Lock-in in Brazil's automotive fuel market: a basis for effective energy transition policies

Abstract

Estimativas recentes indicam a probabilidade de que, ainda no século XXI, a temperatura média da Terra ultrapasse em 1,5ºC os níveis pré-industriais. Combater o aquecimento global por meio da redução das emissões de gases de efeito estufa envolve, necessariamente, o “unlocking” regional de complexos tecno-institucionais muito bem estabelecidos. Contudo, até o momento, não experimentamos “eventos extraordinários” capazes de desfazer o “lock-in” consolidado em torno do uso dos combustíveis fósseis, cuja alta eficiência e viabilidade econômica, além do poder econômico concentrado nas indústrias estabelecidas, conformam condições desafiadoras. Neste contexto, o mercado de combustíveis automotivos do Brasil se apresenta como um estudo de caso exemplar, uma vez que, depois de um carbon lock-in totalmente consolidado, foram implementadas duas grandes iniciativas de “unlocking”, ao menos parcialmente. Dois biocombustíveis foram introduzidos para atuar alternativas tecnológicas aos combustíveis fósseis: o etanol substituindo gasolina e o biodiesel substituindo diesel. Ambas as tentativas enfrentaram desafios distintos e significativos, que impediram seu completo sucesso. O principal objetivo desta tese é fornecer subsídios para a elaboração de políticas eficazes de transição energética, estudando as forças do carbon lock-in e os diferentes desafios encontrados durante as tentativas, já realizadas, de “unlocking”. Primeiramente, o sistema de inovação do biodiesel é analisado. Apesar do crescimento significativo da indústria brasileira de biodiesel, as metas tecnológicas delineadas pelo governo não foram, em grande medida, alcançadas. O estudo emprega um arcabouço analítico baseado nas "Funções dos Sistemas de Inovação" de Hekkert et al. (2007) para investigar as razões por trás da estagnação tecnológica, reunindo dados inéditos recolhidos e tratados a partir de fontes diversas. As conclusões apontam quatro fatores para a estagnação: declínio no desenvolvimento científico e tecnológico; subutilização das redes de pesquisa e de colaborações entre universidades e indústria; pouco desenvolvimento tecnológico do motor adaptado ao biodiesel; e incipiente diversificação de matéria-prima. Em segundo lugar, analisamos a primeira e mais avançada tentativa de “unlocking”: a substituição da gasolina pelo etanol. A política do governo brasileiro de promover o etanol desde a década de 1970 foi considerada bem-sucedida, com incentivos direcionados à oferta e à demanda. Um robusto sistema de inovação evoluiu em torno da tecnologia do etanol, tornando-a competitiva. A introdução de veículos flex reduziu a zero os “switching costs” entre os combustíveis e, contudo, o consumo relativo do etanol permaneceu estagnado nos últimos dez anos. Um conjunto de dados inéditos, organizados por município, revela disparidades regionais na adoção de etanol em todo o Brasil. A adoção do etanol é explicada por um modelo econométrico com dados em painel tendo como variáveis explicativas fatores sociodemográficos – como idade, educação, renda e intensidade de uso –, além dos preços dos combustíveis. Os resultados apontam que todas as variáveis sociodemográficas são estatisticamente significativas para explicar a adoção, o que significa que o preço por si só não determina as escolhas do consumidor. Tais análises são cruciais para a concepção de políticas eficazes de adoção de etanol e enfrentamento dos desafios impostos pela transição energética em meio a tendências globais para políticas de precificação do carbono e adoção de veículos elétricos.