção de salitre na virada do século XVIII para o XIX. Topoi, Rio de Janeiro, Vol. 15, Nº. 29, Jul./Dez. 2014, p. 516. 272 datada de 9 de outubro, agradecendo as mercês e a proteção recebidas da Coroa em retribuição aos seus estudos em História Natural, comunicando que aos 12 dias do mês de setembro passado, acabara de “erigir e [de] pôr em ação a Fábrica de Salitre” e a “Salitreira Artificial”, e que já havia feito “uma cozida” – referindo-se ao beneficiamento do salitre – que o “deixou esperançoso do produto”, conquanto ainda não pudesse afirmar “a respeito de sua quantidade, por necessitar de mais tempo para depois de muitas cozidas tomar um termo médio, e julgar daquela com mais segurança”.902 Nessa ocasião, descreveu as melhorias e os implementos que foram necessários edificar para a fábrica, como a ereção de uma casa, que serve de paiol para se recolher as cinzas, composto primário do processo; canteiros para se preparar as terras nitrosas; e o grande número de apetrechos necessários, como tinas, bacias, caldeiras, tabuleiros, fornalhas, pás, enxadas e um carrinho, bem como outros tantos instrumentos, além da mão de obra, tudo pertencente ao naturalista. 903 Junto a essa carta, enviou as tábuas, ou plantas, com suas legendas explicativas, que representavam as benfeitorias construídas na fazenda e que, infelizmente, se perderam, 904 conquanto tais descrições permitam que sejam delineados os procedimentos empregados na obtenção do salitre artificial naquela propriedade. A primeira tábua versa sobre o processo inicial, que se dava em um pátio, onde estavam dispostos os vasos, no formato de caixas forradas com pedras, em um total de 42, que lado a lado mediam 283 pés e meio de comprimento por 26 de largura, com dois pés de profundidade. As caixas eram separadas uma das outras por baldrames, pequenos muros também de pedra, com a altura de um pé. Para se obter o nitro, colocava-se nas caixas a terra nitrosa e as sobras dos currais e das cavalariças, material também necessário para o processo, devendo tudo ser regado a cada dois dias, com a água da lavagem das baias. Recomendava-se ainda que todo o material fosse revolvido a cada três dias, com uso de alavancas. Após três meses, era de se esperar o aparecimento de “flores salinas” nos torrões, as quais marcavam a 902 AHU, MG, Cx. 154, Doc. 36. Cód. 11717. Carta de Joaquim Veloso de Miranda para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, informando sobre vários assuntos, entre eles, a fábrica de salitre que acabou de construir e a nitreira artificial, para o que envia os seus desenhos. Vila Rica, 9 de outubro de 1800. 903 Idem. 904 Idem. 273 presença de salitre, sinal de que o mesmo estava pronto para ser lixiviado. 905 A fase seguinte, a lixiviação, descrita na tábua nº 2, era realizada a partir da retirada da terra dos sais resultantes do primeiro processo. Para tanto, aquele produto era acomodado em 16 tinas, em camadas intercaladas com palha, cinzas e potassa, ou carbonato de potássio, material que também era utilizado na indústria da porcelana, colocando-se, por fim, água. Posteriormente, abriam-se pequenos buracos previamente tampados nos fundos das tinas, deixando-se escorrer a água com o salitre, que deveria ser conduzida às caldeiras da fornalha de evaporação. A terceira fase, a evaporação, descrita na tábua nº 3, era realizada em uma fornalha feita com um cupinzeiro, sob a qual eram dispostas as caldeiras. Nestas, vertiam-se as águas do processo anterior, adicionando sal marinho, fervendo-as até evaporar. As tábuas seguintes, nº 4 e 5, marcam o processo final, no qual se peneirava o composto resultante da fase anterior para a obtenção do salitre. 906 Este processo foi detalhado por Márcia Ferraz: Começava-se por acondicionar em tonéis, camadas da terra de que se pretendia extrair o salitre alternadas com outras de cinza, e, algumas vezes, com camadas de palha adicionadas para facilitar a passagem da água. Fazia-se uma cova na parte superior deste arranjo, onde se adicionava potassa (nosso carbonato de potássio), para em seguida, colocar água. Passado algum tempo, deixava-se escorrer (através de torneiras ou de orifícios até então tampados) a água, carregada de salitre, que era levada a evaporar em caldeiras. Durante o processo de evaporação, retirava-se, com uma escumadeira, a massa de sal comum (nosso cloreto de sódio) que se vai formando, até se ter apenas o líquido. Continuava-se até evaporação total, quando se tinha, finalmente o salitre “bruto ou impuro”, que seria ser refinado posteriormente. 907 905 AHU, MG, Cx. 154, Doc. 36. Cód. 11717. Carta de Joaquim Veloso de Miranda para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, informando sobre vários assuntos, entre eles, a fábrica de salitre que acabou de construir e a nitreira artificial, para o que envia os seus desenhos. Vila Rica, 9 de outubro de 1800. 906 A estrutura necessária para uma fábrica de salitre também haveria de ser explicitada por Vieira Couto, e encontra muitas semelhanças com o projeto realizado por Veloso de Miranda: “Não é outra coisa mais do que uma casa palhoça, debaixo da qual se ajuntam certas quantidades de terras, que manejadas de certo modo, se impregnam abundantemente de nitrato de potassa, ou salitre. O tamanho desta estrutura poderia variar de 150 até 225 palmos de comprido, e 30 até 45 de largo, com um pé direito de 16, como os lados deste rancho cobertos (...) e resguardados do tempo com muros, (...) ou com esteiras pendentes das linhas do mesmo rancho por uma extremidade, e tocando o chão pela outra. Estas esteiras são preferíveis aos muros, tanto porque temos no país muitos materiais, e á mão, [do material] que se façam, como é o talo das folhas da bananeira, as taquaras, a palma do buriti, etc., como porque também oferecem a comodidade de se poder levantar na ocasião dos tempos serenos, para arejar a salitreira, e fechar-se ou abater-se para impedir os ardores do sol, o alagamento das chuvas, e as ventanias”. In: COUTO. Memória sobre as salitreiras naturais de Monte Rorigo, p. 19-20. 907 FERRAZ, Márcia Helena Mendes. A produção do salitre no Brasil colonial. Química Nova, 23 (6), 2000, p. 845-846. 274 Na falta de jazidas naturais de nitro, como aquelas que Veloso de Miranda havia encontrado na fazenda do Mau Cabelo, o salitre poderia ser obtido a partir de fontes não minerais, como as matérias orgânicas, resultando no chamado salitre artificial, fruto da “indústria humana”.908 Em uma de suas memórias, Vieira Couto sugere diferentes materiais que poderiam ser utilizados para este fim: Geralmente todas as terras a que chamam estrumes, e que são restos de vegetais e animais reduzidos quase a poeira, são, como está dito, ricas em azoto [o salitre era composto, segundo a química da época, por três diferentes compostos: o azoto, o oxigênio e a potassa] (...). Entre estas terras umas são preferíveis a outras: as terras negras que se tiram dos lugares escuros, como debaixo dos sobrados, e sobre tudo se ai habitam animais, das adegas, cavalariças também escuras e resguardadas do tempo, todas estas sortes de terras são muito ricas deste princípio. Elas, logo que são extraídas destes lugares, nada mostram conter de nitrato, porém expostas que sejam ao ar por alguns dias, debaixo de cobertas, depressa se cobrem d'este sal. São também boas as terras negras que estão por baixo das arvores copadas, e que cobrem quase todo o chão com seus densos ramalhos; as terras dos cemitérios, dos currais, principalmente de ovelhas, dos galinheiros, pombais, dos paióis de milho, isto é, a poeira que penetra por entre a estiva deles, e se deposita no chão: a lama das povoações, das latrinas, charcos, e lagoas; a caliça dos edifícios velhos ou arruinados; todas estas terras estão prontas e já preparadas para serem empregadas nas salitreiras. Porém, em falta delas, e havendo tempo, pode o fabricante ais poucos ir acumulando a um canto do de seu terreiro, em alguma grande cava, quantidade destas mesmas terras, e ainda mais ricas que as precedentes. Para esta mesma cava, se vão lançando, segundo se oferece a ocasião, todos os lixos do terreiro, e principalmente de plantas, que abundem dos princípios nitrificáveis (...), como couves, mostardas, nabos, urtigas, borragem, fumo, girassol, todas as plantas leguminosas, e infinitas outras (...). Estas plantas são depositadas nesta cava, e como são muito suculentas, e com facilidade se reduzem a água, devem-se alternar camadas delas com camadas de terras calcarias, que absorvam esta umidade, ou em falta destas , com algumas das terras estrumosas mencionadas acima, e que estejam mais à mão. Nesta mesma cava também se deitam partes de animais, e entre estas escolhem-se as mais próprias para a nitrificação. Todas as partes moles, como músculos, tripas, e seus conteúdos, e o sangue, são preferíveis às partes duras, como pelos, unhas, cornos, etc. Todos os repteis, vermes e insetos , transformam-se quase inteiramente em nitratos. Os peixes, nos portos do mar, ou junto dos rios dos sertões tão abundantes destes animais, não devem ser esquecidos. 909 908 COUTO, José Vieira. Memória sobre as salitreiras naturais de Monte Rorigo; maneira de as auxiliar por meio das artificiais; refinaria do nitrato de potássio ou salitre. Rio de Janeiro: na Impressão Régia, 1809 [1803], p. 16. 909 COUTO. Memória sobre as salitreiras naturais de Monte Rorigo, p. 25-26. 275 Também era possível extrair salitre de refugos de fábricas e de manufaturas: Fábricas de sabão as cinzas lixiviadas, que se deitam fora, é uma excelente terra para as salitreiras: a barrella das lavandeiras, as espumas e águas-mães das refinarias do mesmo nitrato, as águas onde apodrecem panos nas fabricas de papel, as velhas colas da mesma fabrica, os refugos de lãs lugares onde se tecem e lavam panos, o bagaço de varias plantas de que se extraíram tintas nas tinturarias; tudo isto serve de um bom provimento às salitreiras, e por isso não se devem desprezar”.910 Outra possibilidade, segundo João Manso Pereira, era utilizar como matérias-primas “o ‘pó’ das sepulturas; a urina, para a obtenção do ácido nítrico, e árvores do mangue que, queimadas, seriam utilizadas como fontes de cinzas, ricas em potassa. 911 No ano seguinte, 1801, Veloso de Miranda enviou ao Reino notícias do que se passava na nova fábrica. O empreendimento, segundo o naturalista, estava trabalhando “menos no tempo em que dali ando distraído, por motivo de execução de outras ordens”, e avaliou que apesar de todo o esforço e empenho que vinha empregando, não considerava o produto final positivo, ainda que “pode vir a sê-lo logo que se derem algumas providências”.912 Afirmou ainda que sua fábrica não era suficiente para atender as demandas da Coroa, pois só “um edifício ou dois não podem suprir com o salitre necessário para se fazer trabalhar uma fábrica de pólvora, para o que são necessárias várias nitreiras”. Recomendava que, para aumentar a produção, “fosse recolhido o salitre natural que se achava formado em infinitos lugares da capitania”, por serem mais proveitosos que os artificiais, e que também era necessário coibir a produção de salitre que ocorria à margem do controle estatal, pois este prejudicava seriamente a economia reinol. A esse respeito, informou que o governador Lorena já havia procedido “contra umas pequenas sociedades de particulares, que nas vizinhanças desta capital tinham recolhido algumas arrobas de salitre, e se aprontavam a reduzi-lo e a fabricar pólvora, para a venderem”.913 Concluiu, como já havia advertido em 1799, que por mais que o 910 Ibidem, p. 26. 911 FERRAZ. A produção do salitre no Brasil colonial, p. 848. 912 AHU, MG, Cx. 147, Doc. 10, Cód. 11332. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando os caixotes números 2 e 3 com amostras de salitre e suas respectivas notas e informando ter feito diligências para fazer análise ao ferro pantanoso. Vila Rica, 12 de janeiro de 1799. 913 OFÍCIO do Dr. Joaquim Veloso de Miranda para sobre a extração do salitre na Capitania (1801). RAPM, Ano III. Ouro Preto: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1898, p. 273-274. 276 salitre se mostrasse disponível nas Minas e em outras capitanias da América portuguesa, pouco seria rentável sua produção com vistas à exportação, devido às distâncias da Europa e aos altos custos de transporte. 914 Apesar da fábrica ter continuado em operação durante o resto de sua vida, é possível que tenha sido em decorrência das ponderações de Veloso de Miranda que a Coroa decidiu por bem investir na construção de fábricas de salitre localizadas em regiões litorâneas, aproveitando a proximidade dos portos, com o intuito de tornar “o produto final mais barato”, o que explicaria a “criação do Real Laboratório de Refinação de Salitre no Ceará pelo naturalista João da Silva Feijó no mesmo período”;915 o plano para a criação de uma fábrica similar, na vila de Santos;916 e o projeto de se fabricar salitre a partir da carne da baleia, “de onde se retira grande quantidade de óleo [e] perde-se sua carne, que apodrece a céu aberto sem dar grande serventia ao homem”.917 7.2.2 – Milho, rezes e chapéus As pesquisas em Ciências Naturais sob bases iluministas, na segunda metade do século XVIII, também tinham como objetivo transformar os produtos primários em objetos beneficiados, úteis para o consumo, ou seja, em mercadorias. Consoante com a Fisiocracia nascente, os naturalistas luso-brasileiros viam a agricultura como fonte de riquezas e a fazenda do Mau Cabelo tornou-se, sob a direção de Veloso de Miranda, em um laboratório experimental. As culturas agrícolas e as manufaturas ali introduzidas foram destacadas por Eschwege, seguido de Boschi, Ferreira e Maia. 918 A fazenda do Mau Cabelo dispunha dos recursos naturais necessários para a diversificação de culturas e a introdução de algumas manufaturas. Era bem servida de águas e suas terras propícias ao cultivo, possuindo vários “capões de capoeiras e algumas 914 AHU, MG, Cx. 147, Doc. 10, Cód. 11332. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando os caixotes números 2 e 3 com amostras de salitre e suas respectivas notas e informando ter feito diligências para fazer análise ao ferro pantanoso. Vila Rica, 12 de janeiro de 1799. Ferreira (2013), em sua Dissertação de Mestrado, tece conclusões parecidas. 915 FERRAZ. A produção do Salitre no Brasil Colonial, apud FERREIRA. As polêmicas flores, p. 114. 916 PEREIRA, João Manso. Copia de huma carta sobre a nitreira artificial, estabelecida na Villa de Santos, da Capitania de S. Paulo, dirigida a esta Corte. Lisboa: Tipografia do Arco do Cego, 1800, apud FERREIRA. As polêmicas flores, p. 98. 917 Idem. 918 MAIA, Moacir Rodrigo de Castro Maia. O criador e a criatura: o naturalista Joaquim Veloso de Miranda e o Horto Botânico de Vila Rica. Revista do Educador. Ouro Preto: Ministério da Cultura; Vale, 2014, p. 29. 277 restingas de matos virgens”, “com campos e logradouros de criar”.919 Ou seja, além dos campos que podiam servir para as plantações e de pasto para as rezes, as reservas de matas virgens e as capoeiras forneciam madeiras para as construções, para combustível, e podiam ser abertos para introduzir novos cultivos. Como já dito, em 1816, quando foi realizado o seu inventário, o milho era cultura dominante, com roças plantadas que podiam produzir “dez carros pouco mais ou menos”, sendo o estoque então existente avaliado em oitocentos mil reis. Apesar da mandioca não ter sido listada entre as culturas produzidas naquele momento, a existência de “um forno de cobre de torrar farinha” indica que, como era comum nas unidades agrícolas brasileiras, ela também era cultivada e beneficiada. O mesmo ocorre com o açúcar e seus derivados, a rapadura e a cachaça, produtos de fácil comércio local, já que um alambique também aparece listado. 920 Também foram descritos foles de seda, que podiam servir para acender os fornos de produção de mandioca, de salitre, ou dos derivados da cana de açúcar. 921 Animais eram necessários como força motriz dessas manufaturas e fábricas, para o transporte de mercadorias e como fornecedores de alimentos e matérias primas, como era o caso da lã para a produção de tecidos e do leite para a de manteiga e queijo. Quanto às rezes, Veloso de Miranda possuía nove bois de carro, avaliados em 45.000 réis; quatro vacas com suas crias, em 16.800 réis; dez novilhos, em 18.000 réis; 48 carneiros, entre machos e fêmeas, em 23.040 réis; três éguas, em 12.600 réis; um potro, em 7.200 réis, e quatro bestas, de nomes Estrela, Ligeira, Rozilha e Douradinha, em 29.800 réis. Para o transporte de mercadorias haviam cangalhas, quatro canastras de viagem cobertas de couro cru e um carro de bois, já velho e desferrado. 922 Da lã das ovelhas, nas quatro tinas de madeira que possuía, 923 Veloso de Miranda “fazia preparar pelos seus escravos tecidos a que dava cores tão duradouras que se podiam comparar aos melhores tecidos europeus, sendo tão finos como as casimiras”. Por meio da tintura, conseguia produzir tecidos com várias cores, como o carmim, já que 919 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 29v. 920 Idem, fl. 13v. Sobre a produção e o comércio da cana de açúcar e de seus derivados – sobretudo a aguardente – nas Minas, C.f. SILVA, Valquíria Ferreira da. De cabeça de porco à bebida de negro: um estudo sobre a produção e consumo da aguardente nas Minas Gerais no século XVIII. Belo Horizonte: FAFICH, 2015 (Dissertação de Mestrado em História, Universidade Federal de Minas Gerais). 921 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 18. 922 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 84v. 923 Idem, fl. 17. 278 também se encontrava envolvido “da criação e reprodução da cochonilha”, além de ter desenvolvido outros extratos a partir de outras matérias colorantes “brasileiras, que havia descoberto em varias plantas; e para apisoa-las servia-se de uma terra excessivamente untuosa ao tato, a qual encontra-se em grandes camadas nas jazidas de topázio do Capão”.924 Além da confecção a partir da lã animal, o naturalista trabalhava o algodão em sua propriedade, o que pode ser evidenciado pela existência de uma tulha de guardar algodão com caroços, 925 vários novelos de fiar, nove rodas de algodão, 926 dois teares e três urdideiras, utilizadas para enrolar o fio a partir do novelo, sendo uma para baetão, avaliada em 4 mil réis, e outras duas comuns, com seus pertences, avaliadas em 1.920 réis. É provável que o naturalista não apenas produzisse tecidos, mas também plantasse seu próprio algodão. Além dos tecidos para as vestes, outra atividade manufatureira que Veloso de Miranda conduzia com grande desenvoltura era a produção do “chapéu de mineiro”, um chapéu de “abas largas, copa baixa e arredondada, muito usado pelos mineiros” no dia a dia, e que era conhecido ser considerado “espesso e pesado”, diferentemente dos chapéus de feltro, utilizados nas missas e em datas festivas. 927 Dos apetrechos utilizados nesta indústria, além das já citadas rodas de fiar e urdideiras, de uso comum, haviam aqueles específicos, como um molinete para fazer chapéus. 928 7.3 – As mãos e os pés do naturalista Para que toda a estrutura produtiva da fazenda do Mau Cabelo fosse mantida em funcionamento, trabalhadores hábeis e ajustados aos equipamentos eram necessários, já que, vivendo sozinho, o naturalista era o único a tratar da condução de seus negócios, deixando os fazeres a seus cativos, sob sua observação. Por meio deles e por quase duas décadas, Veloso de Miranda semeou, colheu, teceu, minerou, manufaturou, caçou, 924 ESCHWEGE. Contribuições para a geognostica do Brasil, apud XAVIER DA VEIGA. Ephemérides Mineiras, Vol. 3, p. 153. 925 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 17v. 926 Idem, fl. 83v. 927 Infelizmente não há como saber se Veloso de Miranda teve contado com a “Memória sobre varias misturas de materiais vegetais na factura de chapéus”, publicada nas Memórias Econômicas da Academia Real das Ciências de Lisboa, a qual certamente poderia ter lhe servido de inspiração. In: VANDELLI, Domenico. Memória sobre varias misturas de materiais vegetais na factura de chapéus. Memórias Econômicas da Academia Real das Ciências de Lisboa, tomo 2, 1790, p. 431-433. 928 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 14v. 279 conduziu, ordenhou, comprou, vendeu, permutou e exerceu outros tantos verbos capazes de auferir-lhe alguma renda. Seus escravos, a força motriz do que Robert Slenes chamou de o “grande complexo comercial”, foram responsáveis pelas produções que não eram destinadas a exportação para a Europa, mas por abastecer parte de uma grande rede comercial que incluía desde pequenas fazendas até as maiores vilas da Capitania mineira e, não raro, o Rio de Janeiro. 929 A posse de vinte e quatro escravos – plantel verificado quando da realização de seu inventário – era, de fato, bastante expressiva, a julgar pela composição das senzalas no termo da Vila do Carmo nos tempos áureos da mineração, onde o “número médio de quarenta escravos” era o mais considerável para aquela região, pelo que compreende-se que os proprietários “com mais de 20 escravos eram considerados ricos, uma vez que concentravam um importante componente de riqueza”.930 Dos 24 escravos arrolados no inventário de Veloso de Miranda foi possível identificar a origem, isto é, se africanos ou nascidos na América portuguesa em 23 oportunidades, o que corresponde a 95,84%, considerando que a condição dos cativos aqui nascidos era quase sempre indicada pelas terminologias “crioulos/as” ou “cabra”. Assim, constam no rol as seguintes origens étnicas: angolas, banguelas ou canguelas, congos, minas, cabras e crioulos, à seguinte proporção. Nação Quantidade Percentagem Angola 2 8,33 Banguela/Ganguela 5 20,83 Congo 1 4,16 Mina 2 8,33 Cabra 4 16,66 Crioulo 9 37,50 Sem informação 1 4,16 TOTAL 24 100 Tabela 1 – Escravos do plantel de Joaquim Veloso de Miranda, quanto as suas origens étnico-geográficas. In: AHMI. 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816. 929 SLENES, Robert. “Os múltiplos de porcos e diamantes: a economia escravista de Minas Gerais no século XIX”. Cadernos IFCH. Unicamp, n. 17, Jun. 1985, p. 9. 930 LUNA, Francisco Vidal e COSTA, Iraci Del Nero da. Minas Colonial: economia e sociedade. São Paulo: FIPE, Pioneira, 1982, p. 3. 280 Interessante verificar que a distribuição étnica dos escravos africanos de Veloso de Miranda se assemelha aos dados levantados por Laird Bergard, ao analisar a origem dos cativos a partir de inventários post mortem nos termos de São João del-Rei, São José del-Rei, Vila Rica, Mariana (1715-1888) e Diamantina (1790-1888). Segundo Bergard, foram verificadas as seguintes origens, quando mencionadas: “banguela (28,3%), angola (23,9%) e congo (10,7%), ou seja, a grande maioria dos cativos era procedente da África Central Atlântica. Os escravos de origem mina, por sua vez, correspondiam a 10,5%”.931 Quanto ao gênero dos escravos de Veloso de Miranda, dez eram do sexo masculino (41,66%) e quatorze do sexo feminino (58,33%), destoando do que Manolo Florentino e José Roberto Góes chamaram de “uma distribuição sexual aparentemente típica da escravidão”, quando se referiram a presença de dois homens para cada mulher nas senzalas coloniais, 932 o que pode ser justificado como sendo uma estratégia do naturalista em função das atividades realizadas em sua fazenda, como a produção têxtil e de chapéus, desenvolvidas, quase sempre, por mulheres. A escrava Domeneiana, “tecedeira de pano liso” e única mulher elencada pelos louvados com sua profissão, certamente era uma das responsáveis pelos teares. 933 Além de Domeneiana, outros cinco escravos foram arrolados com suas respectivas ocupações, o que corresponde a 25% do total. Constam nas anotações, a saber; dois carreiros, um pintor, um oleiro, um fumeiro e uma tecedeira. Os outros 18 cativos foram arrolados sem que fossem mencionadas suas especializações, como Sebastião, “sem ofício algum”. 934 Ainda assim, os dados refletem o ambiente predominantemente rural em que Veloso de Miranda vivia, onde preponderavam as atividades de cultura e de beneficiamento em detrimento de outras que eram realizadas por escravos qualificados para serviços “urbanos”, como pedreiros, oleiros e ferreiros. Apesar de numeroso o plantel de escravos vivente no Mau Cabelo, verifica-se 931 BERGARD, Laird W. Slavery and the demographic and economic history of Minas Gerais, Brasil, 1720-1888,Cambridge: Cambridge University Press, 1999, p. 148-152, apud ANDRADE, Marcos Ferreira de. Tráfico Atlântico, escravidão e procedências cativas no sul de Minas (1799-1850). In: IX Congresso Internacional da Brazilian Studies Association - BRASA, 2008, New Orleans: Anais eletrôncos do IX Congresso Internaciona da Brazilian Studies Association - BRASA. Vanderbilt: BRASA, 2008. 932 FLORENTINO, Manolo Garcia & GÓES, José Roberto. “Parentesco e família entre escravos no século XIX: um estudo de caso”. Revista Brasileira de Estudos Populacionais. Campinas, 12 (1/2), 1995, p. 152-153. 933 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 28. 934 Idem, fl. 27v. 281 que quase um terço deles encontrava-se incapacitado para as atividades da fazenda. Antônio, 28, era “quebrado da virilha” e tinha as “pernas inchadas”; Joaquim, 42, era possuidor de “defluxo asmático”; a crioula Eufrazia, 24, sofria de “defluxo continuado no peito”; a já idosa Dionízia, 70, era possuidora de moléstias de escorbuto, além de ter um “tumor agomado no braço direito” e Florência, 60, apresentava “dores reumáticas nas juntas”. Nem mesmo os escravos mais jovens se viam livres dos estados patológicos, como Josefa, 20, apontada como sendo possuidora de “princípio de histerismo”.935 O papo, ou bócio, doença comum naquele período, também se fazia presente na escravaria de Veloso de Miranda, tal qual foi apontado por muitos cronistas da época, desassossegados e perplexos com a considerável parcela da população possuidora de grossas protuberâncias no pescoço: “o bócio é muito comum entre os camponeses mais pobres, mas raramente é visto nos fazendeiros mais prósperos. O sexo parece não fazer nenhuma diferença, nem a cor, pois os morenos claros e os negros se mostram igualmente desfigurados”. 936 No Mau Cabelo, Francisco, 40, e Joana, 30, eram portadores de “grossuras no pescoço”.937 Já os outros escravos foram inventariados sem que houvesse menção a doenças ou patologias, como o angola Sebastião, 60, conquanto tenha falecido ao longo do processo sem que fosse justificado o motivo. Quanto à faixa etária dos cativos da Fazenda do Mau Cabelo, três eram crianças recém-nascidas, filhas de escravas da propriedade; quatro cativos (o que corresponde a 16,66% do total) possuíam idade entre um e 19 anos; nove (37,5%) entre 20 e 39 anos, sete (29,16%) entre 40 e 59 anos e quatro escravos (16,66%) possuíam idade superior a sessenta anos, sendo que Anna, mina, possuía incríveis 80 primaveras. A idade avançada de muitos cativos, os quais representavam quase metade (45,82 %) do plantel, era um dos desafios que Veloso de Miranda encontrava em sua propriedade. Ressalte-se que a partir dos quarenta anos, ainda que experiente, o escravo dava entrada na faixa etária que caracterizaria seu decréscimo produtivo, sendo considerado mais propenso às doenças que o tornariam incapacitado para o trabalho. Também seu valor de mercado começava a se desvalorizar a partir dessa idade, a exemplo de Mathias, 935 Idem, fl. 27-28v. 936 MARQUES, Rita de Cássia; MITRE, Sérgio. Bócio endêmico em Minas Gerais: a pesquisa biomédica na terra dos “papudos”. In: NASCIMENTO, Dilene Raimundo do; CARVALHO, Diana Maul de (Org.). Uma história brasileira das doenças. Brasília: Paralelo 15, p. 182-193. 2004. 937 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 27-28v. 282 38 anos, avaliado em cem mil réis, e de Miguel, 40, avaliado em sessenta mil réis. 938 Em decorrência do avançar da idade, e mediante a existência de cativos mais novos que lhe cobrissem as antigas obrigações, passavam os mais velhos a ser empregados em atividades mais técnicas, em detrimento daquelas mais laboriosas. A presença de três crianças pode ser analisada como uma estratégia de Veloso de Miranda em renovar seu plantel. Além disso, o estabelecimento de relações familiares entre os cativos, quase sempre mediante a autorização de seus proprietários, era a forma utilizada pelo senhor para satisfazer as necessidades daqueles, para além de dar algum sentido às suas vidas. 939 O inventário de Veloso de Miranda nos mostra que, em 1816, a crioula Joanna, 30, mãe da cabra Rozinda, de dois anos de idade; a crioula Rosa, 34, mãe da cabra Isabel, 1; e a crioula Josefa, 20, mãe da cabra Antônia, 1, tinham ascendido à maternidade a partir de 1814. Não há, no entanto, e salvo uma exceção, referências ao casamento ou união fortuitas entre as escravas e seus respectivos parceiros. No livro de batismos da freguesia de Ouro Branco foi possível encontrar apenas o registro de nascimento referente à pequena Rozinda, nascida pouco antes de seis de março de 1814, quando foi batizada na Matriz de Santo Antonio de Ouro Branco, filha de Joanna, crioula, como especificado no inventário, então com 28 anos, e de Miguel, então com 38 anos, também pertencente a Veloso de Miranda. Cerca de um ano depois, encontramos o assento de Antônia, filha de Jozefa, batizada a cinco dias do mês de março de 1815 naquela mesma Matriz. Neste caso, no entanto, não há menção a paternidade da criança. 940 Ainda que a posse de vinte e quatro escravos seja um número expressivo para a época, é admirável o quanto o naturalista conduzia as atividades de sua propriedade rural em diferentes frentes, e com uma escravaria reduzida quase que à metade em função de doenças, pelo que não podemos desconsiderar a possibilidade de que jornaleiros terem sido empregados com frequência por Veloso de Miranda, quando em 938 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 27 e 27v, respectivamente. 939 Baltasar da Silva Lisboa em seu Discurso histórico, político e econômico (...), não deixou de tecer comentários sobre a prática do casamento legal entre escravos que, em sua perspectiva, deveria ser estimulada, pois só assim os escravos, agrupados em núcleos familiares, estariam de certa forma mais unidos aos seus senhores e, por fim, “lhe aumentariam suas riquezas”. In: LISBOA, Baltasar da Silva. Discurso histórico, político e econômico dos progressos, e estado atual da Filosofia Natural portuguesa, acompanhado de algumas reflexões sobre o Brasil. Lisboa: Na Officina de Antônio Gomes, 1786, p. 52-53. 940 AEDOO. Livro de Batismos da Matriz de Santo Antônio, Freguesia de Ouro Branco (1774-1817), fls. 115, 121. 283 períodos de colheita ou de outras atividades que demandassem maior atenção e presteza. 284 NOME NAÇÃO IDADE VALOR FOLHA OBSERVAÇÃO Mathias Ganguella 38 100$000 27 Lourenço Congo 18 120$000 27 Sem moléstia alguma; Antônio Crioulo 28 80$000 27 Com exercício de carreiro, quebrado da virilha, com as pernas inchadas; Manoel Cabra 37 80$000 27 Com arte de pintor sem moléstia alguma; Miguel Angola 40 60$000 27v Francisco 40 85$000 27v Com principio de papo no pescoço; Joaquim Ganguella 42 70$000 27v Com exercício de carreiro, com defluxo asmático que disse ter no peito; Joaquim Banguella 50 60$000 27v Com oficio de oleiro; Francisco Mina 50 60$000 27v Com oficio de fumeiro; Sebastião Angola 60 40$000 27v Sem oficio algum. Faleceu ao longo do processo; Eufrazia Crioula 24 96$000 27v Com defluxo continuado no peito; Joanna Crioula 30 75$000 28 Com grossura no pescoço; Rozinda Cabra 2 38$400 28 Filha da dita acima (Joanna, 30 anos), sem moléstia alguma; Dionizia Banguella 70 19$200 28 Com moléstia de escorbuto e com um tumor agomado no braço direito; Domeneiana Crioula 34 45$000 28 Tecedeira de pano liso; Florencia Crioula 60 25$600 28 Com dores reumáticas nas juntas; Lionarda Crioula 46 45$000 28 Sem moléstia alguma; Maria Crioula 32 96$000 28 Sem moléstia alguma; Ana Banguella 40 56$000 28-28v Sem moléstia alguma; Roza Crioula 34 70$000 28v Sem moléstia alguma; Isabel Cabra 1 36$000 28v Filha da dita acima (Roza, 34 anos), sem moléstia alguma; Josefa Crioula 20 96$000 28v Com principio de histerismo; Antonia Cabra 1 36$000 28v Filha da dita acima (Josefa, 20 anos), sem moléstia alguma. Anna Mina 80 6$000 28v TABELA 2 – Escravos de Joaquim Veloso de Miranda, inventariados por ocasião de seu falecimento. In: AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 27-28v. . 285 7.4 – “No remanso da filosofia”: o simples viver no Mau Cabelo Se em Vila Rica Veloso de Miranda soube cultivar uma vida em consonância com a posição social que ocupava, no Mau Cabelo o naturalista viveu com simplicidade, o que é refletido no recheio de sua propriedade rural, onde prevalecia o singelo, e não mais a opulência. Compunha a sede da fazenda do Mau Cabelo grande sorte de bens ordinários e de uso comum, como mesas, cadeiras e tamboretes, todos com acabamento rústico e sem o requinte do acabamento em couro estampado ou dos encostos almofadados. No quarto de dormir, um velho catre haveria de lhe servir de leito. Os enxovais europeus que possuía haviam permanecido em Vila Rica. Na cozinha, os objetos também eram de feitio simples, como panelas de ferro, pratos de estanho e vários utensílios de barro cozido. 941 Outros tantos objetos da casa delimitam o perfil desta fase da vida do naturalista, muitos dos quais curiosos como as “seis peles de ariranhas”, que nos fazem supor que Veloso de Miranda ou seus escravos caçavam, talvez com uma das duas espingardas ali existentes. Uma “sela de montar muito usada” deve ter oferecido algum conforto ao seu proprietário, quando das inúmeras viagens que fez. No paiol, ficavam guardados os apetrechos para cuidar a terra, como as enxadas, pás e picaretas. 942 Oratórios e imagens votivas, indispensáveis à devoção católica e à cultura material de então, no entanto, não foram relacionadas nem nos bens existentes na fazenda, nem naqueles que haviam permanecido na casa da Rua de São José. Conquanto conservasse uma rotina de simplicidade na fazenda, Veloso de Miranda mantinha ali uma bem estruturada botica, onde podiam ser encontrados itens muito interessantes, como uma máquina galvânica, provavelmente uma pilha, utilizada para a produção de pequenas correntes elétricas, avaliada em 6$400 réis, e uma “máquina elétrica”, a 18 mil réis, aparelhos que na Universidade de Coimbra 941 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fls. 16, 18v. 942 Idem, fls. 10, 14v, 16v. 286 eram pertencentes ao laboratório físico. 943 Havia também um termômetro, avaliado a 6$800 réis, e dois microscópios, sendo um com sua caixa, a 3 mil réis, e outro pequeno, com “caixa de buxo”, a 640 réis.944 Outros tantos apetrechos menores compunham sua botica, como quatro vidros brancos redondos e outros vinte igualmente redondos, porém, menores, e que eram utilizados para ensaios e avaliados em 2 mil réis; um almofariz de cobre com sua mão, a 12 mil réis; um compasso de ferro, a 300 réis; duas balanças de meia libra com seus pesos e caixas, cada uma a 750 réis, e outra com quatro pesos miúdos, boceta e colher, a 1$310 réis; um prisma de cristal branco de mostrar cores, a 1$200 réis; um vidro redondo “de tirar fogo, assentado em jacarandá preto”, a 2 mil réis; duas peneiras de seda, a 800 réis e um agulhão de marfim, além de vários compostos, como oitenta e nove libras de pedra ume, avaliadas a 17$800 réis; quatorze onças de ruibarbo, a 2$100 réis; seis onças de quina peruviana, a 960 réis; duas libras de sabão de Veneza, a 5$120 réis; seis libras de pedra lipus, a 3$840 reis; seis libras de esmalte, a 9$600 réis; uma libra e meia de galha, a 960 réis, e uma barra de estanho. 945 Zeloso de seu patrimônio, Veloso de Miranda mantinha consigo uma considerável soma de valores em metais, mais precisamente trinta e cinco barras de ouro, avaliadas em 11:840$549 réis, e mais algumas moedas no mesmo metal, avaliadas em 211$200 réis. Ainda no que se refere a valores em espécie, o naturalista era credor de Francisco Gomes da Rocha, timbaleiro do Regimento de Vila Rica, 946 já falecido à época da confecção do inventário, no valor de 12$150 réis; de Joaquim Marques Francisco, no valor de 6$600 réis, 947 e de Joaquim Jose da Silva Brandão, 943 MOCELIN, Ronei Clesio. Afinidades químicas ou a parte da química mais suscetível de tornar-se ciência exata: Guyton de Morveau em português. Comunicação. 3º Simpósio Temático da Pós-Graduação em Química. Universidade Federal de Minas Gerais, 2014. 944 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fls. 34, 20v. 945 Idem, fls. 8, 12v, 16, 18v-19, 26, 20v, 22v-23, 16v. 946 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa histórica, p. 173. 947 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fls. 9-12v, 29v. 287 graduado em Matemática na Universidade de Coimbra 948 e cunhado de seu irmão, João Veloso de Miranda, no valor de 230$118 réis. Infelizmente não foi possível constatar o dia em que Veloso de Miranda faleceu, e nem sua causa mortis, pois são inexistentes em Ouro Branco e no Arquivo Eclesiástico Dom Oscar de Oliveira, em Mariana, os livros de registros de óbito desse recorte histórico, conquanto por meio de um recibo, no valor de 6$750 réis, passado a 19 de março de 1816, alguns dias após seu falecimento, é possível verificar que o naturalista encontrava-se debilitado e enfermo, sendo este valor utilizado para a compra de dois frascos de vinho, e pelo acompanhamento que o médico Godói Torres, seu colega de longa data, fez ao naturalista. 949 O velório de Veloso de Miranda foi realizado na igreja Matriz de Ouro Branco e durou quase uma semana, como era comum aos defuntos que em vida eram possuidores de largos cabedais. Para as cerimônias, a igreja foi paramentada com galão, ceras e mais aviamentos, ou seja, fitas, sedas e fios de prata ou ouro, para adornar as vestes, 950 e velas para o ambiente, num total de 58$317 réis. 951 Ao sacerdote que fez as vezes de pároco, e pela assistência em todo o funeral, foram ofertados 18 mil réis. Ao sacristão, por seu trabalho, 4$800 réis. Aos acólitos, outros 4$800 réis. Aos sacerdotes, pela missa de corpo presente, pelo acompanhamento e pelo ofício de encomendação e sepultamento, 38$400 réis. Pela regência, ou seja, a condução musical, supondo que tenha havido a participação de uma fanfarra ou mesmo o acompanhamento de piano ou órgão durante as celebrações, 12$000 réis. Pela fabricação da sepultura e da cruz, 10$800 réis, e ainda 3$600 réis por três missas de corpo presente rezadas nos dias 3º e 7º. 952 Todos estes valores foram honrados por Antônio Veloso de Miranda, que solicitou seu reembolso quando 948 AUC. Índice de Alunos da Universidade de Coimbra. Joaquim Jose da Silva Brandão. Disponível em http://pesquisa.auc.uc.pt/details?id=187737&ht=silva. Acesso em Acesso em 26 de agosto de 2016. 949 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 106. 950 BLUTEAU. Dicionário.... p. 648. 951 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fl. 106. 952 Idem, fl. 105. 288 da partilha dos bens, ao longo do inventário. Em outras praças da capitania também foram realizadas missas em honra ao naturalista falecido. Em Vila Rica, o padre Jose Carneiro de Moraes celebrou 25 missas em “altar privilegiado”. No arraial de Catas Altas foram realizadas 22 missas. No povoado de São Domingos, atual município de Diogo de Vasconcelos, 93 missas, conduzidas pelo padre Joaquim Coelho Leal, e em Gualaxo do Sul, não o rio, mas provavelmente a fazenda com este nome, outras tantas missas foram rezadas pelo padre Domingos Antonio da Cunha Osório. 953 Do valor total arrolado no inventário de Veloso de Miranda, descontado as despesas de seu funeral e enterro, as custas processuais, e as despesas decorrentes da reforma que Antônio Veloso de Miranda realizou no sobrado da rua de São José, resultou um monte partível de 14:580$614 réis, cabendo a Antônio o valor de 4:860$204 ½ réis; a cada um dos herdeiros do coronel João Veloso de Miranda, o alferes Luiz Veloso de Miranda e sua irmã, Maria José Velosina de Miranda, 2:430$102 ½ réis; e aos herdeiros de Ana Justina de Miranda, o capitão Manoel Gomes Martins, Antônia Justa de Miranda, Joana Velosina de Miranda e a caçula, Ana Justina de Miranda, o valor de 1:215$051 ½ réis para cada. 954 Coube, a Antônio Veloso de Miranda, dentre outros bens, as joias, o relógio e as espingardas, assim como uma “armadura” de prata; vários escravos; o sobrado da Rua de São José, alugado ao Coronel Fernando Luiz Machado de Guimarães, após uma reforma, à razão de quatro mil réis por mês; a fazenda do Mau Cabelo, o termômetro, a maquina elétrica e a máquina galvânica, bem como toda a livraria. 955 Ao capitão Manoel Gomes Martins coube um alambique pequeno; a prancha de cobre de fazer chapéus; o semicúpio, ou banho sentado; o forno de cobre de torrar farinha; duas espingardas e duas balanças de meia libra. Antônia Justa de Miranda, sua irmã, herdou uma forma de velas de sebo; uma tulha de guardar algodão e nove 953 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fls.106, 103, 106. 954 Idem fls., 64v, 76, 64v. 955 Idem, fls. 65v-72v, 75v. 289 rodas de fiar, dente outros objetos. Joana Velosina de Miranda, sua outra irmã, herdou uma toalha de mesa fina e vinte e quatro guardanapos de Guimarães, assim como outras miudezas. A Ana Justina de Miranda, a irmã caçula, coube dentre outros bens cinco camisas de Bretanha, da França, com babados em cambraia. 956 Ao longo do inventário, Luiz Veloso de Miranda, sobrinho do naturalista, protestou acerca dos prejuízos que teve pela demora em se realizar a partilha, e pela má administração dos bens que ficaram pelo falecimento do tio naturalista, alegando que as terras da fazenda não mais produziam, que as culturas plantadas se perderam, e que os escravos estavam sem administração. 957 Infelizmente não foi possível verificar a quem Antônio Veloso de Miranda vendeu a fazenda do Mau Cabelo, e somente foi possível ter notícias desta propriedade no ano de 1855, quando da realização do Registro de Terras Públicas e Escrituras do termo da Vila de Queluz. 958 A relevância da Fazenda do Mau Cabelo está no fato de ter sido, quando dos primeiros anos das atividades mineradoras do ouro, importante ponto de paragem e de apoio para os viajantes que vinham desde o litoral e tinham, como destino, as vilas do ouro. Posteriormente, no auge da mineração, esta propriedade foi responsável, assim como tantas outras na região, por suprir as vilas mineradoras dos gêneros alimentícios mais básicos, como os grãos, as farinhas, as carnes, os toucinhos e os derivados do leite enviando, ainda, sempre que possível, seus excedentes para o litoral, sobretudo para o Rio de Janeiro. Concomitantemente, também era responsável por uma essencial produção agrícola de subsistência, onde os gêneros eram destinados não apenas ao autoconsumo, mas também para a comercialização e escambo com as propriedades limítrofes. A importância do cultivo da terra para a Fazenda do Mau Cabelo e para as outras propriedades que, como ela, movimentavam a economia mineira a partir de gêneros essenciais foi responsável, segundo Douglas Cole Libby, pela criação de uma 956 AHMI, 2º Ofício, Cód. 34, Auto 380. Inventário de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 1816, fls. 80v-83v, 88v-91. 957 Idem, fls. 57v, 59v. 958 APM, Registro de Terras, 1854-1857, Livro Nº 177. Relação dos possuidores de terras registradas na Paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Queluz, assento n° 247, fl. 26. 290 protoindústria, por meio da qual a economia da capitania seria diversificada, evitando “importações custosas” e a dependência da mineração como única atividade financeira, combinação que teria sido responsável, segundo o autor, por evitar uma grande crise em Minas Gerais no período pós-mineração. 959 Após a aquisição da propriedade por Veloso de Miranda, o naturalista deu continuidade às atividades agrícolas e de pecuária ali realizadas, incrementando sua arrecadação por meio de outras tantas culturas pioneiras na região, como a do bicho da seda, também desenvolvendo, naquelas terras, inéditos projetos científicos, colocando em funcionamento, sob os auspícios da Coroa, uma fábrica de salitre, a qual haveria de ser responsável por suprir parte das demandas do composto na capitania, por curto período, mas que, contudo, não obteve o êxito esperado. Apesar de sua longevidade como centro de produção de bens de consumo e, na época de Veloso de Miranda, do desenvolvimento das práticas científicas na capitania de Minas Gerais, em raras ocasiões a Fazenda do Mau Cabelo foi visitada pela historiografia, consideração que esperamos minimizar finda esta análise, conquanto ainda há muito para compreender acerca de sua história após o falecimento de seu mais afamado proprietário. 959 LIBBY, Douglas Cole. Transformação e trabalho em uma economia escravista: Minas Gerais no século XIX. São Paulo: Brasiliense, 1988. 291 CAPÍTULO 8 A BIBLIOTECA VELOSIANA Esse capítulo tem como objetivo analisar a composição da livraria/biblioteca de Joaquim Veloso de Miranda em suas múltiplas dimensões. A posse de livros, especialmente por parte dos naturalistas em ação na capitania, 960 no século XVIII, tem sido estudada por diversos autores, 961 e a livraria de Veloso de Miranda já foi objeto de atenção de Caio Boschi. 962 Aqui, busca-se aprofundar um pouco mais essa análise, tomando como ponto de partida que tais livros eram necessários ao 960 GOMES, Paulo Leite. “Duas edições anônimas de d'Alambert em Diamantina”. Revista Minas Gerais, nº 16, maio de 1989, p. 43-46; _____. “Um iluminista holandês na biblioteca Viera Couto”. Revista Minas Gerais, nº 32, dezembro de 1990, p. 24-29; FURTADO, Júnia Ferreira. Sedição, heresia e rebelião nos trópicos: a biblioteca do naturalista José Vieira Couto. In: DUTRA, Eliana Freitas; MOLLIER, Jean-Yves. (Org.). Política, Nação e edição: o lugar dos impressos na construção da vida política, Brasil, Europa e Américas nos séculos XVIII-XX. São Paulo: Annablume, 2006, v. 1, p. 69-86; _____. “Enlightenment Science and Iconoclasm: the Brazilian Naturalist José Vieira Couto”. Osiris, Bruges, vol. 25, p. 189-212, 2010; _____. “Seditious Books and Libertinism in the Captaincy of Minas Gerais (18th-Century Brazil): the Library of Naturalist José Vieira Couto”. Revista Complutense de História da América, vol. 40, p. 113-136, diciembre 2014; _____. “Sedition, Revolution and Libertinism in eighteenth-century Brazil: the Library of Naturalist José Vieira Couto”. 2017 (no prelo). 961 Silva, Maria Beatriz Nizza da. “A Livraria Pública da Bahia em 1818: Obras de História”. Revista de História, vol. 43, nº. 87, 1971, p. 225-239; _____. “Livro e Sociedade no Rio de Janeiro (1808-1821)”. Revista de História, nº 94, 1973; _____. Silva, Maria Beatriz Nizza da. “A Transmissão, a Conservação e a Difusão da Cultura no Rio de Janeiro: 1808-1821”. Revista de História, v. 51, nº 102, 1975, p. 553-568; VILLALTA, Luiz Carlos. “Governadores, bibliotecas e práticas de leitura em Minas Gerais no século XVIII”. Oficina do Inconfidência, Ouro Preto, v. 1, p. 77-96, 2001; _____. Ler, Escrever, Bibliotecas e Estratificação Social. In: Maria Efigênia Lage de Resende; Luiz Carlos Villalta. (Org.). História de Minas Gerais: As Minas Setecentistas II. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, v. 2, p. 289-311; _____. MORAIS, Christianni Cardoso. Circulação, posse e usos de livros a partir de incursões pelas bibliotecas mineiras do século XIX. Anais do II Seminário Brasileiro Livro e História Editorial, Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2009. p. 147-147; _____. MORAIS, Christianni Cardoso. Posse de Livros e Bibliotecas Privadas em Minas Gerais (1714-1874). In: BRAGANÇA, Aníbal; ABREU, Márcia. (Org.). Impresso no Brasil: Dois séculos de livros brasileiros. São Paulo: Editora Unesp, 2010, p. 401-418. 962 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica. 292 desempenho de seu ofício, 963 mas não só. Livros eram também símbolos de distinção, serviam a sociabilidade intelectual e ao exercício da religião – ou à falta de religião, de forma ortodoxa ou heterodoxa, entre outros usos que lhes eram atribuídos. 8.1 – Das livrarias e dos seus préstimos nos sertões do ouro Entre os 690 inventários de Vila Rica, compreendidos entre as décadas de 1750 e 1800, Thábata Araújo de Alvarenga encontrou apenas 62 com menções a livros, o que corresponde a parcos 9%. A posse dessas livrarias, segundo ela, “distribuía-se desigualmente entre os gêneros e as condições jurídicas”, sendo 61 dos inventariados pertencentes a homens brancos e livres, e “apenas um era livre e pardo (um sapateiro, filho de uma forra); 53 eram homens e apenas três eram mulheres. Em seis inventários, mulheres e homens compartilhavam os bens, existindo entre eles os impressos”.964 Já Luiz Carlos Villalta, ao pesquisar a existência de livros em 911 inventários do Cartório do Segundo Ofício da Vila do Carmo, entre 1714 e 1822, concluiu que em 76 deles havia bibliotecas, totalizando 1253 obras em 2031 volumes. Ou seja, 8,4% dos proprietários possuíam livros, percentagem bastante próxima à encontrada em Vila Rica. Para o Tejuco, de acordo com Júnia Ferreira Furtado, foi constatada, no mesmo recorte histórico, a presença de impressos em 14 de 66 inventários pesquisados, o que corresponde a pouco mais de 20%, 965 percentagem mais expressiva que aquelas verificadas nas outras urbes mineiras, e que corroboram a afirmativa de Auguste de Saint-Hilaire, de que ele havia encontrado, naquela 963 ANTUNES, Álvaro de Araújo. Espelho de Cem Faces: O Universo relacional de um Advogado Setecentista. São Paulo: Annablume, 2004. 964 ALVARENGA, Thábata Araújo de. Homens e Livros em Vila Rica: 1750-1800. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2003, p. 72 (Dissertação de Mestrado em História, Universidade de São Paulo), apud VILLALTA, Luiz Carlos. Ler, escrever, bibliotecas e estratificação social. In: RESENDE, Maria Efigênia Lage de & VILLALTA, Luiz Carlos. História de Minas Gerais: As Minas Setecentistas. Vol. 2. Belo Horizonte: Companhia do Tempo, 2007, p. 306-307. 965 FURTADO. O livro da capa verde, p. 54. 293 localidade, “mais instrução que em todo o resto do Brasil”.966 Números a parte, constituir uma livraria à época de Veloso de Miranda não era tarefa fácil, fosse o leitor homem da Igreja, das leis ou das ciências. Para que as obras mais recentes lançadas em Portugal chegassem até as vilas mineiras, era prática comum o seu envio desde a Europa, quase sempre por meio de familiares, amigos e ex-professores, conquanto também fosse existente o comércio regular de livros e que era, inclusive, bastante ativo em Vila Rica, realizado por particulares, nas casas de secos e molhados e também nas boticas. 967 A historiografia sobre a posse de impressos na capitania de Minas Gerais ao longo do século XVIII e nas primeiras décadas do século posterior revela que as livrarias pertencentes aos religiosos eram bastante expressivas, e estavam longe de ser circunscritas aos impressos sobre religião e oratória. A mais famosa delas, pertencente ao Cônego Luís Vieira da Silva, por exemplo, era composta de 270 obras divididas em quase 800 volumes. 968 Nela, além de Bíblias e sermões, havia obras profanas, como alguns clássicos gregos, obras de literatura e, inclusive, alguns volumes da Encyclopédie, de Diderot e d'Alembert. 969 Os letrados que se dedicavam às leis também eram possuidores de volumosas livrarias, algumas delas estudadas por Álvaro de Araújo Antunes e Paulo Gomes Leite. O primeiro analisou aquela pertencente ao advogado José Pereira Ribeiro que, ao retornar de Coimbra, onde se formou, para fixar residência na Cidade de Mariana, 966 SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagens pelo Distrito dos Diamantes e Litoral do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EdUsp, 1978, p. 33, apud FURTADO. O livro da capa verde, p. 54. 967 Ainda na primeira metade do século XVIII, ao longo das décadas de 1740 e 1750, o capitão e advogado Manuel Ribeiro dos Santos, por exemplo, manteve, em sua casa, junto à ponte de São José, uma loja “na qual se vendiam os produtos da terra e os gêneros importados de Portugal”, dentre esses, livros. Outro livreiro, por nome Domingos José Marques, estabelecido na freguesia de Antônio Dias e contemporâneo a Veloso de Miranda, também era conhecido importador e distribuidor de impressos em Vila Rica. In: DINIZ, Sílvio Gabriel. “Biblioteca setecentista nas Minas Gerais”. RIHGMG. Belo Horizonte, 1959, nº 6, p. 344; _____. Um livreiro em Vila Rica no meado do século XVIII. Kriterion, nº 47-48. Belo Horizonte, Jan.-Jul. 1959, p. 181; MORAES, Rubens Borba. Livros e bibliotecas no Brasil colonial. Brasília: Briquet de Livros, 2006, p. 31. 968 FRIEIRO, Eduardo. O diabo na livraria do Cônego: como era Gonzaga? e outros temas mineiros. São Paulo: Edusp, 1981, p. 270, apud FURTADO. O livro da capa verde, p. 54-55, nota de rodapé 50. 969 FRIEIRO. O diabo na livraria do cônego. In: _____. O diabo na livraria do cônego, p. 37. 294 trouxe consigo numerosas obras de Direito Canônico, confirmando a função instrumental de seu acervo. Possuía, também, obras de conteúdo sacro, como as do abade Guilherme Thomas François Raynal (1713-1796), bem como o Recueil des loix constitutives des colonies angloises, confédérées sous la dénomination d’Etats Unis de L’Amérique Septentrionale,970 que serviu de inspiração para que os inconfidentes esboçassem as leis da nova nação que projetavam nas Minas. 971 Como na livraria de José Pereira Ribeiro, na do naturalista Vieira Couto dominavam os livros afeitos a seu ofício, o que era comum na colônia. 972 “Of the 226 books that Vieira Couto owned, only 9 (4%) could not be identified, as their titles were transcribed incompletely. As for the subjects that the collection included, 118 books, representing 53% of the whole and 54.4% of the 217 catalogued and classified books, had to do with natural history and were directly tied to the practice of medicine and fields related to the study of nature, with an emphasis on mineralogy and chemistry”. 973 Mas não só. A “diversidade dos interesses intelectuais de seu possuidor”974 revela-se na presença de obras clássicas do Iluminismo, da literatura 970 ANTUNES, Álvaro de Araújo. Considerações sobre o domínio das letras nas Minas setecentistas. Locus: Revista de história. Juiz de Fora, 6 (2): 9-20, 2000; _____. Espelho de cem faces: o Universo Relacional de um Advogado Setecentista. São Paulo: Annablume-PPGH/UFMG, 2004; _____. Resquícios de leitura nas práticas advocatórias setecentistas em Minas Gerais. In: Anais do I Congresso de História da Leitura e do Livro no Brasil. Campinas: Unicamp, 1998; LEITE, Paulo Gomes. Revolução e heresia na biblioteca de um advogado de Mariana. Acervo, v. 8, n. 1-2, p. 153-166, Jan.-Dez. 2012. 971 MAXWELL, Kenneth. (org.) O livro de Tiradentes: transmissão atlântica de ideias políticas no século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2013; FURTADO, Júnia F. e STARLING, Heloísa Maria Murguel. “República e sedição na Inconfidência Mineira: leituras do Recueil por uma sociedade de pensamento”. In: MAXWELL, Kenneth. (org.) O livro de Tiradentes, p.107-132. 972 NEVES, Lúcia Bastos Pereira das e NEVES, Guilherme Pereira das. “A biblioteca de Francisco Agostinho Gomes: a permanência da ilustração luso brasileira entre Portugal e o Brasil”. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, vol. 165, n. 425, p. 11-28, 2004. 973 Dos 226 livros que Vieira Couto possuía, apenas 9 (4%) não puderam ser identificados, pois seus títulos foram transcritos de forma incompleta. Quanto aos temas que a coleção incluiu, 118 livros, representando 53% do total e 54,4% dos 217 livros catalogados e classificados, tinham a ver com história natural e estavam diretamente ligados à prática de medicina e campos relacionados ao estudo da natureza, com ênfase em mineralogia e química. In: FURTADO. “Seditious Books and Libertinism in the Captaincy of Minas Gerais”…, p. 121. 974 BOSCHI. Exercícios de Pesquisa Histórica, p. 205-206. 295 europeia e mesmo na ausência de obras de cunho religioso. 975 Os naturalistas como Veloso de Miranda e Vieira Couto, que tinham o estudo da Ciência Natural como profissão, também mantinham extensas e valiosas livrarias. Começavam a adquirir seus livros ainda em Portugal, e davam continuidade quando retornavam à Colônia. José Vieira Couto, por exemplo, adquiriu seus primeiros volumes quando estudante na Universidade de Coimbra, dando continuidade ao realizar um tour de estudos na Saxônia e na Holanda. De volta ao Tejuco, adquiria para si e vendia livros comprados em Lisboa por seu conterrâneo, Simão Pires Sardinha. 976 O constante fluxo de letrados entre a Metrópole e a América portuguesa, verificado ao longo da segunda metade do século XVIII, suscita muitas considerações sobre as livrarias que foram estabelecidas na capitania. Outro homem de ciências, também colega de Veloso de Miranda e morador em Vila Rica, o médico e cirurgião Vieira de Carvalho, foi igualmente possuidor de uma considerável biblioteca particular, onde se faziam presentes, sobretudo, impressos sobre Anatomia, Cirurgia, Obstetrícia e Farmácia, conquanto também possuísse obras com conteúdo geográfico, relatos de viagens, literatura e dicionários em cinco idiomas. 977 Entre ele e Veloso de Miranda registra-se a presença de “11 títulos coincidentes” em suas livrarias, sobretudo nos campos da Farmacopeia e Botânica, ambos os letrados em consonância com a literatura especializada da época. 978 Para homens como Vieira Couto, Vieira de Carvalho e Veloso de Miranda havia, naquele contexto, uma nova relação entre a prática e os conhecimentos teóricos adquiridos nas instituições de ensino oficiais, sendo os livros e as ideias iluministas 975 Sobre a livraria de José Vieira Couto, C.f. também FURTADO. Sedição, heresia e rebelião nos trópicos: a biblioteca do naturalista José Vieira Couto; LEITE. Paulo Gomes. “Contestação e Revolução na Biblioteca de Vieira Couto”. Revista Minas Gerais. Belo Horizonte, vol. 27, jul.1990, p. 23-29; e _____. Um iluminista holandês na biblioteca de Vieira Couto. In: Revista Minas Gerais. Belo Horizonte, Vol. 32, Dez.1990, pp. 24-29. 976 FURTADO, Júnia Ferreira. Seditious Books and Libertinism in the Captaincy of Minas Gerais (18th-Century Brazil): the Library of Naturalist José Vieira Couto, p. 113-136. 977 Inventário dos bens móveis de Antônio José Vieira de Carvalho, capitão cirurgião mor deste regimento de Cavalaria de Linha de Minas Gerais. In: RAPM, Belo Horizonte, Ano X, fascículos III e IV, Jul.-Dez. 1905, p. 706-709. 978 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 205. 296 responsáveis por balizar seus estudos e, também, por distinguir seus conhecimentos, eruditos daqueles empíricos e práticos. 979 8.2 – A biblioteca velosiana Impossível seria, à luz da historiografia, estudar a trajetória de um letrado como Veloso de Miranda sem dar a devida atenção aos livros que o inspiraram. Composta de 104 títulos divididos em 260 tomos, a biblioteca velosiana foi dos maiores acervos particulares existentes nas vilas mineiras em seu tempo. Só sua dimensão justifica estuda-la, inserindo-a no contexto da produção intelectual de seu proprietário, mas, também, valorizando esse acervo no que distingue seu proprietário, enquanto membro da elite política e intelectual da capitania. Como é bastante comum, a livraria se perdeu no tempo, sobrevivendo apenas o registro dos títulos nela existentes, por meio do inventário redigido pelos louvados, após seu falecimento. O rol dos livros que possuía, às vésperas de sua morte, permite reconstituir os títulos, sendo possível resgatar o conteúdo de muitos dos mesmos em versões digitalizadas, disponibilizadas na Internet, mas perde-se a marginalia, ou seja, as anotações e grifos do autor, o que permitiria reconstituir não só o que leu, mas como leu. Caio Boschi, no artigo “Um hábil naturalista: Joaquim Veloso de Miranda”, analisou a biblioteca de Veloso de Miranda. 980 Nele, transcreveu parte dos bens de Veloso de Miranda constantes em seu inventário, com especial atenção à biblioteca, e identificou os títulos e seus autores, propondo ainda a realização de novos estudos sobre esse acervo. 981 É necessário, ainda, tomar outros cuidados ao estudar uma biblioteca colonial à luz apenas do rol de livros inventariados. A leitura compartilhada e o empréstimo de livros, atividades comuns que compensavam os entraves para a formação de uma biblioteca à época, faziam com que o número de livros constantes 979 FURTADO. Seditious Books and Libertinism in the Captaincy of Minas Gerais, p. 116. 980 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 101-210. 981 AHMI, Cartório do 2° Ofício, cód. 34, auto 380. Inventário de bens de Joaquim Veloso de Miranda, 1816. 297 nos inventários fosse menor aos efetivamente lidos por seus proprietários, o que muito provavelmente também ocorreu com Veloso de Miranda. Sobre esta particularidade, Júnia Furtado apontou, por exemplo, o emprego da obra de Raynal nos escritos de Vieira Couto, sem que as obras do Abade constassem do seu rol de livros inventariados. 982 Boschi buscou identificar os títulos das obras inventariadas de forma precisa, sendo esta uma das maiores dificuldades que se impõe à reconstrução de bibliotecas a partir do rol de inventários post mortem. Catálogos de algumas bibliotecas nacionais e repertórios especializados são essenciais para contornar, por exemplo, a grafia imprecisa ou inexata, bem como o “aportuguesamento, pelo escrivão ou pelos avaliadores, dos títulos das obras e/ou nomes dos autores”.983 A partir do inventário do naturalista, Boschi elaborou uma tabela (Tabela 03), dividindo as obras de acordo com as áreas de conhecimento, número de títulos por área e percentagem: 982 FURTADO, Júnia Ferreira. Sedition, Revolution and Libertinism in eighteenth-century Brazil: the Library of Naturalist José Vieira Couto. 2017 (no prelo). 983 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 202. 298 Área de conhecimento Número de títulos % Agricultura 8 7,7 Artes e ofícios 1 0,9 Belas Artes 1 0,9 Biografia 1 0,9 Botânica 23 22,1 984 Dicionários 4 3,9 Direito 1 0,9 Economia 1 0,9 Farmácia 4 3,9 Filosofia 2 2,0 Filosofia Natural 1 0,9 Física 2 2,0 Geografia 1 0,9 História 1 0,9 História Natural 3 2,9 Literatura 11 10,6 Matemática / Geometria 2 2,0 Medicina 10 9,7 Mineralogia 3 2,9 Música 1 0,9 Química 10 9,7 Religião 1 0,9 Zoologia 1 0,9 Área indeterminada 11 10,6 Total 104 100,00 Tabela 3 – Biblioteca de Joaquim Veloso de Miranda. Classificação por área de conhecimento. Apud: BOSCHI, Exercícios de pesquisa histórica, p. 201-202. Ao se somar as áreas de Agricultura, Artes e Ofícios, Botânica, Economia, Farmácia, Filosofia Natural, Física, Geografia, História Natural, Matemática, Medicina, Mineralogia, Química e Zoologia, diretamente afeitas ao ofício de naturalista, chega-se ao número de 70 livros, ou seja, 67,3% do total da biblioteca. Revela-se, como era dominante na colônia, que sua biblioteca era formada majoritariamente para seu exercício profissional. Se a esses livros, somarem-se os de História, Filosofia, Direito e os Dicionários, que somam 8 títulos, chega-se 78 livros, ou seja, 75% do total indiretamente ligados ao seu ofício, o que reforça ainda mais a 984 Na tabela original consta, equivocadamente, o valor de 2,2%. 299 vocação profissional de seus livros. Para divertir seu espírito, as áreas de Belas Artes, Literatura e Música compraziam 14 livros, ou 13,4% dos títulos. Chama a atenção, levando-se em consideração tratar-se de um padre, a quase inexistência de livros religiosos, totalizando apenas 1 título (1,0%), o que se comentará mais adiante. Se se exclui desse total os 11 livros cujos títulos não foram identificados, as porcentagens são respectivamente, 75,3% (História Natural); 83,9% (História Natural e afins); 15% (Diversão e Cultura); e 1,1% (Religião), do total de 93 livros. É bem provável que o hábito da leitura de Veloso de Miranda teve início ao frequentar as aulas de um professor secular, leigo ou clérigo, 985 ampliando-se quando ingressou como aluno no Seminário de Mariana, por meio de obras como o Promptuarium sacrum, ou a Polyanthea Mariana, 986 e consolidando-se na Universidade de Coimbra. Na Europa, teve contato com as publicações mais recentes sobre as Ciências Naturais, como as obras de Linneu, acumulando conhecimentos e dando início a sua biblioteca particular. 985 Desde as primeiras décadas do século XVIII, era comum em Minas Gerais o ensino das primeiras letras ministrado por professores particulares ou, ainda, contratados pelas Câmaras das vilas. In: FONSECA, Thais Nivia de Lima e. O ensino régio na capitania de Minas Gerais, 1772-1814. Belo Horizonte: Autêntica, p. 20. 986 Estas são, provavelmente, as seguintes obras: MANSI, Giuseppe. Promptuarium sacrum ac morale ... hoc est Discursus Exegetici in omnes totius anni solemnitates ... / ab ... Josepho Mansi ... ; Italicè conscripti, nunc verò Latinè redditi...; Tomus tertius, tres menses, julium, augustum et septembrem complectens. Coloniae Agrippinae: Sumptibus fratrum Joannis Wilhelmi [et] Josephi Huisch, 1720; MARRACCI, Hippolito. Polyanthea Mariana, In Qua Libris Octodecim Deiparae Mariae Virginis Sanctissima nomina, celeberrima & innumera laudum encomia, altissimae gratiarum, virtutum, & sanctitatis excellentiae, & coelestes denique praerogativae & dignitates, Ex. S. Scripturae, SS. Apostolorum omnium, SS. Patrum, & Ecclesiae Doctorum, aliorumque sacrorum Scriptorum, veterum praesertim monumentis studiose collecta, iuxta alphabeti seriem, & temporis, quo vixerunt, ordinem, utiliter disposita, Lectorem oculis exhibentur / Opera Et Studio Adm. R. P. Hippolyti Marraccii Lucensis, è Congregatione Clericorum Regularium Matris Dei. Opus cunctis Mariophilis, divini praesertim Verbi Praeconibus, animarum Pastoribus, S. Scripturae Interpretibus, ac Catechistis perutile ac necessarium, copiosissimos subministrans conceptus ac discursus pro omni & quacunque Deiparae Virginis festivitate & confraternitate praedicabiles. Coloniae Agripp.: Metternich, 1710. Parte da livraria pertencente ao Seminário da Boa Morte, por volta do ano de 1800, foi anotada no livro de Receitas e Despesas do Seminário (Set. 1803-Ago. 1831), fl. 35 (numeração truncada), existente no Arquivo Eclesiástico Dom Oscar de Oliveira (AEDOO), antigo Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana. 300 De volta a América portuguesa, em 1780, continuou a ampliar seu acervo, adquirindo alguns livros no Rio de Janeiro, como os “três volumes da obra de João Bauhino”, que se encontravam desprezados “em uma botica velha que fora dos jesuítas”, lamentando-se por não ter encontrado as obras de Marcgrave e Piso,987 as quais tinha a intenção de mandar vir de Portugal. 988 Da obra de Bauhino, apenas um volume foi inventariado quando de seu falecimento, ausência que revela, como mencionado, as dificuldades de se reconstituir uma biblioteca apenas a partir do rol constante nos inventários post mortem. Teria o naturalista vendido os outros dois volumes, onde o autor descreve cerca de 5 mil plantas, desinteressando-se por eles, desatualizados devido a sua antiguidade; 989 ou os mesmos estariam emprestados na ocasião de seu falecimento? Veloso de Miranda continuaria a enriquecer sua biblioteca ao longo de sua vida, mantendo um “cunho acentuadamente utilitário-pragmático, isto é, obras em plena conformidade com as correntes de pensamento que perpassavam o período”. Essa constante atualização revela-se no dado de que “cerca de 40% dos livros deixados pelo naturalista” foram publicados após 1780.990 Continuou a fazê-lo até poucos tempo antes de seu falecimento, pois possuía o Diccionario da língua portugueza (...), de Antonio de Moraes Silva, e o Traité complet et élémentaire de Physyque (...), de Antoine Libes, ambos publicados em 1813. O mesmo ocorreu com 987 AMP, FJB, Cota: 29-276. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Domingos Vandelli. Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1780. 988 Não se sabe por quais meios Joaquim Veloso de Miranda encomendou esta obra, se mandou vir de Portugal por carta endereçada a algum amigo ou através de pedido de encomenda para quem estivesse se dirigindo à Europa. Fato é que a obra Historia naturalis Brasilia (...), de Willem Piso & Georg Margrave, foi inventariada em sua livraria. Cf. Número 103. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 200. 989 “Historia plantarum universalis, em três volumes, descreve mais de 5.000 plantas e ilustra mais de 3.000, classificadas em 40 classes de acordo com a sua constituição e composição, a sua dimensão e a duração do seu ciclo de vida, e as suas qualidades e propriedades”. CABRAL, João Paulo. Gonçalo Sampaio. Vida e obra; pensamento e ação. Porto: Câmara Municipal Póvoa de Lanhoso, 2009, p. 75 990 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica. p. 203. 301 Vieira Couto. “His latest acquisition, Mémoire sur l'éducation classique des jeunes médecins by François-Christophe-Florimond de Mercy, published in the year of his death in 1827, indicates that he continued to update his medical knowledge even toward the end of his life”.991 Se nos últimos anos de sua vida Veloso de Miranda possuía uma livraria composta, na maior parte, de publicações mais recentes, outras tantas haviam sido publicadas há muito tempo, destacando-se nove do século XVII, entre eles o Libre dels secrets de l’agricultura (...), de 1617, em língua catalã, e o Historiae Universalis plantarum (...), de 1650. Ainda que fosse habilitado a praticar a medicina, nada sugere que Veloso de Miranda tenha, de fato, a exercido, para além de uma pequena clínica doméstica, ou hospital que, por curto tempo, fez funcionar em Vila Rica, ainda que possuísse livros sobre essa área do conhecimento, como os treze tomos da Mémoires de l’Academie Royale de Chirurgie (1743 – 1774); o Traité complet d’anatomie... (1716), de Raphael-Bienvenu Sabatier; o Elementa physiologiae corporis humani... (1757), de Albrecht von Haller; o Observations sur les maladies vénériennes (1785), de Antônio Ribeiro Sanches e o Traite des maladies vénériennes... (1755); além de alguns outros tratados sobre febres e “doenças domésticas”.992 O estudo dos fármacos existentes nas plantas “indígenas” e “exóticas” foi tema de seu interesse, mas livros dessa área são poucos entre os listados no seu 991 “Sua última aquisição, Mémoire sur l'éducation classique des jeunes médecins, de François-Christophe-Florimond de Mercy, publicada no ano de sua morte, em 1827, indica que ele continuou atualizando seu conhecimento médico até o final de sua vida”. In: FURTADO, Júnia Ferreira. Freemasonry and Libertinism in the Captaincy of Minas Gerais (18th-Century Brazil): the Library of Naturalist José Vieira Couto. In: TOWSEY, Mark e ROBERTS Kyle B. Before the Public Library: Reading, Community, and Identity in the Atlantic World, 1650-1850. Leiden: Brill, 2017, p. 123-146. 992 Cf. Tombos números 66, 92, 68, 80, 88. C.f. também os tombos 28, 72, 87 e 89 In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 174-201. 302 inventário. 993 Possuía quatro títulos: a Pharmacopée universelle (1697) e o Dictionnaire ou traité universel des drogues simples (1698) , ambos de Nicolas Lemery; os Éléments de pharmacie théorique et pratique (1762), de Antoine de Baume, e a Farmacopeia tubalense chimico-galenica (1735), de Manuel Rodrigues Coelho. 994 Em relação à Botânica, tema ao qual se dedicou por longos anos, possuía livros impressos antes e depois das teorias de Linneu. Quanto aos primeiros, como dito, chegou a possuir a Historiae Universalis plantarum (...), de Johanne Bauhino; a Historia naturalis Brasiliae (1648), de Willem Piso e Georg Margrave, obra que finalmente conseguiu comprar após procurá-la no Rio de Janeiro, e a Description des plantes de l’Amérique (1693), do monge e viajante francês Charles Plumier. 995 Plumier realizou três grandes viagens ao Caribe, percorrendo desde a Martinica ao Haiti, realizando pesquisas botânicas com atenção para as plantas endêmicas, tais quais as samambaias, as bromélias e os cactos. Bertil Nordenstam destaca que Linneu obteve informações sobre a botânica caribenha a partir de quatro fontes principais, sendo uma delas Plumier. 996 Ainda anteriores à teoria de Linneu, mas publicadas no século XVIII, possuía, entre outras, a Instituitiones rei herbarie (1700), de Joseph Pitton de Tournefor (1656-1708), em três volumes, completa, e o Journal des observations physiques, mathématiques, et botaniques, de Louis Éconches Feuilée, publicado a partir de 1714, também em três volumes, dos quais possuía apenas um. Feuilée, assim como Plumier, também tinha vasta experiência de pesquisa em História Natural e igualmente realizou 993 Padre Veloso dividia as espécies que estudava enquanto plantas indígenas e exóticas. In: FBN, CC, I – 25, 19, 001, n° 004. Deputados da Junta da Real Fazenda de Minas Gerais. Cópia do ofício à Vossa Excelência tratando das despesas do Jardim botânico. Vila Rica, 14 de setembro de 1804, 5 p., Manuscrito. 994 Cf. Tombos números 03, 05, 55 e 91. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 174-201. 995 C.f. número 10. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 177 – 178. 996 “For this region Linnaeus obtained his information from four principal sources. One of these was the remarkable French monk and traveller Charles Plumier”. In: NORDENSTAM, Bertil. Linnaeus’s Global Project – The Exploration of the World’s Flora. Rheedea, Vol. 19 (1 & 2) 1-11, 2 0 0 9, p. 08. Disponível em http://www.iaat.org.in/Rheedea19_01-11.pdf. Acesso em 21 de outubro de 2013. 303 quatro viagens às Antilhas e à América do Sul, entre 1703 e 1724. 997 De Linneu, Veloso de Miranda possuía várias obras, sendo este o autor com mais títulos na livraria do naturalista mineiro, a começar pelo Systema naturae per regna tria naturae, secundum, ordines, genera, species (1735), sua primeira publicação de maior vulto; o Species plantarum, exhibentes plantas rite cógnitas ad genera relatas (1753), em dois volumes; o Genera plantarum corumque characteres natureles (1767); a Philosophia botânica (1770); e uma tradução completa de Systema naturae, intitulada Parte Práctica de Botánica del Caballero Cárlos Linneo (1784), realizada por Don Antonio Paláu y Verdéra (1734-1793), em oito volumes. 998 Outra obra relacionada ao botânico sueco é a Revue générale des écrits de Linné (1789), do botânico britânico Richard Pulteney (1730-1801), em dois volumes, que sintetiza as principais teorias de Linneu e apresenta uma pequena nota biográfica. Convém ressaltar que a influência que os estudos de Linneu exerceram em Veloso de Miranda foram reflexo do prestígio que o botânico sueco desfrutava com Vandelli que, desde 1759, mantinha, com ele, regular troca de correspondência. Vandelli transmitiu a Veloso de Miranda e a seus demais discípulos as teorias propostas pelo botânico sueco, certo de que com o uso de sua sistemática para nomear os exemplares botânicos estaria concorrendo para a difusão da teoria linneliana de classificação, para a uniformização dos procedimentos e da linguagem científica e para divulgar, no âmbito das Ciências Naturais, a flora da América portuguesa. Depois de se mudar definitivamente para a fazenda do Mau Cabelo, o estudo das culturas agrícolas passou a ser parte integrante de suas atividades de pesquisa, realizado em consonância com o estudo da Botânica. Esse interesse se espelha em vários dos títulos que possuía, tais como Éléments de l’art de la teinture (1791), de Claude-Louis Berthollet (1748-1822) e Amédée Berthollet (1780-1810); Cours théorique et pratique sur l’art de la teinture em laine, soie, fil, coton, fabrique d’indienne em grand et petit teint, suivi de l’art de l’art Du teinturier (1798), de M. de Homassel; L’art de la teinture, des fils et étoffes de coton, précédée d’une 997 Cf. número 9. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 177. 998 Cf. Tombos 96, 37, 42, 44, 18 e 38. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 185. 304 théorique nouvelle de véritables causes de la fixité des couleurs de bom teint (1766), de Placide-Auguste Apligny; De rusticis Brasiliae rebus (1798), de Joseph Rodrigues de Mello (1704-1783), que versa sobre a fabricação do açúcar, assunto que Veloso de Miranda “esteve afeto”;999 Éléments d’agriculture (1762), de Louis-Henri Duhamel Du Monceau (1700-1782), e O Fazendeiro do Brasil (1798), do naturalista Frei Veloso, seu contemporâneo. 1000 Ainda que em menor número, também estavam presentes obras de História e Geografia, como a Histoire Générale de Portugal (1735), do historiador francês Nicolas de La Clède (1700-1736), e a Géographie Moderne (1762), de Louis-Antoine Nicole de La Croix (1704-1760). 1001 Havia ainda títulos sobre as artes da pintura e do risco, como o Secrets concernant les arts et métiers (1716), de autor desconhecido, e o Dictionnaire des arts de peinture, sculpture et gravure (1792), de Claude-Henri Watelet (1718-1786); 1002 além de alguns dicionários, como o Novo diccionario das línguas portugueza, e francesa (1758), do Padre José Marques, e o Diccionario da língua portugueza composto pelo padre D. Rafael Bluteau, publicado por António de Moraes Silva (1755-1824) em 1813. 1003 Aparentemente o naturalista não tinha muito contato com a literatura profana ou, se tinha, era por outros meios que não a aquisição própria, como os saraus e reuniões que deveria participar, haja vista as poucas obras de prosa e ficção em sua livraria. Figuram apenas o Diálogos dos Mortos, 1004 uma possível “tradução francesa da obra de Luciano de Samosata (c. 155-c. 181), com anotações, preparada e publicada em Paris por Louis-Marie Quicherat”, sendo esta uma “espécie de subgênero literário, mais exatamente ficção satírica, com o propósito de crítica social”, e que teve “grande disseminação nas literaturas francesa, inglesa e alemã dos séculos 999 C.f. Tombo 76. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 192-193. 1000 C.f. Tombo 23, 2, 27, 29, 30, 31, 41, 74, 93 e 99. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 101 – 210. 1001 C.f. Tombos 14 e 15. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 179. 1002 C.f. Tombos 69 e 70. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 191. 1003 C.f. Tombos 12 e 16. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 178 e 180, respectivamente. 1004 C.f. Tombo 47. BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 187. 305 XVI e XVIII”; as Lettres historiques et galantes de deux dames de condition, dont l’une était à Paris et l’autre em province (1716), de Anne-Marguerite Petit Du Noyer (1663-1719), em seis tomos, e a Ópera (1746), de Públio Virgílio Maro. 1005 Ainda no que toca a literatura, mesmo tendo vivido quase uma década em Portugal, sobressai-se a ausência de “letrados e literatos lusitanos”, como Luis de Camões, Gil Vicente e Manuel Bocage, uma vez que “nenhum prosador ou poeta do país, nem mesmo qualquer dos ditos clássicos [da literatura] compõe sua biblioteca”.1006 Se as obras com teor pragmático e sobre Ciências Naturais eram preponderantes, não se pode, entretanto, esquecer sua formação religiosa, ainda que o próprio não atendesse pelo tratamento “padre”, mas sim “doutor”,1007 conforme foi recorrentemente usado por seus interlocutores. 1008 Esse desinteresse pela religião reflete na quase inexistência de obras sacras, exceção feita ao Novo Testamento. 1009 Importante destacar que não se tratou apenas da ausência de obras de conteúdo religioso em seu inventário, mas também chama a atenção não terem sido registrados crucifixos, escapulários, imagens votivas, recheios de suas casas ou qualquer outros paramentos utilizados quando das cerimônias religiosas. Como ler essa ausência? Teria ele apenas se desinteressado da vida religiosa, certamente abraçada por escolha familiar, em favor da profissão de naturalista, ou revela uma profunda descrença na religião católica, a qual professara os votos na juventude? Se por um lado a livraria de Veloso de Miranda não revela aspectos 1005 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 187. 1006 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 209. 1007 Cf. FBN, CC, I - 26, 22, 053 nº 001, rolo 70, documento microfilmado. Requerimento de Joaquim Veloso de Miranda solicitando o pagamento da despesa feia no rol incluso durante a tarefa de exame e coleta dos produtos naturais da Capitania de Minas Gerais. Vila Rica, 1791. 3 doc. (3 p.) Orig. Ms., ou ainda FBN, CC, I – 28, 09, 054; ALEMÃO, Francisco Freire. Notícias a respeito dos naturalistas Joaquim Veloso de Miranda e José Mariano da Conceição Veloso, colhidas de vários informantes. 1849. Coleção Freire Alemão. 1008 AHU, Minas Gerais, Nº Catálogo 11341, caixa 151, doc. 16, cód. 11428. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, informando que, em consequência da carta de 1799, abril, 5, encarregou Joaquim Veloso de Miranda do exame de plantas e de árvores próprias para o fabrico de papel. Vila Rica, 20 de novembro de 1799. 1009 Cf. número 95. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 198. 306 sedicioso, como a do Cônego Luís Vieira da Silva, 1010 ou heréticos e libertinos, tal qual a do naturalista e colega José Vieira Couto, 1011 por outro nada impede que essa ausência revele a adesão a essas mesmas ideias adotadas por seu colega. Não se pode também descartar a possibilidade de que, apesar de não possuir tais livros heterodoxos, não tenha, em algum momento, tido contado com eles, seja por meio de empréstimos ou mesmo nas leituras públicas, nas tertúlias literárias. Há, ainda, a possibilidade de que tenha existindo em seu acervo alguma obra que pudesse colocar sua reputação em xeque, sendo excluída do rol por seus familiares. Quanto aos idiomas, 49 títulos foram impressos em língua francesa, o que corresponde a 47,1%; 30 em latim (28,8%), onze em português (10,5%) 1012 , quatro em espanhol (3,8%), um em catalão e em dez obras (9,6%), pela falta de dados, não foi possível identificar, devido à abreviação ou ao aportuguesamento dos nomes dos autores e/ou das obras. Oito dos onze títulos publicados em língua portuguesa foram escritos originalmente nesta língua, a exemplo do Diccionario dos termos techinicos de História Natural (...), de Vandelli; e O Fazendeiro do Brasil (...), de frei Veloso. Outras, como o Compendio de Botanica (...), de Felix de Avelar Brotero (1744-1828); o Manual do Mineralogico (...), de Tobern Bergman (1735-1784), e o Ensaio sobre a theoria das correntes e rios (...), de Jean-Antoine Fabre (1794-1864), foram traduzidas do francês. Aparentemente não existiam títulos na língua inglesa na livraria de Veloso de Miranda, o que pode indicar a falta de domínio nesse idioma, o que não seria de se estranhar, visto que o francês e o latim dominavam entre o público savant. Os autores e os títulos da sua livraria revelam mais uma faceta do naturalista. 1010 FRIEIRO. O diabo na livraria do Cônego, p. 270. C.f. também VILLALTA, Luiz Carlos. O diabo na livraria dos inconfidentes. In: NOVAES, Adauto (org.). Tempo e história. São Paulo: Secretaria Municipal da Cultura, 1992. 1011 FURTADO, Junia Ferreira. Sedição, heresia e rebelião nos trópicos: a biblioteca do naturalista José Vieira Couto. _____. Freemasonry and Libertinism in the Captaincy of Minas Gerais (18th-Century Brazil): the Library of Naturalist José Vieira Couto, p.123-146. _____. “República de Mazombos: sedição, maçonaria e libertinagem numa perspectiva atlântica”. In: RODRIGUES, José Damião. (coord.) O Atlântico revolucionário: circulação de ideias e de elites no final do Antigo Regime. Centro de História do Além-mar: Ponta Delgada, 2012, p.291-321. 1012 Uma destas obras é um dicionário português – francês impresso em Lisboa, razão pela qual foi inserido nos livros de língua portuguesa. Cf. 12. In: BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 178. 307 Em primeiro lugar, seus livros apontam a importância que o ofício de naturalista desempenhou em sua vida, em detrimento da formação clerical. Ao longo dos anos, adquiriu os clássicos e o que de mais moderno se publicava nos vários campos que compõem a História Natural, conquanto também se interessasse por obras de outras áreas do saber, cultivando assim o hábito de leituras que não faziam parte de seu sinteresses acadêmicos diretos. Ainda que a compreensão do português e do latim fossem correntes para quem frequentou uma universidade setecentista, ele também era conhecedor de várias outras línguas, indispensáveis para manter-se a par do que mais novo se publicava nos campos do saber de seu interesse. Entre os idiomas estrangeiros, destaca-se o francês, o que assinala a progressiva substituição do latim enquanto língua culta, ao longo dos séculos XVIII e XIX. Também revela a importância que os naturalistas franceses desempenhavam no campo de saber que lhe era mais caro, o das Ciências Naturais. 1013 Após o falecimento de Joaquim Veloso de Miranda, a 2 de março de 1816, a biblioteca desfez-se. Com a distribuição dos bens do naturalista entre os herdeiros, primeiramente a livraria passou às mãos de seu irmão, Antônio, que deu a este acervo destino ignorado, provavelmente vendendo a maior parte, já que apenas trinta e quatro títulos são coincidentes entre as duas livrarias. 1014 Isso era comum, pois livros de grande valor na distante colônia eram, frequentemente, vendidos individualmente ou em pequenos lotes. A lista presente no inventário de Veloso de Miranda permite, ainda, uma aproximação, mesmo que parcial, das leituras que, no decorrer da vida e, especialmente, durante o desempenho do ofício de naturalista, embalou seus dias. 1013 VILLALTA, Luiz Carlos. O que se fala e o que se lê: língua, instrução e leitura. In: SOUZA, Laura de Mello e (Coord.). História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p. 365. 1014 AHCSM, 1° Ofício, caixa 91, auto 1909. Inventário de Antônio Veloso de Miranda, 1822, fl. 35v. 308 CONCLUSÃO Joaquim Veloso de Miranda era um mazombo, isto é, nascido na colônia brasileira. Seu pai, um português que, nas Minas, viveu, inicialmente, do comércio, até despertar a confiança de seu futuro sogro, de quem herdaria as atividades mineradoras. Em decorrência delas, teve acesso a largos cabedais que permitiriam que seus filhos, Joaquim inclusive, tomassem rumos capazes de os distinguir em meio àquela sociedade, estruturada segundo valores hierárquicos de Antigo Regime. A carreira militar, a eclesiástica, o acesso às letras e o casamento das filhas com membros oriundos de importantes famílias de fazendeiros e mineradores locais permitiu-lhes a ascensão social desejada. Joaquim, em especial, depois de receber os primeiros estudos e frequentar o Seminário da Boa Morte, em Mariana, abraçou a carreira eclesiástica, provavelmente mais como estratégia familiar do que como vocação pessoal, já que não vai ser provido a qualquer cargo na igreja. Ao contrário do esperado, parte para o Reino para completar sua educação. Sua passagem pela Universidade de Coimbra representou mais uma etapa na ascensão social que seu pai projetara para os filhos. O estudo permitiu abraçar a carreira de naturalista e, no desempenho desta, ao retornar para Minas Gerais, na virada do século XVIII para o seguinte, passou a se relacionar com as figuras mais importantes na administração da capitania, ocupando, inclusive, cargos administrativos. O poder que dispunha junto a essas autoridades foi por ele utilizado em benefício das Ciências Naturais, especialmente para potencializar seu maior projeto, o Horto Botânico de Vila Rica. Ao mesmo tempo, cultivou relações de amizade e profissionais com outros importantes naturalistas luso-brasileiros, como José Vieira Couto e José de Sá Bittencourt e Câmara, e o médico Luiz Jose de Godói Torres, com quem desenvolveu importantes trabalhos em colaboração. Mais tarde, ao estabelecer-se de vez em sua Fazenda do Mau Cabelo, por volta de 1806, a maioria destes laços deixou de existir, com exceção do último, pelo menos. Os estudos de Veloso de Miranda chamaram a atenção de vários letrados estrangeiros, como Wilhelm Ludwig Von Eschwege, o Barão de Eschwege, que 309 desembarcou no Brasil após a transferência da Corte, ou seja, depois que Veloso de Miranda já havia se mudado para os sertões de Ouro Branco. Entre 1811 e 1812, Eschwege trabalhou para estabelecer uma fábrica de ferro na região de Congonhas, a usina Patriótica 1015 e manteve-se a par das atividades científicas realizadas por Veloso de Miranda em Vila Rica e na Fazenda do Mau Cabelo, como seus estudos químicos sobre a cochonilha e a tintura de tecidos. 1016 A menção a esses estudos ganha maior relevo quando se leva em consideração que redigir extensas notas e fazer considerações elogiosas sobre o trabalho dos naturalistas luso-brasileiros não eram atividades típicas de Eschwege, conhecido por desmerecer os letrados locais e diminuir suas pesquisas, 1017 como ocorreu com o projeto da fábrica de ferro que o Intendente Câmara estava criando, em Morro do Pilar, em 1811, 1018 e que rivalizava com a sua. Sua crítica ácida, no entanto, também foi dirigida a Veloso de Miranda, a quem não poupou, acusando-o de ser tão aferrado e cioso em suas descobertas que não as divulgava a ninguém, nada se podendo aproveitar dos papéis que deixou, e dos quais tinha o comentário na cabeça. Com sua morte também desapareceram suas descobertas, que poderiam ter sido tão úteis à industria e ao comércio se não as sepultasse o capricho do seu autor. 1019 1015 BOSCHI. In: Exercícios de pesquisa histórica, p. 149. 1016 ESCHWEGE. Contribuições para o estudo da Geologia no Brasil, apud XAVIER DA VEIGA, José Pedro. Ephemérides Mineiras, vol. 3. Ouro Preto: Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1897, p. 153, nota de rodapé. 1017 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 149. Além disso, o Barão de Eschwege era conhecido publicamente por ser possuidor de uma forte personalidade. O mineralogista inglês Alexander Caldcleugh afirmou, certa vez, que teria visto o Barão dançar “de raiva ao ver uma pedra quebrada”. In: CALDCLEUGH, Alexander. Viagens na América do Sul: extrato da obra contendo relato sobre o Brasil. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 2000, p. 123. Os estudos sobre o salitre produzidos por Eschwege estão disponível em sua obra. ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig Von. Pluto Brasiliensis. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. Da Universidade de São Paulo, 1797, p. 189-194, vol. 2. 1018 ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig von. Jornal do Brasil. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 2002, p. 394. 1019 ESCHWEGE. Contribuições para o estudo da Geologia no Brasil, apud XAVIER DA VEIGA. Efemérides Mineiras, p. 708. Consultado a partir de BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 149. 310 A crítica de Eschwege explica, em parte, o esquecimento a que ficou relegado o nome de Veloso de Miranda e suas pesquisas no panorama das ciências. No entanto, a mesma parece justa visto que Diogo de Vasconcelos também se queixou que Veloso de Miranda não transmitira ao público suas explorações. 1020 O mesmo lamentou-se José Ferreira Carrato, acusando-o de ser “um intratável misantropo, que se fechou em seu sítio do Mau Cabelo, e nunca permitiu que qualquer pessoa tivesse acesso às suas pesquisas científicas, que levou consigo para o túmulo”.1021 Além de Eschwege, Martius, Saint-Hilaire, Charles James Fox Bunbury (1809-1886), George Gardner (1810-1849), Francisco Freire Alemão (1797-1874), Raimundo José da Cunha Matos (1776-1839) e Francisco Adolfo de Varnhagen (1818-1878) tiveram notícias ou reproduziram informações sobre Veloso de Miranda, seus estudos e suas obras. Martius, por exemplo, afirmou que o (equivocadamente) “jesuíta” Veloso de Miranda era “o mais ativo aluno de Vandelli”,1022 e que seus estudos “foram, aliás, muito mais fecundos que os de seu próprio mestre”. Seria de sua lavra, “como me assegurou o Dr. João Gomes, diretor em 1818, do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, o conteúdo que Vandelli utilizou para o “fasciculus Plantarum cum novis generibus et specibus” e na “Florae Luzitanicae et Brasiliensis especimen”; e ainda “foram entre outros também aproveitados pelo Dr. Gomide, de Mariana, em sua Classificação das plantas oficiais de Minas”.1023 Os manuscritos de Veloso de Miranda, segundo ele, “foram parar nas mãos de seus alunos de Vila Rica”,1024 “onde eu também recebi uma parte dos mesmos por intermédio do meu excelentíssimo amigo Barão de Eschwege, diretor de minas lá mesmo”.1025 Afirma, também, que após retornar de Portugal, Veloso de Miranda permaneceu por mais de um ano no convento em Mariana, 1020 VASCONCELOS, Diogo de. Breve descrição geográfica, física e política da capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994, p. 67. 1021 CARRATO, José Ferreira. Igreja, iluminismo e escolas mineiras. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1968, p. 245. 1022 BOSCHI. Exercícios de pesquisa histórica, p. 150, nota 114. 1023 FERREIRA. As polêmicas flores, p. 120. 1024 Provavelmente fazendo referência a João Gomes da Silveira de Mendonça. 1025 O Patriota. Rio de Janeiro, julho de 1814, p. 3, apud Stellfeld. Os dois Vellozo, p. 239. 311 herborizando, afirmação que elucida as ações realizadas pelo naturalista logo após seu retrono à América portuguesa. Este foi, segundo Martius, o momento em que “observou e descreveu uma grande parte das plantas que se lhe apresentavam na tão rica redondeza daquela cidade serrana”.1026 Saint-Hilaire, que viajou por Minas durante o período em que permaneceu na América, entre 1816 e 1822, não chegou a conhecer Veloso de Miranda, mas salientou o sacrifício que os portugueses faziam “para acelerar os progressos da botânica”, gastando “50,000 cruzados (125 mil francos) para enviar um naturalista – Veloso de Miranda – a diversas partes da província das Minas”, ainda que, em suas palavras, tais esforços não geraram “os resultados que se poderiam esperar”.1027 Segundo ele, o naturalista a quem se referiu ora como “o abade Veloso”,1028 ora como “frei Veloso de Vila Rica”, “por muito tempo viajou pela província das Minas, para observar sua vegetação, [e] teve o cuidado de indicar, em seus manuscritos, as propriedades das plantas que recolhera”,1029 enviando a Vandelli “uma parte de suas descrições”. “Este último, depois de acrescentar algumas palavras, as publicou em sua Florae Lusitanicae et Brasiliensis specimen”,1030 tomando para si considerável fração do estudo de seu discípulo. Seus escritos revelam que conhecia com profundidade os estudos botânicos de Veloso de Miranda, pois em uma discussão sobre as plantas venenosas do Brasil, citou o fato de que Veloso de Miranda havia tido “o cuidado de indicar, em seus manuscritos, as propriedades das plantas que recolhera, e as únicas que cita como venenosas são ainda uma Paullinia, ou Timbó (Paulinia guarania), que 1026 VON MARTIUS. Carl Frederich Philipp, Botanische Zeitung (1837), apud FERREIRA. As polêmicas flores, p. 121. 1027 SAINT-HILAIRE, Auguste de. História das plantas mais notáveis do Brasil e do Paraguai. Organização de Maria das Graças Lins Brandão e Christopher William Fagg. Belo Horizonte: Fino Traço, 2011, p. 84. 1028 SAINT-HILAIRE. História das plantas mais notáveis do Brasil e do Paraguai, p. 83-84. 1029 Diferentemente do que afirmaram os organizadores que reeditaram a obra de Saint-Hilaire, persistindo o secular erro que atribui a um Veloso as atividades realizadas por outro, este Veloso não era Frei José Mariano de Conceição Veloso, mas Joaquim Veloso de Miranda, uma vez que o primeiro nunca herborizou nas Minas. SAINT-HILAIRE. História das plantas mais notáveis do Brasil e do Paraguai, p. 230. 1030 SAINT-HILAIRE. História das plantas mais notáveis do Brasil e do Paraguai, p. 84. 312 ele diz ser mortal para os mamíferos, uma de suas Galvinia (Gênero), ou Erva de Rato (Palicourea marcgravii), Rubiácea que é a mesma que uma das Ervas de Rato de Marcgraff e que dizem ser muito nociva aos animais”.1031 Sobre as plantas que os brasileiros chamam de araticu (Annona montana), Saint-Hilaire menciona mais uma vez os estudos de Veloso de Miranda, e suas considerações sobre a pinha, ou ata, fruta que não era originária do Brasil, como de fato não o é. 1032 Saint-Hilaire conta, ainda, ter visto no herbário do botânico francês Antoine-Laurent de Jussieu (1748-1836), em Paris, uma amostra da planta popularmente conhecida no Brasil como “casca de anta” (Drymis Granatensis), a qual, segundo ele, havia sido enviada à França por intermédio de Vandelli; “mas sabe-se que este último obtinha suas plantas brasileiras do abade Veloso, que herborizava na província de Minas”. 1033 Além da casca de anta, outra espécie brasileira presente no herbário de Jussieu era o Tingui preto (Dictyoloma vandellianum), igualmente anotada como sendo originária das Minas, e enviada por Vandelli em 1790. 1034 As informações de Saint-Hilaire revelam que os exemplares recolhidos por Veloso de Miranda e enviados a Portugal não ficaram restritos aos laboratórios desse país. Sabe-se que parte do acervo recolhido por ele e por outros naturalistas foi, em 1808, transferido para Paris, quando da invasão das tropas do general Jean-Andoche Junot (1771-1813) a Portugal. No entanto, desconhecida é a difusão que Vandelli fez, ainda no século XVIII, na Europa, da produção que havia sido enviada por Veloso de Miranda. Tal informação merece aprofundamento, face à 1031 SAINT-HILAIRE. História das plantas mais notáveis do Brasil e do Paraguai, p. 230. Há nessa página uma menção “o abade Veloso, de Vila Rica”, que em nota de rodapé foi, por parte do responsável pela tradução dos termos técnicos em latim, indicado como sendo o Frei Mariano da Conceição Veloso. Ver nota de rodapé nº 7. 1032 SAINT-HILAIRE, Auguste de. Plantas usuais dos brasileiros. Belo Horizonte: Código Comunicação, 2009, p. 179. 1033 SAINT-HILAIRE. Plantas usuais dos brasileiros, p.164. 1034 GROPPO, Milton. New Synonyms in Hortia and Dictyloma (Rutaceae), with Validation of the Name Hortia badinii. A Journal for Botanical Nomenclature, 20 (2): 163-165, 2010. Disponível em http://www.producao.usp.br/bitstream/handle/BDPI/14917/art_GROPPO_New_Synonyms_in_Hortia_ and_Dictyloma_Rutaceae_2010.pdf?sequence=1. Acesso em 25 de fevereiro de 2017. 313 possibilidade da existência de contribuições de Veloso de Miranda em herbários em outras instituições na França, Espanha, Suécia, Prússia e Rússia, nações onde o lente paduano cultivava correspondentes. Isso também revela a circulação, no campo das ciências, das pesquisas realizadas pelos savants luso-brasileiros com seus congêneres europeus, e aponta para os múltiplos centros de produção do conhecimento existentes à época, tanto na Europa, quanto na América, que a tradicional História da Ciência obliterou. No Brasil, Raimundo José da Cunha Matos (1776-1839), militar e memorialista, valeu-se de textos de Vieira Couto e de Veloso de Miranda quando da redação de suas obras. 1035 Já Francisco Freire Alemão (1797-1874), religioso por formação e botânico por predileção, membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, fundador e presidente da Sociedade Velosiana de Ciências Naturais do Rio de Janeiro, em 1850, dedicou-se a estudar a obra de Frei Veloso, 1036 mas mostrou-se bastante interessado sobre Veloso de Miranda e seus trabalhos. 1037 Por intermédio do padre Antônio Nogueira da Cruz, 1038 em 1849, na vila de Itaguaí, soube que ele havia frequentado a Universidade de Coimbra, que “teve comissão do governo de Portugal de examinar e coligir objetos de História Natural” em Minas Gerais, que se correspondia com Vandelli, que “serviu de secretário de governo daquela província” (sic), que era proprietário de uma fábrica de tecer e que se ocupou, “também, do exame das nossas tintas vegetais, como o subrazil e o anil, do qual extraia tinta”. O padre Nogueira da Cruz havia se formado em cirurgia no Hospital da Misericórdia do 1035 MATOS, Raimundo José da Cunha. Corografia histórica da Província de Minas Gerais, vol. 1. Belo Horizonte: Publicações do Arquivo Público Mineiro, 1979, p. 37 e 42, respectivamente. 1036 MORAIS, Rita de Cássia de Jesus. Nos verdes campos da ciência: a trajetória acadêmica do médico e botânico brasileiro Francisco Freire-Allemão (1797-1874). Rio de Janeiro, 2005 (Dissertação de Mestrado em História das Ciências e da Saúde – Fundação Oswaldo Cruz). 1037 Ressalte-se que Alexandre Antônio Vandelli, filho de Domenico Vandelli, residente no Rio de Janeiro, era membro da Sociedade Velosiana, frequentando a Seção de Mineralogia. In: MORAIS. Nos verdes campos da ciência... 1038 Este religioso era morador no arraial dos Carijós ou em suas redondezas, em 1790, tendo sido um dos signatários de uma petição pública endereçada ao Visconde de Barbacena para que fosse criada uma vila na região, com sede naquele arraial. Auto de criação da Real Villa de Queluz. RAPM. Ano II, 1897, p. 105. 314 Rio de Janeiro, em 1802, e de volta às Minas, se relacionou com Veloso de Miranda durante muitos anos tornando-o, inclusive, seu compadre, ou seja, o naturalista foi padrinho de seu casamento, antes que se tornasse religioso. 1039 Os estudos de Botânica de Veloso de Miranda revelaram e classificaram muitos espécimes endêmicos de Minas Gerais, sendo o mais emblemático deles a Vellosia, como nomeou Vandelli a uma de suas descobertas, homenageando, dessa forma, as contribuições de seu discípulo nesse campo. Já nas primeiras décadas do século XIX, parte dos naturalistas estrangeiros que desembarcaram no Brasil tomaram conhecimento das Vellosias, alguns, inclusive, associando a nomenclatura àquele que a estudou. Martius, por exemplo, sabia que o nome Vellosia era uma homenagem prestada por Vandelli, 1040 exaltando-as ao avistá-las nas cercanias de Ouro Preto: Ficamos, porém especialmente maravilhados, quando subimos o íngreme Morro de Gravier, continuação da Serra de Ouro Branco, ao avistarmos os lírios arbóreos, cujos caules fortes e nus, bifurcados nuns poucos galhos, muitas vezes terminados com um tufo de folhas compridas, com as queimadas dos campos: carbonizadas na superfície são umas das maravilhosas formas do mundo das plantas. Ambos os gêneros que eles formam, Barbacenia e Vellosia, são chamados no país canela de ema. 1041 Saint-Hilaire, por sua vez, fez numerosas considerações sobre essa espécie, ressaltando o quanto eram abundantes em alguns locais do Brasil, como no entorno de Ouro Branco, onde Veloso de Miranda a havia estudado. Ao passar pela serra do Deus te Livre, a caminho de Ouro Preto, afirmou que as Vellosias eram [e ainda são] conhecidas popularmente por canelas de ema, e que existiam em abundancia no topo 1039 FBN, CC, I – 28, 09, 054. ALEMÃO, Francisco Freire. Notícias a respeito do naturalista Joaquim Veloso de Miranda e José Mariano da Conceição Veloso, colhidas de vários informantes. 1849. Coleção Freire Alemão. 1040 SAINT-HILAIRE. História das plantas mais notáveis do Brasil e do Paraguai, p. 341. 1041 SPIX, Johann Baptiste von; MARTIUS, Karl Friedrick Philipp. Viagem pelo Brasil: 1817-1820. São Paulo: Edusp, 1981, p. 198. 315 daquela serra. 1042 Posteriormente, nas proximidades da freguesia de Santa Bárbara, ao realizar uma excursão à ermida de Nossa Senhora Mãe dos Homens, localizada no atual Parque Estadual do Caraça, também chamou a atenção para as Vellosias: Galgamos uma das altas montanhas que rodeiam essa planície. À medida que subíamos, a vegetação se tornava menos vigorosa e variada, e vimo-la mudar constantemente, conforme a altura. Encontrei, entre outras, algumas plantas da família da Ericáceas; várias Umbelíferas de folhas simples; grande número de Eriocaulons e duas ou três espécies de Vellosias (...). 1043 Saint-Hilaire também registrou a presença de Vellosias em outros locais da capitania, como na freguesia da Tapera, atual povoado de Santo Antônio do Itambé, 1044 próximo ao atual município de Madre de Deus de Minas; e na serra da Canastra, nas proximidades de Araxá, quando de sua viagem ao Rio São Francisco. 1045 Na década de 1830 foi a vez do naturalista botânico ítalo-britânico Charles James Fox Bunbury (1809-1886), que descreveu, em viagem do Rio de Janeiro para Vila Rica, as Vellosias que povoavam a serra na região de Ouro Branco: Enquanto subia a Serra do Ouro Branco, vi pela primeira vez aquelas curiosas plantas chamadas Vellosias, que parecem pertencer particularmente a essa espécie de rocha; suas hastes ásperas e escamosas, com três a cinco pés de altura, são repetidamente bifurcadas e cada galho é terminado por um tufo de folhas pontudas e retas, muito parecidas com as Yucca ou Adam´s Needle (Yucca filamentosa). Aliás a aparência geral desta planta é a da mandioca, com uma haste bifurcada. Do alto tive uma vista ampla sobre os 1042 SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem pelas Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1975, p. 67-68. 1043 SAINT-HILAIRE, Auguste de. Voyage dans les provinces de Rio de Janeiro et de Minas Geraes. Paris: Grimbert et Dozer Libraires, 1830, apud BRANDÃO, Maria. Plantas úteis de Minas Gerais e de Goiás. Belo Horizonte: Museu de História Natural e Jardim Botânico da Universidade Federal de Minas Gerais, 2015, p. 52. 1044 _____. Viagem pelos Distritos do Diamante e Litoral do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 78. 1045 _____. Viagens nascentes rio São Francisco. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1975, p. 60 e 141. 316 campos que tinha atravessado durante a semana passada, mas na direção oposta a vista é muito mais limitada, não se vendo senão imensas colinas verdes, através das quais se estende o nosso caminho para Vila Rica. 1046 Alguns dias depois, já em Ouro Preto, Bunbury mencionou que as Vellosias que havia “visto antes, na serra do Ouro Branco, cresciam em abundancia nos rochedos de quartzo perto do cume do Itacolomi”.1047 Na mesma época, foi a vez do naturalista inglês George Gardner, quando de sua passagem nas proximidades da vila de Natividade, cidade homônima localizada no atual estado do Tocantins, ou seja, em uma região bastante díspar àquela pesquisada por Veloso de Miranda, ao subir uma pequena colina, para coletar muitas curiosas espécies, como a “bonita Vellosia”, não deixando de assinalar a quem tal nomenclatura fazia referência: Essas plantas são peculiares do Brasil, como falo com tanta frequência, e eu descreverei agora sua aparência: pertencem à divisão do reino vegetal Endógena ou llfonocotípica e foram nomeados em homenagem ao Dr. Joaquim Veloso de Miranda, um jesuíta (sic), nativo da província de Minas Gerais, e que dedicou muito tempo de lazer ao estudo da botânica de seu país. Elas são mais comumente encontrados nas montanhas do interior, e principalmente nos distritos do ouro e diamante, crescem em lugares gramados abertos e muitas vezes cobrindo grandes extensões; variam de alguns centímetros a doze pés. Suas hastes são muito secas e fibrosas, e parecem estar compostas por uma grande massa de longas e esbeltas raízes soltas juntas; e não frequentemente contêm uma matéria resinosa, o que faz 1046 BUNBURY, Charles James Fox Von. Viagem de um naturalista inglês ao Rio de Janeiro e Minas Gerais (1833-1835). Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1981 apud BRANDÃO, Maria. Plantas úteis de Minas Gerais e de Goiás. Belo Horizonte: Museu de História Natural e Jardim Botânico da Universidade Federal de Minas Gerais, 2015, p. 40. 1047 _____. Viagem de um naturalista inglês ao Rio de Janeiro e Minas Gerais, p. 68. 317 com que eles sejam procurados nas regiões sem madeira do distrito de diamantes para o uso como combustível. 1048 Os obstáculos para que os naturalistas luso-brasileiros dessem visibilidade ao conhecimento que produziam, tanto do ponto de vista individual, caso de Veloso de Miranda, que não deixou apontamentos sobre muitas das pesquisas que conduzia, quanto coletivamente, devido ao idioma, às dificuldades de impressão e circulação das suas obras no restante da Europa, entre outros fatores, ajudam a explicar as dificuldades de universalização dos conhecimentos científicos produzidos na América portuguesa para além das fronteiras lusas, bem como o esquecimento que incidiu a eles, naturalistas, e ao conhecimento que produziram, fazendo com que autores e obras ficassem relegados ao esquecimento, sendo até hoje pouco conhecidos. Esse cenário, no entanto, não impediu Veloso de Miranda de transformar Vila Rica em um Centro de Cálculo setecentista no além-mar, 1049 um local que não apenas recebia inscrições, mas também as produzia e fazia circular; seja por meio das coletas e pesquisas aqui realizadas ou, ainda, por intermédio das várias pranchas, memórias, correspondência e remessas realizadas a posteriori, para Lisboa. Segundo Latour, esse conceito pode ser compreendido como “uma nova forma de enfrentar a complexa problemática do conhecimento”,1050 e envolve a absorção e a troca de conhecimentos 1048 No original, “These plants are peculiar to Brazil, and as I have so often spoken of them, I shall here describe their appearance: they belong to the Endogenous or llfonocotytedonous division of the vegetable kingdom, and were named in honour of Dr. Joaquim Veloso de Miranda, a Jesuit, who was a native of the province of Minas Gerais, and who devoted much of his leisure time to the study of the botany of his country. They are most commonly found on the mountains of the interior, but principally in the gold and diamond districts, growing in open grassy places, and often covering large tracts; they vary in beight from a few inches to twelve feet; their stems are very dry and fibrous, and seem to be made up of a great mass of long slender roots loosely hung together; and not unfrequently they contain a resinous matter, which causes them to be sought after in the woodless regions of the diamond district for fuel”. In: GARDNER, George. Travels in the interior of Brazil. London: Reeve, Benham and Reeve, 1849, p. 261-262. 1049 LATOUR, Bruno. “Les ‘vues’ de l’esprit: une introduction a l’anthropologie des sciences et des techniques”. Culture Téchnique, n. 4, p. 5-29, 1985. 1050 _____. Give me a laboratory and I will raise the world. In: MULKAY, M.; KNORR-CETINA, K. (Ed.). Science observed: perspectives on the study of science. London: Sage, 1983, p. 141-170, apud 318 por meio da relação centro versus periferia, assim como o estabelecimento de redes de saberes criadas entre os homens letrados, bem como os ciclos de acumulação de materiais – ou, segundo Latour, inscrições – e de informações que proporcionam. Para combater a ideia dos binarismos, ou seja, da existência de grandes divisões, como aquelas que justificam separar “as mentalidades científicas das pré-científicas, o conhecimento universal do local, a natureza e a sociedade, a ciência e as demais práticas sociais, o saber e o saber-fazer, a razão e a emoção, o centro e a periferia, a civilização e a selvageria”,1051 o autor destaca a importância dos locais onde o conhecimento é produzido, como os laboratórios, as academias e os jardins botânicos, compreendidos como locais para onde o conhecimento converge, é trabalhado e, posteriormente, divulgado para o público. Nas Minas de Veloso de Miranda, pode-se observar a existência de três instâncias produtoras e detentoras de informação científica e pragmática, a saber; os sertões da capitania, que fazia às vezes, grosso modo, de um “depósito natural”, local onde o conhecimento começava a ser formulado, por meio da coleta dos espécimes a serem estudados; o Horto e o Jardim Botânico de Vila Rica, instituição responsável por centralizar as coletas realizadas, onde também se se consolidava as classificações feitas ainda em campo, “peneirando-o” e selecionando o que haveria de servir aos interesses da administração Reinol e realizando experimentos com a devida produção de conhecimentos, inclusive, e, por fim, a fazenda do Mau Cabelo, onde, à semelhança do Horto e Jardim Botânico de Vila Rica, Veloso de Miranda centralizou várias de suas pesquisas, após certa data, buscando não apenas associar os elementos analisados aos seus usos do ponto de vista produtivo, mas também dando continuidade às pesquisas filosóficas, como antes havia feito, em Vila Rica. Na confluência de todos esses espaços, este naturalista tornava-se o próprio panóptico, 1052 ODDONE, Nanci Elizabeth et al. Centros de Cálculo: A Mobilização do Mundo. Informare. Caderno do Programa de Pós-Graduação de Ciências da Informação. Rio de Janeiro, vol. 6, n. 1, 2000, p. 50. 1051 ODDONE. Centros de Cálculo: a mobilização do mundo, p. 30. 1052 Considerando panóptico o conceito original elaborado por Jeremy Bentham, ou seja, a estrutura que, a partir do centro, é possível se fazer presente e visualizar o que acontece ao redor. In: Bentham, Jeremy et al (Org.). O Panóptico. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2008. 319 responsável pela “compatibilidade” e pela “coerência óptica”,1053 ou seja, por propor sentido a todos os móveis e a todas as inscrições à sua disposição, fazendo-se “presente simultaneamente em tantos lugares onde de fato nunca esteve”.1054 Ao articular de forma central todos esses espaços, Veloso de Miranda tornava-se o observador privilegiado que, “no centro do cálculo, pode capitalizar o conjunto de inscrições reunido por observadores disciplinados e destituídos de privilégios”. 1055 Esses últimos eram os capitães-mores, membros das câmaras municipais e demais autoridades a quem, por correspondência, delegava diversas tarefas, como a coleta e o envio de espécies botânicas para o horto vilariquense; mas também os escravos que participavam, como mão de obra especializada, de várias tarefas necessárias a suas pesquisas. Por fim, não se pode esquecer seus colegas naturalistas, especialmente Vieira Couto, Bittencourt e Godói que, com ele, compartilhavam estudos e resultados. Nessa perspectiva, o Horto e Jardim Botânico de Vila Rica tornou-se, ele próprio, instituição representativa do movimento ilustrado que, à época, uniu Minas Gerais e Portugal, pelo que não deve ser compreendido apenas como um elo ou instrumento responsável por unir as produções vegetais mineiras às instituições científicas lisboetas, e estas às europeias, mas como parte integrante do próprio movimento ilustrado do Século das Luzes, como centro integrado do interesse português pelo estudo da História Natural em suas conquistas e, sobretudo, como lócus responsável pela produção de conhecimentos. Assim, sua finalidade não se resumia a apenas reunir os espécimes para o estudo, mas de estuda-las de fato, produzindo conhecimento original sobre elas e articulando-o ao conjunto dos estudos que, por essa época, se fazia sobre a natureza do planeta. Ou seja, para além de centro de cálculo, o Hortoe Jardim Botânico de Vila Rica tornou-se a própria inscrição, afirmando-se como parte do conjunto responsável pela “integração do Império 1053 LATOUR. Les ‘vues’ de l’esprit..., p. 44; _____. Redes que a razão desconhece: laboratórios, bibliotecas, coleções. In: André Parente (Org.). Tramas da rede: novas dimensões filosóficas, estéticas e políticas da comunicação. Porto Alegre: Sulina, 2004, p 49. 1054 ODDONE. Centros de Cálculo: a mobilização do mundo, p. 31. 1055 ODDONE. Centros de Cálculo: a mobilização do mundo, p. 31. 320 português à mobilização geral do mundo”.1056 No ano de 2008 esse espaço foi revivido em seu lugar original, sob o nome de Horto dos Contos, tendo a Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Ouro Preto como sua responsável. Detentor de novo significado, passou a contemplar a sociedade ouro-pretana com novo espaço de lazer servindo, também, como atrativo turístico que dispunha de um considerável fragmento de mata incrustado em meio a uma das mais importantes cidades históricas da América Latina. Perdeu-se, entretanto, o sentido que lhe era atribuído no momento de sua criação, há pouco mais de 200 anos, e tampouco foi associado à rede de atores que o sustentava e o tornava vivo, locus de produção de conhecimento científico original sobre a natureza nativa. Nesse novo recorte histórico, tornou-se apenas o novo Horto apenas um resquício de um passado distante, com uma trajetória igualmente efêmera, pois foi fechado novamente, no mês de janeiro de 2017. Ademais, ao tratarmos os hortos e jardins botânicos, sobretudo os coloniais, como centros de cálculo, e como locais onde eram geridos os saberes, reafirma-se seu papel como espaço destinado a atividades mais complexas, como a produção de conhecimentos em seu sentido ipsis litteris, e não apenas pela aclimatação de exemplares botânicos, parte de todo esse processo, como em diversos momentos a historiografia luso-brasileira tratou tais locais. 1057 Ali, para além dos conhecimentos adquiridos na Universidade de Coimbra, Veloso de Miranda valeu-se dos conhecimentos nativos, advindos principalmente do gentio da terra, que se revela nas várias plantas indígenas que cultivou e manipulou, e nos conhecimentos que buscou 1056 LOPES, Maria. M. O Brasil descobre a pesquisa científica: os museus e as ciências naturais no século XIX. São Paulo: Hucitec, 1997, p. 30, apud MARANDINO, Martha. Museus de Ciências, Coleções e Educação: relações necessárias. Museologia e Patrimônio. Rio de Janeiro, v. 2, n. 2, Jul./Dez. de 2009, p. 9. 1057 BEDIAGA. Conciliar o útil ao agradável e fazer ciência, p. 1131-1157; PEREIRA, Tânia Sampaio & COSTA, Maria Lúcia da. Os Jardins Botânicos brasileiros: desafios e potencialidades. Ciência e Cultura, vol. 62, n. 1, 2010, p. 23-35; e ROSA, Mélanie Elisabeth Ferreira. As Árvores Ornamentais Introduzidas nos Jardins de Lisboa: uma perspectiva histórica (séc. XVIII-XIX). Lisboa, 2013 (Dissertação de Mestrado em Arquitectura Paisagista, Universidade Técnica de Lisboa), entre outras. 321 junto à sociedade sertaneja, tal é o caso dos saberes relacionados ao óleo da copaíba. A trajetória de vida de Joaquim Veloso de Miranda, aqui historicizado, revela não apenas as nuances que a vida de um mazombo poderia adquirir. Tendo sido direcionado às letras desde tenra idade, utilizou de duas das vias mais corriqueiras para alcançar o reconhecimento social – a fé e as letras. Por meio da última, consolidou a visão que a sociedade tinha de sua pessoa: um filósofo, representante da Coroa para os assuntos relativos às Ciências Naturais, cujo vasto conhecimento se releva, também, na livraria que ao longo da vida constituiu. Além das pesquisas filosóficas, exerceu outras tantas atividades, demonstrando ser administrador, articulador, político, agricultor, minerador e empresário. Para o bem desempenho dessas funções, valeu-se da Ciência ilustrada, aprendida durante os anos em Coimbra, dos livros que possuía e do contato com seus colegas de profissão em Minas Gerais. As diversas frentes de atuação sob a responsabilidade de Joaquim Veloso de Miranda e os demais naturalistas na capitania, a essa mesma época, revelam a riqueza do pensamento ilustrado produzido na América portuguesa, quando da virada do século XVIII para o XIX. 322 REFERENCIAS FONTES TEXTUAIS MANUSCRITAS 1. DOCUMENTOS MANUSCRITOS 1.1. Arquivo da Casa Setecentista de Mariana (ACSM) Inventários 1° Ofício, caixa 30, auto731. Inventário de Ana Justina de Miranda, 1806. 1° Ofício, caixa 34, auto 892. Inventário de Clara Maria de Miranda, 1793. 1° Ofício, caixa 50, auto 1147, Inventário de Domingos Gomes Martins, 1800. 1° Ofício, caixa 79, auto 1686, Inventário de João Veloso de Miranda, 1796. 1° Ofício, caixa 88, auto 1857, Inventário de Francisco Veloso de Miranda, 1764. 1º Ofício, caixa 109, auto 2244. Inventário de Luis José de Godói Torres, 1824. 1° Ofício, caixa 115, auto 2377, Inventário de Paulo Rodrigues Durão, 1743. 1° Ofício, caixa 91, auto 1909. Inventário de Antônio Veloso de Miranda, 1822. 1° Ofício, caixa 116, auto 2406. Inventário de Maria Teresa de Nazaré, 1784.. 1° Ofício, caixa 138, auto 2875. Inventário de Francisco Pereira Lopes, 1764. 1º Ofício, caixa 23, auto 610, Inventário de João Lopes da Rocha, 1791. Testamentos 1° Ofício, Livro de Registro de Testamentos n° 68, 1763-1765, Testamento de Francisco Veloso de Miranda. 1° Ofício, Códice 192, auto 3721. Testamento de Antônio Veloso de Miranda. Notificações 2° Ofício, Notificação, códice 169, auto 4075. Autor: Francisco Veloso de Miranda e réu: Francisco Moreira Pacheco. 1764. Outros Documentos Justificação. Códice 296, auto 5935. Processo de Emancipação de João Veloso de Miranda, 1776, fl. 2. 323 1.2. Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo (ACMSP) Processo 1883, estante 3, gaveta 20. Processo de Habilitação De Genere et Moribus de Joaquim Veloso de Miranda e João Veloso de Miranda, 1761. 1.3. Arquivo da Universidade de Coimbra (AUC) Atas das Congregações da Faculdade de Filosofia Actas das Congregações da Faculdade de Filosofia (1772-1820), 1978. Cadernos para os pontos do curso filosófico Caderno para os Pontos do 1º, 2º e 3º Anos do Curso Filosófico (1773-1774). Cota: IV 1ª. D-2ª. D-8-3-nº 1; Caderno para os Pontos do 1º, 2º e 3º Anos do Curso Filosófico (1782-1783). Cota: IV-2ª. D-8-4-44. Matrículas Livro de Matrículas dos Estudantes da Faculdade de Leis do ano de 1773 para o de 1774 – Cota: IV-1ª D-2-3-nº 69 – 2º Ano do curso de Leis, fls. 39. Livro de Matrículas dos Estudantes da Faculdade de Matemática dos anos letivos de 1772-1783. Cota: IV-1ª. D-15-7-1. Livro de Matrículas dos Estudantes da Faculdade de Teologia – Ano letivo de 1772 para 1773. Cota: IV-1ª. D-2-3-68, fls. 14 e 29. Processos de Cartas/Provas Livro dos assentos dos exames, actos e graus da Faculdade de Filosofia (1773-1778), fls. 179v – Cota: IV-1ª D-3-3-nº. 48. Processos de Cartas (Provas) de curso – 2ª Série – Cx. 37. Outros documentos AUC, Índice de alunos da Universidade de Coimbra. Disponível em http://pesquisa.auc.uc.pt/details?id=204651. Acesso em 29 de outubro de 2016. Carta de D. Vandelli ao Abade Correia da Serra (13 de Setembro de 1784). In: AIRES, Cristóvão. Para a história da Academia das Ciências de Lisboa, Lisboa: Imprensa da Universidade, 1927, p. 224. 324 Livro da Tesouraria Geral da Junta da Fazenda da Universidade de Coimbra para a Folha Acadêmica dos ordenados do ano de 1780, fl. 89. Cota IN-1ª. D-11-5-nº. 48 e 49. Museu de História Natural. Representação de José Álvares Maciel pedindo ajudas de custo para prosseguir a viagem philosophica à Serra da Estrela. Agosto de 1784. 1.4. Arquivo do Museu Paulista (AMP) Fundo José Bonifácio Cota 29-276. Carta de Joaquim Veloso de Miranda a Domingos Vandelli. Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 1780. Cota 29-75. Carta de Manoel Galvão da Silva para Martinho de Melo e Castro. Bahia, 1783. 1.5. Arquivo Eclesiástico Dom Oscar de Oliveira (AEDOO) Livros do Seminário da Boa Morte Livro de Contas, 1751-1756. Livro de Matrículas, 1775-1854. Livros de Registro de Testamentos Estatutos municipais da Ordem Terceira do Serafim Humano o Glorioso Patriarca São Francisco da Cidade de Mariana. Livros de registro de testamentos – 1º Ofício, livro 68. Registros Paroquiais Livro de Batismo da Freguesia do Inficionado (Santa Rita Durão), nov. 1740-mar. 1806. Livro de Batismo da Freguesia do Inficionado (Santa Rita Durão), nov. 1732-mar. 1788 Livro de Batismo da Freguesia do Ouro Branco (Matriz de Santo Antônio), 1774-1817. Livro de Casamento da Freguesia do Inficionado (Santa Rita Durão), 1745-1779. Livro de Casamento da Freguesia do Inficionado (Santa Rita Durão), 1772-1906. 325 Processos De Genere et Moribus Armário 06, Auto 1026. Processo De Genere, vitae et moribus de Joaquim Veloso de Miranda e João Veloso de Miranda. Processos Matrimoniais Processo Matrimonial n° 2908, Francisco Veloso de Miranda e Maria Teresa de Nazaré, 1740. Processo Matrimonial n° 4264, João Veloso de Miranda e Clara Maria da Trindade, 1778 1.6. Arquivo Histórico do Museu da Inconfidência – “Casa do Pilar” (AHMI) 1º Ofício, Códice 306, Auto 6576. Testamento de Antônio José Vieira de Carvalho. Vila Rica, 1820. 2° Ofício, Códice. 34, auto 380, Vila Rica, 1816. Inventário de bens de Joaquim Veloso de Miranda. Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. Livro de Receita e Despesa, 1780-1818. Irmandade do Santíssimo Sacramento. Livro de eleições e termos de ajustes, 1718-1823. 1.7. Arquivo Histórico do Museu Bocage (AHMB) Arquivo Vandelli. Carta do Doutor Joaquim Velloso de Miranda a Domenico Vandelli. Vila Rica, 17 de dezembro de 1797. Arquivo Vandelli. Carta do Doutor Joaquim Velloso de Miranda a Domenico Vandelli. 1º de abril de 1799. CN/D-6. Carta para Júlio Mattiazzi, datada de 10 de Setembro de [17]83, S. Filippo di Benghela [Benguela, Angola]. Manuscrito, 4 p. CN/M-71. Carta de Joaquim Veloso de Miranda para Domingos Vandelli sobre suas diligências em Minas Gerais e do envio de 300 estampas de plantas e animais. Villa Rica, 2 de Dezembro de 1794. 326 CN/S-22. Carta de Joaquim José da Silva para Julio Mattiazzi. Benguela em 24 de maio de 1787. CN/S-26. Carta de Manoel Galvão da Silva para Julio Mattiazzi. Bahia, 16 de Junho de 1783. Rem. 609. FEIJÓ, João da Silva. Relação das sementes das plantas agrestes da Capitania do Ceará destinadas ao Real Jardim Botânico de Berlim, recebidas em 5 de setembro de 1803. Rem. 636. MIRANDA, Joaquim Veloso. Catalogus herbais, 1781 1.8. Arquivo Histórico Ultramarino (AHU) Documentos do Fundo Angola (AHU-Angola) Cx. 16, Inventário do envio de espécimes de história natural. São Paulo de Luanda, 20 de março de 1784. Cx. 39, Ofício de Joaquim José da Silva para Martinho de Melo e Castro. São Paulo de Luanda, 17 de março de 1784. Documentos do Fundo Bahia (AHU-BA) Cx. 93, Doc. 18240. Ofício do Governador Dom Fernando José de Portugal para Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, no qual participa ter transmitido ao Ouvidor, à Câmara e Capitães Mores da Comarca da Jacobina, para que prestassem todo o auxílio que lhes fosse pedido pelo Dr. Joaquim Veloso de Miranda, encarregado por ordem régia, de ir ao Rio de São Francisco examinar as nitreiras naturais, que constava existirem naquele distrito. Cidade da Bahia, 27 de abril de 1798. Documentos do Fundo Ceará (AHU-CE) Cx. 13, Doc. 727. Decreto do príncipe D. João a nomear João da Silva Feijó para sargento-mor de Milícias do Ceará. Palácio de Queluz, 01 de fevereiro de 1799. Cx. 14, Doc. 811. Ofício do naturalista João da Silva Feijó ao [Secretário de estado dos Negócios da Marinha e Ultramar, João Rodrigues de Sá e Melo], informando sobre as minas de salitre encontradas no Ceará e queixando-se das condições em que trabalha na referida capitania, faltando-lhe livros, desenhador e instrumentos para as observações físicas químicas e topográficas. Ceará, 13 de dezembro de 1800. 327 Cx. 17, Doc. 984. Ofício do naturalista João da Silva Feijó ao [secretário de estado dos Negócios da Marinha e Ultramar, Visconde de Anadia, João Rodrigues de Sá e Melo], remetendo sementes de frutos do Ceará. Fortaleza, 12 de maio de 1803. Cx. 101, Doc. 19.726. Ofício do ouvidor Baltasar da Silva Lisboa para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, no qual se refere à criação e pesca das tartarugas e à descoberta de ambargris na praia do Tacaré. Cairú, 22 de agosto de 1799. Documentos do Fundo Espírito Santo (AHU-ES) Cód. 606. Ofício do Governador da Capitania do Espírito Santo, Antônio Pires da Silva Pontes, para [o Secretário Interino de Estado da Marinha e Ultramar], D. Rodrigo de Souza Coutinho, informando sobre as produções naturais da capitania. Vila de Vitória, S/D. Cx. 06, Doc. 455. Ofício do [Governador da Capitania do Espírito Santo], Antônio Pires da Silva Pontes [Pais Leme de Camargo], ao [Secretário Interino de Estado da Marinha e Ultramar], D. Rodrigo de Souza Coutinho, a informar da remessa de suas caixas de caraipe contendo sementes, um embrulho das flores em algodão e um caixão com 18 libras de coxonilha para Antônio Martins Seixas com importante informação sobre Botânica. Vila de Vitória, 08 de fevereiro de 1801. Documentos do Fundo Maranhão (AHU-MA) Cx. 42, Doc. 4134. Carta do provedor e capitão-general do Maranhão, Joaquim de Melo e Póvoas ao Rei D. José, sobre a chegada de um navio de Angola que trazia cartas para o Monarca. São Lázaro, [São Luis do] Maranhão, 16 de agosto de 1765. Documentos do Fundo Minas Gerais (AHU-MG) Cx. 126, Doc. 48, Cód. 10077. Carta de Luís da Cunha Menezes, governador de Minas Gerais, para Martinho de Melo e Castro, secretário de Estado da Marinha e Ultramar, informando ter remetido para o Reino três caixotes contendo amostras recolhidas pelo naturalista Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 07 de julho de 1787. 328 Cx. 128, Doc. 23, Cód. 10204. Carta de Luís da Cunha Menezes, governador de Minas Gerais, para Martinho de Melo e Castro, secretário de Estado da Marinha e Ultramar, dando conta de ter remetido quatro caixas contendo amostras de produtos naturais recolhidas pelo naturalista Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 17 de fevereiro de 1788. Cx. 134, Doc. 56, Cód. 10513. Carta do Visconde de Barbacena, governador das Minas Gerais, enviando quatro caixas de produtos minerais e vegetais, e junto suas relações. Vila Rica, 12 de junho de 1790. Cx.140, Doc. 03, Cód. 10824. Requerimento de Gervásio de Souza Lobo, picador do Regimento de Cavalaria paga de Minas Gerais, solicitando licença para vir ao Reino. Vila Rica, 17 de janeiro de 1795. Cx. 143, Doc. 67, Cód. 10968. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, agradecendo pela sua promoção no cargo de secretário do governo das Minas Gerais, e pedindo os termos do seu cargo, fl. 6. Vila Rica, 10 de dezembro de 1797. Cx. 143, Doc. 68, Cód. 10979. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando cumprimento a ordem régia de fevereiro, 20 de 1797, de prover Joaquim Veloso de Miranda no posto de secretário do governo das Minas Gerais. Contém anexos e cópias. Vila Rica, 1797. Cx. 143, Doc. 46, Cód. 10986. Representação dos oficiais da Câmara de Mariana, pedindo provisão para nomearem o bacharel Luiz José de Godói Torres, médico do partido da dita Câmara, com ordenado. Leal Cidade de Mariana, 28 de agosto de 1797. Cx. 143, Doc. 58, Cód. 10978. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando cumprimento a ordem régia de 13 de dezembro de 1796, e de 18 e 31 de marco de 1797, para tomar providências necessárias para extrair o salitre na salina do rio São Francisco, e enviando uma amostra de chumbo acompanhado da sua nota. Vila Rica, 10 de julho de 1797. 329 Cx. 143, Doc. 67, Cód. 10968. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, agradecendo pela sua promoção no cargo de secretário do governo das Minas Gerais, e pedindo os termos do seu cargo. Vila Rica, 10 de dezembro de 1797. Cx. 143, Doc. 68, Cód. 10979. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando cumprimento a Ordem Régia de 20 de fevereiro de 1797, de prover Joaquim Veloso de Miranda no posto de secretário do governo das Minas Gerais. Vila Rica, 11 de outubro de 1797. Cx. 143, Doc. 74, Cód. 9251. Carta de Francisco Joaquim Moreira de Sá para o secretário de Estado dos Negócios Ultramarinos, como senhor da Casa e Morgado de Sá, em Guimarães, pedindo para que lhe sejam pagas as dívidas que lhe tinham feito várias pessoas em Minas Gerais para poder montar nas terras de seu morgado uma fábrica de papel. S/L, 1797. Cx. 144, Doc. 02, Cód. 11125. Carta de Joaquim Veloso de Miranda para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, sobre as providências que deu para extrair o salitre na fazenda do Mau Cabelo. Vila Rica, 22 de setembro de 1798. Cx. 144, Doc. 03, Cód. 11085. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, enviando a amostra de salitre extraído nas minas, junto com outras informações sobre o assunto. Vila Rica, 6 de fevereiro de 1798. Cx. 145, Doc. 02, Cód. 1128, Vila Rica, 12 de junho de 1798. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, informando sobre os descobrimentos de minas e do seu estado. Cx. 147, Doc. 10, Cód. 11332. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando os caixotes números 2 e 3 com amostras de salitre e suas respectivas notas e informando ter feito diligências para fazer análise ao ferro pantanoso. Vila Rica, 12 de janeiro de 1799. 330 Cx. 147, Doc. 41, Cód. 11344, Vila Rica, 7 de fevereiro de 1799. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, agradecendo a confiança atribuída como secretário do governo de Minas informando ter dado cumprimento as ordens régias sobre o salitre, conforme a carta de 22 de setembro de 1798. Cx. 148, Doc. 08, Cód. 11358. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, pedindo para que a Rainha confirme os 200 mil réis atribuídos pelo partido a Luís José de Godói Torres, medido da Vila. Vila Rica, 13 de março de 1799. Cx. 148, Doc. 18, Cód. 11377. Certidão de Pedro Afonso Galvão de São Martinho, tenente-coronel Comandante do Regimento de Cavalaria das Minas, atestando que Gervásio de Souza Lobo, soldado da 1ª Companhia, assentou praça de soldado em 1767, julho, 22. Vila Rica, 4 de abril de 1799. Cx. 148, Doc. 19, Cód. 11376. Atestado de Antônio José Vieira de Carvalho, cirurgião-mor do Regimento de Cavalaria Regular das Minas, certificando de Gervásio de Souza Lobo, picador do dito Regimento, padece de moléstia, pelo que está impedido de continuar no seu ofício. Vila Rica, 5 de abril de 1799. Cx. 148, Doc. 45, Cód. 11380. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para dom Rodrigo de Sousa Coutinho, respondendo as cartas de 20 de setembro e de 31 de outubro de 1798, a respeito da mina de Ferri encontrada num sítio pantanoso, para o que envia uma carta e um ensaio. Em anexo: 1 carta; 2ª via; cópia do respectivo anexo. Vila Rica, 10 de junho de 1799. Cx. 150, Doc. 46, Cód. 11261. Requerimento de José Gervásio de Souza, pedindo Carta Patente de confirmação do posto de capitão da companhia de Infantaria Auxiliar dos Homens Pardos dos distritos de Montevidel, Onça e Piedade. Vila Rica, 17 de outubro de 1799. Cx. 151, Doc. 16, Cód. 11428. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, informando que, em consequência da carta de 1799, abril, 5, encarregou Joaquim Veloso de Miranda do exame de plantas e de árvores próprias para o fabrico de papel. Vila Rica, 20 de novembro de 1799. 331 Cx. 153, Doc. 28, Cód. 11487. Decreto do Príncipe Regente Dom João, nomeando António Veloso de Miranda, coronel agregado ao Regimento de Cavalaria de Milícias da cidade de Mariana, no posto de coronel efetivo do dito Regimento. Queluz – Portugal, 1800. Cx. 153, Doc. 36, Cód. 14236. Ofício do Governador de Minas, Bernardo José de Lorena para o Secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos, Dom Rodrigo de Sousa Coutinho, no qual remete a planta do Horto Botânico do Ouro Preto. Vila Rica, 04 de julho de 1800. Cx. 154, Doc. 21, Cód. 11094. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas Gerais, a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, secretário de Estado dos Domínios Ultramarinos, dando notícia de achados de nitra (salitre) e enviando amostra da mesma. Vila Rica, 13 de agosto de 1798. Cx. 154, Doc. 36. Cód. 11717. Carta de Joaquim Veloso de Miranda para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, informando sobre vários assuntos, entre eles, a fábrica de salitre que acabou de construir e a nitreira artificial, para o que envia os seus desenhos. Vila Rica, 9 de outubro de 1800. Cx. 154, Doc. 44, Cód. 11735. Lista (1ª via) de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enviando amostras de plantas e de árvores próprias para o fabrico de papel, acompanhadas da nota de Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 15 de outubro de 1800. Cx. 156, Doc. 27, Código 11775. Requerimento de Antônio José Vieira de Carvalho, cirurgião-mor do Regimento de Cavalaria Regular da Capitania das Minas, pedindo a mercê do Hábito da Ordem de Cristo ou de Ávis, atendendo aos seus serviços e a ter feito entrar, na Real Casa de Fundição de Vila Rica, mais de 8 arrobas de ouro. Vila Rica, 4 de fevereiro de 1799. Cx. 160, Doc. 115, Cód. 115. Requerimento de Luís José de Godói Torres, bacharel em Medicina e Filosofia, tendo exercido a profissão nas câmaras de Vila Rica e Cidade de Mariana, solicitando o lugar de físico mor da Capitania de Minas Gerais. Vila Rica, 1801. 332 Cx. 169, Doc. 42, Cód. 12641. Requerimento de António Veloso, coronel, morador no arraial de Inficionado, termo da cidade de Mariana, solicitando o posto de ajudante de ordens do governo de Minas Gerais ou o de 1º caixa dos Diamantes de Serro do Frio ou o de escrivão dos Órfãos ou dos Ausentes da cidade de Mariana, 1804. Cx. 175, Doc. 11, Cód. 13210. Carta de Joaquim Veloso de Miranda, secretário do governo de Minas, ao Rei, dando conta da remessa de uma relação das ordens recebidas desde 1799 na Secretaria do referido governo. Vila Rica, 10 de março de 1805. Cx. 178, Doc. 50, Cód. 13144. Ofício de Pedro Maria Xavier de Ataíde e Melo, governador da capitania de Minas Gerais, ao Príncipe Regente, notificando o envio da justificação de serviço do Bacharel Luiz José de Godói Torres. Vila Rica, 30 de dezembro de 1805. Cx. 180, Doc. 79, Cód. 13476. Carta de Pedro Maria Xavier de Ataíde e Melo, governador de Minas Gerais, para o Visconde de Anadia, dando conta da remessa de uma coleção de sementes das plantas mais raras do país, e cebolas que se encontram nas mesmas plantas. Vila Rica, 26 de junho de 1806. Cx. 180, Doc. 81, Cód. 12959. Atestado escrito por Joaquim Veloso de Miranda. In: Requerimento de João Gomes da Silveira Mendonça, cadete do Regimento de Cavalaria de Minas, solicitando a concessão do posto de tenente do referido Regimento. Vila Rica, 27 de junho de 1806. Cx. 183, Doc. 07, Cód. 13707. Carta de João Gomes da Silveira Mendonça para o Visconde de Anadia, informando sobre uma relação de sementes de plantas indígenas que colhera na capitania de Minas Gerais. Lisboa, 9 de janeiro de 1807. Cx. 188, Doc. 33, Cód. 13874. Requerimento (minuta) de Apolinário de Sousa Caldas, furriel da Cavalaria de Linha das Minas Gerais, pedindo promoção ao posto de alferes ou de tenente de seu Regimento. Vila Rica, 9 de setembro de 1822. 333 Cx. 188, Doc. 35, Cód. 13880. Requerimento do furriel Apolinário de Sousa Caldas, que acompanhou um cientista na descoberta da Nova Lorena Diamantina, designado também para acompanhar o naturalista Joaquim Veloso de Miranda na exploração dos produtos botânicos pintando e desenhando as plantas, solicitando a sua passagem para o 1º Regimento de Cavalaria de Minas Gerais, no posto de tenente. Minas Gerais, 7 de janeiro de 1825. Cx. 149, Doc. 45, Cód. 11396. Carta de Bernardo José de Lorena, governador das Minas, para D. Rodrigo de Sousa Coutinho, propondo António Veloso de Miranda para o posto de coronel do Regimento de Cavalaria de Milícias de Mariana. Vila Rica, 1799. Cx. 153, Doc. 28, Cód. 11667. Decreto do Príncipe Regente D. João, nomeando António Veloso de Miranda, coronel agregado ao Regimento de Cavalaria de Milícias da cidade de Mariana, no posto de coronel efetivo do dito Regimento. Queluz, Portugal, 1800. Cx. 169, Doc. 42, Cód. 12812. Requerimento de António Veloso, coronel, morador no arraial de Inficionado, termo da cidade de Mariana, solicitando o posto de Ajudante de Ordens do Governo de Minas Gerais ou o de 1º caixa dos Diamantes de Serro do Frio ou o de Escrivão dos Órfãos ou dos Ausentes da cidade de Mariana, 1804. Documentos do Fundo Mato Grosso (AHU-MT) Cx. 34, Doc. 1791. Ofício do [governador e capitão general da capitania de Mato Grosso] Caetano Pinto de Miranda Montenegro ao [secretário de estado da Marinha e Ultramar] Rodrigo de Sousa Coutinho, informando que distribuiu desenhos da árvore da Quina para facilitar a sua descoberta; da falta de naturalistas; da necessidade de criação de uma cadeira de História Natural nas capitais do Brasil. Vila Bela, 14 de junho de 1798. Documentos do Fundo Moçambique (AHU-Moçambique) Cx. 21. Carta de Manuel Galvão da Silva para Martinho de Mello e Castro. Moçambique, 18 de agosto de 1784. Cx. 21. Petição de Manuel Galvão da Silva para começar as explorações. Moçambique, 23 de junho de 1784. 334 Cx. 22. Carta de Manuel Galvão da Silva para Martinho de Mello e Castro. Moçambique, Agosto, 1785. Cx. 22, Carta de Manuel Galvão da Silva para Martinho de Mello e Castro informando sobre o descobrimento de minas de ferro. Moçambique, 21 de agosto de 1785. Cx. 22, Carta do Governador de Moçambique, Antônio Manuel de Melo e Castro, para Martinho de Mello e Castro. Moçambique, 1º de dezembro de 1786. Cx. 23, Carta de Manuel Galvão da Silva para Martinho de Mello e Castro. Moçambique, 3 de dezembro de 1786. Cx. 23, Ofício de Manoel Galvão da Silva para Martinho de Melo e Castro. Moçambique, 15 de dezembro de 1786. Documentos do Fundo Pernambuco (AHU-PE) Cx. 99, Doc. 7758. Ofício do Governador da Capitania de Pernambuco, Luís Diogo Lobo da Silva, ao Secretário de Estado da Marinha e Ultramar, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, remetendo na charrua São José um elefante, pássaros e galinhas, vindos do Reino de Angola. Recife, 16 de abril de 1763. Documentos do Fundo Reino (AHU-Reino) Maço 2722. Carta de Domingos Vandelli para Martinho de Melo e Castro com lista de correspondentes no Brasil e equipamentos necessários para os naturalistas em suas jornadas. Coimbra, 22 de junho de 1778. Passaportes, Cód. 804, fl. 86v, Secretaria do Conselho Ultramarino, Cód. 610, fls. 162v-163. 1.9. Arquivo Municipal de Lisboa (AML) Marco dos Navios, Livro das entradas de navios portugueses, IMPS/01/0005, 1779-01-25 – 1779-12-13, fl. 50. 335 1.10. Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT) Desembargo do Paço (Estremadura), Maço 1338, Doc. 4. Ministério do Reino, Maço 44. VANDELLI, Domenico. Relação da origem, e estado presente do real Jardim Botânico, Laboratório Químico, Museu de História Natural, e Casa do Risco, 1795. Real Mesa Censória, Caixa 1, Edital de 10 de julho de 1769. 1.11. Arquivo Nacional do Rio de Janeiro (ANRJ) Códice 67, vol. 9, 11.48. Correspondência da corte com o vice-reinado, 1780. Códice 67, vol. 12, 11.46. Correspondência da corte com o vice-reinado, 1784. Códice 67, vol. 22, 11.92. Correspondência da corte com o vice-reinado, 1797. Códice 121, 1º pacote. Conserto do andaime para a água do Jardim Botânico, 1804. Códice 807, vol. 5, fls. 246-7. Coleção de memórias e outros documentos sobre vários objetos, 1768-1822. Códice 807, v. 24, fl. 62. Memória sobre a liberdade para o comércio do sal e pesca das baleias no Brasil. Códice 816. Memória em que se exorta, com o máximo interesse, o Reino de Portugal a fomentar a agricultura, a pesca e marinha, que devem constituir a base das suas atividades e merecer preferência às demais. 6f. 1.12. Arquivo Público do Estado do Pará (APEP) Códice 676, Oficio de dom Francisco de Souza Coutinho a dom Rodrigo de Souza Coutinho. Pará, 30 de março de 1798. 1.13. Arquivo Público Mineiro (APM) Câmara de Mariana (APM-CMM) Códice 29, fl. 38v, 39, 39v e 40. 336 Câmara de Ouro Preto (APM-CMOP) Cx. 72, doc. 37. Documento aprovando o nome do fiscal João Antônio da Rocha, para servir na Real Casa da Intendência de Vila Rica, no trimestre outubro/dezembro de 1800. Vila Rica, 10 de maio de 1800. Cx. 77, Doc. 40. Solicitação de José Joaquim de Oliveira Cardoso para o aforamento de algumas braças de terra, localizadas nos fundo do seu quintal. Vila Rica, 23 de março de 1804. Cx. 87, Doc. 54. Lista dos moradores escravos da freguesia de Nossa Senhora de Nazareth da Cachoeira. 1804. Casa dos Contos (APM-CC) Cx. 18, Doc. 10367, Rolo 506. Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda com a exploração e estabelecimento do Jardim botânico de Ouro Preto. Vila Rica, 21 de agosto de 1806. Cx. 18, Doc. 10367, Rolo 506. Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda com a exploração e estabelecimento do Jardim botânico de Ouro Preto. Vila Rica, 21 de agosto de 1806. Cx. 18, Rolo 506, Doc. 10377. Recibo passado por Gervásio de Souza Lobo ao capitão Braz Alves Antunes referente ao pagamento dos direitos das entradas. Vila Rica, 14 de março de 1775; Cx. 18, Rolo 506, documento 10367. Lista do cálculo da despesa da Real Fazenda com a exploração e estabelecimento do Jardim botânico de Ouro Preto. 21 de agosto de 1806. Cx. 25, Doc. 10510. Atestado do cavaleiro professo na Ordem de Cristo, Antônio José Vieira de Carvalho, sobre o óbito do soldado Felipe Neri Alves Ferreira. Vila Rica, 7 de setembro de 1815. Cx. 30, doc. 10614. Carta de Florêncio de Abreu Perada à Câmara de Vila Rica sobre a eleição e aprovação do capitão João Antônio da Rocha para o cargo de fiscal da Intendência. Vila Rica, 07 de setembro de 1803. 337 Cx. 31, Rolo 510, Doc. 10634. Atestado de idoneidade passado por Sebastião José de Souza Ferraz para Gervásio José de Souza sobre os bons serviços prestados na expedição das fronteiras do Sul. Onça, 19 de abril de 1785. Cx. 46, Doc. 30275. Carta de Antônio Tomaz de Figueiredo Neves, Teotônio Álvares de Oliveira Maciel, Francisco Lopes de Abreu, José Ferreira Pacheco, Joaquim José Lopes Meneses [Ribeiro], José Bento Soares, João José Lopes Mendes Ribeiro, Manuel Inácio de Melo e Souza, José Bento Leite Ferreira de Melo, a José Bonifácio de Andrada e Silva sobre a impossibilidade da execução do decreto de 16 de fevereiro na capitania de Minas Gerais. Vila Rica, 22 de março de 1822. Cx. 73, Rolo 523, Doc. 30814. Carta de José de Souza Gonçalves ao escrivão deputado da Junta da Real Fazenda, Carlos José da Silva, sobre o envio dos rendimentos das entradas, pelo soldado dragão Gervásio de Souza Lobo. São João del-Rei, 11 de março de 1775; Cx. 75, planilha 20.023. Carta de Antônio Veloso de Miranda, Presídio de São Lourenço, 20 de novembro de 1783. Cx. 77, rolo 524, Doc. 20064. Requerimento de José Veloso Carmo sobre a arrematação do ofício de juiz ordinário. 1780. Cx. 77, Rolo 524, Doc. 20071. Recibo passado por Gervásio de Souza Lobo ao administrador do registro do caminho novo, Manuel do Vale Amado, referente à entrega de ouro em pó e em barra. Registro do Caminho Novo, 03 de novembro de 1771; Cx 77, Rolo 524, Doc. 20071. Recibo passado por Antônio Moreira Duarte ao capitão Domingos de Amorim Lima por preparar a loteria. Vila Rica, 25 de novembro de 1797. Cx. 77, rolo 524, Doc. 20064. Requerimento de José Veloso Carmo sobre a arrematação do ofício de juiz ordinário. 1780. Cx. 77, Rolo 524, Doc. 20072. Recibo passado por Gervásio de Souza Lobo ao administrador do registro do caminho novo, Manuel do Vale Amado, referente à entrega de ouro em pó e em lavra. Registro do Caminho Novo, 04 de julho de 1776. 338 Cx. 79, Rolo 525, Doc. 20120. Recibo passado por Gervásio de Souza Lobo ao capitão Manuel do Vale Amado, referente à entrega de quantia no Tribunal da Junta de Vila Rica. Vila Rica, 03 de outubro de 1775. Cx. 080, Doc. 20135. Carta de Joaquim Felix Pinheiro sobre a criação de uma cadeira de Cirurgia, Anatomia e Parto, com a finalidade principal de atender a população. Vila Rica, 03 de outubro de 1797. Cx. 137, Rolo 541, Doc. 21189. Recibos pela redação dos bilhetes da loteria. Vila Rica, S/D; Cx. 137, Rolo 541, Doc. 21190. Recibos da compra de papel para a loteria. Cx. 137, Rolo 541, Doc. 21191. Recibo passado por José Gervásio de Souza ao capitão Domingos de Amorim Lima, referente à entrega de quantia de ouro pelo pagamento das pinturas das urnas da loteria. Vila Rica, 28 de abril de 1799. Cx. 159, Rolo 548, documento 21640. Requerimento de João Rodrigues Lage sobre o pagamento de dívida. 29 de novembro de 1809. Leis Mineiras (APM-CLM) Lei nº. 175 de 31 de março de 1840. Cria no Jardim Botânico desta cidade (Ouro Preto) uma escola normal de agricultura, e autoriza o governo a dar certas providências em benefício do mesmo estabelecimento. Registro de Terras (APM-RT) Livro Nº 177, 1854-1857. Relação dos possuidores de terras registradas na Paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Queluz, assento n° 247, fl. 26. Secretaria do Governo da Capitania de Minas Gerais (APM-SC) Cx. 11, Doc. 55. Informação de serviço de Antônio Veloso de Miranda sobre ataque de índios e falta de soldados na região do Presídio de Arrepiados. Barra do Bacalhau, 15 de dezembro de 1781. Cx. 13, Doc. 29. Informação de Antônio Veloso de Miranda a Dom Rodrigo José de Menezes, Governador, sobre castigos que devem ser aplicados aos desertores enviados para a conquista. Piracicaba, 05 de maio de 1783. 339 Cx. 13, Doc. 33. Informação de serviço de Antônio Veloso de Miranda a Dom Rodrigo José de Menezes, Governador, sobre as desordens, a falta de pessoas e de comida na conquista dos Arrepiados. Baguaçu (Manhuaçu), 10 de maio de 1783. Cx. 41, Doc. 17. Arquivo Público Mineiro. Seção Colonial. Informação de serviço de Francisco de Souza Guerra Araújo Godinho, ouvidor da Comarca, ao Governador sobre a impossibilidade de enviar as remessas de produtos naturais, plantas e frutos do Curral del-Rei. Sabará, 17 de dezembro de 1798. Cx. 106, Doc. 44. Requerimento do Alferes Francisco da Costa Azevedo e outros pedindo que o herdeiro e Testamenteiro do falecido Dr. Joaquim Veloso de Miranda, Coronel Antônio Veloso de Miranda, apresentada a lista dos bens adjudicados entregue a Fazenda e todos os bens que nela contém para serem juntados ao processo de Inventário, como fizeram todos os outros herdeiros. Vila Rica, 2 de maio de 1819. SC 08. Mapa das Salitreiras Naturais de Linhares, na Mata do Distrito da Formiga, vertentes do Rio São Francisco, desde o Porto R[eal] até o de Mariquita, das Fazendas, do dito Território, e das Fabricas estabelecidas para a extração de Salitre em 1810. Autor desconhecido, 1810. SC 12. Registro de provisões, patentes e sesmarias (1717 - 1721). SC 21. Registro de cartas, ordens, bandos, instruções, patentes, provisões e sesmarias (1721- 1725). SC 41. Informação de serviço de Francisco de Souza Guerra Araújo Godinho, ouvidor da Comarca, ao Governador sobre a impossibilidade de enviar as remessas de produtos naturais, plantas e frutos do Curral del-Rei. Sabará, 17 de dezembro de 1798. SC 83. Originais de Cartas Régias e Avisos, Ordens e Portarias do Governador a Diversas autoridades da Capitania, 1797-1809, 1798. SC 106. Requerimento do Alferes Francisco da Costa Azevedo e outros pedindo que o herdeiro e Testamenteiro do falecido Dr. Joaquim Veloso de Miranda, Coronel Antônio Veloso de Miranda, apresentada a lista dos bens adjudicados entregue a Fazenda e todos os bens que nela contém para serem juntados ao processo de Inventário, como fizeram todos os outros herdeiros. Vila Rica, 2 de maio de 1819. SC 119. Registro de sesmarias (1756 - 1758), fls. 17v-18v. 340 SC 244. Ofício de Antônio Veloso de Miranda para o Governador. [Presídio] dos Arrepiados, 23 de novembro de 1781, fls. 79v-80v. SC 269. Carta de Dom Rodrigo de Souza Coutinho para Bernardo José de Lorena. Mafra, 3 de outubro de 1799. SC 269. Carta ordenando ao Dor. Veloso para que empreenda viagem filosófica ao Rio São Francisco para pesquisar as nitreiras naturais. Palácio de Queluz, 10 de novembro de 1795. SC 269. Registros de Cartas, Ordens Régias e Avisos, 1795-1802. SC 276. Registro de ofícios do governador às Secretarias de Estado, 1797-1802. SC 277. Registro de cartas do Governador a várias autoridades e destas ao mesmo, 1797-1803. SC 279. Registros de Cartas, Ordens e Portarias do Governador a Diversas autoridades da Capitania. 1797-1809. SC 283. Originais de Cartas Régias e Avisos (1798) e Ordens e Portarias do Governador a Diversas autoridades da Capitania (1797-1809). SC 287. Registros de Cartas, Ordens Régias e Avisos (1795-1802), ano 1799, fl. [72]. SC 290. Ofício sobre as pesquisas do Salitre e os valores para a fabricação de pólvora, fl. [105] SC 290. Pedido para envio de aves para os Viveiros da Quinta de Belém. Palácio de Queluz, 3 de dezembro de 1800, fl. [184]. SC 290. Originais de Cartas Régias e Avisos, (1800). SC 295. Originais de Cartas Régias e Avisos, 1801. SC 300. Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-64, Gav. G-4. 1802-1803, p. 104-107v. Ofício de João Rodrigues de Sá e Melo Meneses e Souto Maior, Visconde de Anadia, ao governador da Capitania de Minas Gerais, Bernardo José de Lorena, sobre o envio de plantas, sementes e cebolas para Lisboa. Acompanha pequena instrução/memória. Palácio de Queluz, carta de 11 de Outubro de 1802 e memória de 18 de Outubro de 1802. 341 SC 300. Originais de Cartas régias e avisos. Rolo-64, Gav. G-4. 1802-1803, p. 104-107v. Ofício de João Rodrigues de Sá e Melo Meneses e Souto Maior, Visconde de Anadia, ao governador da Capitania de Minas Gerais, Bernardo José de Lorena, sobre o envio de plantas, sementes e cebolas para Lisboa. Acompanha pequena instrução/memória. Palácio de Queluz, carta de 11 de Outubro de 1802 e memória de 18 de Outubro de 1802. SC 307. Informação de serviço de Francisco de Souza Guerra Araújo Godinho, ouvidor da Comarca, ao Governador sobre a impossibilidade de enviar as remessas de produtos naturais, plantas e frutos do Curral del-Rei. SC 309. Originais de Cartas régias e avisos, 1805-1807. Secretaria do Governo da Capitania de Minas Gerais (APM-SC) Cx. 55, Doc. 63. Ofício do Vice-Rei D. Fernando José de Portugal e Castro ao governador, Bernardo José de Lorena, informando que já fez embarcar para Lisboa, na nau Rainha de Portugal, o bacharel José Joaquim de Oliveira Cardoso, oficial maior da secretaria de governo de Minas, conduzindo algumas vias de cartas, remessas mineralóicas e dois cavalos para Sua Alteza Real. Rio de Janeiro, 11 de maio de 1802. Cx. 89, Doc. 36. Representação que fazem os oficiais da Câmara à Sua Alteza Real, protestando contra a eleição do capitão João Antônio da Rocha para juiz ordinário da vila e termo de Queluz, por se tratar de pessoa de má reputação e imploram para que se proceda a novos pelouros. Queluz, 30 de novembro de 1813. Cx. 108, Doc. 43. Inventário do capitão mor cirurgião do Regimento da Cavalaria de linha, da capitania de Minas Gerais, Antônio José Vieira de Carvalho. Vila Rica, 26 de novembro de 1818. 1.14. Fundação Biblioteca Nacional – Rio de Janeiro (FBN) Documentos da Coleção Freire Alemão (FBN -FA) I – 28, 09, 054, documento microfilmado. Francisco Freire Alemão. Notícias a respeito dos naturalistas Joaquim Veloso de Miranda e José Mariano da Conceição Veloso, colhidas de vários informantes. 1849. Coleção Freire Alemão. 342 Documentos do Fundo Casa dos Contos (FBN -CC) I – 25, 09, 028. Recibo de pagamento do Tesoureiro da Real Fazenda, Manoel Antonio de Carvalho, a Joaquim Veloso de Miranda referente à sua alimentação. Vila Rica, 06/08/1791. I – 25, 19, 001, n° 004. Deputados da Junta da Real Fazenda de Minas Gerais. Cópia do ofício à Vossa Excelência tratando das despesas do Jardim botânico. Villa Rica, 14/09/1804. 5 p. Manuscrito. I – 25, 19, 002. Cópia da Portaria Régia ao Tesoureiro da Real Fazenda da Capitania de Minas Gerais para que se pague as despesas do Naturalista Joaquim Veloso de Miranda. Vila Rica, 17/02/1787. 1 p. Cópia. Manuscrito. I – 26, 22, 012, rolo 70, documento microfilmado. Documentos de autoridades coloniais e metropolitanas sobre Historia Natural, Mineralogia e construção do Jardim Botânico de Vila Rica. Vila Rica, 31/07/1785 – 17/11/1801. 10 doc. (13 p.). Cópia. Ms. Inclui: Carta Régia do Príncipe Regente a Bernardo José de Lorena, de 19/08/1799, Ordem de Dom Rodrigo de Souza Coutinho a Bernardo José de Lorena de 22/11/1799, Termo da Junta da Real Fazenda, de 19/02/1800, Cartas da Junta da Real Fazenda à Rainha D. Maria I e ao Príncipe Dom João, de 07/08/1799 e 05/03/1800. I – 26, 22, 050, rolo 70, documento microfilmado. Requerimento solicitando o reembolso pelo serviço prestado enquanto acompanhava com três escravos e sete bestas o naturalista Joaquim Veloso de Miranda. Villa Rica, 1791. 2 doc. (3 p.). Orig. Ms. Documento digitalizado. I – 26, 22, 053 nº 001, rolo 70, documento microfilmado. Requerimento de Joaquim Veloso de Miranda solicitando o pagamento da despesa feia no rol incluso durante a tarefa de exame e coleta dos produtos naturais da Capitania de Minas Gerais. Vila Rica, 1791. 3 doc. (3 p.) Orig. Ms. I – 26, 31, 047, rolo 79, documento microfilmado. Ordem Régia suspendendo o pagamento de Joaquim Veloso de Miranda e o recolhimento da Portaria que determina esse pagamento. Vila Rica, 08 de outubro de 1793. 343 Manuscritos I – 21, 2, 001. FERREIRA, Alexandre Rodrigues. Tratado Histórico do Rio Branco, 1786. I – 28, 32, 011. Notas sobre os Fasciculus das plantas do Brasil de Joaquim Velloso de Miranda, de autoria do Padre João de Loureiro. 05 de dezembro de 1780. I – 47, 16, 1 nº 8. Oficio de Rodrigo de Souza Coutinho a D. Fernando Jose de Portugal, enviando o catálogo das plantas do Horto Botânico do Para. Palácio de Queluz, 19 de novembro de 1798. 1.15. Museu de Ciências da Universidade de Lisboa (MCUL) Livro de Registro dos decretos, 1803. Livro de Registro dos Decretos, 1804. 1.16. Natural History Museum, London. Autograph letter to Sir J. Banks, consisting of descriptions, with water colour drawings of genera of Plants collected in Minas Geraes, Brazil. By Joaquin Velloso de Miranda, 1785, foll. 8 4°. 2. DOCUMENTOS CARTOGRÁFICOS MANUSCRITOS E IMPRESSOS 2.1. Arquivo Histórico do Exército (AHEx-Cart.) Acervo Cartográfico ANÔNIMO, (1767). Carta Geographica da Capitania de Minas Geraes e partes confinantes, 100 x 160 cm, manuscrito e aquarela, AHE, 004 - B.4.1. 344 2.2. Arquivo Histórico do Itamaraty (AHI-Map.) Mapoteca CARTA geographica que compreheende toda a Comarca do Rio das Mortes, Villa Rica, e parte da cidade de Mariana do Governo de Minas Geraes. Mapa sob a guarda da Mapoteca do Itamaraty. Cópia de 1827. 2.3. Arquivo Histórico Ultramarino (AHU-Cart.) Acervo Cartográfico ANÔNIMO (c. 1763). Mappa em que se compreende toda a Comarca do Sabara denominada do R. das Velhas, Villaz, Fregueziaz e Arrayaez da mesma Comarca com toda sua extensão, e enquanto forao orssados os cabedaes dos seus respectivos habitadores com o numero daz Pessoaz que os possuem, e tãobem a quota que se lançou da derrama de cada Villa, Freguezia e Arrayal, 34,0 x 46,6, Manuscrito, color., AHU n. 1599. ANÔNIMO (c. 1773). Mapa da Capitania de São Paulo em que se mostra tudo o que ela tinha antigamente thé o Rio Paná [Paraná], 41,5 x 53,0, manuscrito e aquarela, AHU, n. 285 / 1200. ANÔNIMO [Cláudio Manuel da Costa?] (c. 1758). Carta Geográfica do Termo de Villa Rica, em q se mostra que os Arrayaes das Catas Altas da Noroega, Itaberava, e Carijós lhe ficam mais perto, q ao da Villa de São José a q pertencem, e igualmente o de S. Antono do Rio das Pedras, q toca ao de Sabará, o q se mostra pela Escala, ou Petipé de leguas, 51,4 x 41,5 cm, manuscrito e aquarela, AHU, n. 253 / 1160 (reproduzido em Fonseca 2003; Costa 2004). CARTA de Monte Rorigo. ACL-N-Codices II, Nº Catálogo 2095. SL. 1803. MAPA Topográfico do Orto Botanico do Ouro preto. 1799. SALES, Cap. Francisco de (ca. 1800). Mappa de toda a extenção da Campanha da Princeza, feixada pelo Rio Grande, e pelos registros, que limitão a Capitania de Minas, 35 x 41 cm, manuscrito e aquarela, AHU, n. 263 / 1170, originalmente incluído no códice n. 2167, intitulado: “Livro de Creação da Campanha da Princeza” (reproduzido em: Fonseca, 2003; Costa, 2004). 345 2.4. Arquivo Nacional do Rio de Janeiro (ANRJ-Cart) Cartografia ANÔNIMO, (c. 1800). Carta topográfica da Comarca do Rio das Velhas, da Comarca de Ouro Preto, da Comarca do Serro do Frio e da Comarca do Rio das Mortes. 2.5. Arquivo Público Mineiro (APM-Cartografia) Acervo Cartográfico ANÔNIMO, (c. 1800). Mapa do Termo da Vila de Campanha da Princeza, Comarca do rio das Mortes de Minas Geraes, que só serve para mostrar a extensão do mesmo Termo, os lugares mais notaveis, distancias entre eles, estradas mais principais que o atravessam, 30 x 34,5 cm, manuscrito e aquarela, APM, MC 02.04. ANÔNIMO, (ca. 1796). [Mapa da região de Itajubá], anexo ao requerimento de João da Costa Manso, morador do distrito do Itajubá, s.d. (despacho de fevereiro de 1796), APM, SG, documentos avulsos, cx. 30, doc 1 e doc 2. 2.6. Fundação Biblioteca Nacional – Rio de Janeiro (FBN -DC) Divisão de Cartografia MAPA da Região das Minas Gerais com uma parte do caminho de São Paulo e do Rio de Janeiro para as Minas e dos afluentes terminais do São Francisco. [S.l.: s.n.]. [17--]. Medida: 56 x 65,5cm. Manuscrito. Localização: ARC. 030, 03, 018. MAPA da região de encontro entre os atuais estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, e do curso do Rio São Francisco. [S.l.: s.n.]. [17--]. Medida: 52,5 x 64cm. SALES, Cap. Francisco de (ca. 1800). Mappa do Termo da Villa da Campanha da Princeza inteiramente fechado por uma parte com os registros que defendem os limites da capitania, e por outra com o Rio Grande que a Adivide e separa dos mais termos das Villas confinantes, 16,2 x 17,9 cm, BNRJ, Seção de Manuscritos, códice 18.3.7A, intitulado “Accordão da Câmara da Villa de Campanha da Princeza”. 346 2.7. Instituto de Estudos Brasileiros (IEB-Cart.) Acervo Cartográfico ANÔNIMO [Cláudio Manuel da Costa?]. [Mapa do Termo de Vila Rica e parte dos termos limítrofes], 35X45 cm, Manuscrito e aquarela, IEB-USP (Col. JFAP, 23, fl. 22) (Reproduzido em COSTA, 2004). 347 FONTES TEXTUAIS IMPRESSAS 1. PERIÓDICOS (JORNAIS E REVISTAS) 1.1. Almanack de Lisboa ALMANACK DE LISBOA, 1786. 1.2. Anais da Fundação Biblioteca Nacional (AFBN) CABRAL, Alfredo do Vale. Notícia das obras manuscritas e inéditas relativas à viagem filosófica do Dr. Alexandre Rodrigues Ferreira, pelas capitanias do Grão-Pará, Rio Negro, Mato Grosso e Cuiabá (1783-92). AFBN, 1877. DISCURSO Político sobre a História Natural Portuguesa, feita pelo Dr. Balthazar da Silva Lisboa. Graduado na Faculdade de Leis, e opositor às cadeiras da mesma faculdade em a Universidade de Coimbra (1786). AFBN, 9,1,31. LISBOA, José da Silva. Carta para Domingos Vandelli, descrevendo-lhe a cidade, as ilhas e vilas da Capitania, o clima, as fortificações, a defesa militar, as tropas da guarnição, o comércio e a agricultura, e especialmente a cultura da cana do açúcar, tabaco, mandioca e algodão. Dá também informações sobre a população, os usos e costumes, o luxo, a escravatura, a exportação, as construções navais, a navegação para a Costa da Mina, etc.. Bahia, 18 de Outubro de 1781. AFBN, vol. 32, 1910. MORAIS, Francisco de. Estudantes brasileiros na Universidade de Coimbra (1772-1872). AFBN, vol. 62, 1940, p. 137-335. 1.3. Diário Oficial de Ouro Preto Lei n° 623, de 21 de dezembro de 2010. Ouro Preto, ano II, n° 223, 27 de dezembro de 2010. Dá denominação a Logradouro Público “Praça Cel. José Veloso do Carmo”.. 1.4. Gazeta de Lisboa Edição de 14 de abril de 1780. 348 1.5. Jornal de Coimbra Vol. XIII, Parte I, 1818, p. 47-50. 1.6. Jornal Minas Gerais Edição de 18 de agosto. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1907, p. 5. Edição de 14 de novembro. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1907, p. 5. 1.7. O Espeto Descoberta arqueológica em Santa Rita Durão. Passagem de Mariana, Mariana, p. 1-2. 15 maio 2014. 1.8. O Patriota SILVA. Joaquim José. Extracto da viagem, que fez ao sertão de Benguella no anno de 1785 por ordem do Governardor e Capitão General do Reino de Angola, o Bacharel Joaquim José da Silva, enviado á aquelle Reino como Naturalista, e depois Secretario do Governo. De Loanda para Benguella. O Patriota – Jornal Literário, Político, Mercantil & Comercial do Rio de Janeiro, n. 2. Rio de Janeiro: Impressão Régia, fevereiro de 1813. TORRES, Luiz José de Godói. Plantas medicinais indígenas de Minas Gerais, pelo Doutor Luiz José de Godoy Torres, Physico das tropas daquella Cappitania. O Patriota, nº 3, maio-jun. 1814. Mappa das Plantas do Brazil, suas virtudes, e lugares em que florescem, extrahido de offícios de vários médicos e cirurgioens. O Patriota. Rio de Janeiro, julho de 1814. 1.9. Revista do Arquivo Público Mineiro (RAPM) Ano I, 1896, p. 417-426. PONTES, Antônio Pires da Silva. Memória sobre a utilidade publica em se extrair o ouro das minas e os motivos dos poucos interesses que fazem os particulares, que minerão egualmente no Brazil. Ano II, 1897, p. 105. Auto de criação da Real Villa de Queluz. 349 Ano III, 1898, p. 273-274. Ofício do Dr. Joaquim Veloso de Miranda para sobre a extração do salitre na Capitania (1801). Ano IV, 1899, p. 101-102. Cartas patentes. Patente de Paulo Rodrigues Durão, sargento-mor do Mato Dentro. 27 de outubro de 1722. Ano X, 1905, p. 706-709. Inventário dos bens móveis de Antônio José Vieira de Carvalho, capitão cirurgião mor deste regimento de Cavalaria de Linha de Minas Gerais. Ano XXXVII, 1988, p. 38, vol. 2. Catálogo de Sesmarias. Ano IX, 1904, p. 320. Posse de Dom Rodrigo José de Menezes. 1.10. Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia (RIHGBahia) FERREIRA, Alexandre Rodrigues. Observações gerais e particulares sobre a classe dos mamais observados nos territórios dos três rios das Amazonas, Negro e da Madeira... (1790). Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, nº 60, p. 5-217, 1934. 1.11. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (RIHGB) COSTA, A. de Souza. O centenário Martim Francisco. RIHGB, vol. 183, p. 252-267, abr./jun. 1944. FERREIRA, Alexandre Rodrigues. Diário da viagem filosófica pela capitania de São José do Rio Negro. RIHGB, vol. 48. Rio de Janeiro, 1885, p. 1-234. _____. Notícias da voluntária redução de paz e amizade da feroz nação do gentio mura nos anos de 1784, 1785 e 1786. RIHGB, Vol. 36, t. 1, p. 323-392. _____. Viagem à Gruta das Onças. RIHGB, Vol. 12, 1874, p. 87-95. _____. Viagem à Gruta do Inferno. RIHGB, Vol. 4, 1863, p. 363-367. GAMA, José Saldanha da. “Biographia do Botanico brasileiro José Marianno da Conceição Veloso”. RIHGB, Vol. 31, 1868, p. 137-305. PONTES, Manoel José Pires da Silva. Memória da Comarca da Pitangui. RIHGB, Vol. 6, 1844. 350 SERRA, Ricardo Franco de Almeida (Capitão Engenheiro). Viagem de reconhecimento das comunicações do Brasil com a colônia holandesa do Suriname, 19 de junho de 1781. RIHGB, Vol. 6, 1844, p. 84-90. 1.12. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (RIHGMG) DINIZ, Sílvio Gabriel. “Biblioteca setecentista nas Minas Gerais”. RIHGMG. Belo Horizonte, 1959, nº 6, p. 344. 1.13. Revista Minas Gerais LEITE. Paulo Gomes. “Contestação e Revolução na Biblioteca de Vieira Couto”. Belo Horizonte. Vol. 27, jul.1990. _____. “Um iluminista holandês na biblioteca de Vieira Couto”. Belo Horizonte, Vol. 32, Dez. 1990, pp. 24-29. 1.14. Suplemento Literário da Manhã FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Velhos jardins mineiros. Domingo, 14/12/1941, p. 398-399. 1.15. Tribuna Farmacêutica O gênero Velloziella. Vol. VIII, n°12. Curitiba, 1941, p. 279. 2. DOCUMENTOS IMPRESSOS ACADEMIA Real de Ciências de Lisboa. Memórias de Mathematica e Phisica da Academia Real das Sciencias de Lisboa, tomo I. Lisboa: Na Typografia da Academia, 1797. _____. Plano de Estatutos com que convierão os primeiros sócios da Academia das Sciencias de Lisboa, com beneplácito de Sua Magestade. Lisboa: Na Regia Officina Typografica, 1780. 351 ACUÑA, Cristóbal de. Novo descobrimento do grande rio das Amazonas. Rio de Janeiro: Agir, 1994. ATWOOD, George. Construcção, e analyse de proposições geometrica, e experiências practicas, que servem de fundamento à architectura naval. Impressa por ordem de Sua Magestade e traduzida do inglez por Antonio Pires da Silva Pontes. Lisboa: Officina Patriarcal de João Procopio Correa da Silva, 1798. BAUMÉ, Antoine. Chymie expérimentale et raisonnée. Paris: Chez P. François Didot le Jeune, 1773. 3 v.; BERGMAN, Torben. Manual do Mineralógico, ou esboço do Reino Mineral, dispostos segundo a análise química. Lisboa: Casa Tipográfica do Arco do Cego, 1799. BINGLEY, William. Animal biography, or, Popular zoology, Vol. III. London: F. C. and J. Rivington, 1829. BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento. Diccionário Bibliográphico Brazileiro , 3 vol. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1898. BLUTEAU, Rafael (Padre). Dicionário da Língua Portugueza. Lisboa: Na Officina de Simão Thaddeo Ferreira, 1789. _____. Vocabulario portuguez & latino: aulico, anatomico, architectonico. Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus, 1712–1728. BOERHAAVE, Herman. Aphorismi de cognoscendis et curandis morbis, uberrimis commentariis, atque illustrati.editio secunda ab autore correcta et curandis febribus locupletata. Patavii (Pádua): Typis Seminarii, Apud Joannem Manfrè, 1754-1758. BRASIL. Autos da devassa da Inconfidência mineira. Belo Horizonte: Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1977, 10 vol. BREVES instrucções aos correspondentes da Academia das Sciencias de Lisboa sobre as remessas dos produos e notícias pertencentes à história da natureza para reformar hum Museo Nacional. Lisboa: na Regia Officina Typographica, 1781. BROTERO, Félix de Avelar. Compendio de botânica ou noçoens elementares desta sciencia, segundo os melhores escritores modernos, expostos na língua portugueza por Felix Avelar Brotero. Paris/Lisboa: Paulo Martin, 1788. 2 v. 352 _____. Flora Lusitanica, seu plantarum, quae in Lusitania vel sponte crescunt, vel frequentius coluntur, ex florum praesertim sexubus systematice distributarum,synopsis. Lisboa: Ex Typographia Regia, 1804. BUNBURY, Charles James Fox Von. Viagem de um naturalista inglês ao Rio de Janeiro e Minas Gerais (1833-1835). Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1981. BURTON, Richard. Viagem ao Rio de Janeiro e a Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1976. _____. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2001. CALDCLEUGH, Alexander. Viagens na América do Sul: extrato da obra contendo relato sobre o Brasil. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 2000. CÂMARA, Manuel Arruda da. Memória sobre a cultura dos algodoeiros, e sobre o método de escolher, e ensacar, etc., em que se propõem alguns planos novos para o seu melhoramento. Lisboa: Officina da Casa Literária do Arco do Cego, 1799. CARDOSO, José Luis. Memórias Econômicas Inéditas (1780-1808). Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa, 1987. CASAL, Manuel Aires de. Corografia brasílica ou Relação histórico-geográfica do Reino do Brasil pelo padre Manuel Aires de Casal. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1976. CHAPTAL, Jean-Antoine. Èléments de chimie. Montpellier: J.-F. Picot, 1790. 3 v. CORTÉS, Hernán. Letters from Mexico. New Haven e London: Yale University Press, 1986. COUTINHO (Dom) Rodrigo de Souza. Memória sobre o melhoramento dos domínios de Sua Majestade na América (1797). In: SILVA, Andrée Mansuy Diniz (Org.). Textos políticos, económicos e financeiros (1783-1811), vol. 2. Lisboa: Banco de Portugal, 1993. _____. Sobre a verdadeira influencia das Minas dos Metaes preciosos na Industria das Nações que as possuem, e especialmente da Portugueza. Memórias econômicas da Academia..., tomo II. Lisboa: Na Officina da Academia Real das Sciências, 1790. 353 _____. Discurso I, feito pelo Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Dom Rodrigo de Sousa Coutinho na abertura da Sociedade Real Marítima, em 22 de Dezembro de 1798. In: FUNCHAL (Agostinho de Souza Coutinho, marquês do). O conde de Linhares Dom Rodrigo Domingos António de Sousa Coutinho. Lisboa: Typographia Bayard, 1908, p. 105-115. _____. Memória sobre a verdadeira influencia das minas de metais preciosos na industria das nações que as possuem, e especialmente na portuguesa. Memórias Econômicas da Academia, Tomo I. Lisboa: Na Officina da Real Academia das Sciencias, 1789. COUTO, Jose Vieira. Memória sobre a Capitania das Minas Gerais: seu território, clima e produções metálicas. Edição organizada e comentada por Júnia Ferreira Furtado. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994 _____. Memória sobre as minas da capitania de Minas Gerais; suas descriçoes, ensaios e domicílio próprio, à maneira de itinerário, com apêndice sobre a Nova Lorena Diamantina, sua descrição, suas produções mineralógicas e suas utilidades que deste país possam resultar ao Estado, escrita pelo Doutor José Vieira Couto, e publicada sob os auspícios do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil. Rio de Janeiro: Em Casa dos Editores Laemmert, 1842 [1801].. _____. Memória sobre as salitreiras naturais de Monte Rorigo; maneira de as auxiliar por meio das artificiais; refinaria do nitrato de potássio ou salitre. Rio de Janeiro: na Impressão Régia, 1809 [1803]. _____. Memória sobre a Capitania das Minas Gerais; seu território, clima e produções metálicas; estudo crítico, transcrição e pesquisa histórica por Júnia Ferreira Furtado. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994. CULLEN, Willian. First lines of the practice of physic. 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Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 2002. _____. Pluto Brasiliensis. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1979. _____. Pluto Brasiliensis. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1944. FERREIRA, Alexandre Rodrigues. Enfermidades endêmicas da Capitania do Mato Grosso. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2008, 176 p. FOURCROY, Antoine-François. Memória sobre a cultura, a preparação do Girofeito aromático, vulgo Cravo da Índia, nas Ilhas de Bourbon e Cavena. Lisboa: Officina de João Procópio Correa da Silva, 1798. GARDNER, George. Travels in the interior of Brazil. London: Reeve, Benham and Reeve, 1849. _____. Viagem ao interior do Brasil, principalmente nas províncias do Norte e nos distritos do ouro e do diamante durante os anos de 1836-1841. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1975. _____. Viagens no Brasil: principalmente nas províncias do norte e nos distritos do ouro e do diamante durante os anos de 1836-1841. 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