Desencontro marcado? Desapropriação, eficiência administrativa e absolutismo proprietário no Brasil (1826-1930)
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Universidade Federal de Minas Gerais
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Tipo
Dissertação de mestrado
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Primeiro orientador
Membros da banca
Maria Tereza Fonseca Dias
Pedro Gimenez Cantisano
Pedro Gimenez Cantisano
Resumo
A historiografia trata o século XIX como um período de exacerbação das prerrogativas do
Estado e, ao mesmo tempo, de absolutização da propriedade. Ao analisar a desapropriação, essa
dissertação se propõe a colocar em perspectiva essas duas conclusões, e identificar como elas
podem se conciliar. Para tanto, foram analisadas as grandes intervenções legislativas nacionais
sobre o tema com os respectivos debates parlamentares, os livros de direito público, as
discussões na imprensa diária e 466 decisões judiciais e 42 pareceres retirados de 12 revistas
jurídicas. Foi possível identificar a existência de três modelos de desapropriação ao longo do
período, que coexistiram. O primeiro deriva da lei de 1826, se fundamenta na distinção entre
utilidade e necessidade pública e é de difícil execução. O segundo surge com a lei de 1845 e
institui o júri de desapropriação; é de realização um pouco mais fácil, mas ainda gera
indenizações elevadas. A partir da década de 1850, com o desenvolvimento econômico do país,
é preciso uma presença maior do Estado, e se cria um novo modelo, a partir de um decreto
especial em 1855. Ele é empregado sucessivamente em pequenas reformas urbanas no Rio de
Janeiro e na construção de ferrovias. Essa flexibilização progressiva foi facilitada por duas
estratégias parlamentares: a criação de regimes legislativos de exceção, com desapropriação
mais rápida; e a segunda era a apresentação de projetos lacunosos, de discussão mais rápida,
que diminuíam as oportunidades de discussão para a oposição. Em 1904, com vistas à grande
reforma urbana do Rio de Janeiro, as complexas disposições vigentes foram consolidadas e
simplificadas. Paralelamente a esse percurso legislativo, tentou-se usar o instituto da
desapropriação para uma abolição progressiva da escravidão, mas os proponentes dessa solução
não obtiveram sucesso. Daí deriva a primeira conclusão: o desenvolvimento do instituto estava
prioritariamente relacionado às necessidades das reformas urbanas e, em menor medida, com a
construção de ferrovias. A análise das revistas jurídicas, por sua vez, levou a resultados
adicionais. A segunda conclusão, então, é a existência de uma disjunção entre um discurso
doutrinário e judicial que demoniza a desapropriação, apesar de considerá-la necessária, e, por
outro lado, uma prática forense que mostra proprietários lucrando com as desapropriações por
meio da negociação com o Estado. A terceira é que as desapropriações não podem ser encaradas
unicamente como um conflito entre Estado e particular, já que a maior parte delas é promovida
por empresas particulares autorizadas pelo poder público. A quarta conclusão é que, no século
XX, as leis são feitas com o objetivo de acelerar a intervenção Estatal, mas os juízes contrariam
esse objetivo ampliando as oportunidades de discussão de diversos temas dentro do processo.
A quinta é que os juristas brasileiros constantemente referenciam autores estrangeiros,
especialmente franceses, mas, ao “traduzir” as suas ideias para o direito brasileiro, construíram
um sistema progressivamente mais favorável ao Estado. Em linhas gerais, é possível dizer que,
entre 1826 e 1930, o ordenamento jurídico brasileiro foi dotando o Estado de meios cada vez
mais eficientes para intervir na propriedade; mas essa intervenção podia tanto violar o direito
de propriedade como atender a interesses ocultos de uma minoria de proprietários bem relacionados
Abstract
Historiography thinks of the nineteenth century as a time when State prerogatives are
exacerbated but, equally, of absolutization of property. Through the analysis of expropriation,
this dissertation put these two conclusions into perspective, and try to identify how they can be
reconciled. To tackle this objective, the major national legislative interventions on the subject
were scrutinized, coupled with the respective parliamentary debates, public law books,
discussions in the daily press and 466 court rulings and 42 legal opinions taken from 12 legal
journals. It was possible to identify the existence of three models of expropriation over the
period which coexisted. The first derives from the 1826 act, is based on the distinction between
public utility and public necessity and is projected to be hard to execute. The second arises with
the 1845 act and institutes the expropriation jury; it is a little easier to carry out, but still
generates high compensations. From the 1850s on, with the economic development of the
country, a greater presence of the State was demanded, and a new model was created, based on
a special decree in 1855. It was successively employed in small urban reforms in Rio de Janeiro
and in the construction of railroads. This progressive flexibilization was facilitated by two
parliamentary strategies: the creation of legislative regimes of exception, with faster kinds of
expropriation; and the second was the presentation of sketchy projects, of faster discussion,
which diminished the opportunities for filibuster for the opposition. In 1904, with the major
urban reform in Rio de Janeiro in view, the complex provisions then in force were consolidated
and simplified. Parallel to this legislative path, an attempt was made in late 19th century to use
expropriation for a smooth abolition of slavery, but the proponents of this solution were
unsuccessful. Hence the first conclusion: the development of the institute was primarily related
to the needs of urban reforms and, to a lesser extent, to the construction of railroads. The
analysis of legal journals led to additional results. The second conclusion, then, is the existence
of a disjunction between a doctrinal and judicial discourse that demonizes expropriation, despite
considering it necessary, and, on the other hand, a forensic practice that shows landowners
profiting from expropriations through negotiation with the State. The third is that expropriations
cannot be viewed solely as a conflict between the State and private individuals, since most of
them are promoted by private companies authorized by the public authorities. The fourth
conclusion is that in the twentieth century, laws are made with the objective of accelerating
state intervention, but judges oppose this objective by expanding the opportunities for
discussion of various issues within the process. The fifth is that Brazilian jurists constantly refer
to foreign authors, especially French ones, but when "translating" their ideas into Brazilian law,
they have built a system that is progressively more favorable to the State. In general terms, it is
possible to say that, between 1826 and 1930, the Brazilian legal system was providing the State
with increasingly efficient means to intervene in property; but this intervention could in certain
cases violate the right to property, or, in very specific ones, serve the hidden interests of a
minority of well-connected owners.
Assunto
Direito – História, Direito de propriedade, Desapropriação – Legislação – Brasil, Intervenção estatal
Palavras-chave
Direito
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